2.3 Agricultura familiar e saúde mental
2.3.3 Métodos e técnicas utilizados em estudos sobre saúde mental
Em uma revisão dos instrumentos utilizados para avaliação da saúde mental de trabalhadores agrícolas, podem-se verificar diferentes métodos e medidas nos estudos, conforme o Quadro 2:
ESTUDOS INTERNACIONAIS
Autor/Ano9 Local Medidas Amostra
Walker e Walker,
1987 Canadá
Farming Stress Inventory (FSI) 880 agricultores
Eberhardt e Pooyan, 1990
Estados Unidos Estudo - Survey sobre estresse no meio rural 1400 agricultores Belyea e Lobao, 1998 Ohio – Carolina do Norte (USA)
Entrevista por telefone Escala de depressão (CES-D)
503 agricultores Jacob, Bourket e Luloff, 1997 Pensilvânia, Estados Unidos Questionários estruturados Escala de Percepção de Estresse
1490 agricultores
Simkin et al., 1998
Inglaterra e País de Gales
The stress in farming questionnaire 500 agricultores
Booth e Lloyd, 1999
Inglaterra General Health Questionnaires
(GHQ-28)
Hospital Anxiety and Depression Scale (HAD) 303 agricultores (271 homens e 32 mulheres) Raine, 1999 Yorkshire – Norte do Reino Unido
Estudo qualitativo com entrevistas semiestruturadas
20 agricultores (25-63 anos)
Sutherland, 2000
Inglaterra (região
nordeste) Hospital Anxiety and Depression Scale (HADS)
Phelps, 2001 Norte de Yorkshire, Inglaterra
Hospital Anxiety and Depression Scale (ZIGMOND; SNAITH,
1983)
Social Readjustement Rating Scale
(HOLMES; RAHE'S, 1967)
272 agricultores
Thomas et al.,
2003 Inglaterra
(CIS-R) Revised Clinical Interview Schedule
425 agricultores
Melberg, 2003 Noruega Survey “Standard of Living in the
Agricultural Population
3383 agricultores
Stallones e Beseller, 2004
Colorado - USA Escala de depressão (CES-D) 761 agricultores
Hosain,
Chatterjee, Ara, Islam, 2007
Bangladesh General Health Questionnaire 60
(GHQ-60)
766 agricultores (351 homens e 415 mulheres)
ESTUDOS NACIONAIS
Autor/Ano Local Medidas Amostra
Rozemberg, 1994
Espírito Santo Inquérito de morbidade 93 lavradores de 25 comunidades Faria et al.,
1999 Serra Gaúcha – Rio Grande do Sul
Entrevista direta
Questionário dos Indicadores Sociodemográficos
Questionário de Morbidades Associadas
Self Report Questionnaire-SRQ-20
1282 agricultores 446 propriedades
Vorcaro et al.,
2001 Bambuí - Minas Gerais
CIDI – (OMS) – Depressão Mini-Mental State Test adaptado
para a realidade Brasileira.
1221 participantes (idade superior a 18 anos)
Gomes e
Rozemberg, 2000 Nova Friburgo – Rio de Janeiro.
Análise de discurso Entrevista 102 agricultores Levingard e Rozemberg, 2004 Nova Friburgo – Rio de Janeiro Entrevistas semiestruturadas Observação participante 15 profissionais do Programa de Saúde da Família (PSF)
Monteiro, 2004 Tangará – Santa Catarina Análise Ergonômica do Trabalho (AET) 3 propriedades agrícolas familiares
Quadro 2: Métodos e técnicas utilizados em estudos sobre saúde mental de trabalhadores
agrícolas
Fonte: Elaborado pela autora.
Analisando os trabalhos, observa-se um número maior de estudos quantitativos. As pesquisas internacionais e nacionais apresentam métodos e medidas específicas para a saúde mental dos trabalhadores agrícolas, de acordo com os objetivos e características dos estudos, podendo destacar os seguintes métodos utilizados: o
Escala de depressão (CES-D); o Hospital Anxiety and Depression Scale (HAD); a
Perceived Stress Scale (PSS); o Composite International Diagnostic Interview (CIDI); o Farming Stress Inventory (FSI); Stress in Farming Questionnaire e o Self Report Questionnaire (SRQ-20).
A seguir, serão descritas as medidas utilizadas nas pesquisas sobre saúde mental de trabalhadores agrícolas.
