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MAPA 2 Localização das aldeias antigas e atuais

0. INTRODUÇÃO – O povo, a língua e a pesquisa

0.4. A presente pesquisa

0.4.1. Metodologia e dados

Demos prioridade à aplicação de um referencial teórico funcional-tipológico8, como Givón (1995, 2001), Comrie (1974, 1981, 1989), DeLancey (2000), Dixon (1994, 2000), Hopper & Thompson (1980), Mithun (1984, 1991, 1996) e outros. Funcionalistas buscam explicações nas funções e nos processos diacrônicos recorrentes, os quais são em grande parte dirigidos por funções. Eles vêem a língua como uma ferramenta, ou melhor, um conjunto de ferramentas, cujas formas são adaptadas a suas funções (DeLancey 2000). Já a abordagem tipológica pode ajudar a identificar e classificar os dados que permitem explicação funcional.

Construções de diversas línguas podem ser classificadas e comparadas estrutural e funcionalmente. Em Mundurukú, por exemplo, ocorre a reduplicação, que encerra propriedades funcionais como: duração, intensificação e pluralização. Não é apenas esta língua que apresenta este traço estrutural aliado a estas funções, nem muito menos se deve acreditar que tais funções sejam realizadas necessariamente por tal

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O termo "funcional" tem sido empregado para uma variedade de modelos diferentes, escolas, movimentos e metodologias. Aqui será usado para referir-se especificamente a um movimento que surgiu com o trabalho de um grupo de lingüistas situados na Califórnia no anos 70, incluindo Talmy Givón, Charles Li, Sandra Thompson, Wallace Chafe, Paul Hopper, e outros. Os integrantes deste grupo têm sido chamados de lingüistas funcionais-tipológicos.

processo. O que se tem percebido nos estudos lingüísticos é que certas estruturas tendem a ser usadas em certas funções, e certas funções tendem a ser expressas por certas estruturas.

Um outro caminho de pesquisa importante na construção desta tese foi a revisão das publicações primárias e secundárias existentes sobre o Mundurukú:

- dicionários e vocabulários; - coleções de textos;

- gramáticas;

- estudos sobre aspectos da gramática; - estudos sobre a fonologia.

Os dados analisados foram coletados durante idas à área indígena Mundurukú, precisamente às aldeias Sai-Cinza e Katõ, entre 1998 e 2005. Também utilizamos os dados fornecidos pelo Mundurukú Misael Kabá em sua vinda a Brasília, por cerca de 20 dias durante o mês de janeiro de 2005. Outros dados, que serviram de base para o trabalho proposto, são os coletados por Marjorie Crofts. Esses dados foram organizados e reanalisados por mim para a elaboração de um dicionário dos verbos da língua (em andamento) e para a construção da minha dissertação de mestrado (Gomes 2000).

Os dados por mim coletados incluem narrativas, conversações, descrições da feitura de artefatos indígenas, textos de cantigas, frases e vocábulos. Misael Kabá e eu fizemos a tradução para o português de um manual de saúde, que aborda a prevenção de doenças sexualmente transmissíveis e Aids. Esse manual foi lingüisticamente analisado e dele foram extraídos diversos exemplos.

Os informantes que contribuíram com os dados representam diferentes faixas etárias e são detentores de conhecimentos vários. Por exemplo, para descrever utensílios Mundurukú, foi convidado Valdemar Puxu, um homem que se responsabiliza por fazer tais utensílios, o qual, por sua vez, contou com a ajuda da mãe para lhe explicar detalhes de uma rede, que só as mulheres faziam. Já os mitos foram narrados por um experiente e respeitado contador de histórias, o cacique Amâncio Kabá, o Biboy. A coleta de outros textos e a análise de boa parte dos dados se deram, principalmente, com o filho de um dos

caciques, Zenildo Saw, e com Misael Kabá, ambos professores de Mundurukú formados em um curso promovido pela FUNAI em parceria com o MEC. Além deles, várias outras pessoas contribuíram esporadicamente em diversas ocasiões, desde o fornecimento do nome de um peixe recém-pescado até a narração de um pequeno trecho mítico.

Notas finais da Introdução

(Carta de lideranças Mundurukú, na qual se percebe um engajamento político em prol do seu povo) i

"Ao longo de muitas décadas o povo Munduruku luta para permanecer neste pedaço de chão. E vem conquistando isto até hoje graças ao espirito vigilante de bravos guerreiros, expulsando garimpeiros e fazendeiros, não permitindo desbravarem sua floresta como ocorre em outras localidades da Amazônia, destruição de madeiras de lei e ervas medicinais e disseminação de doenças com aberturas de rodovias e construção de hidrovia para prejudicar nossos igarapés e servir de escoamento fácil de nossas riquezas naturais quer minerais, vegetais e animais. Temos na aldeia uma Escola de Ensino Fundamental que funcionou este ano até a 5a série para formação dos professores indígenas. A SEDUC- Pará em parceria com a Prefeitura de Jacareacanga e a FUNAI está promovendo cursos na própria área. Conservamos nossa língua e somos atualmente uma população de sete mil indígenas habitando em 87 aldeias numa área de 2362 hectares de terra que se encontra na sua fase conclusiva de demarcação, faltando apenas a assinatura declaratória do Ministro da Reforma Agrária. Após anos e anos de luta do povo Munduruku reivindicando e protegendo o seu território a FUNAI resolveu instituir grupos de trabalhos formados por técnicos peritos no assunto. Um grupo, em 1987 e outro em 1993 para identificar o território Munduruku, procedendo levantamento antropológicos, culturais e em conseqüência disso a área foi reconhecida como sendo de habitação permanente e tradicional do grupo tribal Munduruku. Apesar de tal reconhecimento e dos esforços dos indígenas, encontra-se hoje invadida no local denominado Bico do Rio das Tropas por atividades garimpeiras que em busca de riquezas naturais contribuem para o esbulho e subtração dos direitos originários dos Munduruku sobre as terras que tradicionalmente lhes pertencem.

