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Mecanismos de resistência às polimixinas

2. REVISÃO BIBLIOGRÁFICA

2.2 Opções terapêuticas e mecanismos de resistência

2.2.2 Polimixinas

2.2.2.1 Mecanismos de resistência às polimixinas

O mecanismo de resistência às polimixinas não está completamente elucidado até o momento. Em geral, são observados dois fenótipos de resistência, o primeiro, denominado resistência natural, provavelmente resultante de mutação no genoma bacteriano e que promove baixo grau de resistência com CIMs próximas aos pontos de corte para mudança de categoria de sensibilidade. O segundo fenótipo de resistência às polimixinas é denominado mecanismo adaptativo, no qual a bactéria, inicialmente sensível, desenvolve resistência às polimixinas após à exposição cem concentrações crescentes de polimixinas. Esse último mecanismo pode levar a CIMs bem mais elevadas, acima de 128 µg/mL e pode ser um fenótipo reversível, dependendo da espécie bacteriana, na ausência da pressão seletiva estabelecida pela droga (Skiada et

al., 2011). Dessa forma, a utilização do antimicrobiano em doses não suficientes para

erradicação do patógeno pode contribuir para o surgimento do fenótipo adaptativo de resistência às polimixinas.

A parede celular de bactérias Gram negativas é formada por uma membrana interna que separa o conteúdo intracelular do espaço periplasmático onde estão presentes as betalactamases, seguida por uma camada fina de peptideoglicano. Esses microrganismos possuem a membrana externa fosfolipídica envolvendo a célula. A

parede celular bacteriana é ancorada por moléculas de LPS

total da superfície celular bacteriana, com exceção dos espaços ocupados pelas porinas (Nikaido, 2003). O LPS é composto

por um lipídio A, na porção central extremidade mais externa, por um antígeno O

Figura 3. Desenho esquemático da parede celular bacteriana de bactérias Gram

negativas (Adaptado de Brock, 2003).

Lipídio A é a porção que ancora o LPS composto por fosfolipídios

endotoxina bacteriana, responsável por Like 4, desencadeando a resposta inflamatória Whitfield, 2002; Koch et al., 2012

parede celular bacteriana é ancorada por moléculas de LPS que cobre

bacteriana, com exceção dos espaços ocupados pelas porinas O LPS é composto por três regiões, em sua extremidade mais

na porção central por um core de oligossacarídeo e, em sua , por um antígeno O (Figura 3).

Desenho esquemático da parede celular bacteriana de bactérias Gram Brock, 2003).

Lipídio A é a porção que ancora o LPS na superfície da membrana s baseados em moléculas de glicosamina.

endotoxina bacteriana, responsável por ativar os receptores do sistema imunológico Toll a resposta inflamatória, que pode levar ao choque tóxico

., 2012; Triantafilou et al., 2012). Devido à grande afinidade da

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cobrem a área externa bacteriana, com exceção dos espaços ocupados pelas porinas , em sua extremidade mais interna, arídeo e, em sua

Desenho esquemático da parede celular bacteriana de bactérias Gram

na superfície da membrana interna e é glicosamina. O lipídio A é a ativar os receptores do sistema imunológico

Toll-choque tóxico (Raetz e . Devido à grande afinidade da

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molécula de polimixina pelo lipídio A, cuja carga é negativa, essa droga também apresenta atividade anti-endotoxina (Chen et al., 2010).

O core de oligossacarídeo é uma pequena porção central do LPS dividida em core externo e core interno (lipídio A proximal), esse último é composto por heptose e resíduos de ácido 3-deoxi-D-manno-oct-2-ulosonico (KDO). Assim como o lipídio A, o core de oligossacarídeo é uma região altamente conservada e desempenha papel crucial na estabilização das funções de barreira da membrana externa bacteriana (Heinrichs et al., 1998; Nikaido, 2003). Durante sua formação, o core de oligossacarídeo é agregado a um lipídio A pré-formado, por transferência sequencial do radical glicosil a partir de precursores de açúcares. Esse processo envolve um complexo de glicosiltransferases associadas à membrana, agindo na face interna da membrana celular interna. Após a síntese do LPS, o MsbA, um transportador do tipo ABC, é responsável por lançar o lipídio A através da membrana (Heinrichs et al., 1998; Nikaido, 2003).

A porção do antígeno-O é a mais externa da molécula de LPS e, dessa forma, define as propriedades da superfície celular em espécies que não produzem cápsula. Essa porção do LPS é importante para fugir do ataque do sistema imunológico do hospedeiro. Para isso, essa porção é menos conservada do que o lipídio A e o core de oligossacarídeo. Microrganismos produtores de cápsula podem não possuir o core de oligossacarídeo em seu LPS, ou esse não estar aparente na superfície celular (Nikaido, 2003).

