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Medidas não farmacológicas e farmacoterapia

1. Diabetes Mellitus Tipo 2 Objetivos

1.4. Medidas não farmacológicas e farmacoterapia

O primeiro passo para o tratamento da DM2 passa pela educação do doente em relação à doença. Esta educação compreende uma modificação do estilo de vida, nomeadamente quanto ao tipo de dieta e adesão a medidas que visam a prática de exercício físico, ambos personalizados para o doente em causa [28].

A redução do peso alcançada apenas pela dieta ou com intervenção médica ou cirúrgica contribui para melhoria do controlo glicémico e de outros fatores de risco cardiovasculares. Uma modesta perda de peso (5-10%) contribui de um modo significativo para o controlo glicémico. Recomenda-se o estabelecimento de um objetivo na redução de peso ou, caso não seja possível, pelo menos na sua manutenção. Para

cumprir com este objetivo o doente diabético deve optar por uma dieta equilibrada e variada, hipocalórica, devendo ingerir alimentos ricos em fibra (vegetais, frutas, cereais integrais e legumes), alimentos pobres em gorduras saturadas, produtos lácteos com baixo teor em gordura, carnes brancas e peixe fresco [28].

Está provado que a atividade física realizada regularmente contribui para um melhor controlo da glicemia, reduz o risco cardiovascular, contribui para a perda de peso e melhora o bem-estar geral do doente [29]. A atividade física recomendada é específica de cada doente, no entanto é recomendado um mínimo de 150 minutos/semana de atividade física moderada, incluindo treino aeróbico, de resistência e flexibilidade, divididos por 3 dias não consecutivos da semana [28, 29]. Em indivíduos idosos ou com dificuldades de mobilidade, qualquer aumento do nível de atividade física é vantajoso [28].

Para alguns doentes é possível começar o tratamento da DM2 por mudanças no estilo de vida, antes de optar pela farmacoterapia [28]. Independentemente do tratamento escolhido, a evolução do doente deve ser acompanhada da determinação, não só da glicemia, mas também da determinação da hemoglobina glicada (HbA1c). Este

parâmetro permite avaliar o grau de controlo glicémico nos últimos 3 meses. [28,29] A determinação da HbA1c deve ser realizada, pelo menos, semestralmente em

todas as pessoas com diabetes. No entanto, deve ser avaliada mais frequentemente no caso de alteração de tratamento (intervalo mínimo de 3 meses) ou em pacientes que não alcançaram os objetivos terapêuticos previstos [30]. Valores aceitáveis de HbA1c

devem ser inferiores a 6,5%, no entanto, o valor a atingir deve ser individualizado de acordo com a idade, a duração da DM2 e o tipo de complicações existentes [26].

A farmacoterapia deve ter em conta três fatores essenciais: segurança, eficácia e relação custo/benefício. Deve ter em conta também potenciais efeitos adversos, eventos hipoglicémicos, alterações no peso corporal, comorbilidades e ainda a preferência do paciente [29, 31].

Na maioria dos doentes, deve iniciar-se a terapêutica com alterações do estilo de vida, já que, como foi referido acima, cerca de 90% dos doentes são obesos, e a metformina em monoterapia, salvo casos de intolerância [32]. Na tabela seguinte encontram-se representadas as diversas classes de fármacos utilizados no tratamento/controlo da DM2 (Tabela 2).

Tabela 2: Classes de fármacos disponíveis para o tratamento/controlo da DM2.

Classe de fármacos Nomes genéricos

Biguanidas Metformina Sulfanilureias Glibenclamida Glipizida Gliclazida Glimepirida Glinidas Nateglinida Repaglinida Glitazonas Pioglitazona Rosiglitazona

Inibidores da α-Glucosidase Acarbose

Miglitol Voglibose Inibidores DPP-4 Sitagliptina Vildagliptina Saxagliptina Linagliptina Alogliptina Agonistas GLP-1 Exenatide Liraglutide Insulinas Humana NPH Humana Regular Lispro Aspártico Glulisina Glargina Detemir Pré-misturas

Legenda: Inibidores DPP-4 – inibidores da dipeptidil peptidase 4; Agonistas GLP-1 - Agonista do receptor do glucagon-

like peptide-1.Tabela adaptada de [33].

