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1 REVISÃO DA LITERATURA

3.2 AVALIAÇÃO DA CONSCIÊNCIA FONOLÓGICA

3.2.3 Associações entre a memória de trabalho auditiva, o tempo de letramento

3.2.3.1 Memória de trabalho auditiva

A memória de trabalho auditiva (MTA) foi, primeiramente, analisada no grupo todo (n=11). Os resultados dessa análise aparecem na tabela 12. Devido à grande variabilidade de dados, devem ser considerados os resultados referentes à mediana e aos valores máximo e mínimo.

Tabela 12 – Desempenho da amostra na avaliação da MTA (n=11) Escores Variação

possível Média DP Mediana Mínimo Máximo

MTA (Escore Total) 0-46 28,1 10,9 33,0 9,0 39,0

Nº de seqüências repetidas corretamente 0-14 5,36 3,75 7,00 0,00 10,0 Nº máximo de dissílabas repetidas corretamente em uma seqüência 0-5 2,73 1,19 3,00 1,00 4,00 Nº máximo de trissílabas repetidas corretamente em uma seqüência 0-3 2,36 0,92 3,00 1,00 3,00

MTA: Memória de trabalho auditiva, DP: Desvio Padrão Fonte: O autor (2008)

Pode-se observar, na tabela acima, que o escore total do grupo, referente à mediana, foi de 33 palavras repetidas corretamente durante a avaliação da MTA (apêndice 4). Esse teste, elaborado pela pesquisadora, é composto de 46 palavras apresentadas verbalmente distribuídas em 14 seqüências de vocábulos dissilábicos ou trissilábicos, conforme explicitado na subseção 2.4.5 deste trabalho. Cabe ressaltar que a maioria das palavras de conteúdo do português, principalmente as encontradas em livros infantis, é formada de duas ou três sílabas (PINHEIRO & KEY, 1987 apud CARDOSO-MARTINS, 1995).

O escore total mínimo obtido foi de 9 palavras repetidas corretamente durante toda a avaliação, essa foi a pontuação de somente um dos sujeitos da amostra. O escore total máximo alcançado por outra criança foi de 39 vocábulos repetidos corretamente durante a avaliação da MTA. O escore total do grupo referente ao número de seqüências inteiras repetidas corretamente foi 7 (mediana). Três sujeitos não conseguiram repetir nenhuma seqüência inteira corretamente. Devido a esse fato, o escore mínimo obtido foi zero, enquanto que o escore máximo foi de 10 seqüências repetidas corretamente. Esses dados mostram que, apesar de ser considerado que indivíduos com síndrome de Down apresentam um déficit específico relacionado à memória de trabalho auditiva (CHAPMAN & HESKETH, 2000; CHAPMAN & HESKETH, 2001; BADDELEY & JARROLD, 2007), a capacidade de memorização pode apresentar variabilidade entre esses sujeitos.

As diferenças encontradas na capacidade de memorização auditiva entre as crianças avaliadas nesta pesquisa podem explicar, em parte, a variabilidade dos resultados encontrados na avaliação da consciência fonológica. Deve-se levar em consideração que o instrumento utilizado nesta pesquisa para avaliar as habilidades metafonológicas requer, nas tarefas de identificação, a memorização de seqüências de três palavras dissilábicas ou trissilábicas. No CONFIAS, somente para a apresentação das palavras-alvo utilizam-se figuras.

Com o objetivo de avaliar a interferência da memória de trabalho auditiva na avaliação da consciência fonológica, considerou-se importante verificar a quantidade máxima de palavras dissilábicas e trissilábicas apresentadas verbalmente que os sujeitos da amostra eram capazes de memorizar. Ainda na tabela 12, no que se refere ao número máximo de dissílabos repetidos corretamente em uma seqüência, o valor mínimo obtido foi 1 palavra; o máximo, 4 palavras dissilábicas. A quantidade mínima de palavras trissilábicas repetidas corretamente em uma seqüência foi 1

palavra, o valor máximo foi de 3 vocábulos. Isso significa que, para os sujeitos com capacidade de memorizar até 3 dissílabos ou trissílabos, a interferência da MTA foi menor do que para os sujeitos com capacidade de armazenar menos de 3 palavras.

A tabela 13 apresenta os resultados da comparação entre os sujeitos com diferentes hipóteses de escrita quanto à MTA. Essa análise foi realizada para avaliar a hipótese de que os sujeitos alfabéticos poderiam apresentar MTA mais desenvolvida, levantada a partir da análise dos dados da tabela 8 no item 3.2.1 deste capítulo.

