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Metodologias para apreender Representações Sociais

No documento annelizifermino (páginas 43-48)

2. TEORIA DAS REPRESENTAÇÕES SOCIAIS

2.5. Metodologias para apreender Representações Sociais

A Teoria das representações sociais é apropriada por uma variedade de escolas e perspectivas que abordam diferentes aspectos do fenômeno. Wachelke, Matos, Ferreira e Costa (2015) identificam que estas abordagens vão desde abordagens etnográficas para entender a relação entre apropriação individual da cultura de grupo a estudos experimentais do nível individual cognitivo dos valores compartilhados pelos membros do grupo. Essa característica reflete sua abertura ao diálogo interdisciplinar e gera grande diversidade metodológica entre os estudos de representações sociais.

As representações sociais se consubstanciaram como temas transversais ao serem abordadas por várias áreas de conhecimento. Essa fluidez conceitual produz a diversidade de perspectivas que marca a trajetória de seu avanço teórico. Ressalta-se que as representações sociais foram pensadas de uma forma que aceite diversas abordagens metodológicas e de objetos. Para Jodelet (1993), ―Ao contrário do paradigma informático que confina todo o esforço científico sob a chapa de um mesmo molde, o modelo das representações sociais impulsiona a diversidade e a invenção ergue o desafio da complexidade.‖ (p.21). Nesse sentido, as representações configuram-se como um campo de pesquisa em expansão com múltiplos objetos de pesquisa, abordagens metodológicas e desafios a serem incorporados a sua base teórica.

A variedade de perspectivas presente nos estudos de representações sociais foi acompanhada por um politeísmo metodológico. Encontramos procedimentos realizados através de observação participante, estudos de campo, entrevistas, grupos focais, técnicas de associação livre de palavras, inquéritos por questionário, análise de documentos e de discursos, entre outras. Para Cabecinhas (2009, p.12), ―nenhuma metodologia por si só é suficiente para investigar estes complexos fenômenos‖. A autora argumenta que a representação social se destaca por não privilegiar nenhum método de pesquisa específico. Trata-se de uma tradição de pesquisa muito heterogênea e não prescritiva no que respeito à metodologia, mas caracterizada por compreender o que as pessoas fazem na vida real e em situações significativas.

Entre os estudiosos da representação social, alguns se preocuparam com o desenvolvimento de uma metodologia que desse conta da complexidade das representações, como Bauer e Jovchelovitch ao estabelecer modos e meios como as duas instâncias de análise

de uma representação. Para eles, a forma e o veículo correspondem aos problemas centrais para identificação das RSs. Os modos consistem na forma, modelo ou formato em que as representações se apresentam. Os meios os canais através do qual a representação circula. Nesse sentido, as questões que o pesquisador deve fazer para análise de uma representação são: de que modo ou em que modelo comunicacional essa representação se configura, e por que meio, veículo comunicacional, essa representação circula socialmente entre os grupos e indivíduos (REIS; BELLINI, 2011).

Guareschi (2000) considera que esse quadro deixa certos aspectos de lado e sugere um proceder metodológico mais próximo ao usado por Jodelet quando estudou as representações de uma comunidade sobre pacientes de um manicômio no contexto de luta anti-manicômial. Jodelet faz uso da observação participante, em sua análise pôde observar os hábitos, práticas, interações e costumes (modos) e os movimentos, gestos, rituais (meios). Para Guareschi, a observação é a melhor possibilidade de acesso aos hábitos dos membros de uma comunidade, revelando muito mais do que os dados obtidos através de entrevista sobre o convívio de uma comunidade. Segundo Ida Galli (2014), o estudo Denise Jodelet sobre a loucura foi pioneiro e é considerado a segunda obra que inaugurou os estudos sobre representações sociais. Com o objetivo de identificar o nascimento e o funcionamento das representações, seu lugar e o seu papel na dinâmica de interações com os doentes mentais, Jodelet utilizou de uma metodologia complexa que mesclava procedimentos de etnografia, história, psicologia social e sociologia, superando a insuficiência de dados de seu campo de estudo e acessando ―a totalidade dos fenômenos‖ ao abordar relacionalmente a comunicação, os modelos culturais de comportamento, as práticas reais e simbólicas.

Em estudos mais recentes, observa-se com frequência o uso de variedade metodológica para recolha de dados e análise das representações sociais. Esta bricolagem de instrumentos de coleta de dados coaduna-se com a complexidade de apreensão das representações. Também percebe-se a coexistência desta abordagem com métodos ―únicos‖. Geralmente estes correspondem aqueles familiares à psicologia, sendo o mais comum a associação livre combinada a análise prototípica. A análise prototípica é uma perspectiva analítica que considera a representação social mais acessível à consciência. Portanto, passível de ser alcançada através de um estimulo que provoque em respostas expressões associadas ao objeto representacional, esta metodologia indutora de frases e expressões é a associação livre (WACHELKE; WOLTER, 2011).

Outra forma de analisar representações sociais que leve em consideração à adaptação e à proficiência no domínio ideativo é a associação livre. Apesar de parecer uma abordagem para um fenômeno individual, também pode tratar-se de aspecto social na medida em que o conteúdo ideativo é pré-requisito formal de adesão de uma representação por um grupo. Entre os benefícios do método de associações livres elencados por Tsoukalas (2006) está a abertura que as associações contêm por serem menos estruturados que a maioria dos métodos de pesquisa tradicionais. As associações livres não dependem de respostas pré-especificadas e pré-classificadas, como a maioria dos questionários, e retêm muitas das vantagens do questionário, por exemplo o seu caráter formal e a capacidade de reunir grandes quantidades de dados quantificáveis.

