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Modelo multidimensional de profissionalização da empresa familiar

2 Revisão da literatura e desenvolvimento das hipóteses 2.1 Valores Pessoais

2.2 Profissionalização na Empresa Familiar

2.2.1. Modelo multidimensional de profissionalização da empresa familiar

Dekker et al. (2013, 2015) procuraram suprir as inconsistências e limitações das investigações anteriores sobre a relação entre empresa e profissionalização e, nesse sentido aproveitaram as contribuições teóricas existentes para a criação de um constructo multidimensional sobre este tema. Em seus estudos nas pequenas e médias empresas familiares da Bélgica, através de um questionário, mediram as diferentes dimensões encontradas na literatura sobre profissionalização no contexto das empresas familiares. Com base numa análise fatorial exploratória, identificaram cinco diferentes dimensões da construção de profissionalização: (1) Sistemas de controlo financeiro; (2) Envolvimento não familiar em sistemas de gestão; (3) Sistemas de controlo de recursos humanos; (4) Descentralização de autoridade; e (5) Atuação efetiva de alto nível.

Sistemas de controlo financeiro – refere-se à utilização de sistemas de controlo financeiro como parte da profissionalização da empresa familiar.

Nos estudos são encontrados sistemas de controlo financeiro, tais como sistemas de orçamento, sistemas de planeamento e sistemas de avaliação de desempenho (García Pérez de Lema & Duréndez, 2007; Songini, 2006; Daily & Dollinger, 1993).

Trostel e Nichols (1982) enfatizam que o principal propósito para as empresas familiares adotarem políticas contabilísticas é a minimização de impostos em vez de ações estratégicas e as suas decisões de desempenho. Contudo, a introdução de sistemas de controlo financeiro formal pode não ser apropriada para empresas familiares (Stewart & Hitt, 2012), pois requer muitos desafios de coordenação, em que as empresas familiares, dependendo do estágio do ciclo de vida em que se encontra, podem falhar (Sayles & Stewart, 1995).

Em alguns estudos são encontrados resultados indicando que as empresas familiares tendem a confiar menos na utilização de sistemas de controlo financeiro do que em empresas não familiares (Daily & Dollinger, 1993; Pérez de Lema & Duréndez, 2007).

Dyer (1989) infere que as empresas familiares podem ter uma maior dependência de métodos de controlo informal, métodos que podem ter sido incorporados na empresa há anos, de acordo com o conhecimento tácito dos gestores e das equipas. Esse conhecimento tácito é uma característica típica de empresas familiares (Habbershon, 2006).

Com base nestas evidências, tem-se indícios de uma certa resistência das empresas familiares em adotar sistemas financeiros formais, principalmente as mais conservadoras, onde ainda é preferível a utilização de controlos informais de sistemas financeiros. Com base no exposto, formula-se a hipótese 1.

H1 – Os valores pessoais de conservação estão relacionados negativamente com a profissionalização

por meio da formalização total os sistemas financeiros nas empresas familiares.

Conforme referido anteriormente, o valor pessoal de ordem superior diametralmente oposto ao de conservação é a abertura à mudança (Schwartz, 1992, 1994), portanto, formula-se a hipótese 2 H2 - Os valores pessoais de abertura à mudança estão relacionados positivamente com a

profissionalização por meio da formalização total dos sistemas financeiros nas empresas familiares.

Envolvimento não familiar em sistemas de gestão – refere-se à profissionalização da empresa envolvendo o mínimo possível os membros familiares na gestão, incentivando a formação e a direção dos negócios por quadros de gestores externos à família. Dekker et al. (2013) encontraram estudos que buscaram justamente avaliar o nível de envolvimento de pessoas externas à família na gestão da empresa familiar como forma de profissionalizar (Astrachan, Klein & Smyrnios, 2002; Chittoor & Das, 2007; Sonfield & Lussier, 2009; Bennedsen et al., 2007; Gedajlovic et al., 2004; Klein & Bell, 2007; Lin & Hu, 2007; Zhang & Ma, 2009), especificamente o grau de envolvimento de membros do Conselho de Administração não pertencente a família proprietária da empresa, assim como a quantidade de conselheiros externos utilizados por essas empresas (Lane et al., 2006; Songini, 2006; Whisler, 1988; Yildirim-Öktem & Üsdiken, 2010).

