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Capítulo 4. Pesquisa empírica

4.1. Metodologia

Como estratégia metodológica para examinar as interações ocorridas no site, decidimos categorizar usuários tendo como pressuposto a existência de interesses, como já explicado no final do capítulo anterior. Desse modo, compreendemos que os referenciais identitários dos usuários são adotados considerando a existência de interesses afetivos,

estéticos e promocionais, no Flickr.

Defendemos, para a pesquisa empírica, que esses interesses podem ser detectados nos usuários através de uma análise de suas páginas. Para tanto, organizamos a pesquisa através de dois momentos.

No primeiro, fizemos uma seleção de usuários brasileiros do Flickr, através da página do site que lista os uploads recentes de usuários do país, acessada por meio da seção Explorar

do site, na escolha por Lugares70; nessa seleção, consideramos aqueles que postaram mais de cinco vezes durante o período de 30 de outubro a 14 de novembro de 2010, o que resultou em um total de 42 usuários. A seleção, dessa forma, se baseou na atividade ocorrida entre os usuários durante um determinado período de tempo no site – durante esses 16 dias. De modo a manter um critério objetivo na coleta das páginas, optamos por fazer a seleção no mesmo horário desses dias – às 23:30.

Por se tratar de uma pesquisa qualitativa, vale ressaltar que a análise não se dispôs a ter um recorte que priorizasse resultados com significância estatística; nem tampouco o número de usuários buscou se basear em dados proporcionais que correspondessem a uma amostra significativa, tendo em vista a quantidade de cadastrados no Brasil.

Tendo em mãos os 42 usuários selecionados do site, partimos para o segundo momento da pesquisa, o qual consistiu na análise desses usuários por meio de duas matrizes (ver tabelas 1 e 271) cujas páginas foram submetidas; ou seja, a partir dos critérios de investigação propostos nessas matrizes, buscamos compreender como os usuários estariam gerando e compartilhando conteúdos, e como estariam ocorrendo interações na ambiência do site. Nesse sentido, consideramos critérios a serem pontuados com relação à performance e à construção dos significados por meio de recursos existentes no Flickr, selecionados para essa pesquisa e já tratados anteriormente – no capítulo 3.

As etapas da pesquisa são mais detalhadas após uma breve digressão sobre o aporte metodológico aqui empregado – a etnografia virtual.

4.1.1. Digressão sobre o aporte metodológico

Temos como aporte metodológico aqui empreendido a etnografia virtual, desenvolvida principalmente a partir dos trabalhos de Christine Hine. Esta é derivada da etnografia, cujo procedimento de análise empírica dos fenômenos consiste na adoção, pelo pesquisador, de uma postura de imersão no corpus e na consideração das relações formadas entre aqueles participantes dos processos sociais desse corpus, para compreender relações das pessoas com o contexto.

Ainda, Braga (2007) diz que tal proposta de etnografia, aplicada à ambiência digital, estaria representando um desafio metodológico: preservar os detalhes ricos da observação em

70 Disponível em: <http://www.flickr.com/places/Brazil>. Acesso em dezembro de 2010. 71 As tabelas aparecem na página 5.

campo etnográfico usando o meio eletrônico para buscar o mapeamento de padrões sócio- comportamentais dos usuários. Na etnografia virtual, o enfoque leva em conta práticas de consumo midiático, processos de sociabilidade e fenômenos comunicacionais que envolvem representações do “eu” dentro de comunidades na internet (BRAGA, 2007).

Kozinets (2002), por sua vez, enumera três formas eficazes de captura de dados. A primeira diz respeito aos dados coletados diretamente dos membros dos grupos de interesse – nos quais cabe ao pesquisador fazer uso de enquadramentos para obtenção de informações de relevância para os propósitos de sua pesquisa. A segunda consiste em informações que o pesquisador observou das práticas comunicacionais dos membros das comunidades, das interações, simbologias e de sua própria participação. A observação participante abriria espaço para o etnógrafo ter acesso a processos que dificilmente teria, assim como reduziria possíveis enviesamentos que por ventura acontecessem no ambiente, caso se apresentasse como tal. Tal enviesamento pode ocorrer porque, para Soriano (2007), a presença do investigador sempre incide de alguma maneira na vida cotidiana observada. Já a terceira forma refere-se aos dados levantados em entrevistas ou questionários com os indivíduos. Com relação a essa última forma, segundo Winkin (1998) poderia servir para tentar reconstituir a percepção do lugar por meio de seus diferentes usuários.

Assim, percebemos que a etnografia virtual se configura enquanto uma metodologia, com o objetivo de preservar os detalhes da observação em campo etnográfico utilizando da internet, como os SRS para a observação dos envolvidos. Tendo em vista as possibilidades exploratórias das interações nos sites, consideramos que a etnografia virtual se apresentou como uma metodologia relevante para a compreensão do fenômeno em questão. Isto porque foi capaz de se realizar uma imersão no corpus empírico analisado, no lugar onde ocorrem as interações entre os usuários na comunicação mediada pelo computador, de modo a coletar as informações necessárias às argumentações aqui propostas.

