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CAPÍTULO 2 A SUSTENTABILIDADE E AS EDIFICAÇÕES RURAIS E NÃO

2.7 Materiais construtivos alternativos e não-convencionais

Materiais de construção civil podem possuir diferentes adjetivos e classificações. Quanto à popularidade de utilização em edificações, na literatura técnica e acadêmica pode-se constatar três nomenclaturas básicas: materiais convencionais ou tradicionais (MARX; PAULA, 2011; SUJATHA; DEVI, 2018), materiais alternativos (ARGOLLO FERRÃO, 2007; KESIKIDOU; STEFANIDOU, 2019) e os materiais não-convencionais (AZEVEDO, 2008; MATEUS, 2009).

Freire (2003), entende que materiais e sistemas construtivos alternativos são aqueles que não possuem normatização específica e que, necessariamente, precisam adotar procedimentos específicos desenvolvidos ou adaptados pelo pesquisador que

o desenvolveu. Em oposição a esta ideia Mateus (2006), Azevedo (2008), Barbosa (2015) classificam as técnicas construtivas e materiais não exploradas comercialmente como não-convencionais.

Neste sentido, para a definição de uma base teóricas se entende por técnicas e materiais alternativos, por força de significado do termo “alternativa”1, que adjetiva a oração, conota a ideia de alternância, de opção viável a ser escolhida. Já os não- convencionais, formam um conjunto de soluções que se opõe às convencionalmente utilizadas, abaixo, são propostas definições para a utilização dos termos:

 Materiais convencionais ou tradicionais para a construção civil: são insumos empregados nos sistemas construtivos mais utilizados para a construção de edificação, tais como os vinculados ao concreto armado e a alvenaria de blocos cerâmicos. A palavra tradicional é empregada com o sentido de prática realizada por hábito ou costume adquirido, ou seja, é vinculada aos processos historicamente empregados na construção civil ao longo do tempo em determinada região. Portanto, podemos entender o termo como materiais utilizados na construção civil por hábito ou costumes históricos, vinculados à cultura construtiva de determinada região.

 Materiais alternativos para a construção civil: são todos aqueles materiais que se apresentam como opção aos tradicionalmente utilizados em canteiros de obras, sendo que a sua viabilidade técnica e construtiva deve ser necessariamente comprovada, ou ainda que representa uma opção fora das instituições, costumes, valores e ideias convencionais.

 Materiais não convencionais: termo utilizado para designar um determinado material construtivo não habitualmente empregado para tal fim. Nesse caso, esses elementos não necessariamente se apresentam como uma alternativa aos materiais tradicionais, mas sim, são

1 Significado para o termo “Alternativa”: “sucessão de coisas excludentes entre si que se repetem de

forma alternada; Opção entre duas ou mais possibilidades; O que pode ser usado no lugar de outro”. Fonte: Michaelis, 2019 - Dicionário Brasileiro da Língua Portuguesa -disponível em

classificados pela sua utilização inédita, restrita ou pouco difundidos em determinada região.

Como ilustração ao exposto, a classificação dos blocos de solo-cimento em edificações prediais, ou ainda a incorporação de resíduos de construção e demolição (RCD) em concretos não podem ser classificados como “não convencionais”, como verificado em alguns trabalhos, pois tais técnicas, no Brasil, possuem um grau considerável de aplicações, cabendo, portanto, considerá-los como “materiais alternativos”. Ao passo que, por exemplo, o material construtivo solo-cimento auto adensável não pode ser considerado como alternativo, já que não se pode optar por esse material em obras corretes devido ao seu desenvolvimento recente (BARBOZA, 2014).

2.7.1 A apropriação de tecnologias construtivas mais sustentáveis

A utilização de um material alternativo em uma determinada região não garante que este é mais sustentável que o tradicionalmente utilizado, há que se analisar, além de seus impactos (sociais, econômicos e ambientais), a aderência (ou apropriação) da técnica ao contexto local. A construção de edificações em ambientes não urbanos representa um campo fértil para a apropriação de técnicas e tecnologias alternativas e não convencionais, pois grande parte dos aglomerados populacionais procura adaptar os insumos locais em novas edificações (FREIRE, 2003).

