Capítulo 3 Resultados e Discussão
3.5 Oxidação do NO utilizando os carvões ativados como catalisadores
3.5.9 Estudo cinético e mecanístico da oxidação do NO
3.5.9.1 Mecanismo
A oxidação do NO a NO2 pode parecer simples, uma vez que apenas um átomo de
oxigénio é adicionado estequiometricamente ao NO. No entanto, o processo detalhado da oxidação do NO, e os factores que controlam este processo, ainda estão sob discussão.
Ahmed et al. [68] sugerem que o NO é oxidado pelo oxigénio a NO2 na fase gasosa
e então o NO2 é adsorvido na superfície do carvão.
Neste trabalho verificou-se conversão de NO obtida na reação em fase homogénea com 1000 ppm de NO e 20% de oxigénio é bastante menor que as conversões de NO obtidas nas reações realizadas com os carvões ativados. Por isso o mecanismo o proposto por Ahmed et al. [68] não está de acordo com os resultados experimentais obtidos neste trabalho.
Mochida et al. [64] propõem que o NO é adsorvido e oxidado a NO2 adsorvido, que
posteriormente dessorve como produto. O NO é um gás supercrítico à temperatura ambiente, por isso pouco NO é adsorvido fisicamente na superfície dos materiais de carbono [170].
150 Neste trabalho foram realizadas experiências de adsorção do NO com o carvão ativado original (AC) e com o carvão ativado tratado com ureia (AC-U). Verificou-se que o NO não adsorve nos carvões ativados (Figura 32).
Da experiência realizada com o carvão ativado tratado com ureia, pode-se concluir que os grupos azotados presentes na amostra AC-U não são centros ativos para a adsorção do NO.
Rathore et al. [63] defenderam que o NO e o O2 na fase gasosa adsorvem nos
sítios ativos da fibra de carbono ativada, sendo depois o NO oxidado a NO2. O NO2
adsorvido pode ainda reagir e formar vários intermédios adsorvidos tal como NO3 e
NO-NO3. O NO-NO3 dessorve como NO2.
Kong e Cha [55] propõem que o oxigénio reage com os centros ativos livres do carvão ativado e forma complexos oxigenados, que reagem com o NO e formam o NO2 que fica adsorvido na superfície dos carvões ativados e que é posteriormente
dessorvido.
Ainda existem muitas dúvidas em relação ao mecanismo de reação do NO com o oxigénio e com os materiais de carbono. Por isso, para tentar elucidar o papel dos grupos azotados na oxidação do NO e quais são as espécies que ficam adsorvidas na superfície do catalisador foram realizados os seguintes ensaios:
Colocaram-se as amostras AC-1100ºC (tratada termicamente a 1100ºC em atmosfera inerte) e AC-U (tratada com uma solução de ureia à temperatura ambiente) em contato com oxigénio durante 2 horas à temperatura ambiente. Este ensaio foi realizado com o objetivo de verificar se o oxigénio fica adsorvido na superfície dos carvões ativados nas reações realizadas à temperatura ambiente e se os grupos azotados presentes na superfície do material são centros ativos para a adsorção do oxigénio. Anteriormente verificou-se que os grupos azotados não adsorvem o NO. As amostras sujeitas a este ensaio serão designadas de AC-U-O2 e AC-1100ºC-O2 quando o ensaio foi realizado com as amostras AC-U e
AC-1100ºC, respetivamente.
Depois das amostras estarem em contato com oxigénio foi adicionado 1000 ppm de NO, agora sem a presença de oxigénio na fase gasosa durante 2
horas. Este ensaio foi realizado para verificar se o NO na fase gasosa interage com o oxigénio adsorvido na superfície do material.
151 As amostras sujeitas a este tratamento serão designadas de AC-U-O2-NO e
AC-1100ºC-O2-NO quando o tratamento foi realizado com a amostra AC-U e com a
amostra AC-1100ºC, respetivamente.
A superfície das amostras resultantes destes ensaios foi analisada por XPS. Também foi analisada a superfície das amostras após a reação com 1000 ppm de NO e 20% de oxigénio (amostras AC-U-R e AC-1100ºC-R).
As amostras selecionadas para estes ensaios foram as amostras AC-1100ºC e AC-U, porque a amostra AC-1100ºC apresentou uma elevada conversão de NO e praticamente não tem azoto na sua superfície, e a amostra AC-U é a amostra que apresenta maior quantidade de azoto determinada por XPS.
