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Mai 86 de Jacques Sternberg

No documento A utopia na história do petrólio (páginas 40-42)

2.4 Importância da energia e do petróleo em obras utópicas

2.4.10 Mai 86 de Jacques Sternberg

preço da energia praticamente não tinha significado e as restrições ao seu fornecimento eram impensáveis, contrariamente a cenários que ocorreram décadas mais tarde.

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Esta utopia de 1978 projecta a vida em França no ano futuro de 1986,124 deixando transparecer um sentimento de frustração, por não terem sido alcançados os ideais de Maio de 68. Estará justificada a proposta do autor para a inversão dos algarismos de 68 para 86?

No ano em que esta obra foi escrita, o autor já revela alguma desilusão em relação àqueles ideais. Na narrativa deste livro, esta situação vai agudizar-se até se chegar a 1986, como é reconhecido nas angústias que assolavam a vida das pessoas. Nos anos oitenta do século XX, a esperança de vida humana tinha caído para os quarenta e cinco anos.125

A principal preocupação do autor é dirigida para os problemas ambientais com relevância para a poluição dos cursos de água e dos mares. Em 1986, os rios apresentavam uma coloração «répugante qu’un drapeau: tricolore»;126 vermelha devido à acção das refinarias de petróleo, amarela devido aos efluentes provenientes da indústria química e negra devido aos efluentes originados pela população fixada junto ao rio ou junto ao mar.127

Dirigindo a sua atenção para o petróleo, o autor considera-o « […] la première cause de toutes les guerres, la source jamais tarie des profits les plus putrides et d’autant d’injustices sociales, l’agent nº 1 de pollution n’est plus.»128 Como exemplo, Jacques Sternberg indica a descarga directa no mar dos produtos de lavagem dos tanques dos petroleiros, ajudando a transformar os oceanos em vazadouro de resíduos.129 A pesca para

124 Mais precisamente, refere folhas dum diário escrito entre 1 Abril e 10 Outubro de 1986 e termina com

um capítulo sobre uma visão de acontecimentos ocorridos em Setembro de 1996.

125 Cf. « […] la certitude que l’espérance de vie, comme on disait, était tombée de 65 ans à 45 ans depuis

le début des années 80, assurance sur la non-vie qui ne prédisposait guère à l’optimisme quand on atteignait 40 ans.» in Jacques Sternberg, Mai 86, Paris, Éditions Albin Michel, 1978, p. 20.

126 Idem, ibidem, p. 16.

127 Cf. « Rouge, c’est la rançon des raffineries de pétrole qui bouffent toute la côte, rouge sang caillé, rouge

comme le sang des consommateurs consommés consumés. Jaune, c’est le dégueulis de la chimique, cette industrie homicide de première catégorie. Et noir, c’est le vomi agglomeré de la capitale que le fleuve recrache au ralenti en une seule respiration d’épouvante qui ne connaît ni temps mort ni récession. Rouge, jaune et noir, comme l’écho des trois mots qui composent la fière devise du monde actuel : travail, profit, poison.», Idem, ibidem.

128 Idem, ibidem, p. 112.

129 Cf. « […] les pétroliers géants-puants font la file por se gaver de saloperie carburante, et ils dégorgent à

pleins tuyaux leurs crachats résiduels pour mieux affirmer que la mer n’est plus qu’une poubelle et qu’on n’oublie jamais de la remplir.», Idem, ibidem, p. 17.

39 alimentação humana foi proibida, porque os peixes, mesmo em alto-mar, estão envenenados e causariam doenças ao nosso organismo, se utilizados na alimentação humana.130 O autor também considera o automóvel como um dos principais responsáveis pela poluição existente, salientando a forte dependência do automóvel na vida das comunidades. Por outro lado, é a principal fonte de receita do Estado, pois 80% do total dos impostos estão associados ao consumo da gasolina.131 Criticando o mito da viatura particular, o autor descreve um episódio corrido em 1980. Neste ano a ruptura global no abastecimento de combustível auto, ocasionou perturbações na vida das pessoas devido à falta de transporte privado, provocando fortes doenças psíquicas e ataques de fúria em multidões.132

Duma forma espontânea, a população revolta-se em Maio de 1986, com o objectivo de acabar com o transporte por automóvel. Começam a destruir as gasolineiras, refinarias e camiões-cisterna133 e até os próprios motores dos automóveis.134 Os aeroportos acabam também por ser sabotados e as torres de controlo aéreo são dinamitadas.135 Cessa a produção de energia eléctrica e as populações abandonam a cidade e vão viver para o campo ou para o litoral, algumas delas alojadas em barcos acostados aos cais.

Esta utopia termina quando a Terra é invadida por extraterrestres em 1996. As populações sem energia, sem armas e sem exércitos organizados, não oferecem resistência a esta ocupação. Ou, para resistir contra esta invasão, haveria que reconstruir

130 Cf. «De toute façon, il y avait longtemps que les bains étaient interdits en Bretagne comme ailleurs,

longtemps aussi que l’on ne pêchait plus de poisson dans ces eaux;», Idem, ibidem, pp 151-152.

131 Cf. [«L’industrie automobile, la seule encore en plein essor, n’est pas seulement la plus grosse source

de profit pour l´État, mais tout ce qui touche de près à la voiture rapporte encore plus gros: l’essence sur laquelle les caisses nationales raflent d’autorité plus de 80% en taxes, les assurances rassurantes, […]», Idem, ibidem, p.72.

132 Cf. «La crise de l’essence de mai 80 avait donné la température exacte de l’homme de tous les jours, de

l’homme du bitume. […] Le fait d’être privé de moteur et de pneus pendant quelques mois avait provoqué une épidémie générale de suicides, un raz de marée de dépressions nerveuses, une vague de meurtres sauvages et de viols défoulants, sans parler d’une cuvée de graves maladies psychiques et d’innombrables cas de folie furieuse. Le tout avait coûté, d’aprés les statistiques, plus de deux millions de victims …», Idem, ibidem, p. 40.

133 Cf. « Sur l’ensemble du territoire, […] ils ont incendié, fait crever ou réduit en pièces tous les réservoirs

et citernes gorgés à ras bord d’essence. […] l’opération n’a pu être menée qu’en liaison étroite avec le personnel des raffineries car, même aux endroits où il y a eu des explosions d’apocalypse, on ne déplore pas une seule victime. Et tous les camions-citernes, […] ont été incendiés ne même temps.», Idem, ibidem, p. 112.

134 Cf. «Dans la nuit du 18 mai, non seulement plus de deux cent mille voitures ont été sabotées dans les

banlieues est et ouest qui manquaient encore à l’appel, mais les voitures de tous les quartiers résidentiels de la capital ont subi le même sort.», Idem, ibidem, p. 99.

135 Cf. «Les avions existent encore, du moins pour l’instant, mais toutes les tours de contrôle ont été

40 um tipo de sociedade com valores idênticos aquela que havia sido destruída em 1986. O autor termina este livro sem revelar o que aconteceu.

No documento A utopia na história do petrólio (páginas 40-42)