Uma tecnologia, diferentemente da técnica que pode ser entendida como a atividade relacionada à prática (assim como o assentamento de tijolos cerâmicos), é caracterizada por resolver, por meio de uma estruturação científica, questões práticas muitas vezes relacionadas com a técnica (ABIKO, 2003).

A apropriação de uma tecnologia, embasada por meio da teoria das tecnologias apropriadas (GARCIA, 1987), especialmente em edificações, objeto da construção civil se relaciona com a incorporação de determinada solução construtiva ante aos objetivos de desenvolvimento esperados para uma determinada localidade e suas condições sociais, econômicas e ambientais. Cabe ressaltar que não necessariamente uma tecnologia apropriada é menos impactante ambiental,

econômica e socialmente, ou, em outras palavras, a adoção de uma determinada solução construtiva por grande parte das pessoas em uma localidade não garante que esta seja mais sustentável, porém, não faz sentido a proposição de tecnologias construtivas mais sustentáveis à populações que não irão se apropriar destas. Exemplificando, não seria a melhor solução, mesmo que mais sustentável ambientalmente, propor a implementação de telhados de sapê2 (em seu formato

tradicional) em ambientes fortemente urbanizados, já que para essas áreas outras soluções são fortemente implementadas, em conformidade com a população local e com os objetivos de desenvolvimento pretendidos. Outro aspecto importante se faz na não atenção das questões sociotécnicas da abordagem clássica prevista na teoria das tecnologias apropriadas, sendo pouco efetivas quanto às mudanças efetivas em uma determinada região, necessitando-se, desta maneira, complementações e extrapolações de sentido, tais como a teoria das tecnologias sociais (DAGNINO, 2014) e a própria conceituação proposta para a sustentabilidade, em sua abordagem integral, holística e pluralista.

Neste cenário, ao se propor a implementação de novas tecnologias construtivas no Brasil, percebe-se que, de modo geral, há um conservadorismo construtivo, onde engenheiros e usuários tendem a rejeitar novas soluções, sejam elas já incorporadas em outras regiões ou proposta tecnológica inovadora (ABIKO, 2003). Sendo, assim, de vital importância o fomento à participação de agentes, como universidades e o setor público com o intuito de se popularizar a cultura construtiva que se utilize materiais mais sustentáveis (BERGE, 2009).

Nos ambientes não urbanos, a utilização de materiais naturais e de fontes renováveis em elementos construtivos representa um campo de grande interesse socio, econômico e ambiental (base teórica para a conceituação de sustentabilidade), pois incorporam materiais locais e de fácil manipulação nas edificações e, em muitos casos, resgatam tradições historicamente utilizadas. Porém, ainda é um campo recente em meio científico, sendo essa aplicação não consolidada. É evidente a sua contribuição na redução dos impactos ambientais em um primeiro momento quando se substitui elementos industrializados e que precisam de grandes quantidades de energia para a sua fabricação (como a substituição de armadura de aço por fibras de

2 Técnica tradicional de cobertura de edificações, onde, as fibras de sapê são utilizadas para proteção

bambu), porém, a durabilidade e confiança estrutural são questões ainda delicadas para materiais compósitos e, portanto, precisam ser mais aprofundadas (TORGAL e JALALI, 2010).

Diversas formas construtivas alternativas foram propostas ao longo dos anos para as regiões afastadas dos grandes centros brasileiros, especialmente nas regiões rurais. Historicamente, a utilização de técnicas construtivas à base de solo nessas regiões se destaca. Esse comportamento se explica, em um primeiro momento, pela disponibilidade desse insumo em abundância e à facilidade construtiva das técnicas culturalmente disseminadas. Outra explicação possível se dá devido à herança das tradições construtivas portuguesas (SANTOS, 2015) e africanas (WEIMER, 2014) que utilizam o solo como matriz construtiva, sendo implementadas já nos primeiros anos coloniais, expandidas para o interior em diversos ciclo e os demais períodos sociais e econômicos vinculados à produção agrícola nacional.