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Moacir Medeiros de Sant’Ana, maceioense nascido em 1932, foi o primeiro diretor do Arquivo

Público de Alagoas, inaugurado em 1961. Ficou conhecido como bibliófilo por ter conseguido reunir a maior coleção de livros de autores alagoanos publicados no Brasil e fora do país (em 1962 seu acervo atingiu a casa dos 1000 exemplares). Suas várias publicações sobre a história de Alagoas se destaca por beber dessas fontes primárias.

Figura 15 - Fotografia da capa do livro Zefinha pertencente ao acervo de Moacir Sant’Anna. Fonte: acervo da pesquisa Ver a Cidade, 2013.

Quadro 4 - Fotografias presentes do livro

Zefinha.

A narrativa toda é muito interessante, primeiro porque ele escreve de forma muito fluida e envolvente, engraçada até. Segundo porque, mesmo que ele não traga fatos reais, ele nos fala dos aspectos da sociedade, incluindo inclusive, os assuntos que se discutiam à época e o próprio cotidiano da cidade.

Podemos perceber, a partir também da maneira que escreve, que Lavenère foi uma figura muito crítica. Ele nos conta dos seus ideais e propósitos, dos assuntos com os quais se envolveu. Tudo isso dá conta de um pouco da sua personalidade, que começa a se desenhar para mim a partir de suas entrelinhas.

- A terra é nossa. A propriedade é um roubo! Falou Silveira. [...] A terra nunca foi producto do trabalho do homem. Só o producto do trabalho é que pode constituir objeto de propriedade. (LAVENÈRE, 1921a, p. 18)

- Certamente! A photographia é um “processo” de que pode se servir o artista para produzir uma obra d’arte. (LAVENÈRE, 1921a, p. 19, grifo nosso)

- É por isso que vamos muito mal... Um Francez, um Inglez, não sabe muitas vezes si existe o Brasil: em compensação conhece perfeitamente tudo do seu paiz. Um brasileiro ignora tudo do seu paiz e sabe os nomes de quanto lugarejo ha na Siberia e na China, a historia de Napoleão e de Carlos Magno e assim se julga instruido. (LAVENÈRE, 1921a, p. 96)

Tudo vai muito bem na sociedade, quando as apparencias podem enganar. A sociedade tolera tudo que se faça ocultamente: o grande crime é viver às claras. (LAVENÈRE, 1921a, p. 165, grifo nosso)

O primeiro destaque nas citações revela que ele se considerou um artista e, por consequencia, que suas fotografias seriam obras de arte. Talvez isso nos mostre um pensamento não só dele, mas da época em relação à técnica emergente que logo suscitou discussões sobre a sua feitura enquanto arte. O segundo destaque nos diz que Lavenère foi grande observador e crítico da moral e dos bons costumes. Provavelmente aquela pessoa que batia de frente com o que considerava errado.

Se levarmos em conta que o romance enfatiza os aspectos vividos e observados por um nativo, profundo conhecedor de Maceió, e não por um visitante que talvez tivesse uma visão mais superficial sobre a cidade, faz sentido pensarmos que o subtítulo, na verdade, é que dá o tom que justifica a gravura na capa, ao retratar o autor como fotógrafo das cenas alagoanas, dos costumes e aspectos do lugar.

No artigo “A fotografia em Alagoas” publicado no primeiro volume da Revista do Arquivo Público de Maceió, em 1962, escrito por Moacir Sant’Ana e pelo próprio Luis Lavenère, vê-se ressaltado o seu pioneirismo no que diz respeito à introdução dos materiais fotográficos e de novas técnicas fotográficas no Estado e até da profissão de repórter fotográfico.

Nessa ocasião [em 1902] L. LAVENÈRE ainda não havia se projetado, na arte fotográfica, o suficiente para, na qualidade de amador, figurar ao lado dos que acabamos de mencionar. Contudo, já então vendia material fotográfico, de cujo comércio regular foi o pioneiro em Alagoas.

