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A abordagem quantitativa segue os pressupostos básicos da Sociolingüística laboviana (cf Labov, 1972), que busca medir o efeito de grupos de fatores sobre formas de significado aparentemente equivalentes, com ênfase na questão da variável lingüística, evidenciando aspectos que permitam o enquadramento do fenômeno em estudo dentro da Teoria da Variação.

Para cumprir esse objetivo, efetuaram-se pesquisas em trabalhos que tratavam da variação na ordem dos constituintes, a fim de determinar o grau de aceitabilidade de hipóteses inferidas a partir da análise da teoria e do corpus. A hipótese maior que sustentou este trabalho, com seu prenuncio em Tarallo e Kato (1989), é a de que a variação intra-lingüística da ordem dos constituintes é regida pelos mesmos parâmetros

da variação inter-lingüística. A possibilidade de o português manifestar a ordem V DP, por exeirq)lo - uma das propriedades das línguas de sujeito nulo (pro-drop) - pode ser quantitativamente maior ou menor que a mesma possibilidade em linguas como o italiano e o espanhol.

Os resultados de Lira (1986; 1996), Berlinck (1988; 1989; 1995) e ZiUes (1999) sobre a variação da ordem do DP mostraram que as chances de se encontrar a ordem V DP são maiores em contextos monoargumentais e raras em contextos com verbos de mais de um argumento, como já foi observado no capítulo I. Esses resultados também foram revelados por Silva-Corvalán (1983) sobre o espanhol, o que mostra que muitos dos grupos de fatores que condicionam a inversão do sujeito atuam nessas duas línguas na mesma direção. Verificar em quais contextos monoargiimentais a ordem V DP se manifesta com uma maior fi-eqüência no português do Brasil, em especial, no português falado em Florianópolis, pode contribuir para mostrar que a monoargumentalidade não é uma construção homogênea

4.2.1. A variação nos estudos sintáticos

Uma questão que vem sendo bastante discutida na área dos estudos sobre variação é a aplicabilidade da teoria da variação, e, mais amplamente, de técnicas quantitativas ao estudo de fenômenos sintáticos. Nos seus primórdios, a teoria da variação concentrou-se na análise de fenômenos fonológicos, que, na grande maioria das vezes, estão associados a significados estilísticos e sociais distintos. A transferência dos métodos de análise para além do nível fonológico coloca problemas com rdação ao requisito de mesmo significado.

Segundo Lavandera,

“as unidades para além do nível fonológico têm cada uma um significado. Logo, se cada construção sintática tem seu próprio significado, como épossível que haja variação, se po r variação entendemos duas (ou mais) maneiras de dit^r a mesma coisa?” (1977)

Nesse sentido, para a autora, seria inadequado estender a outros níveis de análises de variação a noção de variável sociolingüística, a não ser que a variação carregue significado social e estilístico além do significado referencial, que tem de ser o mesmo

para todas as variantes. A questão que se levanta é polêmica: o que seria ter o mesmo significado referencial, dada a inexistência de sinonímia absoluta nas línguas naturais?

Labov (1978) alarga a noção de variável lingüística para dois enunciados que se

referem ao mesmo estado de coisas e que têm o mesmo valor de verdade (entendendo

estado de coisas como significado representacional), relativizando a noção de ‘mesmo significado’. Diz que a teoria da variação deve levar em conta a Gramática da língua e a competência lingüística dos falantes. Para o autor, o valor da análise de variação em sintaxe está em ser um indicador dos processos gramaticais subjacentes, isto é, um indicador das restrições que inibem ou favorecem o uso de uma ou de outra variante, um indicador que também possa predizer mudanças no sistema.

Utilizando-nos da proposta metodológica de Labov, entendemos que a quantificação de fenômenos sintáticos pode, além de nos fomecer bons indicadores da relevância de diversos grupos de fatores, como Paiva (1991) ressalta, ser um instrumental útil, capaz até mesmo de verificar a ausência de variação. Como a pesquisa que ora desenvolvemos se concentra, principalmente, na situação de construções V DP no interior do sistema lingüístico do português do Brasil, a variação sintática intra- lingüística pode ser entendida como um caso de competição entre gramáticas, entre sistemas, segundo a perspectiva de Kroch (1994), principalmente se for atestado que as diferenças entre construções intransitivas e inacusativas estão diretamente relacionadas às diferenças entre as ordens DP V e V DP, respectivamente.

4.2.2. Constituição e caracterização da amostra

Nosso estudo se constrói com base em dados reais de feia florianopolitana. As amostras analisadas fazem parte do Banco de Dados do Projeto VARSUL (Variação Lingüística Urbana da Região Sul) cuja constituição é pautada pelos princípios metodológicos da Sociolingüística Variacionista laboviana

É objetivo do Projeto VARSUL

“arma^nar e colocar à disposição dos pesquisadores interessados amostras de reaU^ções da fala de habitantes enraizados em áreas urbanas sócio-culturalmente representativas de cada

o acervo do Banco VARSUL é considerado um exenplo de fala informal. Tal caracterização decorre da própria técnica de obtenção dos dados: entrevista face-a-face, na qual se estabelece uma situação de comunicação em que o entrevistador tenta conduzir a entrevista de modo que o informante preste o mínimo de atenção possível a sua fala, permitindo, dessa forma, que o vernáculo venha à tona. Para minimizar o efeito do distanciamento entre entrevistador e entrevistado, ficou estabelecido que a entrevista seria realizada após um contato prévio entre os dois. Essa tática visava também reduzir o efeito do que Labov (1972) chama de ‘paradoxo do observador’, criando condições para uma relação menos formal durante a realização da entrevista, para que as situações de comunicação se aproximassem do vernáculo do entrevistado.

O projeto tem como meta possibilitar o desenvolvimento de pesquisas da variedade lingüística falada nos centros urbanos da região sul, a fim de que se possa repensar políticas da linguagem, replanejar o ensino de língua portuguesa, bem como testar nrodelos teóricos em vigor na área de lingüística As amostras foram estratificadas tendo como base quatro parâmetros sociais: sexo, idade, escolaridade e região. Integra hoje um acervo de 96 entrevistas por estado, totalizando 288 entrevistas’, constituídas por informantes dos três estados do sxil do Brasil - Santa Catarina, Paraná e Rio Grande do Sul.

Para a realização de nossa pesquisa, utilizamos 16 entrevistas da região de Florianópolis, distribuídas igualmente segundo duas categorias sociais assim estratificadas: escolaridade e faixa etária.

Informantes da região urbana de Florianópolis Escolaridade Primário Colegial Faixa etária^ 08 informantes 04 04 25 a 39 anos 40 a 49 anos 08 informantes 04 04 50 a 59 anos Mais de 60 anos Tabela 4.1.: Distribuição da amostra de informantes da região de

Florianópolis, extraída do Projeto VARSUL

Acreditamos que os resultados possam espelhar a real situação da variável, uma vez que a ordem DP V ou V DP não está associada a nenhum estigma, e justamente por

isso não deve registrar nenhum fator social como condicionador da posposição do DP. O estudo de dois grupos de fatores sociais, em especial do grupo faixa etária, tem como objetivo observar se é possível falarmos em mudança em tempo aparente e se a escola exerce influência sobre uma possível mudança

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