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1 INTRODUÇÃO

3.2 Método de Pesquisa e Composição do Corpus

Nesta pesquisa, o método de procedimento selecionado foi a pesquisa documental, caracterizada como aquela cujos dados obtidos são estritamente provenientes de documentos, como método autônomo, com o objetivo de extrair desses, as informações para compreender um determinado fenômeno (FLICK, 2009), podendo-se tratar de fontes primárias ou secundárias, contemporâneas ou retrospectivas (MARCONI; LAKATOS, 2003). Entendemos ainda que a realidade social pode ser representada em comunicações formais ou informais (BAUER; GASKELL; ALLUN, 2002) e, assim, nossa opção pela análise do jornalismo escrito parte da compreensão de que comunicações formais, nesse caso, os textos das reportagens, reconstroem maneiras pelas quais a realidade social pode ser representada por grupos de interesse e, sendo assim, carrega em si a visão de mundo de um determinado público.

A construção do corpus de pesquisa, de acordo com Bauer e Aarts (2002, p. 39), implica na “escolha sistemática de um racional alternativo”, invariavelmente, arbitrário, para seleção de representações significantes da vida social que será analisada. Como critérios, iniciamos, optando por realizar a análise em uma organização multinacional do setor bancário, o que permite o encontro com nosso contexto de corrupção transnacional. O segundo critério considerado foi que houvesse envolvimento com casos de corrupção nos últimos 10 anos, mesmo não sendo a organização o principal agente do delito, pois esse quesito implica na disponibilização de material documental para a análise. Por fim, julgamos importante que esse ilícito envolvesse, em alguma esfera, o contexto brasileiro, dada a nossa intenção de analisar o fenômeno a partir das margens.

Iniciamos a seleção da organização a partir da lista cronológica de exemplos de bancos indiciados e processados desde a década de 1990 até 2015, a qual consta do relatório Banks and

Dirt Money (Bancos e Dinheiro Sujo), da organização não governamental Global Witness

(2015, p.11), que identifica, nominalmente, dezenove instituições (Riggs Bank, Barclay, RBS, HSBC, NatWest, UBS, Wachovia, Citibank, Abbey National, Coutts & Co Bank, Credit Suisse,

Lloyds, TSB, Commerzbank), das quais o HSBC aparece com o maior número de ocorrências,

seguido pelo Barclay.

O banco britânico HSBC, além de um dos maiores bancos internacionais em ativos (S&P, 2017) da atualidade, atendeu aos outros dois critérios. Quanto à participação recente em grandes escândalos de fraudes e crimes financeiros, destacam-se casos conhecidos, sendo: a maior multa aplicada a um agente individual por lavagem de dinheiro, US$ 1,92 bilhão nos EUA, em 2012 (DOJ, 2012); o maior vazamento de dados bancários da história, que se refere à unidade suíça, divulgado ao público em 2015 pelo Swiss Leaks (RYLE et al., 2015); e o envolvimento com o escritório Mossack & Fonseca, como seu principal cliente bancário, no maior vazamento de informações de contas offshore já divulgado, no Panama Papers em 2016 (ICIJ, 2016). Enfim, o terceiro critério para seleção do HSBC como organização de análise foi atendido, visto que, nos últimos dois casos, encontram-se indícios de lavagem de dinheiro relacionada à corrupção de agentes brasileiros, destacando-se, inclusive, envolvimento com a operação “Lava Jato” (DAVIES, 2015a; ICIJ, 2016).

Para a seleção do corpus de pesquisa, consideramos que esses e outros eventos envolvendo o HSBC foram amplamente noticiados em diversos jornais em todo o mundo. Entretanto, cientes que o tamanho do corpus deve considerar o equilíbrio entre o esforço envolvido na coleta e análise de dados, bem como o número de representações que se desejam caracterizar (BAUER; AARTS, 2002), restringirmos as fontes da pesquisa documental pelos critérios de cobertura jornalística de livre acesso/ gratuita, internacionalmente reconhecida e com protagonismo jornalístico em algum dos casos envolvendo o HSBC. Assim, as fontes selecionadas são a organização International Consortium of Investigative Journalists (ICIJ - Consórcio Internacional de Jornalistas Investigativos)32 e o jornal britânico The Guardian (O Guardião).

A seleção dessas fontes levou em consideração a constituição do ICIJ por se tratar de um consórcio internacional reconhecido, independente, e ter sido responsável pela realização e publicação das reportagens que ficariam conhecidas como Swiss Leaks, um vazamento sem precedente na história bancária (RYLE, et al., 2015a). Por sua vez, a escolha do The Guardian foi ponderada por duas questões: o fato de ser um jornal do Reino Unido, tal como o HSBC, questão que julgamos relevante para um estudo sob a perspectiva pós-colonial, bem como pela

32 O ICIJ é uma rede global de repórteres e organizações de mídia, sem fins lucrativos, que trabalham juntos em

investigações internacionais. Atualmente, contam com 220 repórteres investigativos de 83 países e territórios, bem como com parcerias com mais de 100 organizações de mídia, incluindo a BBC, o New York Times, o The Guardian, o Asahi Shimbun, e pequenos centros regionais de investigação sem fins lucrativos. Com sede nos EUA, possuem equipe na Austrália, França, Costa Rica, Espanha, Hungria, Alemanha e Inglaterra (ICIJ, 2018).

sua credibilidade como fonte, sendo considerado como o principal jornal britânico, de acordo com o último web ranking (4IMN, 2017).

