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Meios lingüísticos de expressão da modalidade deôntica

CAPÍTULO V – A MANIFESTAÇÃO DA MODALIDADE DEÔNTICA EM

5.2. Meios lingüísticos de expressão da modalidade deôntica

Em cada um dos quatro grupos nos quais organizamos os discursos que compõem nosso corpus, assim como na análise dos grupos em sua totalidade, constatamos ser o verbo auxiliar modal o mais recorrente meio lingüístico de expressão da modalidade deôntica. Na seqüência, apresentamos os porcentuais das formas de expressão da modalidade deôntica no corpus em sua totalidade (tabela 01):

Verbo auxiliar modal N % Verbo de significação plena N % Adjetivo em posição predicativa N % Substantivo N % Adjetivo N % 126 67 17 9 31 16 7 4 7 4 Tabela 01 – Formas de expressão da modalidade deôntica no discurso político.

Na tabela 01, temos, em ordem decrescente de produtividade, o verbo auxiliar modal, o adjetivo em posição predicativa, o verbo de significação plena e substantivos e adjetivos compartilhando a posição de menor produtividade.

Na tabela 02, na seqüência, vemos como os meios lingüísticos de expressão da modalidade deôntica se distribuem nos grupos:

Grupos Verbo auxiliar modal N % Verbo de significação plena N % Adjetivo em posição predicativa N % Substantivo N % Adjetivo N % 1 26 62 2 5 8 19 5 12 1 3 2 46 73,4 5 7,9 9 14 1 1,6 2 3,1 3 18 60 6 20 4 13,3 0 0 2 6,7 4 36 68 4 7,3 10 19 1 1,9 2 3,8 Tabela 02 – Formas de expressão da modalidade deôntica em cada grupo de discurso político

Percebemos que, apenas no 3º grupo, identificamos uma maior produtividade do verbo de significação plena (20%) se comparado ao adjetivo em posição predicativa (13, 3%); e a ausência de substantivos como meio de expressão da modalidade deôntica. No entanto, as diferenças quantitativas, no que tange aos meios de expressão, percebidas entre

um grupo e outro, são pequenas, o que nos respalda a asseverar ser o que encontramos na análise do corpus na sua totalidade um reflexo bem próximo do que ocorreu nos grupos individualmente.

No que concerne ao tipo de verbo auxiliar empregado, verificou-se uma maior freqüência do verbo dever (36%) indicativo de obrigação (em afirmativas) e proibição (em negativas), conforme podemos constatar, respectivamente, nos exemplos a seguir:

30) Assim sendo, salvo melhor juízo, duas vertentes de análise devem ser observadas. [M v 1 m I I U 4 Y] Disc.41

31) Não se deve simplesmente bater o pé e dizer que quem é da base do Governo tem de votar de acordo. Não é assim. [e v 3 m I I U 8 Y] Disc.16

Com segunda maior freqüência (24%), é utilizada a expressão ter que/de. Tal expressão também é característica do valor deôntico de obrigação, conforme vemos na ocorrência a seguir:

32) A reforma da nossa Previdência tem que ser feita e vai receber meu total apoio. [e v 1 x I I U 4 Y] Dis.16

O verbo poder, por sua vez, é utilizado em 23% das ocorrências, freqüentemente com valor de uma negação de permissão, isto é, de uma proibição. A ocorrência, abaixo, ilustra o que acabamos de mencionar:

33) Por tudo isso, não podemos votar o texto da reforma da Previdência Social sem antes discuti-lo com profundidade. [e v 3 x I I L 8 Y] Disc.16

O verbo precisar manifesta-se em 17% das ocorrências, indicando uma necessidade deôntica, ou seja, uma obrigação:

34) Quero falar, Sr. Presidente, sobre algumas incongruências que percebo no projeto, e esta Casa precisa se empenhar para aperfeiçoá-lo, para o bem da população brasileira e de suas entidades representativas. [e v 1 x I i U 4 Y] Disc.16

A diferença mais evidente entre as qualificações modais feitas nos discursos em que os oradores demonstram ser favoráveis à proposta e naqueles em que houve manifestação de desfavor ao conteúdo do texto em apreciação está no uso do verbo dever. Observamos que os oradores que se manifestam contrários à proposta fazem mais uso do modal dever (70%) em orações assertivas afirmativas, instaurando obrigações nas quais se incluem, segundo observamos no exemplo (35).

35) Devemos fazer emendas que possibilitem ao Governo brasileiro assegurar uma aposentadoria para quem trabalhou toda sua vida neste País. [bv1mIIU4Z] Disc.8

Por sua vez, os oradores que manifestam um posicionamento favorável à proposta utilizam, mais freqüentemente, o modal dever (66%) também em orações assertivas afirmativas, mas instaurando obrigações das quais se excluem, como podemos ver em (36).

36) Aqueles que radicalizam o discurso contra a reforma da Previdência dos servidores públicos parecem esquecer que a atual conjuntura acaba onerando absurdamente as finanças públicas, e, conseqüentemente deveriam ter eles esse discernimento, finda por impingir à grande maioria da sociedade brasileira, exatamente a que vive nas piores condições, a responsabilidade de garantir e financiar um sistema mal planejado de benefícios previdenciários. [ev1mIIU4Y] Disc.12

Quanto aos oradores que optaram por não adotar uma posição taxativa (contra/ a favor), estes se valeram, mais freqüentemente, de adjetivos em posição predicativa (60%), com destaque para a alta produtividade da expressão é preciso, tal como observamos em (37):

37) É preciso um correto diagnóstico dos problemas, para que se possa avaliar se realmente necessitamos reformar nosso Direito Positivo. A opinião pública vem sendo mobilizada, nos últimos 10 anos, a favor de algumas reformas. [Ma1mIIU4Y] Disc.41

Percebemos que, enquanto os oradores que se manifestaram contrários à realização da proposta, nos moldes emanados do Executivo, transmitiram ao auditório a imagem de disposição no que concerne a empreender tarefas necessárias à realização de alterações no

regime previdenciário benéficas à população; os que manifestaram posicionamento favorável valeram-se, com mais freqüência, da imagem de cumpridores de seus deveres e utilizam o verbo dever na tentativa de mostrar à opinião pública o que compete a outrem realizar, conforme ilustram, respectivamente, os exemplos (35) e (36).

Por sua vez, o uso do verbo dever não tem o mesmo destaque nos discursos nos quais os oradores optaram pela não manifestação de um posicionamento quer absolutamente contrário quer absolutamente favorável. Nestes, adjetivos em posição predicativa são mais recorrentes (é preciso, é importante, é urgente, é necessário). Por meio dessa expressão da modalidade deôntica, os oradores vestiram a máscara da conscienciosidade, ou seja, sem expressarem, diretamente, sobre quem recai a obrigação que estão a instaurar, mostraram-se preocupados com determinadas questões, as quais são por eles defendidas como relevantes à execução de mudanças no regime previdenciário, de fato, benéficas à sociedade. Ao colocar como foco central o que é preciso, urgente, necessário, importante... realizar, e não a quem compete realizar, o discurso perde a força do embate argumentativo entre grupos de posicionamento divergente e ganha um aspecto de “convocação à reflexão”, que constitui, sem dúvida, estratégia retórica de muita valia.

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