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2.6 MÉTODOS COMPUTACIONAIS

2.6.1 Métodos ab initio

A função de onda contém toda a informação acessível sobre um sistema. Este é descrito por um operador Hamiltoniano que opera na função de onda e contém os termos de energia cinética e potencial. Um operador hamiltoniano pode ser dependente ou independente do tempo.132 Nos casos onde este operador é explicitamente independente do tempo, pode-se

separar o problema nuclear do problema eletrônico. Essa separação recebe o nome de separação de Born-Oppenheimer (BO) ou aproximação adiabática40 e é uma simplificação para o problema

de muitos corpos, pois como o movimento dos elétrons e dos núcleos estão correlacionados só é possível a resolução analítica de um sistema contendo dois corpos. A separação de BO é baseada no fato de que o movimento dos elétrons é muito mais rápido do que o movimento dos núcleos e, portanto os núcleos podem ser considerados fixos.

Devido ao problema de muito corpos, a Equação de Schrödinger precisa ser resolvida utilizando métodos aproximativos. Em face deste problema, diversos métodos computacionais têm sido desenvolvidos ao longo dos anos, buscando aproximações cada vez melhores para descrever os sistemas quanticamente.

33 A aproximação Hartree-Fock (HF)133-135 desempenha um papel central nos métodos de

estrutura eletrônica. Em diversos casos, ela fornece uma descrição qualitativamente correta da estrutura eletrônica de átomos com muitos elétrons e moléculas no seu estado fundamental. Além disso, é utilizada como base para o desenvolvimento de métodos mais acurados.

No método de HF a função de onda eletrônica de um sistema de N-elétrons no estado fundamental é representada por um determinante de Slater.136 Esse determinante contém os spins-

orbitais do sistema, que são funções que descrevem as coordenadas espaciais (x, y e z) e de spin de um elétron. Devido às propriedades gerais dos determinantes, a função de onda escrita dessa forma satisfaz o Princípio de exclusão de Pauli, ou seja, é antissimétrica com respeito à troca de dois elétrons, o que implica que dois férmions não podem ocupar o mesmo estado quântico.137

A aproximação de HF baseia-se no Princípio Variacional, ou seja, os estados de uma determinada função de onda aproximada possuem energia acima ou igual à energia “exata” do estado fundamental. A consequência disso é que para um dado sistema, a função de onda que minimiza a energia é a melhor possível dentro da aproximação utilizada, ou seja, no limite de um conjunto de base infinito (limite Hartree-Fock). A diferença entre a melhor energia calculada no limite HF e a energia “exata” é igual à Energia de Correlação.138 A energia “exata” é definida

como a energia que incorpora todo o efeito da correlação e um conjunto de base completo.

Assim, obter um determinante de Slater com a menor energia possível implica em determinar o melhor conjunto de spin-orbitais e obter a melhor aproximação para o valor da energia, respeitando o Princípio Variacional. Para computar as energias é necessário definir um conjunto de funções matemáticas que representem os orbitais. Um orbital molecular é originado por uma combinação linear de funções matemáticas que representam os orbitais atômicos (LCAO, Linear Combination of Atomic Orbitals) (Equação 1). Essas funções são chamadas funções de base (𝛷𝑟) e o conjunto de funções de base para vários átomos é denominado conjunto de base.139 Na Equação 1, os coeficientes ci indicam o quanto cada função de base contribui para

o orbital molecular i. O objetivo é então encontrar um conjunto de orbitais moleculares que minimizem a energia do sistema, com a restrição de que eles permaneçam ortonormais. Isso é feito otimizando variacionalmente os expoentes e coeficientes das funções de base.

𝜓𝑖(𝑟) = ∑ 𝑐𝑖

𝑟

34 O erro no cálculo da energia é altamente dependente do conjunto de base empregado. Conforme o número de funções de base aumenta, o erro associado à aproximação utilizando uma LCAO deve diminuir. Dessa maneira, utilizando um conjunto de base suficientemente grande, o cálculo de HF pode fornecer até 99% da energia eletrônica total do sistema, descrito por uma Equação de Schrödinger não relativística. Porém, o 1% restante, associado à energia de correlação não descrita pela aproximação HF, é geralmente essencial para descrever fenômenos químicos.140

A correlação eletrônica refere-se à interação entre elétrons em um sistema quântico. Ela é uma medida de quanto o movimento de um elétron será afetado pela presença dos demais. No método de HF, a interação elétron-elétron é substituída pela interação de um elétron com um potencial médio gerado pelos demais, denominado potencial efetivo. Assim, a repulsão elétron- elétron é substituída pela repulsão entre um elétron e o campo médio gerado pelos demais. Essa aproximação origina um erro no cálculo da energia eletrônica total do sistema, associado à falta de correlação entre os elétrons de spins opostos.