2.3.3.1 General Health Questionnaire – GHQ
O GHQ é um questionário estruturado e de autoresposta, adequado a diversas faixas etárias, desenvolvido por Goldberg e Williams (1988). O instrumento contempla a possibilidade de registro de períodos de tensão, depressão, incapacidade de luta ou enfrentamento, insônia de fundo ansioso, falta de confiança e outros problemas psicológicos. É utilizado em estudos populacionais para rastreamento de transtornos mentais comuns, juntamente com questionários para rastreamento de transtornos alimentares. Tem sido aplicado extensivamente em todo mundo, traduzido em diversas línguas e adaptado nas seguintes versões:
a) GHQ 60 é uma forma altamente detalhada do questionário;
b) GHQ 30 é uma forma menor, sem itens que relatam as doenças físicas; c) GHQ 28 é uma versão da escala que avalia os sintomas somáticos,
ansiedade, insônia, disfunção social e depressão severa;
d) GHQ 12 é uma versão rápida, ideal para ser utilizada em pesquisas.
2.3.3.2 Revised Clinical Interview Schedule - CIS-R
O CIS-R é uma entrevista semiestruturada, desenvolvida por Lewis et al. (1992) e utilizada para avaliar a prevalência de sintomas neuróticos psicopatológicos associados à depressão e à ansiedade.
O CIS–R é comporto de 14 seções: sintomas somáticos, fadiga, concentração, alterações do sono, irritabilidade, preocupações com o funcionamento corporal, depressão, ideias depressivas, preocupações, ansiedade, fobias, pânico, compulsões e obsessões. Em cada seção, duas questões introdutórias averiguam a ocorrência de sintomas durante a última semana. Em caso afirmativo, a frequência, a intensidade, a persistência e o grau de incômodo ocasionado pelo sintoma passam a ser avaliados. A pontuação em cada seção varia de 0 a 4 (exceto ideias depressivas: 0 a 5). (LEWIS; PELOSI (1990).
2.3.3.3 Escala de Depressão - CES-D
A CES-D é uma escala de rastreamento populacional autoaplicável de 20 itens, desenvolvida por Radloff (1977) com a finalidade de detectar sintomas depressivos em populações adultas. A escala compreende itens relacionados a humor, comportamento e percepção que foram considerados relevantes em estudos clínicos sobre depressão.
Grande parte da contribuição para o desenvolvimento desse instrumento provém de outras escalas de sintomas depressivos, tais como a Escala de Depressão de Zung, o Inventário de Depressão desenvolvido por Beck, a Escala Autoaplicável de Raskin, a Escala de Depressão do Minnesota Multiphasic Personality Inventory e a Escala de Depressão de Gardner.
A CES-D vem sendo amplamente utilizada em estudos clínicos e populacionais. Os resultados destes estudos indicam considerável convergência com outras escalas de depressão e boa discriminação com relação a escalas não-análogas como, por exemplo, a Escala de Afeto Positivo de Bradburn. (WEISSMAN et al., 1977).
As respostas a cada uma das questões são dadas segundo a frequência com que cada sintoma esteve presente na semana precedente à aplicação do instrumento.
É muito utilizada pela sua fácil aplicabilidade, pelo seu foco em sintomas depressivos e por empregar critérios de uma semana de duração da sintomatologia depressiva.
2.3.3.4 Hospital Anxiety and Depression Scale - HAD
A HAD é um instrumento para detectar a presença e a severidade de graus médios de distúrbios de humor, ansiedade e depressão. (ZIGMOND; SNAITH, 1983).
A escala HAD contém 14 questões de múltipla escolha. Compõe-se de duas subescalas de sete itens, para ansiedade e depressão. A pontuação global em cada subescala vai de 0 a 21. Essa escala foi primariamente desenvolvida para aplicação em pacientes de serviços não psiquiátricos de hospital e destina-se a detectar graus leves de transtornos afetivos, em ambientes não psiquiátricos. É uma escala curta, podendo ser rapidamente preenchida; ao paciente solicita-se que responda baseando- se em como se sentiu durante a última semana.
2.3.3.5 Perceived Stress Scale - PSS
A PSS foi elaborada por Cohen, Kamarck e Memelstein (1983), é um instrumento de autoresposta que pretende verificar o grau de estresse que cada indivíduo vivencia num dado momento. O resultado do PSS é visto como um indicador de perturbação emocional. (MOTA-CARDOSO et al., 2000).
