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2 CIDADANIA: LUTA POR DIREITOS E POR PARTICIPAÇÃO

4.1 Metodologia de pesquisa Do que estou falando?

4.1

Metodologia de pesquisa. Do que estou falando?Metodologia de pesquisa. Do que estou falando?

Silva (1990, p. 111) sublinha que “o conhecimento científico não é o único conhecimento valioso”. Ele é mais uma forma de saber. De acordo com esse

16Cursada no PPGE/UFSCar durante o 2º semestre de 2007, ministrada pelas Profas. Carmem Lúcia

Brancaglion Passos e Denise de Freitas. Capítulo

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entendimento, o saber valioso das Ciências Humanas dar-se-á por meio do “diálogo entre o saber popular e o acadêmico”. Nessa discussão, Oliveira (2004, p. 15) acrescenta que “o conhecimento acadêmico pode e deve ser colocado como mais um conhecimento, evitando-se revesti-lo de autoridade (distante e próxima; racional, justa), pois daí haverá hierarquia e ordem, certamente, a já estabelecida”.

Estudos mencionados neste capítulo apontam para a importância da explicitação, em pesquisas científicas, da metodologia adotada que serve para conferir rigor científico para o estudo em questão. Segundo Silva (1990, p. 111), o rigor científico nas Ciências Humanas está intrinsecamente relacionado com a presença do outro que não o/a pesquisador/a, também como alguém que, ao ser investigado/a, investiga sua experiência vivenciada. Nesse entendimento, Silva (1987, p. 122) sublinha que “o lugar deles [negros do Limoeiro] nesta pesquisa é de tão pesquisadores quanto eu, ao nível de compreender o fenômeno em questão [educação deles], ao este fazer-se presente às nossas consciências”.

Na metodologia, de acordo com Becker (1993, p. 17), estudam-se os procedimentos de como foi realizada a pesquisa em questão e analisam-se o que se deu a investigar e “o grau de confiabilidade do conhecimento assim adquirido, e de tentar aperfeiçoar estes métodos através da investigação fundamentada e da crítica de suas propriedades” (BECKER, 1993, p. 17).

Para Becker (1993, p. 23), a primeira tentativa de sistematização metodológica consistiu na “pura descrição técnica”. Tais sistematizações “na verdade não são mais do que tratados sobre ‘como fazer’”. Nesses tratados, o/a pesquisador/a “descreve algo que ele tentou e descobriu que ‘funciona’, qualquer que seja o significado que a isto se atribua” (BECKER, 1993, p. 24).

Outro tipo de texto metodológico, descrito por Becker (1993, p. 24-25), é o analítico, que procura “descobrir a lógica inerente à prática convencional, a fim de reduzir aquela prática a um conjunto defensável de regras de procedimento”. Entretanto, esses tipos de textos metodológicos apresentados anteriormente, segundo Becker (1993, p. 27), negligenciam questões como a relação entre o pesquisador e os sujeitos de pesquisa.

Para além da explicitação e sistematização de como a pesquisa foi realizada, a metodologia, de acordo com o entendimento de Becker (1993, p. 31),

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contribui para a identificação de “traços gerais de organizações que ainda não estão registrados na literatura”.

O estudo de Minayo (1994) também me auxiliou para a compreensão de metodologia de pesquisa. Segundo Minayo (1994, p. 16) metodologia é “o caminho do pensamento e a prática exercida na abordagem da realidade”. Nesse entendimento, “a metodologia ocupa um lugar central no interior das teorias e está sempre referida a elas”.

Minayo (1994, p. 16) acrescenta que “a metodologia inclui as concepções teóricas de abordagem, o conjunto de técnicas que possibilitam a construção da realidade e o sopro divino do potencial criativo do investigador”. Nessa compreensão, a metodologia e a teoria são inseparáveis: “a metodologia deve dispor de um instrumental claro, coerente, elaborado, capaz de encaminhar os impasses teóricos para o desafio da prática” (MINAYO, 1994, p. 16).

Ainda sobre essa questão, Bauer, Gaskell e Allum (2002, p. 29) fazem problematizações instigantes sobre o conhecimento e método em pesquisas. Eles sublinham que métodos qualitativos e quantitativos, para além das diferenças em termos de estratégias de pesquisa, consistem em “posições epistemológicas profundamente diferentes”.

Nessa discussão sobre métodos qualitativos e quantitativos, Minayo (1994, p. 22) adverte que:

não existe um 'continuum' entre 'qualitativo-quantitativo', em que o primeiro termo seria o lugar da 'intuição', da 'exploração' e do 'subjetivismo'; e o segundo representaria o espaço do científico, porque traduzido 'objetivamente' e em 'dados matemáticos'.

Minayo (1994, p. 22) concorda com o posicionamento de Bauer, Gaskell e Allum (2002), nessa discussão, ao salientar que a “diferença entre qualitativo- quantitativo é de natureza”. Nesse caso, “cientistas sociais que trabalham com estatística apreendem dos fenômenos apenas a região 'visível, ecológica, morfológica e concreta”; já a “abordagem qualitativa aprofunda-se no mundo dos significados das ações e relações humanas, um lado não perceptível e não captável em equações, médias e estatísticas” (MINAYO, 1994, p. 22).