Para a operacionalização do estudo, orientamo-nos pelo objetivo de pesquisa de compreender, sob a perspectiva pós-colonial, a corrupção como um fenômeno transnacional, tendo sido delineado por duas questões principais: (i) qual a dinâmica, padrões e atores dos esquemas de corrupção transnacional? e (ii) quais as relações coloniais que emergem da análise desses casos?

A pesquisa documental foi realizada nos websites do ICIJ e do jornal The Guardian. Os textos estão originalmente em inglês e foram analisados nesse idioma, sendo apresentados em português nas seções de resultados e discussões e com toda tradução nossa.

Existem milhares de páginas com informações úteis para uma consulta típica na web. Essas pesquisas são realizadas através de algoritmos, ou seja, processos e fórmulas de computador que permitem transformar as perguntas ou palavras-chave em respostas por meio de inúmeros sinais diferentes, tentando decidir quais são as páginas mais relevantes para aquele usuário. Os sinais podem incluir, entre outros, o grau de atualidade do conteúdo no site, o número de outros sites que contêm link para um site específico, palavras na página web, região geográfica em que a consulta foi gerada ou resultados recomendados por pessoas às quais o usuário está conectado (GOOGLE, 2018).

Desse processo altamente interativo, resulta que consultas via web podem ser dinâmicas e retornarem resultados distintos em diferentes momentos ou locais e, portanto, tivemos o cuidado de registrar todas as telas por meio da função print-screen, conforme ilustrado na Figura 6, além de catalogar os resultados da pesquisa e seus respectivos websites no momento de cada uma das buscas, como apresentado no Apêndice A.

A coleta de documentos ocorreu em duas etapas. Na primeira, foram selecionados um conjunto de 34 reportagens divulgadas em 2015 associadas ao vazamento dos dados da filial

suíça do HSBC - conhecido como a investigação SwissLeaks no ICIJ (16 reportagens)33, como

uma séroe de reportagens em cinco partes, chamada de HSBC files no The Guardian (18 reportagens). Na segunda etapa, foram realizadas três consultas adicionais em cada um dos dois

websites, utilizando as palavras-chave de busca: “HSBC corruption” (HSBC corrupção), “HSBC corrupt” (HSBC corrupto) e “HSBC bribery” (HSBC suborno).

33 Para a etapa de análise, foram considerados os links de reportagens de texto sobre o vazamento de dados. Assim,

da série SwissLeaks do ICIJ, foram desconsideradas: dois links para reportagens audiovisuais, três links para textos de síntese do projeto e apresentação da equipe, um link apresentando documento externo do HSBC e um link para o banco de dados Swiss Leaks Data, conforme apresentado no Apêndice A nas linhas de 56 a 62. Assim, dessa série de reportagens, foram considerados nove artigos para o corpus de pesquisa.

Figura 6 - Registro da tela, com a função print screen, de busca da pesquisa com as palavra- chave “HSBC Corruption” no website do ICIJ.

Fonte: Pesquisa pela autora no website do ICIJ.

A partir dos web links de reportagens indicadas nas seis consultas desta segunda etapa, foram desconsideradas as repetições e catalogados 93 documentos adicionais, totalizando 127 reportagens. A partir dessa base, foi realizada uma primeira leitura para identificação da aderência ao conteúdo, especificamente, se relatavam a participação do HSBC, seus agentes, clientes ou pares do sistema financeiro em casos envolvendo práticas de corrupção. Como critérios de exclusão foram considerados, conforme indicado no Quadro 1 do Apêndice A: textos que incluíam apenas a citação do nome do banco em outro contexto; textos que não continham nenhuma das palavras-chave utilizadas para referência à corrupção (corruption,

corrupt, bribery); reportagens do tipo opiniões e blogs; e publicação anteriores aos dez últimos

anos. Assim, em conjunto com o material selecionado na primeira etapa, foram classificados ao todo 55 textos (12 ICIJ e 43 The Guardian) publicados de 11 de março de 2009 a 15 de janeiro de 2018.

Após a seleção dos documentos que comporiam o corpus de pesquisa, a etapa seguinte foi a separação entre textos e demais elementos não textuais de uma página web. Ao convertermos as páginas web para Portable Document Format (PDF - Formato Portátil de Documento), muitas delas se desconfiguraram, eventualmente, sobrepondo imagens e

propagandas a textos, ou, até mesmo, cortando parte de textos devido ao formato de diagramação da página. Assim, com o intuito de garantir a padronização do material para melhor aderência à ferramenta de software utilizada para análise, somada ao fato de que elementos não textuais, incluindo a própria diagramação da página, não eram escopo de interesse analítico, optou-se por transferir os textos completos para o formato Microsoft Word, formatados de acordo com Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT) para dissertações, consolidando-se 208 laudas (92 ICIJ e 116 The Guardian), o que também se encontra detalhado por documento no Quadro 1 do Apêndice A.