Estudos em Salmonella enterica foram os primeiros a demonstrar a associação entre alterações no LPS bacteriano e diminuição da sensibilidade às polimixinas. A principal alteração encontrada foi uma adição de 4-amino-arabinose na porção do lipídio A do LPS (Castelli et al., 2000; Navarre et al., 2005). Logo após os estudos com S.

enterica, essas alterações de LPS também foram descritas em outras espécies, inclusive

entre microrganismos não fermentadores (Gunn et al., 1998; Moskowitz et al., 2004; Winfield et al., 2005). Em geral, alterações no LPS bacteriano são descritas como

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responsáveis por alterações na carga de superfície da célula bacteriana e redução na afinidade do antimicrobiano pela parede celular.

A regulação gênica do desenvolvimento de resistência às polimixinas, por meio de alterações no LPS conhecida até o momento, é realizada pelos sistemas de dois componentes (“Two Component Systems”). Esses sistemas são ativados por fatores ambientais, como, presença de ferro, concentrações elevadas de cálcio ou baixas de magnésio, ou ainda, alterações do pH no meio. A presença de polimixinas no meio também desencadeia a ativação desses sistemas (Groisman et al., 1997, Moskowitz et

al., 2012).

Esses sistemas de dois componentes são sistemas globais de regulação gênica, utilizados por diversas espécies bacterianas para regulação da expressão de diferentes fatores de resistência e também de virulência. Eles são constituídos por uma proteína sensor de histidina quinase que percebe estímulos ambientais, sofrendo uma reação de autofosforilação, ativando uma segunda proteína citoplasmática, por uma reação de transfosforilação. A segunda proteína, então, promove a ativação ou a repressão dos genes alvo, desencadeando a resistência às polimixinas (Gooderhan e Hancock, 2009).

Estudos com isolados de K. pneumoniae mostraram a participação dos sistema PhoPQ e PmrAB em diferentes condições ambientais para o desenvolvimento de resistência às polimixinas (Mitrophanov et al., 2008, Mitrophanov e Groisman, 2008). Mitrophanov et al. (2008) observaram que em baixas concentrações de magnésio, o sistema PhoPQ é ativado promovendo a expressão do gene pmrD. Tanto a expressão de

pmrD, quando a presença de ferro estimulam a ativação do sensor quinase pmrB, que

promove a ativação de PmrA, que por sua vez, leva a modificações no LPS bacteriano em K. pneumoniae e à resistência às polimixinas. O mesmo grupo de pesquisa, em estudos anteriores avaliando outras enterobactérias como S. enterica e E. coli, mostraram a participação desses dois sistemas. No entanto, nessas duas espécies, tanto

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o sistema PhoPQ quanto o sistema PmrAB ativa Kato et al., 2003; Kato et al.,

Figura 4. Esquema da regulação do desenvolvimento de resistência às polim

isolados de Enterobactérias controlado por sistemas de dois componentes. regulatório em S. enterica.

2008).

A resistência às polimixinas em isolados de rede de sistemas de dois componentes.

sistemas com resistência às polimixinas

mais recentemente, o sistema ParR/S (Barrow e Kwon, 2009; Fernández Miller et al., 2011; Moskowitz

mutações no gene pmrB, associado à expressão dependente de

importantes mecanismos de regulação de resistência às polimixinas (Barrow e Kwon, 2009; Moskowitz et al., 2012). O sistema PhoP

A do LPS de bactérias Gram

do gene phoQ e contribuem para o desenvolvimento de altos níveis de resistência às polimixinas (Barrow e Kwon, 2009; Miller

PhoPQ, promovem modificações na expressão do operon

adição de 4-amino-arabinose no lipídio A, que leva à alteração no fenótipo de resistência

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o sistema PhoPQ quanto o sistema PmrAB ativaram diretamente o gene

et al., 2007).

Esquema da regulação do desenvolvimento de resistência às polim isolados de Enterobactérias controlado por sistemas de dois componentes.

