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PARTE I ENQUADRAMENTO TEÓRICO E CONCEPTUAL

I. Modelo da imunidade absoluta

Atualmente, sobre a questão da responsabilidade civil dos árbitros, nos países de common law, como é o caso dos Estados Unidos da América, assume- se que a teoria dominante é a da imunidade absoluta do árbitro83.

Os países anglo-saxónicos sublinham a posição superior do árbitro, afirmando, por outro lado, as semelhanças dos direitos e obrigações entre o árbitro e o juiz84. O árbitro «as contractually chosen substitutes for state or federal judges, performing functions analogous to those of a judge, and assuming similar responsibilities.»85. Assim, o que decide e prática durante um processo de arbitragem representa um ato quase-judicial, pois o árbitro resolve disputas entre as partes e toma decisões obrigatórias, exercendo assim também uma função quase-judicial, comparável ao exercido pelo juiz do tribunal estadual86. Como o juiz americano John Donaldson refere os «Courts and

arbitrators are in the same business, namely, the administration of justice. The only difference is that the courts are in the public and arbitrators are in the private sector of the industry. Their problems are the same and so should be the

solutions which they adopt»87, ambos se dedicam ao tratamento de litígios entre

as partes, em conformidade com a lei e, em última instância, à tomada de decisões vinculativas. Nos Estados Unidos da América, a arbitragem é                                                                                                                

83 Cf. BROWN, Jenny, Expansion of Arbitral Immunity: Is Absolute Immunity a Foregone Conclusion,

The, 2009 J. Disp. Resol. (2009), pp. 227 e segs.

84KLAUSEGGER, Christian, KLEIN, Peter, et al. (eds), Austrian Yearbook on International Arbitration,

2015, p. 321.

85HAUSMANINGER, Christian, Civil Liability of Arbitrators – Comparative Analysis and Proposals for

Reform, 1990, 7 (4) J. Int'l Arb. 7, 14.

86SCHWARZ, Franz e KONRAD, Christian, The Vienna Rules: A Commentary on International

Arbitration in Austria, 2009, 8-003 e segs.

87 Bremer Vulkan Schiffbau Und Maschinenfabrik v. South India Shipping Corporation Ltd [1981] AC

considerada como um dos meios jurídicos disponíveis no tribunal estadual, com o mesmo valor jurídico dos processos judiciais.88

Por forma a “guarantee decisional finality, to protect arbitral

independence and to facilitate the recruitment of arbitrators”89, ao árbitro é conferido a mesma imunidade, que é concedida ao juiz estadual. Assim, o Tribunal dos Estados Unidos da América concluiu que a «Arbitrators’ immunity

is essential to protect the decision-maker from undue influence and protect the decision-making process from reprisals by dissatisfied litigants. Because federal policy encourages arbitration and arbitrators are essential in furthering that policy, it is appropriate that immunity be extended to arbitrators for acts within the scope of their duties and within their jurisdiction».90 Isto é, neste contexto de domínio público, o árbitro possuí quase os mesmos privilégios e direitos que o juiz estadual, com base no princípio da imunidade judicial e em consideração da sua função jurisdicional.91

«The public policy reasons justifying the immunity were that it was of “great public importance” that arbitrators should be able to perform their functions “free from fear that disgruntled and possibly impecunious persons who have lost their cause or been convicted may subsequently harass them with litigation»92. Se um árbitro julgar, num ambiente em que prolifere o risco de ser responsabilizado, este pode tornar-se excessivamente cauteloso, e até mesmo chegar a ter medo de julgar, recusando-se a aceitar a sua nomeação, o que levaria a um declínio da qualidade da arbitragem93, o que é, obviamente, imprudente.

No Reino Unido, «It is well settled that judges, barristers, solicitors,

jurors and witnesses enjoy an absolute immunity from any form of civil action

                                                                                                               

88 Cf. SCHÜTZ, Hebert Mendes de Araújo, A utilidade da arbitragem como forma jurisdicional de

resolução dos conflitos, in “Âmbito Jurídico”, Rio Grande, XIV, n. 89, jun 2011. Acesso em: 2016-10-14,

disponível no site: <http://www.ambito-

juridico.com.br/site/?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=9582&revista_caderno=21>.

89 NOLAN, Dennis R. e Abrams, Roger I., Arbitral Immunity, 11 INDUS. REL. L.J., 1989, p.228, p.237,

p. 255.

90 Veja-se o acórdão Olson v. National Ass'n of Securities Dealers, 85 F.3d 381, 382-83 (8th Cir.1996). 91 Cf. NOLAN, Dennis R. e Abrams, Roger I., Arbitral Immunity..., 1989, p.238.

92 John Litton QC, The Liability of Arbitrators when Determing Land Premium Disputes, p.4 93 Cf. NOLAN, Dennis R. e Abrams, Roger I., Arbitral Immunity..., 1989, pp.253 e segs.

being brought against them in respect of anything they say or do in court during the course of a trial. It is of great public importance that they shall all perform their respective functions free from fear that disgruntled and possibly impecunious persons who have lost their cause may subsequently harass them with litigation.»94.

Como é óbvio, a adoção deste modelo tem por objetivo criar um ambiente jurídico amistoso, com vista a incentivar o desenvolvimento da arbitragem. Assim, o árbitro deve ser isento de responsabilidade, ao mesmo tempo que, as disposições aplicáveis à responsabilidade do juiz devem ser aplicadas analogicamente ao árbitro. Como refere Christian Hausmaninger, «arbitrators

should, just like judges be able to make their decisions independently and without the threat of a civil liability suit being filed against them by disappointed litigants.»95

Ainda assim, existe uma preocupação sobre a proteção dos interesses das partes, que diz respeito à imunidade judicial sem limitações, visto que o árbitro poderia apenas agir em função do seu interesse pessoal, colocando os interesses das partes numa situação inferior e desfavorável, causando potenciais prejuízos fruto desta sua atuação inadequada96. Por este motivo, o modelo da imunidade absoluta, tem sido alvo de diversas críticas, dado que não é capaz de solucionar a questão que envolve a isenção de responsabilidade civil do árbitro, concretamente, como se isenta esta responsabilidade e, ao mesmo tempo, se assegura a justiça no processo de arbitragem, no caso de incumprimento do deveres e obrigações do mesmo.

De qualquer modo, salienta-se que a imunidade do árbitro pode garantir a integridade do processo de arbitragem97. Repare-se que no caso em que um árbitro assuma toda a responsabilidade pelos erros cometidos, a parte vencida                                                                                                                

94 Sutcliffe v. Thackrah [1974] A.C. 727 at 757 per Viscount Dilhorne.

95HAUSMANINGER, Christian, Civil Liability of Arbitrators – Comparative Analysis and Proposals for

Reform, 1990, 7 (4) J. Int'l Arb. 7, 14.

96 Cf. FRANCK, Susan D., The Liability of International Arbitrators: A Comparative Analysis and

Proposal for Qualified Immunity, pp. 54 e segs.

97 Cf. Franck, Susan D., The Liability of International Arbitrators: A Comparative Analysis and Proposal

poderá abusar do direito a recorrer e, além disso, poderá livremente alegar o descuido do árbitro para exigir um novo julgamento contra a decisão original98.

A arbitragem como meio de resolução alternativa de litígios não serviria para economizar tempo e dinheiro.

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