Na avaliação da MTA, a variabilidade entre os dados permaneceu mesmo entre os sujeitos que formavam um grupo em relação à hipótese de escrita. Isso ocorreu, principalmente, no grupo dos sujeitos pré-silábicos. Devido a esse fato, utilizaram-se, para essa análise, os valores da mediana e o número máximo e mínimo de respostas corretas em cada grupo. Através da aplicação do teste de Mann-Whitney, encontrou-se diferença estatisticamente significativa entre o grupo de crianças pré-silábicas e alfabéticas no que se refere ao escore total na avaliação da MTA (p=0,019) e ao número de seqüências repetidas corretamente (p=0,010). Os resultados apresentados mostram que os sujeitos com hipótese de escrita alfabética apresentaram desempenho significativamente superior em medidas de MTA. Esse fato evidencia que as crianças alfabéticas com síndrome de Down deste estudo têm uma maior capacidade de MTA, o que corrobora a hipótese levantada anteriormente.

Tabela 13 – Comparação do desempenho de sujeitos com diferentes hipóteses de

escrita na avaliação da MTA (n=10)

Hipóteses de escrita (n=10) Escores Pré-silábica (n=6) Alfabética (n=4) p* MTA – Mediana (Mín-Máx)

MTA (Escore Total) 20 (9-35) 36 (33-39) 0,019

Nº máximo de dissílabas repetidas corretamente em uma seqüência

2 (1-3) 3,5 (3-4) 0,067

Nº máximo de trissílabas repetidas corretamente em uma seqüência

1,5 (1-3) 3 (3-3) 0,114

Nº de seqüências repetidas corretamente 2,5 (0-7) 8,5 (8-10) 0,010 MTA: Memória de trabalho auditiva, Mín: Mínimo, Máx: Máximo,

* teste de Mann-Whitney Fonte: O autor (2008)

O número máximo de dissílabos e trissílabos não se mostrou estatisticamente diferente entre os grupos de sujeitos com hipóteses de escrita pré- silábica e alfabética. Apesar de a mediana ter ficado abaixo de 3 para as crianças pré-silábicas, tanto indivíduos do grupo pré-silábico quanto do alfabético foram capazes de memorizar até 3 palavras dissilábicas ou trissilábicas.

O fato de as crianças com síndrome de Down do grupo com hipótese de escrita alfabética apresentarem um desempenho significativamente superior em medidas de MTA pode ser interpretado de duas maneiras diferentes. Primeira, a MTA mais desenvolvida em algumas crianças pode ter facilitado a alfabetização. Segunda, a alfabetização pode ter aprimorado as habilidades de memória de trabalho auditiva. Para a confirmação dessas hipóteses são necessários outros estudos, preferencialmente longitudinais, envolvendo crianças com síndrome de Down em processo de alfabetização.

Para verificar a correlação existente entre as medidas de MTA e os escores de consciência fonológica foi utilizado o teste de correlação de Spearman (rs). Essa análise foi realizada no grupo como um todo (n=11). Encontrou-se correlação positiva estatisticamente significativa entre o escore total da consciência fonológica e o escore total na MTA dos sujeitos com SD (rs=0,823, p<0,001). O escore total da MTA também apresentou correlação positiva estatisticamente significativa com os escores dos participantes no NS (rs=0,831, p=0,002) e no NF (rs=0,685, p=0,020). O número máximo de seqüências inteiras repetidas corretamente também apresentou correlação positiva estatisticamente significativa com os dois níveis da avaliação da consciência fonológica (rs=0,895, p<0,001 para o NS; rs=0,794, p<0,001 para o NF) e com o escore total (rs=0,889, p<0,001). Os números máximos de dissílabos e trissílabos repetidos corretamente em uma seqüência apresentaram correlação positiva estatisticamente significativa somente com o nível da sílaba (rs=0,668, p=0,025 para os dissílabos; rs=0,710, p=0,014 para os trissílabos ) e com o escore total (rs=0,663, p=0,026 para os dissílabos; rs=0,662, p=0,026 para os trissílabos). Esses dados podem ser observados na tabela 14 a seguir.

Tabela 14 – Associações, através do coeficiente de correlação de Spearman (rs), entre

MTA, tempo de letramento escolar e idade cronológica com os escores de consciência fonológica (n=11)

Consciência Fonológica Nível da

sílaba Nível do fonema Escore Total Variáveis

rs p rs p rs p

MTA (Escore Total) 0,831 0,002 0,685 0,020 0,823 <0,001

Nº de seqüências repetidas corretamente

0,895 <0,001 0,794 <0,001 0,889 <0,001

Nº máximo de dissílabas repetidas corretamente em uma seqüência

0,668 0,025 0,587 0,058 0,663 0,026

Nº máximo de trissílabas repetidas corretamente em uma seqüência

0,710 0,014 0,460 0,154 0,662 0,026

Tempo de Letramento 0,550 0,080 0,598 0,052 0,509 0,110

Idade Cronológica 0,543 0,085 0,659 0,027 0,514 0,106

MTA: Memória de trabalho auditiva Fonte: O autor (2008)

Resumidamente, pode ser observado na tabela 14 que as correlações mais fortes entre a MTA e a consciência fonológica ocorreram entre os escores totais das duas avaliações e entre o número de seqüências inteiras repetidas corretamente na avaliação da MTA e os escores da consciência fonológica (NS, NF e escore total).