S. enterica. B. Sistema regulatório em K. pneumoniae (Mitrophanov

A resistência às polimixinas em isolados de P. aeruginosa envolve rede de sistemas de dois componentes. Até este momento, o envolvimento de sistemas com resistência às polimixinas foram descritos, o sistema

mais recentemente, o sistema ParR/S (Barrow e Kwon, 2009; Fernández ., 2011; Moskowitz et al., 2012). Alterações no sistema PmrA

, associado à expressão dependente de pmrA

importantes mecanismos de regulação de resistência às polimixinas (Barrow e Kwon, ., 2012). O sistema PhoPQ está envolvido na modificação do lip A do LPS de bactérias Gram negativas, devido à mutações que levam a perda de função

e contribuem para o desenvolvimento de altos níveis de resistência às limixinas (Barrow e Kwon, 2009; Miller et al., 2011). Ambos os sistemas, PmrAB e Q, promovem modificações na expressão do operon arnBCADTEF responsável pela arabinose no lipídio A, que leva à alteração no fenótipo de resistência

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m diretamente o gene pmrD (Figura 4,

Esquema da regulação do desenvolvimento de resistência às polimixinas por isolados de Enterobactérias controlado por sistemas de dois componentes. A. Sistema (Mitrophanov et al.,

envolve uma complexa Até este momento, o envolvimento de três destes , o sistema PmrAB, PhoPQ e, mais recentemente, o sistema ParR/S (Barrow e Kwon, 2009; Fernández et al., 2010; ções no sistema PmrAB, por meio de

pmrA, representam

importantes mecanismos de regulação de resistência às polimixinas (Barrow e Kwon, Q está envolvido na modificação do lipídio negativas, devido à mutações que levam a perda de função e contribuem para o desenvolvimento de altos níveis de resistência às os sistemas, PmrAB e BCADTEF responsável pela arabinose no lipídio A, que leva à alteração no fenótipo de resistência

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às polimixinas. O sistema de dois componentes ParRS foi o último descrito até o momento em isolados de P. aeruginosa com resistência adaptativa às polimixinas. Esse sistema foi relacionado a mutações no operon arnBCADTEF na presença de concentrações subinibitórias de polimixina, que levaram à modificações no LPS e conseqüente resistência à mesma (Fernández et al., 2010).

Em A. baumannii, somente o operon pmrCAB foi descrito, até o momento, como relacionado à resistência às polimixinas. Seus genes compõem um sistema de dois componentes, onde o pmrB é o sensor de histidina quinase e o pmrA é a proteína reguladora da resposta. Esse sistema controla a expressão do gene pmrC o qual é responsável pela adição de fosfoetanolamina ao lipídio A do LPS da parede celular bacteriana levando à resistência bacteriana (Figura 5). Mutações nos genes pmrA ou

pmrB também promovem diminuição da sensibilidade às polimixinas (Adams et al., 2009;

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Figura 5: Desenho esquemático do sistema de dois componentes que regula o

desenvolvimento de resistência à polimixinas em isolados de PmrCAB (B). Adaptado de Mitrophanov

Em 2010, Moffat et al

A. baumannii com resistência

gene que codifica o LPS, bacteriana. Moffat et al. (2010)

uma parede celular na ausência de LPS para sobreviver às pressões externas e internas. Esses autores afirmaram que a perda do LPS promoveu

parede celular bacteriana e, consequentemente levou a mudanç sensibilidade dos isolados de

perfil de sensibilidade com reversão da resistência aos antimicrobianos, incluindo aqueles

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Desenho esquemático do sistema de dois componentes que regula o desenvolvimento de resistência à polimixinas em isolados de A. baumannii

Adaptado de Mitrophanov et al., 2008.

et al. relataram a perda total do LPS bacteriano em isolados de

com resistência in vitro à colistina. Esses autores observaram

gene que codifica o LPS, lpxA, que levou a perda total do LPS da parede celular (2010) ainda sugerem que esses isolados conseguiram elaborar uma parede celular na ausência de LPS para sobreviver às pressões externas e internas.

m que a perda do LPS promoveu a diminuição da integridade da parede celular bacteriana e, consequentemente levou a mudanç

sensibilidade dos isolados de A. baumannii. Alguns estudos descrevem a mudança do perfil de sensibilidade com reversão da resistência aos antimicrobianos, incluindo aqueles

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Desenho esquemático do sistema de dois componentes que regula o

A. baumannii (A). Operon

bacteriano em isolados de à colistina. Esses autores observaram a mutação no , que levou a perda total do LPS da parede celular ados conseguiram elaborar uma parede celular na ausência de LPS para sobreviver às pressões externas e internas. a diminuição da integridade da parede celular bacteriana e, consequentemente levou a mudanças no perfil de . Alguns estudos descrevem a mudança do perfil de sensibilidade com reversão da resistência aos antimicrobianos, incluindo aqueles

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para os quais os isolados de Acinetobacter spp. são intrinsecamente resistentes (Gordon

et al., 2010; Cai et al., 2012). Alguns autores sugerem, tanto em estudos in vivo quanto in vitro, o uso da associação sinérgica de polimixinas a outros antimicrobianos como

carbapenens, tigeciclina, vancomicina, rifampicina, ampicilina/sulbactam ou amicacina, para tratamento de infecções graves causadas por A. baumannii (Fulnecky et al., 2005; Biancofiore et al., 2007; Pantopoulou et al., 2007; Bassetti et al., 2008; Song et al., 2008; Principe et al., 2009; Candel et al., 2010; Pankuch et al., 2010; Rodriguez et al., 2010; Hornsey et al., 2011; Santimaleeworagun et al., 2011; Sheng et al., 2011; Shields et al., 2011; Peck et al., 2012).

