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A- Introdução

4. Neuropatia autonômica cardíaca (NAC) Definição

4.4 Métodos de avaliação e critérios diagnóstico de NAC

4.4.1 Métodos não invasivos

A NAC tem sido tradicionalmente diagnosticada através de testes que permitem a avaliação da integridade da função autonômica cardiovascular, tanto simpática, como parassimpática (68-75). A mesma é avaliada fundamentalmente por análise da variabilidade da frequência cardíaca (VFC) no domínio de tempo, no domínio de frequência e mediante métodos geométricos (76). Além do analise da VFC, os testes de reflexo cardiovascular ou testes de Ewing são atualmente também muito utilizados para diagnóstico de NAC.

VFC

A VFC consiste numa série de medições sucessivas de variações dos intervalos RR com origem sinusal que fornecem informação acerca do tónus autonômico (68). A VFC pode ser avaliada durante curtos períodos de monitorização eletrocardiográfica, entre 60 segundos e 30 minutos, ou por períodos prolongados, geralmente através de eletrocardiograma de longa duração, 24 horas (sistema Holter) (77).

Analise da VFC no domínio de tempo

Esta análise mede as mudanças na frequência cardíaca ao longo do tempo ou os intervalos entre ciclos normais sucessivos. Numa tira de ECG contínua cada complexo

é detectado e os intervalos RR normais (intervalos NN) são determinados devido a despolarizações sinusais de frequência cardíaca instantânea (78).

As variações do domínio do tempo calculadas podem ser simples tal como o intervalo RR, frequência cardíaca média, a diferença entre o intervalo RR mais curto e o mais longo, ou a diferença entre a frequência cardíaca diurna e noturna; e mais complexas baseadas em medições estatísticas. Estes índices estatísticos do domínio do tempo dividem-se em duas categorias, incluindo intervalos batimento a batimento, ou variáveis derivadas diretamente destes intervalos, ou frequência cardíaca instantânea e os intervalos derivados das diferenças entre intervalos NN adjacentes. Os parâmetros mais frequentemente usados no domínio do tempo são:

- SDNN (Standard deviation at all NN intervals), representa o desvio-padrão em todos os intervalos de acoplamento de todos os batimentos normais consecutivos (NN). - SDANN (Standard deviation of the mean of NN intervals) representa o desvio padrão da média de intervalos NN em todos segmentos de 5 minutos de registo).

- RMSSD (Root mean square of successive diference betwen RR intervals) representa a raiz quadrada da média dos quadrados das diferenças entre intervalo R- R normais sucessivos.

- pNN50 (Percentage of the difference between NN intervals greater than 50 ms) representa percentagem da diferença entre intervalos NN adjacentes superiores a 50 ms, em relação ao total de R-R normais, dos R-R normais que, em relação aos R-R anteriores, tenham uma diferença superior a 50ms.

O parâmetro SDNN é um índice global da VFC e reflete todos os componentes de longa duração e ritmos circadianos responsáveis pela variabilidade durante o período de gravação do registro. SDANN é um índice da variabilidade de uma média de 5 minutos. Assim, fornece informação de longa duração. É um índice sensível de baixas frequências como a atividade física, mudanças de posição e ritmo circadiano. SDANN é geralmente considerado como refletor das mudanças dia/noite da VFC.

RMSSD e pNN50 são os parâmetros mais comuns baseados em diferenças de intervalo. Estas medições correspondem a mudanças da VFC de curta duração e não dependem das variações dia/noite. Refletem alterações no tónus autónomo e são predominantemente mediadas pelo sistema vagal. Quando comparado com o pNN50, o RMSSD parece mais estável e deve ser eleito para uso clínico (79).

Análise da VFC no domínio de frequência

A análise no domínio de frequência da VFC permite a caracterização quantitativa e qualitativa, individualizada e simultânea, em termos absolutos e relativos, da atividade autonômica cardíaca, por meio das frequências das ondas e suas respectivas origens fisiológicas (80).