No Artigo 231 da Constituição Federal de 1988 são reconhecidos aos índios sua organização social, costumes, línguas, crenças, tradições e os direitos originários das terras tradicionalmente ocupadas, competindo à União, demarcá-las, protegê-las e fazer respeitar todos os seus bens.

Já estamos realizando a 10a Assembléia sobre este assunto o que significa que a mais de dez anos lutamos para se efetivar esta demarcação de nossa terra, e o processo continua tramitando nos órgãos públicos federais, sendo protelado sua realização por força

e apoio dos latifundiários e empresários brasileiros e por multinacionais que querem nos reduzir a farrapos humanos como é a prática deles desde a invasão portuguesa aqui no Brasil

O governo brasileiro baixou um decreto Nº 1775 de 08/01/96 que define como deve ser os trabalhos de identificação e demarcação das terras indígenas dando direito ao não índio recorrer no prazo de 90 dias após a publicação no Diário Oficial da União, a dimensão da área a ser demarcada. Este ato chama-se Contestação. Com este Decreto que substitui o Decreto N° 22/91, o Presidente da República engendrou um dos maiores retrocessos na legislação indigenista brasileira. Ao em vez de agilizar o processo demarcatório das terras indígenas há tanto tempo esperado, o Decreto N° 1775 de 08/01/96, põe novos entraves que possibilitam até a redução das áreas já demarcadas, provocando muitos assassinatos e causando grandes violências com vários povos indígenas e seus patrimônios nos últimos anos. Neste decreto foram portanto atacados os nossos direitos originários de posse permanente da terra e usufruto exclusivo de nossas riquezas naturais que a Constituição Federal de 1988 explicita como bens inalienáveis dos índios. Caindo este direito à terra todos os outros tendem a desaparecer. Até o recurso que era repassado às Administrações Regionais-FUNAI, para atendimento à saúde do índio, está sendo cortado em todo território deste país. Atualmente as Administrações estão sempre precárias. Não tem nem alimentação suficiente para os índios doentes que se deslocam de suas aldeias para tratamento de saúde. Nossos Postos de Saúde estão sucateados. Não existem medicamentos nas nossas áreas. Ainda bem que as vacinas estamos recebendo regularmente, tanto adultos como crianças

No Congresso Nacional o Governo tem atuado para impedir a votação do Estatuto das Sociedades Indígenas que iria atualizar a partir da Constituição Federal de 1988 o antigo Estatuto do Índio. Mas ao mesmo tempo o governo está favorecendo os projetos de leis que abrem as portas para Grupos Econômicos ávidos em explorar os recursos naturais dos nossos solos e subsolos. Um desses projetos terríveis é o de N° 1610/ A-96 de autoria do Senador Romero Jucá (PFL-RR) em prol das empresas Mineradoras. Uma vez aprovado um projeto de lei desse tipo, o novo Estatuto das Sociedades Indígenas terá pouco a definir porque os interesses dos grandes empresários estarão garantidos em relação a nosso patrimônio e a nossa subsistência que dele depende.

Temos algumas Entidades que nos apoiam como: Igrejas, CIMI, GENDA, PPTAL. FUNAI, AMTAPAMA e nossas organizações a nível nacional: COIAB, CAPOIB e a nível local: CIMAT - Conselho Indígena Munduruku do Alto Tapajós, AIP – Associação Indígena Pusuru, CCMKE – Centro Cultural Munduruku Kerepo Ewekuku, CEM – Conselho Escolar Munduruku.

Solicitamos a vossa solidariedade para nossas lutas em prol da demarcação das áreas indígenas, para a aprovação do Estatuto das Sociedades Indígenas, pela destituição do Decreto N° 1775 e para a não aprovação do projeto de lei N° 1610 / A-91 do Senador Romero Jucá e o Projeto sobre a Hidrovia Rio Tapajós/Rio Teles Pires que estão em tramitação no Senado Federal."

Missão São Francisco do Rio Cururu, 22 de outubro de 1998

Assinado por:

José Crixi e Aurélio Krixi do CIMAT Venâncio Puxú e Cláudio Mitu da AIP Albino Sal do CEM

Arnaldo Alci do CCMKE

E os líderes comunitários: Silvério Kabá, Bruno Manhuari e Adonias Kabá (http://freeweb.supereva.com/mensageiro.freeweb/n114/munduruk.htm?p,b, acessado em 1 de maio de 2006, às 11h34)

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