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2 AS RESISTÊNCIAS NA IMPLANTAÇÃO DO PROJETO ENSINO MÉDIO COM

2.2 Mapa de Resistências ao Projeto

Para Heckert (2014, p. 469), as resistências “[...] desnaturalizam as evidências que compõem nossa vida cotidiana. São práticas anônimas e impessoais que provocam fissuras nos modos de existência instituídos e fazem emergir novos problemas”. Assim, ser resistente significa defender um ideal e mobilizar-se contra certas situações por acreditar num ponto de vista diferente ao que é proposto, sendo que, da resistência podem surgir conflitos como modos alternativos sobre a causa em disputa. E assim, no ambiente educacional, a resistência às mudanças pode resultar no insucesso de um programa ou projeto.

Dentre as causas para a resistência podem estar a insegurança ao que pode acontecer a partir das inovações decorrentes da nova iniciativa, o medo da não adaptação, os riscos para com a manutenção do emprego ou, até mesmo, o conformismo com a situação atual, ocasionando desinteresse em sair da “zona de conforto”. Por outro lado, a resistência pode indicar uma insatisfação com a proposta a ser implementada, pelo fato de existir uma outra interpretação para o que seria adequado àquela realidade. Neste sentido, Heckert (2004) esclarece que:

Práticas de resistência são aquelas que não apenas atendem ao prescrito, ao designado, ao já esperado, mas que no seu fazer esboçam outros modos de ação. Tais modos, muitas vezes imprevisíveis, são impossíveis de serem programados e funcionam como foco irradiador que se conecta a outras práticas (HECKERT, 2004, p. 27).

Assim, a resistência pode estar ancorada na perspectiva dos atores do contexto da prática em defender uma identidade educacional para a comunidade onde a escola está inserida. Para Girotto (2016, p. 1127), é necessário “[...] compreender a forma com que a dinâmica da unidade escolar está relacionada com os processos que ocorrem no seu entorno e que são profundamente espacializados”. Para o autor, as condições materiais dos estudantes para a experiência educacional não podem ser deixadas de lado, assim como a relação que professores e estudantes têm com a escola afeta sobremaneira a forma como constroem a prática educativa em sua vivência cotidiana.

O ensino mediado por tecnologia exige dos Professores Ministrantes e dos Professores Presenciais uma organização diferente do que estão acostumados. Segundo Souza, Sartori e Roesler (2008, p. 329), “[...] o/a professor/a depara-se com situações, em geral, não vivenciadas anteriormente como aluno, pois grande parte se formou no ensino presencial”, e, para os estudantes inseridos no Projeto, o modelo exige maturidade, visto que, conforme Souza, Sartori e Roesler (2008, p. 337), “para alguns alunos, o fato de não ter aula na forma convencional e presencial leva-os a pensar que não precisam estudar”, o que demonstra o descrédito de muitos para com o ensino à distância.

Dada a complexidade da análise das resistências à política, estudá-las considerando o ciclo de políticas permite perceber que existem diferentes momentos no processo de construção e implementação da política, sendo necessário reconhecer as especificidades de cada um desses momentos para entender as influências dos diversos atores interessados no processo.

A abordagem do ciclo de políticas, conforme destaca Mainardes (2006, p. 48), “[...] permite a análise crítica da trajetória de programas e políticas educacionais desde sua formulação inicial até a sua implementação no contexto da prática e seus efeitos”. Sendo assim, observar a interferência ocasionada pelos atores nos contextos de influência, produção de texto ou prática pode proporcionar respostas para as resistências vivenciadas no Projeto.

As resistências à política nos levam a identificar quem são os atores contrários à implementação do EMMT. Analisando os contextos de influência, produção de texto e prática, temos, no Quadro 6, os atores e os argumentos que justificam essa posição.

Quadro 6 – Atores resistentes ao Projeto EMMT

Atores Argumentos Contexto

SINTERO Projeto desnecessário à Cacoal que possui professores habilitados no EMC.

