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MEI no Desenvolvimento

Neste passo aplica-se a proposta metodológica sugerida por Diogo Coutinho ao Programa do Microempreendedor Individual como instrumento jurídico. Nessa perspectiva, examinam-se funções e papéis-chave desempenhados pelo direito utilizando as categorias de análise já descritas: direito como objetivo, como ferramenta, como arranjo institucional e como vocalizador de demandas.

A política pública veiculada através da Lei Complementar nº 128/2008 objetiva combater a informalidade, promovendo a inclusão de vários grupos de trabalhadores no sistema de previdência social, além de facilitar-lhes o acesso ao crédito bancário.

Sendo esses os objetivos primeiros, é possível salientar que há, ainda, metas de segundo grau a serem atingidas: resta induvidoso, especialmente quando se verificam as intenções dos próprios microempreendedores, que este caminho possibilita o crescimento da própria empresa, a qual, no cenário otimista, tende a se tornar uma microempresa com a elevação do faturamento.

Segundo dados levantados pelo Sebrae acerca da perspectiva de crescimento334, 77% dos microempreendedores individuais, em 2015, responderam que pretendem, nos próximos anos, faturar mais de 60 mil reais por ano. Este número, em 2013, chegou a 84%, de modo que o recrudescimento da crise econômica pode ser um dos fatores responsáveis pela queda nessa intenção.

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SEBRAE – Serviço brasileiro de apoio às micro e pequenas empresas. Perfil do microempreendedor individual 2015. Brasília: Sebrae, 2015. Disponível em: <http://www.sebrae.com.br/Sebrae/Portal%20Sebrae /Anexos/Perfil %20do%20MEI%202015.pdf>. Acesso em: 20 set 16.

O programa do MEI reveste-se, portanto, de um meio para o indivíduo atingir a cidadania empreendedora335. A lei, neste caso, caracteriza-se como formalizadora da política pública, instrumentalizando e delimitando as suas metas e diretrizes. É o direito utilizado como objetivo de iniciativas de desenvolvimento.

O direito também é empregado como ferramenta para o desenvolvimento. Nesse caso, pode-se apontar a escolha do Simples como sistema tributário adequado aos objetivos da política pública, bem como as facilidades envolvidas no momento do registro da empresa, que de imediato consegue o alvará provisório de funcionamento, por exemplo, como modelos jurídicos de ação coerentes com as finalidades declaradas.

O uso da espécie legislativa denominada lei complementar reforça o caráter de política de estado envolvida na questão, dada a maior dificuldade exigida para aprovação de mudanças: o quórum requerido é de maioria absoluta, ao passo que uma lei ordinária pede apenas maioria simples; além disso, são necessários dois turnos de votação. Ademais, o tema envolve simplificação de obrigações tributárias, as quais devem ser regidas por lei complementar em razão do disposto no art. 146, III, ‘d’, e parágrafo único, da Constituição de 1988336.

Pode-se referir, outrossim, à criação de estruturas administrativas voltadas a permitir o melhor desempenho da política pública, tais como a Rede Nacional para a Simplificação do Registro e da Legalização de Empresas e Negócios – Redesim (estabelecida pela Lei nº 11.598/2007) e o Comitê para Gestão da Rede Nacional para a Simplificação do Registro e da Legalização de Empresas e Negócios – CGSIM (determinado pelo Decreto nº 6.884/2009).

Ainda no aspecto do direito como ferramenta, pode-se citar a existência de condicionantes claramente definidas nas leis para o enquadramento como MEI, as quais servem como instrumentos de indução comportamental e mecanismos de alerta. No caso, para ser MEI, além do teto anual de faturamento no valor de 60 mil reais, há o rol fechado de

335 Idem. 5 anos: microempreendedor individual – MEI: um fenômeno de inclusão produtiva. / SEBRAE. –

Brasília: Sebrae, 2015.

