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2 O MARCO TEÓRICO

2.1 MEIO AMBIENTE, DESENVOLVIMENTO E POLÍTICAS PARA A

2.1.3 Meio ambiente e desenvolvimento

A chamada revolução ambiental ganhou novo impulso a partir dos anos 1960, emergindo das ciências da vida, e a ecologia se tornou a base cientificista, senão a científica da ideologia verde, que combinava “as contribuições da ecologia com as insatisfações geradas pela deterioração da qualidade de vida [...] e pelo renascimento de um sentimento religioso em relação à natureza, como reação a um mundo que parecia cada vez mais artificial”. (SACHS, 2007, p. 201)

A tese malthusiana do esgotamento dos alimentos provocado pela explosão demográfica ressurge acompanhada da consciência sobre os limites da capacidade da natureza em suportar o modelo de desenvolvimento. Sachs (2007) destaca que a onda de pessimismo surge num momento de otimismo tecnológico, embalado pela competição entre os dois principais sistemas sociopolíticos vigentes (capitalismo moderado e o socialismo real) e pela esperança de modernização dos países recém emancipados. Como explicar esse paradoxo?

Em primeiro lugar, é importante destacar que nos países industrializados o crescimento econômico não era capaz de resolver os problemas relacionados à pobreza, à exclusão social e à segregação geográfica, já que o elevado crescimento do nível de vida material acentuava, cada vez mais, o problema da concentração de renda. O segundo aspecto está relacionado ao abismo que separava os países do Hemisfério Norte (desenvolvidos) e os do Sul (subdesenvolvidos) quando se analisam relações de consumo por habitante entre o Norte e o Sul6. Em outras palavras, a exploração predatória dos recursos naturais empreendida pelos países do Norte desde a Revolução Industrial, limitou a capacidade de carga do meio ambiente que não suportaria a expansão descontrolada desse modo de produção.

Na Conferência das Nações Unidas sobre o Ambiente Humano7, buscaram-se um “meio termo” entre as duas teses vigentes sobre o desenvolvimento – o estritamente

6 Sachs exemplifica as disparidades entre o consumo per capita dos habitantes dos países desenvolvidos em relação aos dos países subdesenvolvidos (ou em desenvolvimento) a partir das seguintes categorias: “cereais (2,9); carne (5,7); leite (8,1); ferro e aço (19,9); produtos químicos (20,3); metais (20,6); automóveis (26,6); hidrocarbonetos (9,8); eletricidade (13,4); e emissões globais de CO2 (8,1).” (SACHS, 2007, p. 203)

7 A Conferência sediada em Estocolmo, na Suécia, em 1972, representou um marco para as discussões em torno das questões relacionadas ao desenvolvimento e meio ambiente. Os adeptos do “crescimento em primeiro lugar” defendiam que o crescimento rápido como solução para todos os problemas: ou ele asseguraria por si mesmo o ajuste automático de todas as outras dimensões do desenvolvimento, graças ao efeito de percolação das novas riquezas – trickle-down (teoria segundo a qual o enriquecimento das elites atinge pouco a pouco todas as camadas sociais, inclusive as mais desfavorecidas, para maior proveito de todos os setores da economia e da sociedade) ou forneceria os meios para se atuar em melhores condições, uma vez que o país interessado tivesse atingido um Produto Nacional Bruto (PNB) mais alto. Os partidários do “crescimento zero” defendiam que o verdadeiro desenvolvimento deveria ser mais qualitativo do que quantitativo; o padrão de crescimento zero deveria ser aplicado tanto para a população (crescimento demográfico) como também para a produção de bens materiais. (SACHS, 2007)

econômico e o incondicionalmente ecológico – que resultou no compromisso, segundo o qual toda estratégia de desenvolvimento precisa assumir, simultaneamente, três princípios: a equidade; a prudência ecológica; e a eficácia econômica. A equidade se refere à necessidade de conformidade entre os objetivos sociais do desenvolvimento e o imperativo ético de solidariedade de todos os povos. A prudência ecológica diz respeito a um postulado ético de solidariedade com as gerações futuras, sem descuidar da melhoria da qualidade de vida do presente. E a eficácia econômica está relacionada ao uso adequado das forças de trabalho e dos recursos materiais levando-se em conta os custos sociais e ecológicos até então considerados como externalidades.

Sachs (2007) advoga que todo projeto de ecodesenvolvimento8 requer soluções adaptadas ao local, à cultura e ao ecossistema em questão, isto é, os problemas do planeta só poderão ser resolvidos por meio de um conjunto de soluções locais coordenadas. As unidades locais devem estar articuladas formando novos arranjos institucionais em níveis locais, regionais, nacionais e internacionais para compartilhamento das experiências e dos recursos comuns e evitar a tendência centralizadora e urbanizadora herdada do passado. Ressalta também a relevância da contribuição dos conhecimentos locais para o êxito dos projetos de ecodesenvolvimento, destacando o pensamento de Amilcar Herrera:

A principal contribuição local consistiria, provavelmente, menos em colaborar para o desenvolvimento de tecnologias concretas e específicas, do que me sugerir novas abordagens para resolver velhos problemas, o que poderia levar a pesquisa científica a seguir novas direções até então negligenciadas. (HERRERA, 1981, apud SACHS, 2007, p. 213)

Uma avaliação mais pessimista sobre os avanços registrados entre a Conferência de Estocolmo e a Conferência sobre o Meio Ambiente e o Desenvolvimento que aconteceu em 1992, no Rio de Janeiro, certamente apontaria poucos avanços. Na realidade, essa avaliação estaria correta se considerasse apenas os aspectos internacionais. Basta dizer que o Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA), criado em Estocolmo, ainda não dispôs de meios para dar conta da magnitude da missão que lhe fora confiada.

No âmbito dos Estados nacionais os avanços foram mais significativos, especialmente devido ao arcabouço jurídico-normativo criado em nível constitucional e infraconstitucional para o enfrentamento dos problemas oriundos dos projetos desenvolvimentistas.

8

Conceito seminal desenvolvido por Ignacy Sachs, enunciado pela primeira vez em 1972, por ocasião da Conferência de Estocolmo. Ecodesenvolvimento designa um novo estilo de desenvolvimento e um novo enfoque (participativo) de planejamento e gestão, norteado por um conjunto interdependente de postulados éticos, a saber: atendimentos de necessidades humanas fundamentais (materiais e intangíveis); promoção da autoconfiança (self-reliance) das populações envolvidas; e cultivo da prudência ecológica. (SACHS, 2007, p. 12)