Contexto de Influência UNIR O alunos do campo necessitam do ensino presencial para preservar os postos de trabalho, tendo na docência

formada para tal, condições para lidar com identidades diversificadas presentes na realidade do estado. Deputados Estaduais O alunado do Campo tem direito a um ensino que atenda suas necessidades e anseios, devendo o governo do estado propiciar as condições necessárias à esse atendimento com qualidade.

Ministério Público Não se posicionou antes da aprovação do texto do Projeto, mas vem acompanhando a implementação em todos os municípios rondonienses, sugerindo a necessidade de melhorias.

UNIR De que forma será possível a interdisciplinaridade no Projeto EMMT, uma vez que a sua estrutura curricular está estruturada em conteúdos modulares.

Contexto da Produção de Texto Deputados Estaduais Responsáveis pela aprovação do Projeto na ALE/RO, também influenciaram a produção do texto.

CEE/RO Necessidade de melhorias no Projeto para atendimento ao que preconiza a legislação educacional.

Ministério Público Após visitas técnicas às escolas, tem enviado documentos à Seduc sobre a necessidade de melhorias no atendimento do EMMT nas escolas cujo Projeto foi implementado. SINTERO Que o Projeto não seja ampliado indiscriminadamente em localidades que não sejam de difícil acesso, em

especial, nas cidades.

Contexto da Prática UNIR

O EMMT fere com a legislação que dá direito à educação científica, diferenciada, uma educação voltada para a população do Campo, pois apresenta um currículo mínimo, descontextualizado da realidade sociocultural do estudante. Segue padrões tecnicistas, com aulas padronizadas e homogêneas.

Estudantes Preferência pelo ensino regular considerando dificuldades de adaptação ao ensino mediado por tecnologia e escassez de recursos materiais e tecnológicos necessários ao desenvolvimento do Projeto. Professores do EMC O ensino mediado por tecnologia não respeita a diversidade regional do estudante.

Professores Presenciais do EMMT

Dificuldades em sanar as dúvidas dos estudantes em todos os componentes curriculares, visto que são formados em apenas uma área.

Prefeituras Inviabilidade de transporte público escolar no período vespertino.

Ministério Público Além de um ensino que atenda às necessidades do alunado do campo, é preciso que este atendimento seja de qualidade.

Percebe-se, portanto, que as resistências ao EMMT foram identificadas em todos os contextos de implementação da política e estão associados a motivos diversos. Sindicatos e Universidade defendem a manutenção do ensino presencial no campo como defesa de um modelo que preserve os postos de trabalho e à docência formada para lidar com identidades diversificadas presentes na realidade do estado de Rondônia, identidades essas que estão comprometidas em face de um sistema de ensino massificado.

Houve ainda resistência transfigurada em forma de adaptação quando o modelo de ensino implementado no Amazonas foi adaptado pela SEDUC em Rondônia, sendo firmado convênio com o IFRO para transmissão das aulas e inclusão do curso técnico ao currículo do Projeto.

Além disso, houve resistência do Ministério Público nos contextos de influência, produção e da prática, assim como do Conselho Estadual de Educação de Rondônia, de prefeituras e comunidades escolares. Cada um destes segmentos, motivados por questões específicas, modificaram a proposta inicial.

Neste sentido, podemos elencar diferentes resistências: manutenção do caráter presencial do ensino; preservação dos postos de trabalho; adaptações do modelo à realidade de Rondônia; preocupação com a questão da diversidade sociocultural da população do Campo; e, questões de infraestrutura.

Assim, no que se refere à “resistência”, é importante observá-la não como aspecto negativo, mas sim nos resultados que ela produz, a saber: por que existem esses movimentos de resistência? Sob qual ponto de vista ocorrem essas resistências? Diante da proposta, o que seus atores produzem no cotidiano? Como tornam possíveis suas atividades cotidianas? Que subversões praticam? Questões como essas nos fazem pensar a relação entre as pessoas que se relacionam com o projeto, assim como, aquilo em que a proposta se transforma nas práticas cotidianas.

2.3 Disputas e adequações às condições existentes à implementação do Projeto Ensino