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Mecanismos de definição da oferta formativa

4 Formação Profissional e Gestão do Mercado de Trabalho

4.2 Mecanismos de definição da oferta formativa

Em termos gerais, o modelo de definição da oferta formativa tem sofrido alterações significativas ao longo do tempo, encontrando-se todavia, quase sempre, condicionado pelo contexto sócio económico e político em que se insere.

Num primeiro momento, a definição da oferta formativa centrou-se na necessidade de obtenção de qualificações, sem preocupação pela área profissional em que as mesmas fossem obtidas. A ausência de recursos humanos preparados para operar com as tecnologias que incorporavam a maquinaria existente, assim o determinava.

Nos anos de 1970, o agravamento dos níveis de desemprego, exacerbados pelas alterações que se fizeram sentir ao nível económico e tecnológico que afectaram os métodos de produção, de gestão e as relações de trabalho, induziram a necessidade de alteração dos perfis de qualificação (Drucker, 1993). A formação profissional, até então centrada na oferta, sente o efeito dos excedentes de mão-de-obra qualificada, que não conseguem obter colocação no mercado de emprego. A definição da oferta formativa tentará, então, centrar-se nas áreas que possibilitem responder à capacidade produtiva instalada.

Assiste-se desta forma à queda do mito de que a formação por si só cria postos de trabalho, ao mesmo tempo que se alerta para a importância de considerar as necessidades do tecido produtivo na definição da oferta formativa, o que levou alguns países a definirem a sua oferta formativa, unicamente, com base na procura do tecido produtivo (Castro, 2002).

Não obstante a importância de considerar as necessidades do tecido produtivo, o mesmo autor alerta também para os perigos decorrentes de uma definição da oferta formativa exclusivamente centrada na procura, dado que a mesma pode não permitir fazer face às transformações de um sector produtivo em permanente mutação, que apela cada vez mais à existência de competências diversificadas, a que uma formação demasiado focalizada nas necessidades actuais, não conseguirá dar resposta.

È na década de 1970 que os discursos políticos oficiais passam a enfatizar a necessidade de produzir formação de acordo com as necessidades do tecido produtivo. Documentos recomendando aos países que não desenvolvam formação sem se assegurarem previamente, da existência de integração profissional para as qualificações a ministrar (Kanaway, 1990) são então, veiculados pela Organização Internacional do Trabalho (OIT) na tentativa de que os países não favoreçam a existência de excedentes de mão de obra qualificada.

Acreditamos que (em grande medida fruto das orientações dos organismos internacionais que Portugal tem que acatar na definição das políticas públicas, para poder usufruir dos fundos comunitários de apoio à qualificação dos recursos humanos nacionais) surgem, a partir de meados da década de 1980, um conjunto de mecanismos legais que apontam para a participação dos parceiros sociais na gestão da formação. A participação dos parceiros sociais na coordenação do sistema de formação pode ser identificada a vários níveis. Cardim (1999: 96) reconhece 3 níveis de participação:

• Macro concertação, constitucionalmente consagrada nos grandes órgãos nacionais de concertação, onde se verifica a intervenção das “associações de topo” na definição global das políticas, nos acordos que as consubstanciam e no seu acompanhamento; • Nível intermédio, constituído pela presença das organizações representativas de

interesses específicos dos sectores, regiões ou profissões, nos órgãos consultivos da tutela, ou direcção dos sistemas, programas ou das intervenções horizontais especializadas;

• Micro concertação, constituído pela participação dos parceiros na gestão das entidades que realizam a formação, por parte das empresas, organismos associativos ou representantes autárquicos, que prosseguem interesses mais localizados.

Em 1986 a Portaria 656/86 de 4/11 introduz a participação directa dos parceiros sociais no conselho de administração do IEFP encorajando a acção formativa por intermédio de uma actividade mais descentralizada, determinando a institucionalização dos parceiros sociais na gestão das actividades, por hora, só ao nível do topo e regional -Serviços Centrais e Delegações Regionais.