Levando em consideração a literatura, sugere-se que o valor de ordem superior de abertura à mudança (AM) possa ser o mais propício a ter uma relação com este fator, devido ao fato de AM ser composto pelos valores de ordem inferior autodireção, estimulação e hedonismo e, portanto, indica que a pessoa que carrega estes valores esteja direcionada e estimulada à inovação, como por exemplo, a aceitação de pessoas não familiares atuando na gestão da empresa familiar. Assim, formula-se a hipótese 3 de investigação.

H3 – Os valores pessoais de abertura à mudança estão relacionados positivamente com a

profissionalização das empresas familiares prioritariamente com o envolvimento de pessoas externos à família.

Sistemas de controlo de recursos humanos – Esta dimensão compreende a utilização de sistemas formais de recrutamento (Van Den Berghe & Carchon, 2003; Kellermanns & Eddleston, 2004; Dyer, 2006), de treinamento (De Kok, Uhlaner & Thurik, 2006), de remuneração, de avaliação do desempenho (Schulze et al., 2001) e de reuniões formais das equipas de trabalho (Dyer, 1989). Pfeffer (1994) cita que as práticas de recursos humanos têm grande valor para as organizações. Para Dekker et al. (2015), o uso dos sistemas formais de recursos humanos pode ajudar as empresas familiares a superarem questões relacionadas ao nepotismo ou altruísmo familiar. Estes problemas são comuns no ambiente deste setor de empresas (Dyer, 2006; Kellermanns & Eddleston, 2004) e podem gerar conflitos de agência (Flamholtz & Randle, 2007).

Entretanto, pelos estudos evidencia-se a existência de problemas como o altruísmo e o nepotismo nas empresas familiares (Schulze et al., 2001; Steier, 2003), o que dificulta a adoção de mecanismos formais de recursos humanos (RH), demonstrando muitas vezes que por tradição, a adoção de sistemas informais de gestão, como o de recursos humanos, talvez ainda seja o melhor ajuste para determinadas empresas familiares, dependendo do seu estágio de ciclo de vida (Moores & Mula, 2000). Levando em consideração a certa relutância das empresas familiares mais conservadoras em adotar sistemas formais de recursos humanos, muitas vezes por questões de nepotismo ou altruísmo, formula- se a hipótese 4.

H4 – Os valores pessoais de conservação estão relacionados negativamente com a profissionalização

da gestão das empresas familiares através da formalização total dos sistemas de recursos humanos.

Novamente, seguindo a teoria de Schwartz (1992, 1994) o valor diametralmente oposto ao de Conservação é o de Abertura à Mudança e, portanto, formula-se a hipótese 5.

H5 - Os valores pessoais de abertura à mudança estão relacionados positivamente com a

profissionalização da gestão das empresas familiares através da formalização total dos sistemas de recursos humanos.

Descentralização de autoridade – A descentralização de autoridade está vinculada à confiança do proprietário/gestor da empresa familiar, quer seja esse o fundador ou da próxima geração familiar em depositar autonomia na tomada de decisões a outras pessoas, quer sejam membros da família ou não (Garcia, 2001; Freitas & Krai, 2010).

A confiança que os membros familiares do topo da gestão têm que depositar em terceiros para que as decisões sejam tomadas de forma mais eficiente e eficaz, nem sempre é visto com facilidade nas empresas familiares, pois uma de suas caraterísticas é a centralização de autoridade (poder) por parte dos gestores familiares (Muchon & Campos, 1998), tornando-se uma força impeditiva no caminho da profissionalização.