Com a facilidade de adquirir chapas, papéis e drogas, por êle oferecida, surgiram então outros amadores, [...].

Na Exposição Universal de Turim, em 1911, concorrendo com trabalhos fotográficos executados em porcelana, madeira e papelão, foi o único fotógrafo alagoano a obter medalhas cujos diplomas se encontram no Instituto Histórico de Alagoas.

(REVISTA DO IHGAL, 1962, p. 137-138, grifo nosso)

Em Alagoas a fotografia em cores também foi introduzida no ano de 1912, pelo fotógrafo amador Luiz Lavenère Wanderley. (L. Lavenère).

“A fotografia das cores naturais, - prossegue o noticiarista - onde sobressai o efeito da luz do sol sôbre o solo e o mar, com êsse brilho misterioso que o pincel dos mais afamados pintores não pôde ainda levar à tela, foi conseguida pelo hábil amador (L. Lavenère) em placas diretamente importadas da Europa. (grifo nosso, grifo do autor).

O prof. L. LAVENÈRE foi, indiscutivelmente, o primeiro repórter-fotográfico de Alagoas, como demonstra a sua coleção de fotografias, adquirida há pouco

pelo ARQUIVO PÚBLICO DE ALAGOAS, composta de quase trezentos e cinquenta negativos, inclusive alguns de aspectos desaparecidos, [...]. (REVISTA DO IHGAL, 1962, p. 138, grifo nosso)

O nome de L. LAVENÈRE está ligado a outro acontecimento relacionado com a história da fotografia em Alagoas: foi o proprietário do primeiro periódico ilustrado com fotogravura preparado totalmente em Maceió. A Conquista era o nome do citado periódico, cujo número inicial apareceu em 14 de março de 1920, saído das oficinas da Tipografia da Livraria Machado, de sua propriedade, a primeira, nesta capital, portanto, a possuir oficina própria de fotogravura. (REVISTA DO IHGAL, 1962, p. 139, grifo nosso)

A caricatura na capa daquele romance faz total sentido quando se pensa que o autor teria sido o primeiro a trazer para Alagoas as inovações da técnica fotográfica que estavam acontecendo em todo o mundo, no caso, a fotogravura compondo um livro. O primeiro trabalho desse tipo no estado, como citado, genuinamente maceioense, veio à luz em 1920, ou seja, numa data anterior e muito próxima à da publicação das novelas de costumes de Lavenère: as duas vieram a público em 1921. Percebe-se, portanto, a relevância do seu trabalho para a história da fotografia em Maceió. Ali, naquela capa, ele se coloca como esse profissional de fundamental importância que contribuiu diretamente em trazer a imagem da cidade (fosse ela visual ou escrita) para perto dos alagoanos. E também como pessoa observadora e atenciosa aos costumes da cidade. Talvez por isso Théo Brandão13 o tenha convidado para contribuir com uma série de livros que pretendia ressaltar os autores alagoanos.

Ao prof. Luiz Lavenère, já àquela época beirando os oitenta anos lúcido, sabedor, contemporâneo e atuante em vários sucessos da vida de nossa cidade, lembrei- lhe a possibilidade de nos dar um livro que se intitularia Maceió de Outrora. O prof. Luiz Lavenère prefere ouvir hoje suas maravilhosas coleções operáticas e nos contar os sucessos do fim de século passado e começos do atual, quando dirigiu o Evolucionista e editava Zefinha e O Padre Cornélio.

Diante do desprezo do prof. Lavenère pelo tema que lhe havia atribuído, Félix Lima Júnior tomou a si o encargo de escrever o Maceió de outrora, decisão para a qual nunca regateei aplausos e incentivos. É que sentia, desde então, a necessidade que tínhamos de deixar registrados para a prosperidade, os aspectos pitorescos, históricos e sociais da cidade. (LIMA JÚNIOR, 2014, p. 13, prefácio escrito por Théo Brandão em 1959, grifo do autor)

13 Theotônio Vilela Brandão, natural de Viçosa -