Bodgan e Biklen (1994, p. 200) pavimentam as reflexões sobre diferentes tipos de dados qualitativos, ao salientar “que os dados não são apenas aquilo que se

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recolhe no decurso de um estudo, mas a maneira como as coisas aparecem quando abordadas com um espírito de ‘investigação’”.

Minayo (1994, p. 22) aprofunda essa discussão ao afirmar que “o conjunto de dados quantitativos e qualitativos [...] não se opõem. Ao contrário, se complementam”. Entretanto, Minayo (1994, p. 22) nos alerta que essas afirmações não são assim entendidas por algumas “correntes de pensamento como, por exemplo, a positivista”.

Segundo Minayo (1994, p. 22), “a principal influência do Positivismo nas ciências sociais foi a utilização dos termos de tipo matemático para a compreensão da realidade”. Nesse entendimento, “para os positivistas, a análise social seria objetiva se fosse realizada por instrumentos padronizados, pretensamente neutros” e, continua a autora, “os positivistas atribuem à imaturidade das ciências sociais sua incapacidade de prever e determinar a ação humana” (MINAYO, 1994, p. 23).

Como alternativa e oposição a essa corrente de pensamento, temos outras posturas e formas de realizar pesquisas como, por exemplo, a Fenomenologia, a Etnometodologia e o Interacionismo Simbólico, as quais respondem “de forma diferente [do Positivismo] à questão sobre o qualitativo” (MINAYO, 1994, p. 23) e colocam “como tarefa central das ciências sociais a compreensão da realidade humana vivida socialmente” (MINAYO, 1994, p. 23).

No que diz respeito à metodologia, esta pesquisa de cunho qualitativo foi realizada com uma postura inspirada na fenomenologia, em que investigar e participar são dimensões de um mesmo processo (SILVA, 1990, p. 117). De acordo com essa postura, busca-se compreender o “sentido do fenômeno” observado (GIORGI, 2008; PAVIANI, 1990; SILVA, 1987). Para isso, o pesquisador precisará ter tempo e disponibilidade para consultar documentos, conversar e conviver com os/as participantes da pesquisa, isto é, pessoas que se dispuserem, ao serem instigadas pelo pesquisador, a investigar sua experiência de assessor/a educacional para Assuntos da Comunidade Negra no Estado de São Paulo.

Cabe acrescentar que a postura inspirada na fenomenologia adotada para realizar esta pesquisa é também ancorada nas reflexões de Suransky (1980), que nos ensina uma postura para pesquisar como forma de luta sem deixar de ser ciência. Nesse sentido, Suransky (1980, p. 164) sublinha que “we now turn to a

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consideration of Phenomenology wich initially arose as a protest movement, in rebellion against the rigid paradigm of natural science”.

A perspectiva fenomenológica demanda uma postura diferente da adotada pelo “Natural Science Paradigm”, em que “we must ackwledge the force of phenomenology as a weapon of social change; for its to unveil reality, to demythicize the second order constructs of social science and penetrate to the essence of our social phenomena” (SURANSKY, 1980, p. 177).

Dessa forma, a postura tanto para examinar os documentos como para realizar as entrevistas se inspiraram na fenomenologia que busca estudar e compreender experiências vividas numa postura de interlocução, em que o/a pesquisador/a busca, sem esquecê-los, suspender tudo que já sabe ou pensa saber sobre os fenômenos que pretende compreender (PAVIANI, 1990, p. 28; SILVA, 1990, p. 123). No presente caso, processos educativos vivenciados por assessores/as educacionais para assuntos da Comunidade Negra, junto à Secretaria da Educação do Estado de São Paulo, na formulação e execução de projetos e políticas públicas educacionais de combate ao racismo.

Do fenômeno, nesse processo, tenta-se reconstituir a experiência vivida, buscando identificar e tentando explicitar o ponto de vista de quem viveu a experiência e não na perspectiva de julgamento do/a pesquisador/a (PAVIANI, 1990, p. 26). Dessa forma, a interpretação de textos e falas expõe como referência a visão dos que viveram e reconstituíram os fenômenos. A literatura, que foi um importante apoio na construção da problemática, na questão de pesquisa, na formulação de conceitos e significados de termos-chave tem papel fundamental na discussão dos resultados.

Tendo apresentado essas considerações sobre metodologia de pesquisa e a postura adotada neste estudo, antes de apresentar os procedimentos adotados no próximo item, retomo a questão de pesquisa que orienta este estudo: Como assessores/as educacionais para assuntos da Comunidade Negra, junto à Secretaria da Educação do Estado de São Paulo, ao exercerem suas funções, foram educando-se na prática social de combate ao racismo e formando-se enquanto intelectuais negros/as?

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