A análise do domínio da frequência (densidade espectral) descreve as oscilações do sinal de frequência cardíaca decomposto em diferentes frequências e amplitudes; e fornece informação sobre a quantidade das suas intensidades relativas no ritmo cardíaco sinusal. A análise espectral pode ser executada de duas formas (81):

1) através de um método não-paramétrico, o Fast Fourier Transformation (FFT), que é caracterizado por picos discretos para os vários componentes da frequência. 2) através de um método paramétrico, o modelo de previsão auto-regressivo, resultando num espectro de atividade contínuo e suave.

O primeiro método é simples e rápido enquanto este último é mais complexo e necessita que se verifique que o modelo escolhido é apropriado. Quando se usa o FFT os intervalos RR individuais guardados no computador são transformados em bandas de diferentes frequências espectrais. A duração dos intervalos RR que é obtida em milissegundos pode ser convertida em frequência cardíaca por minuto (Hertz). O poder espectral é constituído por bandas de frequência entre os 0 e os 0.5 Hz e pode ser classificado em quatro bandas: banda de frequência ultra baixa (ULF), banda de frequência muito baixa (VLF), banda de baixa frequência (LF) e banda de alta frequência (HF) (81).

Quadro 2. Valores de referência das variáveis da análise espectral no domínio de frequência.

Variável Unidade Descrição Intervalo

Poder

total ms

2 Variação de todos os intervalos NN < 0.4 Hz

VLF ms2 Frequência muito baixa 0.003 - 0.04Hz LF ms2 Poder de baixa frequência 0.04 - 0.15Hz HF ms2 Poder de alta frequência 0.15 - 0.4Hz LF/HF Razão Razão poder de baixa/alta frequência 1-2

ULF: Frequência ultra baixa, VLF: Frequência muito baixa, LF: Baixa frequência, HF: Alta frequência. Fonte: Aplicabilidade Clínica da Variabilidade da Frequência

Cardíaca, 2013.

Gravações espectrais de curta duração (5-10min) são caracterizadas pelos componentes VLF, HF e LF enquanto gravações de longa duração incluem todos os componentes anteriores juntamente com a ULF. O quadro acima sintetiza os parâmetros do domínio da frequência mais usados. Os componentes espectrais são avaliados em termos de frequência (Hz) e amplitude, sendo esta determinada pela área (densidade espectral) de cada componente. Assim os valores absolutos são expressos em ms2. Logaritmos naturais (ln) dos valores do poder podem ser utilizados devido a assimetria das distribuições.

LF e HF podem ser expressos em valores absolutos (ms2) ou normalizados (nu). A normalização de LF e HF e obtida subtraindo o componente VLF do poder total. Por um lado tende a reduzir o ruído causado por artefatos e por outro minimiza os efeitos das mudanças no poder total nos componentes LF e HF. É útil quando se avaliam os efeitos das diferentes intervenções no mesmo sujeito com grandes diferenças de poder total. Unidades normalizadas são obtidas da seguinte forma: LF ou HF (nu) = (LF ou HF (ms2)) x 100 / (poder total (ms2) - VLF (ms2). O poder total da variabilidade do intervalo RR e a variação total e corresponde à soma das quarto bandas espectrais LF, HF, VLF e ULF. O componente HF é geralmente definido como um marcador de modulação vagal. Este componente é mediado pela respiração e portanto determinado pela frequência respiratória. O componente LF é modulado pelos sistemas simpático e parassimpático. Neste sentido a sua interpretação é mais controversa. Alguns cientistas consideram o poder LF, especialmente quando expresso em unidades normalizadas, como uma medição de modulações simpáticas; outros interpretam-no como uma combinação de atividade simpática e parassimpática.