De fato, uma parte da correlação eletrônica é considerada na aproximação de HF. Devido à natureza antissimétrica da função de onda, a correlação entre elétrons de spins paralelos é considerada e encontrada no termo de troca. Isso evita que dois elétrons com spins paralelos sejam encontrados no mesma região espacial. Essa parte é conhecida como energia de troca. Por outro lado, a correlação entre elétrons de spins opostos não é considerada. Essa energia de correlação coulombiana (usualmente referida apenas como energia de correlação) descreve a correlação entre a posição/movimento de um elétron em relação aos demais, devido à repulsão eletrônica existente entre eles. Assim, ao mover um elétron, todos os demais irão reagir em função deste movimento inicial.140

Por definição, a aproximação do campo médio resultante da aproximação de uma função de onda multieletrônica por um único determinante de Slater não considera a energia de correlação (coulombiana). Para levar em conta esse efeito, é necessário escrever a função de onda como uma combinação linear de vários determinantes de Slater. Usualmente, a energia de correlação é dividida em correlação estática e dinâmica. Embora essa divisão não seja rigorosa, ela é útil, já que os dois tipos de correlação têm origens físicas diferentes e podem ser recuperados por diferentes métodos, que envolvem diferentes combinações de determinantes de Slater.

35 A correlação estática diz respeito à descrição incorreta do estado fundamental por um único determinante de Slater associada à contribuição significativa de duas ou mais configurações eletrônicas (quase) degeneradas para a função de onda do sistema. Uma forte correlação estática é encontrada em situações onde vários estados eletrônicos são degenerados ou muito próximos em energia. Tais situações ocorrem quando elétrons podem ser distribuídos de diversas formas em orbitais com energias similares, como por exemplo, em processos de quebra de ligação ou em sistemas contendo átomos de metais de transição com camadas eletrônicas incompletas. Nesse caso, diz-se que a função de onda possui um caráter multiconfiguracional e a representação monodeterminantal não é suficiente para descrever o problema eletrônico nem qualitativamente. A função de onda eletrônica deve ser descrita por mais de um determinante contendo diversas configurações de iguais pesos.141 Isso pode ser feito utilizando os chamados

métodos multiconfiguracionais, que utilizam mais de um determinante de Slater para incorporar os efeitos de correlação eletrônica estática no estado fundamental. Entre esses métodos está o

Multi-Configurational Self-Consistent Field (MCSCF).

A energia de correlação dinâmica correlaciona o movimento dos elétrons e resulta da interação coulombiana repulsiva entre dois elétrons muito próximos. Ela requer a inclusão de um grande número de configurações obtidas a partir de excitações eletrônicas para orbitais virtuais de alta energia. Como, nesse caso, a estrutura eletrônica é dominada por uma configuração monodeterminantal e os determinantes de Slater excitados, que devem ser incluídos na combinação linear, possuem coeficientes pequenos, a energia de correlação dinâmica pode ser recuperada utilizando métodos baseados na função de onda HF. Entre esses métodos, pode-se citar os chamados post-Hartree-Fock, como por exemplo, Interação de Configuração (CI),

Coupled Cluster (CC) e Teoria de Perturbação de Møller-Plesset (MP2, MP3, MP4). Todos eles

são qualificados como single-reference e utilizam um determinante de Slater HF como referência, mas combinações lineares que incluem determinantes excitados.132

Em diversas situações de interesse, as correlações estáticas e dinâmicas precisam ser levadas em consideração. Isso é particularmente verdade para o estudo de processos envolvendo estados eletrônicos excitados, como na espectroscopia UV e fotoquímica. Nesses casos, é necessário utilizar métodos que incluam correlação dinâmica, mas que possuam uma descrição multideterminantal da função de onda. Esses métodos são conhecidos como métodos

36 multireferência e entre eles encontram-se o e Multi-reference Configuration Interaction (MRCI) e diversas variantes do Second-order Multi-reference Perturbation Theory (MRPT).

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