Neste método, os sujeitos são convidados a produzir uma série de associações em resposta a uma determinada palavra-mãe. Essas associações são classificadas sucessivamente, contextualizadas e elaboradas através da utilização de vários exercícios. O padrão de associações resultantes do procedimento ajuda a elucidar a distribuição de um campo semântico das representações sociais, sua construção social, bem como suas características básicas e seu núcleo central. Através desses quatro aspectos, é obtido um conhecimento válido capaz de compreender uma representação social. Tsoukalas (2006) defende que o método pode ser aplicado a muitas situações e a grupos grandes ou pequenos, inclusive por aqueles pesquisadores de interesse qualitativo para completar observações participantes e entrevistas. Nas associações livres, é distinguido e privilegiado o processo de geração de palavras e frases, o objetivo do método é produzir associações significativas, capazes de captar o conteúdo semântico de uma representação social, a organização de seu conteúdo e seu núcleo central. A primeira parte do procedimento consiste em um mapeamento do conteúdo semântico, uma única palavra é dada aos participantes que precisam associar uma quantidade determinada de novas palavras a ele. A segunda parte da pesquisa investiga as ligações entre os componentes semânticos de uma representação social, a partir do agrupamento e nomeação das associações realizadas. Por último, as características básicas da representação e seu núcleo central são identificados através de hierarquização entre palavras mais e menos característica da representação social.

Este é um método muito comum aos estudos psicanalíticos, onde a análise de associações livres é uma técnica bem conhecida para a investigação de conteúdos inconscientes. Para Wachelke (2014), embora a associação livre seja um dos métodos na investigação de conteúdos representacionais, ele argumenta que este método não informa

diretamente sobre a natureza das relações que os elementos representacionais mantêm com o objeto social. Nesse sentido, apresenta a Questionário Qualitativo para a Identificação de Cognemas (Qualiquic) como um método de análise de representação sociais mais simples e profundo em relação às associações livres. A Qualiquic baseia-se no quadro do modelo esquemas cognitivos básicos (SCB) em que reúne os conteúdos representacionais através de suas relações com o objeto de representação, estas associações são classificadas em três categorias: Descrição, Praxis e avaliação. A partir deste método é possível a caracterização lexicográfica, funcional e de valores e julgamentos contidos numa representação social. Muitas outras perspectivas metodológicas são utilizadas para análise de representações sociais. Ferrara e Friant (2015) propõe a aplicação de uma multimetodologia que dialogue quatro métodos de análise, que são: a análise prototípica, a análise de similaridade, o controle de centralidade e a análise temática das questões abertas. A diferença desta aplicação de métodos é sua implementação prática, o uso de questionários e outros aportes que dinamizam a aplicação. Também se diferencia pelo uso de ferramentas utilizadas para o processamento de dados que combinam aspectos quantitativos e qualitativos. Os resultados dessa abordagem metodológica permite a reunião rápida de corpus eficientemente rico para permitir a transformação dos dados em análise qualitativa das representações.

Dos modelos metodológicos apresentados, optamos por uma abordagem mais próxima à proposta de Jodelet. Ao utilizar diferentes instrumentos de coleta de dados, conseguiu se aproximar das relações, práticas e conflitos do cotidiano que rodeia a representação. Através de três direções, que são: Quem sabe, e a partir de onde sabe? O que e como se sabe? Sobre o que se sabe, e com que efeito se sabe?, Jodelet (1993) considera ser possível revelar as condições de produção e de circulação das representações sociais, os processos e os estados das representações sociais e o estatuto epistemológico das representações sociais.

A partir de diferentes ferramentas de coleta qualitativas, pretendemos traçar informações mais gerais sobre a interação e circulação de representações sobre o patrimônio cultural. E em um nível mais específico, através dos discursos de alguns moradores, identificar o conteúdo destas representações – a partir dos eixos diretivos proposto por Jodelet – e localizar como estas representações estão articuladas dentro de uma estrutura desigual e hierárquica a partir de uma abordagem heurística do conceito de campo de Bourdieu sobre as relações, interesses e valores que envolvem estas representações sociais. Esta abordagem visa adicionar uma localização histórica e política das representações de modo a desenvolver o aspecto social para além dos referenciais partilhados socialmente. Tal localização é

fundamental para a compreensão da funcionalidade e eficácia social das representações na assimetria dos processos de comunicação social (XAVIER, 2002).

A Representação Social pode ser concebida como mais um caminho para análises sociais, sendo utilizada para a compreensão dos fenômenos sociais e do impacto desse conhecimento produzido nas interações, pois são um modo de conhecimento sociocêntrico, ou seja, que parte das necessidades, dos interesses e desejos dos grupos sociais (OLIVEIRA, 2003). E apesar de algumas lacunas que a Teoria das Representações Sociais apresentam para uma abordagem sociológica, como menciona Oliveira (2003) e Spink (1993), é uma teoria fundamentalmente com pressupostos sociais. Nesse sentido, apresenta a necessidade de utilizar uma outra teoria social que suporte e complemente seus dois processos (ancoração e objetivação), localizando histórica e socialmente, ou seja, os elementos relacionais e estruturais – onde o sujeito se situa e se posiciona – das representações sociais.

No documento annelizifermino (páginas 43-48)