Na Tabela 22 estão representadas a quantidade de azoto determinada por XPS e as concentrações relativas dos grupos azotados obtidos por ajuste do pico de azoto das amostras resultantes dos ensaios e após reação.
Observando a Tabela 22, verifica-se que estes ensaios praticamente não alteraram as quantidades dos grupos N6 e N5 presentes na amostra AC-U e as quantidades dos grupos N6 e NQ presentes na amostra AC-1100ºC. As diferenças que existem deverão corresponder a erros experimentais da técnica de XPS.
Pode pois concluir-se que não houve interação entre os grupos azotados presentes nas amostras originais com o oxigénio, com o NO e com o NO2 formado pela
reação entre o NO e o oxigénio.
A partir dos resultados representados na Tabela 22, pode-se concluir que o oxigénio não é adsorvido pelos grupos azotados presentes nos materiais de carbono, porque as amostras AC-U-O2 e AC-1100ºC-O2 apresentam os mesmos
grupos azotados que as amostras originais. Se os grupos azotados fossem centros ativos para a adsorção de oxigénio seria de esperar que, pelo menos na amostra AC-U-O2 depois do ensaio com oxigénio, houvesse a formação de óxidos de azoto,
o que não foi verificado (Tabela 22).
Uma situação diferente foi reportada por Deliyanni et al. [176], que sugerem que os grupos amina e amida introduzidos na superfície dos carvões interagem com o NO e com o NO2. Para além dos resultados pelas análises de XPS, na Figura 32
verificou-se que os grupos azotados presentes na amostra AC-U não adsorvem o NO.
O papel dos grupos azotados na atividade catalítica dos carvões ativados está relacionado com a sua capacidade de formar o ião superóxido, O2
-
152 grande influência nas reações de oxidação [87]. Este superóxido é formado pela transferência dos eletrões dos elevados estados de energia para o oxigénio adsorvido. Quando os átomos de carbono são substituídos por átomos de azoto nas camadas de grafeno, os eletrões extra dos grupos azotados ocupam elevados estados de energia.
A presença dos átomos de azoto nas camadas de grafeno aumenta a densidade eletrónica na superfície nos materiais de carbono, aumentando assim as propriedades catalíticas destes materiais.
Tabela 22 – Quantidade de azoto determinada por XPS e as concentrações
relativas dos grupos azotados obtidos por ajuste do pico de azoto do espetro de XPS das amostras resultantes dos ensaios e após reação.
Amostras NXPS [%] N6 N5 NQ N-X NO2 AC-1100ºC 0,14 0,06 - 0,08 - - AC-1100ºC-O2 0,14 0,06 - 0,08 - - AC-1100ºC-O2-NO 0,37 0,10 - 0,11 - 0,16 AC-1100ºC-R 0,42 0,05 - 0,09 0,11 0,17 AC-U 1,65 0,78 0,54 - - 0,33 AC-U-O2 1,77 0,81 0,64 - - 0,32 AC-U-O2-NO 2,14 0,95 0,55 0,21 0,43 AC-U-R 2,44 0,75 0,57 - 0,34 0,78
Foi detetado por XPS a presença dos grupos NO2 na amostra AC-1100ºC-O2-NO.
O que significa que o NO na fase gasosa reagiu com os complexos oxigenados previamente formados quando a amostra esteve em contato com o oxigénio. A quantidade de NO2 presente na amostra AC-U-O2 é superior à quantidade de
NO2 presente na amostra original; nesta amostra, o NO também interagiu com o
oxigénio previamente adsorvido.
Rathore et al. [63] defenderam que o NO e o O2 na fase gasosa adsorvem nos
153 AC- 1100 ºC AC- 1100 ºC-O 2 AC -110 0 ºC -O2- NO AC- 1100 ºC-O 2-R AC- U AC-U -O2 AC- U-O 2-N O AC- U-R 0.000 0.005 0.010 0.015 0.020 0.025 N/C
NO3. Nas análises de XPS das amostras sujeitas à reação não foi verificado a
presença de NO3.
Na amostra AC-U-O2-NO, verificou-se a presença de óxidos de azoto, devido a
adsorção do NO.
Nas Figuras 39 e 40 estão representadas as razões de azoto/carbono e oxigénio/carbono, respetivamente, nas amostras originais, após os diferentes ensaios e após a reação.
Figura 39 – Complexos azotados presentes nas diferentes amostras.