Na prática um aumento do componente LF (tilt, stress mental e/ou físico, agentes farmacológicos simpaticomiméticos) é geralmente considerado uma consequência da atividade simpática. Contrariamente, um bloqueio b-adrenérgico resulta numa diminuição do poder LF. A relação LF/HF reflete o equilíbrio simpático-vagal global e pode ser usada para medir este equilíbrio. Num adulto normal em repouso a razão é geralmente entre 1 e 2. A ULF e a VLF são componentes espectrais com oscilações muito baixas. O componente ULF poderia refletir os ritmos circadiano e neuroendócrino e o componente VLF os ritmos de longo período. Este último foi considerado um determinador de atividade física e proposto como um marcador de atividade simpática (83).

Analise da VFC por medições geométricas. Neste sentido as variáveis avaliadas são:

- Índice triangular de VFC: número total de todos os intervalos NN divididos pela altura do histograma de todos os intervalos NN medidos numa escala discreta com caixas de 7,8125 ms (1/128 s).

- TINN (triangular interpolation of the highest peak of the histogram of all NN intervals). Interpolação triangular do pico mais alto do histograma de todos os intervalos NN. - Índice diferencial: Diferença entre as larguras do histograma entre os intervalos NN adjacentes medidos a alturas selecionadas.

- Índice logarítmico: Coeficiente da curva exponencial negativa, que é a melhor aproximação do histograma das diferenças absolutas entre os intervalos NN adjacentes.

Estes métodos são derivados e construídos através de sequencias de intervalos NN. Existem diferentes formas geométricas para avaliar a VFC:

-o histograma

-o índice triangular de VFC e a sua modificação, a interpolação triangular do histograma de intervalos NN.

-o método baseado em Lorentz ou Poincare.

O histograma avalia a relação entre o número total de intervalos RR detectados e a variação de intervalos RR.

O índice triangular da VFC considera o maior pico do histograma como um triângulo onde o comprimento da base corresponde à quantidade da variabilidade de intervalos RR, a sua altura equivale à duração mais frequentemente observada de intervalo RR e a área corresponde ao número total de intervalos RR usados para construir o triângulo. O índice triangular da VFC e uma estimativa da VFC global. Os métodos geométricos são menos afetados pela qualidade dos dados e podem oferecer uma alternativa para obter parâmetros estatísticos mais facilmente, no entanto, a duração mínima do registo deve ser de 20 minutos o que significa que com este método não se podem obter gravações de curta duração (84).

Testes de reflexo cardiovascular ou testes de Ewing

No diagnóstico da NAC também podemos utilizar os testes de reflexo cardiovascular, chamados Testes de Ewing, que são: o teste de respiração profunda, Valsalva, Ortostático, Hipotensão Ortostática. Na metodologia descrita por Ewing, também é descrito o teste de preensão manual ou handgrip, mas, este teste acaba não sendo utilizado na maior parte dos estudos pois não é considerado útil para o uso clínico de rotina, sendo reservado somente para uso experimental (85).

Atualmente, o chamado protocolo de 7 testes que utiliza as três bandas da análise espectral (VLF, HF e LF) e os quatro testes de Ewing (Respiratório, Valsalva, Ortostático e de Hipotensão ortostática) parece ser a metodologia não invasiva com maior acurácia para a detecção precoce da NAC (86-88), sendo reprodutível das anormalidades na integridade parassimpática e simpática no coração, devido a seu mais alto nível de especificidade e sensibilidade (18).

Embora menos utilizadas, existem outras provas que contribuem para o diagnóstico de NAC, como: o eletrocardiograma, onde podemos avaliar a prolongação do intervalo QT, o ecocardiograma para avaliar a fração de ejeção e a função sistólica e diastólica, a servopletismomanometria que avalia respostas da frequência cardíaca a manobras de Valsalva, contração isométrica sustentada e mudanças posturais, a avaliação dos baroreflexos mediante o estímulos mecânico dos corpos carotídeos, manobra de Valsalva, os quais induzem modificações de pressão arterial que devem ocasionar modificações da frequência cardíaca (89).

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