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2 REVISÃO BIBLIOGRÁFICA

2.2 Metodologia de Revisão Bibliográfica

A revisão bibliográfica foi elaborada tomando como base quatro objetivos: (1) o entendimento do ciclo produtivo completo do etanol de primeira geração (E1G), (2) a coleta de dados primários2, (3) a confirmação de dados primários3 e recálculo dos dados secundários4, e (4) o estudo da metodologia usada pelos autores das referências para fins de contextualização dos dados numéricos.

Como a fronteira é muito ampla, o ponto onde começar a pesquisa é irrelevante. À medida que é detalhado um tópico pesquisado, cada dado “primário” é pesquisado e

1 Melaço não é melado. Segundo ANVISA, Melado é o xarope resultante da evaporação do caldo da

cana-de-açúcar, contendo todos os nutrientes do caldo integral. Melaço é o caldo resultante da centrifugação do açúcar, em usinas de açúcar. Melaço é um material bem mais pobre em nutrientes, geralmente usado como ração para gado ou como caldo para produção de etanol em usina anexa

2 Dado Primário é aquele dado que é usado como dado para cálculo de outros dados. Geralmente são

dados levantados diretamente no processo, ou dados tabelados, ou dados definidos por um fornecedor de equipamento, ou mesmo estabelecido por legislação pertinente. Como exemplos, consumo de um veículo, fator de conversão de energia, PBT (Peso Bruto Total) para uma categoria de veículo de carga. Note que o dado primário para um processo pode ser o resultado, ou dado secundário de processos anteriores na cadeia produtiva

3 Normalmente a confirmação dos dados primários são feitos com verificação de consistência (como

comparação com outras atividades semelhantes), comparação com eficiências energéticas e

termodinâmicas de processos e atividades conhecidas, e em alguns casos, detalhamento do processo produtivo de um insumo e recálculo teórico da energia necessária para produção do insumo ou produto

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Dado Secundário é aquele dado que é calculado a partir de Dados Primários em um determinado processo ou atividade. Com dados primários verificados e confiáveis, e metodologia explícita, os dados secundários passam também a ser confiáveis. Nesta dissertação, dados secundários são recalculados, não são referenciados a partir de outros autores.

45 confirmado se realmente é um dado primário. Se não for, a fronteira é ampliada para levantamento de dados usados para o cálculo deste dado não primário. Por exemplo, a energia indireta em um quilograma de liga ferrosa varia de 20 a 60 MJ/kg, dependendo do autor. Os valores menores normalmente só consideram a energia de transformação do minério de ferro já beneficiado para aço simples. Os valores maiores normalmente incluem a transformação do ferro gusa ou aço simples em aços específicos (inoxidável, alta resistência, forjado, etc). Uns poucos estudos consideram a energia direta da mineração do minério de ferro e seu beneficiamento e concentração. Normalmente os estudos ignoram a energia indireta embutida nos equipamentos usados na mineração e beneficiamento, como escavadeiras, caminhões ultra pesados, trituradores de minério, eletroimãs para separação magnética, fornos de sinterização, etc. Também normalmente ignoram a energia para transporte do minério beneficiado a longa distância, muitas vezes transcontinentais, e muito menos contabilizam a energia das locomotivas, vagões e navios usados para transporte em grande volume. A fronteira da pesquisa foi ampliada até a mineração do minério de ferro para chegar a um valor com embasamento. Os valores de energia indireta para aços variam bastante dependendo do processo de produção e especificidades da liga. O valor final está ao redor de 60 MJ/kg de aço simples. Se for forjado, com têmpera especial, e sofrer outros tratamentos contra corrosão, o valor pode triplicar, como no caso de metais específicos usados em motores de combustão interna e caixas de câmbio de caminhões pesados e tratores, e aços estruturais usados na indústria petroquímica e mineração (BOUSTANI, 2010; SULLIVAN, 2010; ZVI, 2015) . Outro exemplo é a energia necessária para a produção de adubos nitrogenados. A maioria dos autores só relata a energia direta usada na produção do nitrogenado, assumindo energia nula contido nos insumos. A energia do gás natural, usado em grande quantidade como fonte de hidrogênio, e a energia para obtenção do nitrogênio a partir do ar, é ignorada por quase todos os autores. Um autor (MENDES JÚNIOR, 2014) levou em conta a energia do gás natural e chegou a um valor quase igual ao dobro da média relatada na literatura. Detalhes da confirmação do novo valor de energia de nitrogenados está na seção 2-13.

