• Nenhum resultado encontrado

Percentual de audiências por responsáveis presentes

3.4 A perda do poder familiar

Foi perguntado ao juiz se, após o advento da lei 12.010/2009, houve um significativo aumento da decretação da perda do poder familiar. Segundo o entrevistado houve sim um aumento significativo devido à obrigatoriedade da lei rever os casos das crianças e adolescentes envolvidos no cenário de uma possível perda do poder familiar de suas famílias, a cada seis meses, conforme determina a lei 12.010/2009, in verbis:

Art. 2o A Lei no 8.069, de 13 de julho de 1990, Estatuto da Criança e do Adolescente, passa a vigorar com as seguintes alterações:

§ 1º Toda criança ou adolescente que estiver inserido em programa de acolhimento familiar ou institucional terá sua situação reavaliada, no máximo, a cada 6 (seis) meses, devendo a autoridade judiciária competente, com base em relatório elaborado por equipe interprofissional ou multidisciplinar, decidir de forma fundamentada pela possibilidade de reintegração familiar ou colocação em família substituta, em quaisquer das modalidades previstas no art. 28 desta Lei. (BRASIL, 2009)

Esta constatação feita pelo juiz em relação ao significativo aumento da decretação da perda do poder familiar pós advento da lei 12.010/2009, também foi feita por outros entrevistados, como os psicólogos, por exemplo.

O pscicólogo Joaquim participa da mesma opinião, ou seja, acredita que houve um aumento das sentenças que decretaram a perda do poder familiar após a nova legislação, devido a necessidade trazida pela lei das audiências concentradas ocorrem de seis (6) em seis (6) meses nas instituições de acolhimento. Aduz ainda o entrevistado que as crianças e adolescentes hoje em dia, não podem ficar mais de dois (2) anos institucionalizadas. Embora saibamos que isso ocorre apenas na teoria, pois, na prática, inclusive nas pesquisas de campo, foi visto crianças e adolescentes institucionalizados cinco, oito, dez anos.

Questionamos ao psicólogo se essa celeridade trazida com a nova lei não poderia ser perigosa e até mesmo induzir a erro. O entrevistado concordou, porém afirmou que a perda do poder familiar às vezes pode ser apenas uma figura jurídica, pois na sua opinião, ninguém deixa de ser pai ou mãe, apenas porque o juiz decretou a sentença.

Ora, o comentário do entrevistado quando afirma que “ninguém deixa de ser pai ou mãe apenas porque o juiz decretou a sentença” deve ser problematizada. Na prática, a destituição do poder familiar muitas vezes vem seguida pela adoção, ou seja, a criança ou adolescente é colocada em família substituta, perdendo o contato e vínculo, na maioria das vezes, com sua família de origem.

Contudo, em relação aos pais e principalmente às mães que se fazem mais presentes a situação é mais complexa. O “esquecimento” de um filho e a certeza de que este está sendo criado por outra família podem ser um importante agente de sofrimento e dor. E aí a frase do pscicologo ganha sentido: não se deixar de ser pai e mãe afetivamente por conta de um decreto. Mas se deixa de ser pai e mãe legalmente, e isso tem seus efeitos. É certo que o sentimento de ser pai ou mãe, seja pelos pais, ou, seja pela criança ou adolescente, podem não se apagar com a decretação de uma sentença de destituição do poder familiar, ocorre que os laços civis são apagados, e muitas vezes os afetivos são afastados.

Em virtude disso, corroborando com o entendimento do psicólogo, o artigo 48 da lei 8060/90 (ECA), com redação dada pela lei 12.010/2009 aduz, in verbis:

Art. 48. O adotado tem direito de conhecer sua origem biológica, bem como de obter acesso irrestrito ao processo no qual a medida foi aplicada e seus eventuais incidentes, após completar 18 (dezoito) anos. (BRASIL, 1990)

Logo, se ao completar 18 anos o adotado tiver interesse em procurar sua família biológica, o mesmo pode e tem direito de conhecer sua origem, segundo inovações trazidas pela nova legislação. Mas um pai e uma mãe não têm direito de saber como e onde estão seus filhos.