Depois das amostras estarem em contato com o NO, a razão N/C sofre um aumento devido à quimissorção de NO e à formação de NO2 que fica adsorvido na
superfície do carvão ativado(Figura 39).
As amostras sujeitas aos tratamentos com oxigénio e com NO e após a reação apresentam quantidades de complexos oxigenados superiores relativamente às amostras originais.
Observou-se a seguinte sequência para as quantidades de grupos oxigenados. Para as amostras AC-1100ºC e AC-U:
154 AC -110 0 ºC AC-1 100 ºC-O 2 AC- 1100 ºC-O 2-N O AC- 1100 ºC-O 2-R AC -U AC- U-O 2 AC- U-O 2-N O AC-U -R 0.00 0.01 0.02 0.03 0.04 0.05 0.06 0.07 0.08 O /C
AC-U <AC-U-O2 <AC-U-O2-NO <AC-U-R
Como foi observado anteriormente, o aumento da concentração de oxigénio tem um efeito positivo na conversão de NO. Este tipo de dependência sugere que o primeiro passo da reação é a adsorção de oxigénio na superfície dos materiais de carbono, que posteriormente reage com o NO formando o NO2 adsorvido. Esta
hipótese foi confirmada pelas análises de XPS, estando também de acordo com o mecanismo proposto por Kong e Cha [55].
Figura 40 – Complexos oxigenados presentes nas diferentes amostras.
Para se estabelecer o mecanismo, foi considerado que os sítios ativos para a quimissorção de oxigénio são átomos de carbono insaturados situados nas extremidades das camadas de grafeno ou defeitos dos planos basais.
Com base na literatura [55, 177] e nos resultados obtidos neste trabalho, assumiu- se que o oxigénio é a primeira espécie a ser adsorvida na superfície dos materiais de carbono (adsorção dissociativa do oxigénio, Equação 56); posteriormente o NO reage com o oxigénio adsorvido e forma o NO2 que fica adsorvido (reação de
superfície do NOno estado gasoso com o oxigénio adsorvido, Equação 59) e que posteriormente dessorve como produto (Equação 60).
Para além destas reações, o mecanismo reacional proposto também inclui uma reação que representa a adsorção do NO nos carvões ativados (Equação 57) e
155 outra equação que representa a reação entre o NO adsorvido e O2 adsorvido
(Equação 58). Mas como foi discutido anteriormente, o NO praticamente não adsorve na superfície dos carvões ativados e por isso as Equações 57 e 58 serão desprezadas. (56) (57) (58) (59) (60)
Nestas equações, Ki representa as constantes de equilíbrio e kd representa a
contante de velocidade da etapa controlante. Cf ( ) representa os sítios ativos livres
e C(NO), C(O) e C(NO2) representam os centros ativos ocupados com NO, O e
NO2, respetivamente.
Quando o catalisador começa a ficar saturado com o NO2 verifica-se um aumento
da concentração de saída do NO, alcançando um valor máximo. Ao mesmo tempo o NO2 começa a ser libertado, o que faz com que os sítios ativos fiquem livres. A
adsorção de oxigénio ocorre nos sítios livres e apenas quando o NO2 dessorve
libertando os sítios ativos para a reação. Por estas razões, a dessorção do NO2
(Equação 60) foi considerada como o passo controlante da reação. Sudhakar et al. [62] nos seus estudos também consideram a dessorção do NO2 como o passo
controlante da reação da oxidação do NO.
Com base nesta hipótese, a equação da velocidade de reação é escrita da seguinte forma:
(61)
A equação de velocidade tem uma variável desconhecida [C(NO2)], que tem que
ser expressa em termos de variáveis que possam ser determinadas e de constantes de equilíbrio.
Assumindo que as Equações 56 e 59 não são etapas controlantes, é possível determinar [C(O)] e [C(NO2)], através das Equações 62 e 64, respetivamente, que
traduzem a relação de equilíbrio de adsorção do O2 e do NO2.
K1
K2
K3
K4
156 (62)
(63) (64)
Substituindo a Equação 64 na equação de velocidade (Equação 61), obtém-se: (65)
Considerando que o número total de centros ativos [Ct] se mantém constante, nas
diferentes condições reacionais, verifica-se a seguinte relação:
(66) Substituindo as expressões escritas acima (Equações 62 e 64) na Equação 66, obtém-se:
(67)
Resolvendo a equação anterior em ordem a [Cf ( )]:
(68)
Substituindo a Equação 68 na Equação 65, a equação de velocidade fica:
(69)