As áreas de conhecimento pesquisados, devido à extensão da fronteira do sistema produtivo, vão de astrofísica, radiação solar, meteorologia, física da atmosfera, agricultura, nutrição da cana, processos produtivos de E1G de cana, cogeração, balanço energético planetário, logística e custeio, produção de metais, plásticos e pneus, produção de veículos e tratores, rendimento de tratores e veículos de carga,

46 termodinâmica, bioquímica de fermentação, produção de motores (energia embutida no processo), produção de insumos agrícolas (energia embutida nos adubos), produção de química fina (defensivos agrícolas), logística de calcário e gesso agrícola, logística de nutrientes NPK, e claro, balanço energético. Foi também estudado o custo energético de produção de petróleo e gás para determinar a real energia embutida em um litro de diesel, o que deu um balizamento para a energia embutida no E1G. A energia contabilizada como energia direta é a energia de queima do combustível fóssil. Sem surpresa, EROI de combustíveis fósseis é bem maior que EROI de energia renovável. Afinal, não é necessária a fase de produção do produto primário (petróleo ou gás natural ou carvão). Só se há a fase de extração (equivalente à colheita da cana) e refino (equivalente à fase industrial de produção de E1G). Mesmo a fase de distribuição tem rendimento melhor com combustíveis fósseis, pois a densidade de energia do combustível (aproximadamente 35 MJ/litro) é bem maior que a densidade de energia do etanol (aproximadamente 21 MJ/litro). Portanto usam-se menos veículos, menos energia para movimentar a mesma quantidade de energia até o consumidor final, dada as mesmas distâncias.

Mesmo levando tudo isso em conta, os valores primários levantados certamente estão subestimados. Os autores normalmente levantam os dados da produção local, quando muito incluem a energia de produção dos insumos necessários. Mas pouquíssimos se preocupam em incluir a energia indireta que é necessária para a produção e manutenção dos equipamentos e infraestrutura necessária para a cadeia produtiva toda. Não foi possível sequer o levantamento de dados confiáveis sobre a massa de equipamentos individuais na fase industrial de E1G, como caldeiras, moendas, geradores, etc. Quando muito temos valores agregados (MACEDO, 2004). Massas de veículos rodoviários, implementos agrícolas e tratores tem dados confiáveis a partir de catálogos de fabricantes. Também não foram encontrados valores confiáveis sobre equipamentos de movimentação de carga usado dentro da usina, como tratores, carregadeiras e caminhões usados internamente para movimentação e arrumação física de cana e bagaço. Só se encontrou um autor relatando dados operacionais de um duto de bombeamento de vinhaça entre a usina e a fazenda usuária, mas sem muitos detalhes sobre características físicas, como comprimento real, diâmetros, material, taxa de manutenção, etc. (MARQUES, 2009)

Ao procurar registrar sempre o valor máximo, o mínimo e o adotado para cada dado primário, fica evidente como o resultado final pode variar muito, dependendo do

47 valor a ser adotado. Alguns dados primários só tem o valor adotado, pois não foi encontrado mais de uma referência com valor confiável. Sempre que possível, o valor adotado é justificado com razões explícitas, nos Apêndices.

Energia em Larga Escala é um tema que tende a dominar os estudos nas próximas décadas ou no próximo século. O que é fóssil é finito. O que está em jogo não é a sobrevivência da raça humana, mas a sobrevivência de um estilo de vida, baseado em consumo extraordinário de energia fóssil a um custo irrisório. A Revolução Industrial é melhor expressa como a Revolução Energética Fóssil. A Revolução Verde que permitiu abundância de alimentos a custo baixo, permitindo a expansão da população de 2 bilhões para 7 bilhões em apenas 90 anos aproximadamente, só foi possível com uso intensivo de energia fóssil na forma de adubos agrícolas e mecanização da agricultura. Sem energia fóssil, certamente teremos limitações não só ao estilo de vida que temos hoje, início de século 21, como também a quantidade de alimentos disponíveis para a população existente hoje.

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