É pertinente iniciar a farmacoterapia pelas biguanidas, classe na qual se encontra o fármaco de primeira linha de tratamento desta doença, a metformina. Este fármaco inibe a gluconeogénese hepática através da ativação da AMP cínase, com consequente diminuição da produção hepática de glucose [28]. A ativação da AMP cinase confere também sensibilidade tecidual à insulina (combate a resistência à insulina), principalmente através da modulação do metabolismo dos lípidos, pelo que se verifica um aumento da captação de insulina por parte dos tecidos, ou seja, a metformina facilita a ação da insulina circulante [34]. Atua também pela inibição do complexo 1 da cadeia respiratória mitocondrial, fenómeno que leva ao aumento do metabolismo anaeróbio de glucose e produção de ácido láctico [35].

Tem como vantagens, a vasta experiência de utilização, a elevada eficácia, a não ocorrência de alterações no peso corporal nem de episódios de hipoglicemia. Como a maioria dos fármacos ADOs, a metformina apresenta alguns efeitos indesejáveis, sendo os principais os efeitos gastrointestinais nomeadamente a diarreia, no entanto, este efeito secundário é dose-dependente e costuma ser transitório [28]. A metformina sofre eliminação renal e a acidose lática constitui uma rara complicação da utilização deste fármaco [36]. Assim, a sua utilização deve ser evitada em casos de insuficiência renal [28, 36]. Os pacientes idosos podem apresentar uma função renal diminuída, pelo que antes da utilização da metformina nestes pacientes, a função renal, nomeadamente a taxa de filtração glomerular, deve ser verificada [36].

Dentro da classe das glitazonas, entre as quais se salientam a pioglitazona e a rosiglitazona, sublinha-se que ativam o fator de transcrição nuclear PPAR-Ƴ, no tecido adiposo, fígado e músculo-esquelético, com consequente aumento de sensibilidade à insulina. Para ambos os fármacos não se verificam episódios de hipoglicemia; no entanto, podem levar a aumento de peso, o que não é benéfico no caso do doente diabético obeso. Outros efeitos adversos a realçar são a ocorrência de edema, insuficiência cardíaca e fraturas ósseas [28].

As sulfonilureias e as glinidas representam duas classes de fármacos com uma característica comum, são secretagogos, embora por diferentes mecanismos de ação. As sulfonilureias promovem o bloqueio dos canais de potássio dependentes de ATP nas membranas plasmáticas das células β, com consequente aumento na libertação de insulina. Apresentam como vantagens principais a vasta experiência clínica na respetiva utilização e o facto de diminuírem o risco microvascular na DM2. Como principais efeitos adversos sublinha-se a hipoglicemia e o aumento de peso [28].

As glinidas atuam de forma semelhante às sulfonilureias no bloqueio dos canais de potássio dependentes de ATP, mas num receptor diferente. São vantajosas pela libertação pós-prandial de insulina pancreática que provocam, permitindo um melhor controlo da hiperglicemia pós-prandial, e ainda pela flexibilidade de dosagem. Tal como as sulfonilureias, podem condicionar o aparecimento de episódios de hipoglicemia e induzirem aumento do peso corporal [28].

Em relação aos inibidores da α-glucosidase, como por exemplo a acarbose, estes atuam inibindo a α-glucosidase intestinal. Esta inibição tem como efeito primário o atraso da absorção/digestão dos hidratos de carbono, com consequente redução dos picos glicémicos pós-prandiais. A acarbose não contribui para episódios de hipoglicemia, sendo que é principalmente responsável pela redução da hiperglicemia pós-prandial. A toma deste fármaco é acompanhada de efeitos secundários

gastrointestinais (flatulência, diarreia) e revela uma modesta eficácia na redução dos níveis de HbA1c [28].

Os inibidoresda dipeptidil peptidase 4 (iDPP-4) atuam, como o próprio nome indica, pela inibição da atividade da dipeptidil peptidase 4, esta última responsável pela degradação do peptídeo intestinal GLP-1. Como resultado, existe um aumento de secreção de insulina e uma diminuição da secreção de glucagon. São fármacos no geral bem tolerados, com baixa incidência de hipoglicemia [28].

Os agonistas dos recetores da GLP-1 (agonista do receptor do glucagon-like peptide-1), exenatido e liraglutido, ativam os recetores do GLP-1 aumentando a secreção de insulina glucose-dependente, causam diminuição da secreção glucose- dependente de glucagon, atrasam o esvaziamento gástrico e aumentam a saciedade. Têm como principais vantagens a redução do peso corporal e não causarem episódios de hipoglicemia. No entanto, podem provocar distúrbios gastrointestinais. O facto da sua administração se fazer por forma injetável, requer treino específico [28].