Por meio da observação não-participante, foi possível analisar o material empírico e discutir o modo como os usuários estariam a exercer sua performance por meio da construção do significado perante os objetos envolvidos no site. Seguindo esse método de coleta de dados, foram analisadas páginas dos usuários, adotando como pressuposto a investigação de interações e simbologias presentes nelas. Por meio dos critérios para a escolha do corpus, entendemos que esses usuários estavam familiarizados com as situações do site, interagindo de forma não-anônima a partir de linguagens e símbolos específicos, de modo a manter certas

Segundo Hine (2005), tecnologias contemporâneas de comunicação necessitam de uma metodologia capaz de considerar questões como a sociabilidade e a apropriação dessas tecnologias, tendo em vista que os agentes de mudança seriam os usos e as construções de

significados ao redor das mesmas. Desse modo, é importante compreender de que modo se

percebe a apropriação dessas tecnologias nesses ambientes de interação por parte dos usuários, com o objetivo de tornarem-se objetos importantes também para compreensão dessa pesquisa.

Então, acreditamos que o uso desse aporte metodológico foi importante tendo em vista as orientações que o pesquisador deve ter com relação à coleta e análise dos dados empíricos – por meio da observação não-participante do fenômeno. Daí, considerando o Flickr, defendemos a adoção da etnografia virtual para a compreensão das interações na ambiência do site, levando em consideração a presença da rede social e dos recursos para a formatação dos cenários de interação.

4.1.2. Matrizes de análise

Para a pesquisa de campo, foram elaboradas matrizes, com o objetivo de analisar as páginas dos usuários selecionados. Nessa análise, buscamos detectar a presença de características peculiares, ou mesmo semelhantes, nos usuários com os três interesses aqui propostos.

Essas matrizes tiveram como objetivo estabelecer esquemas de compreensão, e partiram do pressuposto de que os usuários interagem nas páginas baseados em alguns critérios a serem discutidos, negociados, ressignificados perante as situações que se impõem aos engajados. Ainda, as matrizes buscaram auxiliar na compreensão das proposições acerca dos interesses no Flickr, nos municiando de argumentos que pudessem ser importantes para a categorização aqui pretendida.

Os critérios para análise dos usuários foram divididos a partir do modo em que os indivíduos estariam a exercer a performance (ver tabela 1) e do modo com que os significados estariam sendo construídos na interação (ver tabela 2), considerando alguns recursos que seriam intervenientes nesses ambientes.

Tabela 1: Critérios para análise da performance

1. Tipo de informações do perfil 2. Gerenciador da conta

3. Tipos de títulos e legendas 4. Contatos que interagem

Nessa primeira tabela, são considerados: (1) informações presentes no perfil; (2) por quem é gerenciada a conta – se por um indivíduo ou por um grupo, e no que essa variável poderia auxiliar na categorização; (3) o modo como descrevem os títulos e as legendas – questões referentes à como eles buscariam certas discussões em suas páginas por meio desses recursos; (4) os contatos nos quais os usuários interagem – de modo a compreender se esse público seria composto por pessoas socialmente próximas (laços fortes) ou distantes (laços fracos), e no que isso poderia ser relevante para o entendimento dos interesses.

Tabela 2: Critérios para análise da construção dos significados

1. Tipo de comentários 2. Presença de marcações 3. Número de tags 4. Tipos de tags

5. Número de grupos em que a foto se encontra 6. Número de álbuns em que a foto se encontra 7. Número de “favoritamentos” das fotos 8. Número de fotos participando de “expô”

Já com relação à segunda tabela, são analisados: (1) as discussões presentes nos comentários – quais questões estariam envolvendo determinados interesses, de modo a diferenciá-los um dos outros; (2) a presença de marcações – se haveria uma correlação entre o número de marcações com os interesses dos usuários; (3) a quantidade de tags inseridas – se houve uma correlação entre o número de tags com os interesses dos usuários; (4) os tipos de

tags – quais os objetivos para inserção de algumas tags, em detrimento de outras, e no que

isto poderia auxiliar na categorização aqui proposta; (5) o número de grupos que a foto pertence – buscando compreender a existência de uma correlação entre o número de grupos com os interesses dos usuários; (6) o número de álbuns que a foto pertence – buscando compreender a existência de uma correlação entre esse número com os interesses dos usuários; (7) o número de “favoritamentos” das fotos – se as páginas de determinados interesses teriam maior propensão às suas fotos obterem algum reconhecimento, indicado por

meio dessa ação; e (8) a presença de fotos participando de “expôs” – se haveria uma correlação entre essa constatação com os interesses dos usuários.

Partindo, então, para os resultados, consideramos importante salientar que as caracterizações apresentadas tratam-se de proposições dessa pesquisa, nas quais são discutidas nas seções seguintes desse capítulo, tendo como base para tal entendimento a metodologia aqui explicada.

Portanto, não defendemos a existência de alguém com um perfil “ideal” – ou seja, que viesse a apresentar todas as características, apresentadas nos critérios, necessárias para a categorização dele como pertencente a algum interesse. O que propomos aqui é a predominância de características que pudessem – por meio do entendimento da sua

performance e da construção de significados perante alguns recursos selecionados – ser

detectadas e, com isto, pudéssemos categorizar os usuários de acordo com os três interesses propostos.