Além de alterações no LPS bacteriano, a produção de cápsula polissacarídica já foi relacionada com a diminuição da sensibilidade às polimixinas em isolados de K.

pneumoniae (Llobet et al., 2008; Cheng et al., 2010). Cheng et al. (2010) observaram que

amostras mutantes para o gene ugd, responsável pela biossíntese de cápsula apresentavam maior sensibilidade às polimixinas em relação à cepa selvagem, o que demonstra que, nessa espécie, a produção de cápsula também está envolvida com resistência às polimixinas.

A membrana externa da parede celular de bactérias Gram negativas permite a passagem de moléculas de nutrientes pequenas e lipofílicas. No entanto, sua natureza hidrofóbica dificulta a entrada de solutos hidrofílicos por ela, como a maioria dos nutrientes celulares. Sendo assim, a parede celular bacteriana possui canais formados por proteínas que permitem a entrada dessas moléculas e a saída de moléculas tóxicas para a célula. Essas proteínas são denominadas porinas e servem de porta de entrada para os antimicrobianos hidrofílicos na célula bacteriana. Dessa forma, a perda ou a diminuição na expressão de porinas contribuem para a resistência. A regulação da expressão de porinas em resposta à presença de antimicrobianos é uma estratégia de sobrevivência desenvolvida por bactérias de diferentes espécies (Nikaido, 2003). Um estudo conduzido por Vila e colaboradores (2007) observou que a redução na expressão

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da porina OmpW (21 kDa) foi observada em isolados mutantes resistentes à colistina de

A. baumannii selecionados in vitro, demonstrando um possível papel dessa porina na

resistência a essa classe de antibióticos (Vila et al., 2007; Lee et al., 2011).

Em 2006, Li et al. (2006b) descreveram o aparecimento de heterorresistência à colistina em isolados de A. baumannii. Heterorresistência é denominada quando é detectado o surgimento de uma subpopulação resistente em uma população de isolados sensíveis à colistina. Após esse estudo, outros relatos de heterorresistência à colistina começaram a ser publicados em todo o mundo (Ko et al., 2007; Yau et al., 2009; Rodriguez et al., 2009; Chang et al., 2012). Entretanto, o conceito de heterorresistência ainda não é concenso entre pesquisadores. Ainda não se sabe se a base para essa resistência é a presença de uma população de indivíduos geneticamente distintos ou se a variação no sistema regulatório entre indivíduos idênticos pode ser suficiente para a expressão de resistência às polimixinas (Adams et al., 2009). Segundo Cai et al. (2012), a prévia exposição à colistina contribui para o desenvolvimento de heterorresistência, selecionando isolados com CIMs mais elevadas, o que pode levar a falha terapêutica. O uso inapropriado do antimicrobiano é um fator de risco tanto para o surgimento de heterorresistência quanto para o aparecimento dos fenótipos de indução de resistência nos isolados clínicos. Hawley et al. (2008) observaram em seu estudo que, dos pacientes com infecções por A. baumannii que estavam recebendo polimixina em seu tratamento, eram isoladas cepas com CIMs para polimixinas extremamente elevadas, acima dos pontos de corte para mudança de categoria de sensibilidade. Esses autores ressaltam a importância em monitorar a emergência de resistência durante o uso prolongado de polimixinas para evitar falha terapêutica em tratamento por infecções causadas por A.

baumannii multirresistentes. Lopez-Rojaz et al. (2011) sugerem que as taxas de

resistência às polimixinas ainda são baixas devido à um custo energético sofrido pelo isolado bacteriano para o desenvolvimento do fenótipo de resistência, reduzindo seu fitness. Entretanto, Rolain et al. (2011) afirmam que essas taxas de resistência

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aumentarão assim que o uso da droga se tornar mais comum, levando ao desenvolvimento de resistência por adaptação à pressão seletiva exercida pela droga. Al-Sweih et al. (2011) prevê grandes problemas clínicos assim que a atividade das polimixinas for reduzida e não existirem outras opções terapêuticas disponíveis para o tratamento de infecções por bacilos Gram negativos multirresistentes.

Objetivos

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3. OBJETIVOS

3. OBJETIVOS

3. OBJETIVOS

3. OBJETIVOS

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