Em relação à entrevista da psicóloga Antônia – esta participou de todas as audiências concentradas em todas as instituições de acolhimento - no tocante à mesma pergunta feita ao psicólogo, a mesma afirma ter ocorrido sim um aumento das destituições pós lei 12.010, agilizando a perda do poder familiar, pois acredita que a legislação acelerou todo este processo. Porém, a entrevistada, diferentemente do juiz e do psicólogo, argumenta que acha essa celeridade perigosa, principalmente pelo fato de não haver políticas públicas em prol dessas famílias, bem como uma rede atuante. Por outro lado, a entrevistada menciona que em alguns casos foi necessário essa celeridade que a lei se propôs a trazer, pois algumas situações se carregavam anos e anos, e a legislação veio exatamente para resolver e acelerar esses problemas.

Para nossa surpresa, em entrevista com a assistente social Joana, indagada se de novembro de 2009 até os dias de hoje aumentou o número de sentenças decretando a perda do poder familiar, a mesma teve uma resposta diferente dos outros entrevistados. Afirmou que não houve aumento, sendo a realidade anterior a 2009 bem parecida com a dos dias atuais. Aduziu ainda a entrevistada que não acredita que a lei 12.010/2009 trouxe uma agilidade quanto à decretação da perda do poder familiar, nem uma celeridade em relação ao processo de adoção.

Vale ressaltar que Joana, logo no inicio da entrevista, demonstrou conhecer de forma resumida a lei 12.010/2009, respondendo inclusive que conhecia pouco a mencionada legislação. As respostas da assistente social eram sempre muito curtas, não se aprofundando em nenhum dos assuntos especificamente quando se tratava da norma jurídica, nem demonstrando interesse em desenvolver uma relação com a entrevistadora.

Em relação à última entrevistada, a também assistente social, Mercedes atua há dois (2) anos na Vara da Infância e Juventude de Niterói e para nosso espanto, quando indagada

sobre a lei 12.010/209, disse desconhecer tal legislação. Logo, todas as perguntas relativas a esta norma jurídica ficaram comprometidas para a entrevista.

Essa é uma questão muito grave. O relato de uma profissional (a quem o juiz escuta e recebe relatórios e laudos) que diz desconhecer a lei com a qual trabalha. Ainda que sendo recente na instituição, o tempo de dois anos é suficiente para um estudo da temática. Não se pode achar que por não ser uma aplicadora do direito, deve se eximir de conhecer a lei, deixando apenas isso a cargo do juiz, afinal trata-se de uma integrante da equipe técnica do judiciário.

De fato não se espera que a equipe técnica da Vara da Infância e Juventude domine totalmente a legislação que rege atualmente a área da criança e do adolescente juntamente com o Estatuto da Criança e Adolescente, principalmente porque se trata de assistentes sociais e psicólogos, e não operadores do direito. Porém, espera-se que alguém que esteja há dois (2) anos atuando no setor infanto juvenil conheça a legislação aplicável a esta seara. Fato esse que não ocorreu em relação à assistente social Mercedes.

Verifica-se diante desses fatos, que as assistentes sociais foram as profissionais que menos conheciam a lei 12.010/2009. Considerando ser esta uma profissão que afirma o compromisso com seus usuários, este desconhecimento pode ser interpretado como um certo descompromisso com as atividades as quais exercem, bem como com seu público alvo.

3.5 Avanços e retrocessos da lei

Retomando a entrevista realizada junto ao juiz, quando questionado quais seriam os retrocessos da nova lei, o entrevistado respondeu dizendo que não vê qualquer retrocesso na legislação, apenas avanços. Logo a celeridade trazida pela lei, abordada e tida como consenso por quase todos os entrevistados, é considerada um avanço para este entrevistado.

No que tange a média de tempo de um processo de adoção, ou seja, de qual era a duração de um processo que envolvia a retirada do poder familiar antes da lei e qual a duração atualmente, o juiz respondeu dizendo que não pode precisar, tendo em vista que os processos julgados por ele, sempre foram rápidos, pois em sua opinião o fator tempo é determinante para as crianças, principalmente quando se trata de colocá-las para a adoção. Finalizou sua resposta, dizendo que “infância, diferente das outras, é vida.”

Nessa linha de raciocínio, o psicólogo Joaquim, quando indagado sobre a duração de um processo de destituição do poder familiar, com a consequente adoção, informou que