Em 1993 com a Portaria 180/93 de 16/2, é criado o Observatório do Emprego e Formação Profissional (OEFP) que apresenta uma constituição de base tripartida e tem como objectivo contribuir para o diagnóstico, prevenção e solução de problemas de emprego e formação profissional, bem como para a execução de medidas e programas de acção. Igualmente em 1993 o DL 76/93 de 12/03 institui a participação dos parceiros sociais na gestão dos centros de formação. A constituição dos conselhos consultivos (de base tripartida porquanto integra representantes da Administração Pública central e local e das confederações patronais e sindicais) junto dos centros de formação profissional tem como atribuições fundamentais:

1. “Emitir parecer sobre o plano anual e o orçamento do centro de formação;

2. Acompanhar a actividade do centro e emitir parecer sobre o relatório anual de actividades;

3. Formular propostas, sobre a actividade do centro, que considerar convenientes;

4. Emitir parecer sobre o alargamento da actividade formativa do centro a novas áreas profissionais;

5. Contribuir para a integração do centro no respectivo tecido económico e social, o que deverá ser realizado pela participação em actividades como:

• Diagnóstico das necessidades e potencialidades de formação;

• Promoção da resposta adequada às necessidades e aproveitamento de potencialidades de formação;

• Promoção do acesso a acções de formação de empresários e

trabalhadores;

• Promoção e difusão de inovações tecnológicas e apoio às empresas;

• Análise da integração dos ex-formandos no mercado de emprego.” (DL 76/93 de 12/03: 1149-1150)

Pelo exposto percebe-se intenção legal de mudança de paradigma na definição da oferta formativa, que por força da descentralização e da intervenção de vários actores na definição dos planos de actividades promova uma definição da oferta formativa capaz de dar resposta, às exigências actuais do mercado de trabalho, à sua evolução; à adequação das respostas formativas às necessidades do tecido produtivo da área geográfica que envolve o Centro de Formação e que se ajuste às necessidades formativas de públicos diversos. Este espaço legal para além de introduzir uma dimensão avaliativa, da adequação do plano de actividades dos Centros, na adaptação às necessidades do mercado de trabalho, permite conferir aos Centros de Formação um papel de dinamizadores e potenciadores do desenvolvimento económico regional que não pode ser descurado, num contexto de elevada taxa de desemprego e baixa competitividade económica.

Todavia nem sempre os objectivos preconizados com a definição do quadro legal são alcançados com a sua aplicação. Castro (2002) e Leite (2003), alertam-nos para que a alteração de paradigma na definição da oferta formativa não é facilmente interiorizada e

consequentemente levada à prática uma vez que os responsáveis pela definição da oferta formativa, possuem resistências à mudança de tipo individual, sobretudo, em virtude da sua preparação ter ocorrido num contexto de escassez de oportunidades formativas.

Os contributos de Castro e Leite alertam para a importância de que se reveste a definição da oferta formativa num contexto político-económico crescentemente problematizado, onde graça o desemprego crescente e a sociedade do conhecimento altera velozmente os contextos tecnológicos e organizacionais, deixando igualmente antever, a importância de que se pode revestir a operacionalização das políticas de formação quando acautela que, a existência de orientações legalmente definidas não constituí garantia suficiente no alcance dos objectivos que as mesmas preconizam (Castro, 2002).

Na mesma linha, Moreira alerta-nos para que na passagem do papel à realidade, qualquer política é sempre confrontada “com numerosos e poderosos obstáculos, como são, antes de mais, a cultura instalada e o cinismo burocrático” (2002: 11).

Percebemos assim que a par com a definição das políticas, a sua operacionalização assume especial relevância, no alcance dos objectivos que com elas se pretendem atingir.

A referência que no presente trabalho se faz aos modelos de definição de políticas públicas, não pretende ser exaustiva, destinando-se só a um melhor entendimento de que, as fases de definição e implementação em políticas públicas não devem ser vistas de forma separada ou estanque, uma vez que ambas se podem influenciar, dependendo o grau de influência mutuo, em grande medida do modelo teórico que lhes está subjacente.

A reflexão sobre a importância da definição e implementação das políticas públicas, nos resultados que as mesmas podem produzir, torna premente conhecer com mais detalhe o pensamento desenvolvido por alguns investigadores no que respeita à definição e implementação das políticas públicas, em ordem a uma melhor compreensão do que se passa com a operacionalização das políticas de formação profissional em Portugal.