A PSS possui 14 questões com opções de resposta que variam de 0 a 4 (0 corresponde a nunca; 1 corresponde a quase nunca; 2 corresponde às vezes; 3 corresponde a quase sempre e 4 a sempre). As questões com conotação positiva (4, 5, 6, 7, 9, 10 e 13) têm sua pontuação somada invertida (0=4, 1=3, 2=2, 3=1 e 4=0). As demais questões
são negativas e devem ser somadas diretamente. O total da escala é a soma das pontuações destas 14 questões e os escores podem variar de 0 a 56.
2.3.3.6 Composite International Diagnostic Interview - CIDI
O CIDI é um questionário padronizado por meio de algoritmos computadorizados, fornece diagnósticos psiquiátricos de acordo com as definições e critérios da CID 10 e do Manual de Diagnóstico e Estatística de Transtornos Mentais. (WHO, 2007).
O CIDI é um instrumento que identifica sintomas potenciais de problemas de saúde mental e investiga estes sintomas para identificar o nível de severidade (significância clínica).
O instrumento apresenta duas versões: CAPI (Computer Assisted Personal
Interviewing), a versão computadorizada e PAPI (Paper and Pencil Interviewing), a
versão manual. A diferença entre as versões é a habilidade do instrumento CAPI conduzindo para padrões mais elaborados, rotinas complexas randomizadas e alterações verificadas durante o andamento da entrevista. No entanto, estas diferenças não alteram nos resultados entre os dois modos de instrumentação.
O CIDI é composto por diversas dimensões: depressão, doença do pânico, fobias especificas, fobia social, uso de substâncias, distúrbios alimentares, déficit de atenção, ansiedade, suicídio, neurastenia, distúrbios de conduta, entre outros.
2.3.3.7 Farming Stress Inventory - FSI
O FSI é um inventário utilizado para identificar fatores de estresse no trabalho rural. Foi desenvolvido no Canadá por Walker e Walker (1987) e adaptado pelo The Human
Harvest. (MANITOBA AGRICULTURE, FOOD NA RURAL INITIATIVES OFFICE,
2007).
O inventário apresenta 60 questões e, em cada uma, deve ser indicada a frequência de ocorrência e os graus de estresse. Cada um dos eventos e situações citadas no inventário representa fontes oficiais de estresse relacionadas à agricultura, divididas em diferentes categorias.
2.3.3.8 The Stress in Farming Questionnaire
É um questionário desenvolvido para aplicação com trabalhadores rurais na Inglaterra e País de Gales (SIMKIN et al., 1998) com o objetivo de avaliar as situações de estresse. Apresenta 23 questões relacionadas às características sociodemográficas, problemas financeiros, consequências financeiras das recentes legislações, utilização de organofosforados, longas horas de trabalho, suporte social e saúde.
2.3.3.9 Self-Report Questionnaire (SRQ-20)
O SRQ-20 é um questionário de identificação de distúrbios psiquiátricos em nível de atenção primária, foi desenvolvido por Harding et al. (1980) e validado no Brasil por Mari e Willians (1986).
É um instrumento constituído de 20 perguntas que podem ser respondidas através de autopreenchimento ou de entrevista. Permite fazer o rastreamento de distúrbios psiquiátricos menores (depressão, ansiedade, distúrbios somatoformes e neurastenia), mais do que estabelecer categorias diagnósticas como na CID-10.
Há uma segunda seção com 24 questões, em que são acrescidas quatro outras para detecção de distúrbios ―psicóticos‖.
Em centros de atenção primária, o SRQ é útil como o primeiro estágio no processo diagnóstico, tendo em vista sua alta sensibilidade (83%) e especificidade (80%). É recomendado pela OMS para esta finalidade e tem se mostrado eficaz na detecção de distúrbios psiquiátricos menores (DPM). Mostrou-se superior, inclusive, ao próprio exame clínico no que diz respeito à capacidade de detecção de casos. (MARI; WILLIAMS, 1986; MARI et al., 1987).
Os pontos de corte estabelecidos para caracterizar a presença de distúrbios psiquiátricos menores foram distintos para os sexos (5-6 para os homens e 7-8 para as mulheres), uma vez que representam os melhores pontos de sensibilidade e especificidade do instrumento. (MARI; WILLIAMS, 1986).
Os estudos evidenciados no referencial teórico e os métodos utilizados serviram de base para a escolha da medida a ser utilizada nesta pesquisa.
3 TRAJETÓRIA METODOLÓGICA DA PESQUISA