Chua, Chrisman e Bergiel (2009) enfatizam que nas empresas profissionalizadas, os empresários devem compartilhar autoridade com os gestores subordinados que precisam ser motivados para implementar a estratégia da empresa. Nesse sentido, descentralizar a autoridade e delegar a tomada de decisões é um processo importante de profissionalização da gestão (Dekker et al., 2015).

Levando em consideração as características encontradas nas empresas familiares, especificamente na dificuldade do gestor confiar a tomada de decisões a terceiros, sugere-se a indicação do valor de ordem superior de Conservação, o que permite formular a hipótese 6.

H6 – Os valores pessoais de conservação estão relacionados negativamente com a descentralização

Conforme já mencionado, como o valor de ordem superior diametralmente oposto ao de Conservação é o de abertura à mudança (Schwartz, 1992, 1994) a hipótese 7 é formulada.

H7 - Os valores pessoais de Abertura à Mudança estão relacionados positivamente com a

descentralização de autoridade como forma de profissionalizar a empresa familiar.

Atuação dos níveis do topo – Na literatura é salientado que a presença de um conselho ativo influencia a qualidade da tomada de decisão neste tipo de empresa (Gersick et al.,1999), pois se existir apenas um conselho para cumprir os requisitos legais, certamente não existirá um envolvimento real (Pieper, Klein & Jaskiewicz, 2008) podendo assim influenciar nas decisões no desempenho, medido pela frequência de reuniões existentes (Lipton & Lorsch, 1992; Jackling & JOHL, 2009; Hall & Nordqvist, 2008).

Também, a atuação efetiva da equipa de gestão revela-se como um fator importante no conselho da empresa familiar. Alguns estudos têm mostrado que a comunicação efetiva das equipas de nível superiores também influencia o desempenho da empresa (Barrick et al., 2007; Campion, Medsker, & Higgs, 1993; Hyatt & Ruddy, 1997). Os agendamentos de reuniões regulares aumentam a comunicação de gestão interna (Flamholtz & Randle, 2007) fazendo com que as equipas de gestão tenham uma comunicação mais efetiva, melhorando o desempenho de equipa (Hyatt & Ruddy, 1997), assim como a formulação e implementação das estratégias (Raes et al., 2011). Dekker et al. (2015) reforçam a importância de uma certa formalização e frequência das reuniões, quer as dos conselhos de governança quer as das equipas gerenciais.

Sob este contexto, pode-se fazer uma reflexão sob a ótica do valor de ordem superior de autotranscendência, que sugere os interesses coletivos e mistos, assim como, o valor de ordem contrária (autopromoção). Relativamente ao primeiro caso, espera-se que gestores que são motivados pelos valores de universalismo e que, portanto, visam o bem-estar coletivo, assim como o valor de benevolência, remetendo a preservação do bem-estar das pessoas mais próximas, julguem importante a atuação dos níveis do topo da empresa familiar perante os demais colaboradores. Por outro lado, gestores que carregam consigo valores individualistas como poder e realização, podem não dar importância para uma atuação mais efetiva dos níveis do topo com demais partes interessadas na empresa familiar e que fazem parte da gestão. Face a esta argumentação, formula-se a hipóteses 8. H8 – Os valores pessoais de autotranscendência estão relacionados positivamente com a

profissionalização da empresa familiar por meio da atuação efetiva de alto nível.

Da mesma forma tem-se o valor de ordem superior autopromoção em sentido diametralmente oposto ao valor de Autotranscendência (Schwartz, 1992, 1994), neste sentido, propõe-se a hipótese 9.

H9 - Os valores pessoais de autopromoção estão relacionados negativamente com a profissionalização da empresa familiar por meio da atuação efetiva de alto nível.

2.2.2 Ampliação do modelo multidimensional de profissionalização da empresa