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1. INTRODUÇÃO

1.4 Pós-menopausa e Hipertensão arterial

O climatério é a fase da vida da mulher em que ocorre a transição do período reprodutivo, ou fértil, para o não reprodutivo, devido à diminuição dos hormônios sexuais produzidos pelos ovários. Já a menopausa, é basicamente a soma de duas palavras gregas, mês e fim, sendo definido como o último ciclo menstrual da mulher assim como a menarca é caracterizado como o primeiro (Trench & Santos, 2005). Nesta fase os ovários, naturalmente deixam de funcionar, e a produção de estrogênio pelas células foliculares dos ovários diminui, e consequentemente se produzem no organismo, diversas mudanças fisiológicas, algumas resultantes da cessação da função ovariana (OMS, 1996). Entretanto, a menopausa pode ser ainda resultante de ovariectomia bilateral cirúrgica, realizada na mulher ainda em idade fértil (Bassam, 1999).

A OMS considera que uma mulher encontra-se na pós-menopausa após ausência de menstruação durante 12 meses consecutivos, o que normalmente ocorre entre 45 e 50 anos (OMS, 1996). Atualmente, a maioria dos países ocidentais experimentou uma melhoria na atenção à saúde o que se traduz num aumento da expectativa de vida, com isso, espera-se que a mulher passe mais de um terço de sua vida na fase pós-menopausa (Botrel et al., 2000).

Mesmo com a melhora da atenção a saúde, a literatura mostra que as doenças cardiovasculares são uma das principais causas de óbito na sociedade moderna (Botrel

et al., 2000). Essa incidência de doenças cardiovasculares ocorre temporalmente de maneira diferente entre os sexos. A morbiletalidade no sexo feminino apresenta uma

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maior incidência após a menopausa, e principalmente em mulheres jovens com perda da função gonadal (Kannel et al., 1976; Reckelhoff, 2001).

Ao longo dos anos, muitos estudos têm mostrado diferenças sexo especificas na incidência de doenças cardiovasculares, e os estrógenos têm sido considerados os principais colaboradores para essa dissimilaridade (Fismam et al., 2002). Essas contendas são observáveis ainda no período pós-púbere persistindo durante adolescência e fase adulta (Himmelmann et al., 1994; Yong et al., 1993). Embora seja um ponto de muita discussão e controvérsia, muitos estudos têm demonstrado que em todos os grupos étnicos, homens apresentam um maior risco de doença renal e cardiovascular quando comparados com mulheres de mesma idade na pré-menopausa (Reckelhoff, 2001). Além disso, trabalhos utilizando-se da técnica de registro ambulatorial da pressão arterial por 24 horas têm mostrado que a PA é mais elevada nos indivíduos do sexo masculino do que feminino em idade pareada. Contudo, após a menopausa essa diferença é revertida, com a prevalência da elevação da PA sendo maior na mulher do que no homem de mesma idade (Wiinlberg et al., 1995; Khoury et

al, 1992; Burt et al., 1995). Além disso, grandes estudos populacionais, como o estudo Framinghan mostram que o risco de infarto agudo do miocárdio é 2,6 vezes mais alto em mulheres pós-menopáusicas do que pré-menopáusicas (Kannel et al., 1976).

As razões para essas diferenças sexuais da PA ainda não estão muito bem esclarecidas. Muitos trabalhos têm sugerido, mas não provado, que os estrógenos são responsáveis pela menor PA em mulheres jovens. Dados sobre a flutuação da PA durante as fases do ciclo menstrual podem defender essa hipótese. Chapman et al. (1997), em um estudo de mudanças hemodinâmicas associadas com o ciclo menstrual mostrou uma menor PA durante a fase lútea, que é a fase de concentrações mais elevada de estradiol, do que durante a fase folicular. Entretanto, observações opostas também já foram relatadas, com uma elevação da PA durante a fase lútea (Dunne et al., 1991). Durante o período gestacional tanto estradiol quanto progesterona encontram-se elevados, apresentando taxas séricas de 50 até 100 vezes os níveis basais de mulheres não gravidas e a pressão arterial encontra-se diminuída durante esse período (August, 1990).

Embora os mecanismos pelos quais os estrógenos exerçam sua função cardioprotetora não estejam bem esclarecidos, existem várias linhas de pensamento acerca do assunto. Por exemplo, pesquisas têm mostrado que os estrógenos apresentam uma marcante modulação sobre os níveis de lipídeos e lipoproteínas circulantes

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(Aloysio, 1999). Mulheres na pós-menopausa apresentam uma elevação significativa dos níveis séricos de colesterol total (CT), triglicérides (TRIG), lipoproteína de baixa densidade (LDL colesterol) e uma diminuição da fração lipoproteína de alta densidade (HDL colesterol) (Stevenson et al., 1993). A prevalência dessa síndrome metabólica leva a um perfil lipídico mais aterogênico com aumento da oxidação de LDL’s levando ao aparecimento de obesidade central (intra-abdominal) (Carr, 2003). A terapia de reposição hormonal tem sido empregada, e é capaz de reverter essas alterações (Grodstein, 1996). O declínio da função ovariana após a menopausa está associado com o aumento espontâneo de moléculas pró-inflamatórias como a interleucína 1 e 6 (IL-1, IL-6 ) e fator de necrose tumoral alfa (TNF- ) (Pfeilschifter et al., 2002).