A terapêutica de reposição com insulina também pode ser utilizada nos pacientes com DM2, normalmente em associação com outros fármacos.

Os diferentes tipos de insulina diferem essencialmente na sua farmacocinética, nomeadamente início de ação, duração de ação e tempo para atingir a concentração máxima. De acordo com estas características é possível estabelecer a seguinte classificação das insulinas:

 ação ultra-rápida ou ultra-curta (lispro, aspartato e glulisina);  ação rápida ou de curta duração (insulina solúvel ou regular);

 ação intermédia (insulina com protamina neutra de Hagedorn (NPH) ou insulina isofânica, insulina com protoamina);

 ação lenta ou de longa duração de ação (insulina glargina e a insulina detemir).

As insulinas têm como vantagem a sua vasta utilização e grande eficácia, e ainda a diminuição do risco cardiovascular. Entre os efeitos adversos mais comuns observa- se a hipoglicemia, aumento do peso corporal e a via de administração injetável que requer treino para o efeito [28].

A DM2 é uma doença progressiva (com progressiva disfunção das células β), facto que leva a que muitos pacientes venham a requerer um tratamento com insulina exógena, com o objetivo de manter o controlo glicémico. Nestes casos, a insulinoterapia é iniciada com insulina basal, ou seja, insulina de longa duração (glargina ou detemir) ou insulina de ação intermédia (insulina NPH) [28,37].

No caso de os pacientes apresentarem uma diminuição progressiva na capacidade de secreção de insulina haverá necessidade de recorrer a terapia com

insulina prandial, através da utilização de insulinas de curta duração (lispro, aspártico ou glulisina) [28].

O programa terapêutico com recurso a insulina deve ser específico de cada doente, fazendo corresponder os níveis de insulina a administrar com necessidade de insulina tendo em consideração o estilo de vida (dieta e exercício) [28]. No entanto, um doente que apresente sintomas hiperglicémicos significativos e/ou se os níveis de HbA1c

estiverem entre 10 e 12%, a insulinoterapia deve ser considerada logo no início do tratamento. A insulinoterapia é recomendada em pacientes sintomáticos com valores de HbA1c acima de 9% [38].

A terapêutica da DM2 deve ser individualizada, no entanto, salvo contraindicações, a metformina é o fármaco de primeira linha no tratamento da DM2, associada a alterações do estilo de vida [29, 32]. A eficácia da metformina diminui com a progressão da doença, havendo necessidade de optar por associações de ADOs com distintos mecanismos de ação. Como referido anteriormente, existe uma gama de fármacos disponíveis para utilização como segunda linha de tratamento em associação com a metformina mas não existe uniformidade no esquema preferido e o tempo de início [32]. A Tabela 3 indica os diversos esquemas terapêuticos que podem ser utilizados ao longo da progressão da doença.

No caso de monoterapia com metformina, se após três meses não se verificar benefício no alcance do objetivo de reduzir ou pelo menos manter o valor de HbA1c, deve

associar-se um segundo fármaco ADO ou insulina. A escolha deste fármaco deve ser realizada de acordo com a história clínica do paciente, os efeitos adversos dos fármacos tendo em conta a reação do paciente, a eficácia e o custo do fármaco [28].

No caso de ser necessário avançar para uma terapia tripla, é importante associar três fármacos com mecanismos de ação que se complementem. Deve ainda ter-se em consideração que a associação de mais um fármaco aumenta a possibilidade de potenciais efeitos adversos, interações entre fármacos, aumento dos custos de tratamento e, não menos importante, um impacto negativo na adesão do doente ao novo esquema terapêutico [28].

No caso de um regime de terapia tripla se mostrar ineficaz deve optar-se por um esquema que inclua a insulinoterapia em associação com um ou dois ADOs. Esta opção terapêutica com injetáveis, apesar de ser mais dificilmente aceite por parte do doente, deve ser encorajada se for eficaz [28].

Tabela 3: Regimes terapêuticos para o tratamento da DM2.

Alterações do estilo de vida: alimentação saudável, controlo do peso corporal, prática de exercício físico

Monoterapia

inicial Metformina

Eficácia Alta

Hipoglicemia Baixo risco

Peso Neutro/Perda

Efeitos adversos GI/Acidose Láctica

Custo Baixo

Caso seja necessário atingir um valor alvo de HbA1c individualizado decorridos três meses, prosseguir para associação de dois fármacos (escolher a melhor opção para o doente)

Associação de dois fármacos

Metformina +

Sulfonilureia Glitazona iDPP-4 Agonista

GLP-1

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