336 Art. 146. Cabe à lei complementar: (...) III - estabelecer normas gerais em matéria de legislação tributária,

especialmente sobre: (...) d) definição de tratamento diferenciado e favorecido para as microempresas e para as empresas de pequeno porte, inclusive regimes especiais ou simplificados no caso do imposto previsto no art. 155, II, das contribuições previstas no art. 195, I e §§ 12 e 13, e da contribuição a que se refere o art. 239. Parágrafo único. A lei complementar de que trata o inciso III, d, também poderá instituir um regime único de arrecadação dos impostos e contribuições da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, observado que: I - será opcional para o contribuinte; II - poderão ser estabelecidas condições de enquadramento diferenciadas por Estado; III - o recolhimento será unificado e centralizado e a distribuição da parcela de recursos pertencentes aos respectivos entes federados será imediata, vedada qualquer retenção ou condicionamento; e IV - a arrecadação, a fiscalização e a cobrança poderão ser compartilhadas pelos entes federados, adotado cadastro nacional único de contribuintes.

atividades permitidas, encontrado no anexo XIII da Resolução nº 94/2001 do Comitê Gestor do Simples Nacional.

Ademais, há também que se manter adimplente com as obrigações tributárias, através do pagamento mensal do DAS. Como se viu, a norma mais recente aplicada ao regime jurídico próprio ao MEI, a Resolução nº 36/2016 do CGSIM, cuida do procedimento de cancelamento da inscrição de microempreendedor individual.

A propósito das articulações institucionais em prol do programa do microempreendedor individual, na ótica do direito como arranjo institucional, pode-se registrar que o CGSIM envolve, na sua composição, os seguintes órgãos e entidades: Ministério da Indústria, Comércio Exterior e Serviços (antigo Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior), Ministério do Planejamento, Desenvolvimento e Gestão, Ministério da Fazenda, Secretaria Especial da Micro e Pequena Empresa da Casa Civil da Presidência da República, Receita Federal do Brasil, Instituto Nacional do Seguro Social - INSS, Associação Nacional de Presidentes de Juntas Comerciais - Anprej, Conselho Nacional de Política Fazendária - Confaz, Associação Brasileira das Secretarias de Finanças das Capitais - Abrasf, além de um representante dos Municípios, a ser indicado pelas entidades de representação nacional dos Municípios brasileiros.

Há ainda a participação, nesse concerto, do Serviço Brasileiro de Apoio à Microempresa e Empresa de Pequeno Porte – Sebrae, da Agência Brasileira de Desenvolvimento Industrial – ABDI e dos diversos bancos públicos e privados.

Considerando que todas essas entidades, de algum modo, contribuem amparadas em normas as mais variadas, para o aperfeiçoamento do programa do MEI, verifica-se presente a função do direito como arranjo institucional.

E por fim, o direito como vocalizador de demandas surge diante da realização de pesquisas pelo Sebrae, o qual se conecta diretamente com microempreendedores individuais, inclusive por meio telefônico, em prol da melhor compreensão do ambiente de trabalho de cada um e do programa como um todo.

Vale dizer que essa configuração possibilita o acompanhamento das dificuldades enfrentadas no cotidiano, permitindo a busca de soluções e propondo alteração de rotas, o que gera cada vez mais melhorias para o MEI.

Um exemplo dessa situação ocorreu com o problema enfrentado por muitos microempreendedores individuais relacionado ao local de trabalho. Isso porque o registro da empresa sempre permitiu a indicação do local de residência como sede da atividade empresarial, seguido do alvará provisório de funcionamento. No entanto, em diversos

municípios brasileiros as normas de uso e ocupação do solo, as quais estão associadas muitas vezes à autorização para emissão de nota fiscal eletrônica, exigem que a atividade se dê em local aberto, isto é, em um ponto comercial distinto do endereço residencial (casa ou apartamento).

Essa dificuldade só foi vencida em 2016, oito anos após a introdução do programa do MEI no ordenamento jurídico, mediante a aprovação da Lei Complementar nº 154, a qual lhe permitiu expressamente utilizar sua residência como sede do estabelecimento, quando não for indispensável a existência de local próprio para o exercício da atividade. A partir de então, as eventuais restrições municipais nesse sentido não devem mais burocratizar o exercício profissional do microempreendedor individual.