Outras linhas de pesquisa levam em consideração as alterações provocadas diretamente sobre o sistema vascular (Koh, 2002; Tostes, 2003). Trabalhos mostram que a menopausa esta associada ao dano endotelial e atenuação da vasodilatação dependente do endotélio (Kublickiene et al., 2005). A diminuição dos níveis de óxido nítrico (NO) tem sido observada, visto que o estradiol através de receptores específicos no endotélio e célula muscular lisa tem uma ação modulatória sobre a síntese de NO. A disfunção endotelial e redução do NO pode também estimular a síntese e liberação de endotelina (ET-1), resultando em um aumento do tônus vasoconstrictor, estimulando a liberação e atividade de fatores de crescimento, resultando na hiperplasia da musculatura lisa e migração dentro da íntima resultando no aumento das moléculas pró- inflamatórias (Liuzzo, 1994; Koh, 2002). O estradiol é capaz de atenuar vasoconstricção dependente de ET-1 em artérias coronárias in vitro e in vivo, (Tostes et al., 2003). Outros trabalhos têm também demonstrado que o estrógeno pode modular a ação da ET- 1 através da expressão gênica de seus receptores e em contrapartida mulheres tratadas com reposição hormonal apresentaram diminuição dos níveis séricos de ET-1 e seus receptores (Saitta et al., 2001).

Outro sistema no qual o estrógeno tem uma importante participação é o sistema renina angiotensina (SRA). É observada elevação na expressão gênica e nos níveis séricos de angiotensinogênio em resposta ao estradiol, e tanto a terapia de reposição hormonal (TRH) quanto o uso de contraceptivos promovem um aumento de seus níveis, (Fischer et al., 2002; Tostes et al., 2003). Outro fato interessante é a influência sobre os níveis de renina plasmática. O estradiol é capaz de promover aumento nos níveis de renina plasmática bem como o de angiotensina I (Ang I). Contudo, sabe-se que a Ang I é convertida por uma enzima produzida nos pulmões, enzima conversora da

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angiotensina (ECA), em Angiotensina II, que é um agente vasoconstrictor e induz a proliferação da vasculatura. Com isso, há de se pensar que haveria um aumento de resistência vascular periférica com consequente elevação da PA. Pesquisadores acreditam que é através deste mecanismo que alguns anticoncepcionais podem causar elevação da PA. Em contrapartida, alguns ensaios mais recentes, fazendo uso de novas tecnologias, como radioimunoensaio, apresentam dados diferentes, mostrando que em mulheres os níveis de renina são inferiores quando comparados com homens, e em mulheres na pré-menopausa ou pós-menopausa que recebem Terapia de Reposição Hormonal (TRH) os níveis de renina diminuem consideravelmente quando comparados com mulheres pré- e pós menopáusicas que não receberam o tratamento, ( Schunkert et

al., 1997). Outro fato a se considerar é que o estrógeno é capaz de suprimir a atividade da ECA, com isso promovendo uma significante redução nos níveis de Ang II (Schunkert et al., 1997; Fischer et al, 2002). Tanto em animais como em seres humanos a deficiência estrogênica pode levar a um aumento na expressão de receptores do tipo AT1, (Laborde et al, 2004; Harrisson-Bernard et al., 2003). Harrison-Bernade et al. (2003) e Labord et al. (2004) mostraram em um experimento com ratas OVX, que a diminuição de estradiol circulante promoveu uma maior expressão de receptores AT1. Em contrapartida, o tratamento com TRH é eficaz em promover a diminuição na expressão desses receptores em diferentes tecidos, como vasos, rins, adrenal e aumento nas ações da Angiotensina (1-7). A Ang (1-7) apresenta efeitos opostos dos das Ang II, promovendo uma vasodilatação dependente do NO e também facilitando o reflexo pressoreceptor (Ferrario et al., 1997). Brosnihan et al.(1999) em um estudo com ratas OVX, observou que em tratamento preventivo com TRH houve uma redução de atividade da ECA acompanhado de uma queda nos níveis de Ang II com um subsequente aumento nos níveis de Ang (1-7).

Pode ainda existir alterações sobre a vasoatividade, com aumento da atividade do sistema nervoso simpático levando a um aumento do tônus vascular e consequente elevação da pressão arterial, (He et al., 1998 ; Dantas, 2001; Czarnecka et al., 2009). Receptores de estrógeno têm sido identificados em centros cerebrais envolvidos com a regulação cardiovascular, como por exemplo, área pré-óptica, núcleo paraventricular, núcleo supraóptico, núcleo do tracto solitário, ventrolateral da medula e área postrema (Pelletier et al., 1988; Simoniam, 1997). Xiao – Rui He et al. (1998) demonstrou em um experimento realizado com ratas OVX que a administração de estradiol resultou em uma redução gradual da FC, atividade do nervo renal e splâncnico dentro de 20 minutos

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quando comparados com animais que receberam veículo, mostrando uma inibição da atividade simpática promovida pelo estradiol. Mulheres sob TRH na pós-menopausa apresentam uma diminuição na frequência de disparo de um nervo simpático, constituindo outro mecanismo de efeitos benéficos do estradiol (Vongpatanasin et al., 2001). A deficiência de estradiol promove ainda um aumento da sensibilidade simpática barorreflexa (Minson et al., 2000).

Os hormônios sexuais femininos, principalmente os estrógenos, apresentam inúmeros efeitos sobre o sistema cardiovascular, podendo conferir cardioproteção. Considerando essa proteção conferida pelo estradiol, há de se destacar que a sua redução, seja no período pós-menopausa, por outros motivos de supressão hormonal ou decorrentes de um estado nutricional inadequado, pode significar um grande aumento na incidência de patologias cardiovasculares.