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Capítulo 3 – FUNDAMENTOS TEÓRICOS E REVISÃO BIBLIOGRÁFICA

3.6 Modelos cinéticos de inativação enzimática

A fim de otimizar os processos térmicos aplicados para a inativação enzimática, é essencial estabelecer o modelo de cinética de inativação das enzimas em questão. A principal informação para a construção da curva cinética de inativação é a atividade enzimática (A) medida em diferentes intervalos de tempo; esta é determinada como a taxa de reação da enzima em condições específicas (Polakovič e Vrábel, 1996).

Considerando a possibilidade da presença de isoenzimas no início do processo de inativação, os modelos cinéticos aplicados na literatura estão baseados em diferentes mecanismos: primeira ordem, reações em série e paralelas. A Tabela 3.6 apresenta diversos modelos de inativação térmica enzimática (Chen e Wu, 1998; Rudra Shalini, Shivhare e Basu, 2008; Weemaes et al., 1998).

Tabela 3.6 – Modelos cinéticos de inativação enzimática.

Eq. n° Modelo Equação

(3.1) Primeira ordem ln(A/A0) = -k.t

(3.2) Isoenzimas distintas A/A0 = AL.exp(-kLt)+AR.exp(-kR.t)

(3.3) Duas frações A/A0 = a.exp(-kL.t)+(1-a).exp(-kR.t) (3.4) Multicomponente de 1ª

ordem

A/A0 = [exp(-k1.t)+r.exp(-k2.t)] (1+r)

(3.5) Conversão fracionária A/A0 = Ar+(A0-Ar).exp(-k.t) (3.6) Distribuição de Weibull A/A0 = exp(-b.tn)

(3.7) nésima ordem A/A0 = [A01-n+(n-1).k.t]1/(n-1)

(3.8) Séries A/A0 = α2 + [1 + (α1k1/k2-k1) – (α2k2/k2-k1)]exp(-k1.t) – [(α1k1/k2-k1) – (α2k1/k2-k1)] exp(-k2.t)

(3.9) Etapas consecutivas A/A0 = [A1 – A2(k1/k1-k2)]exp(-k1.t) + A2(k1/k1-k2)exp(-

k2.t)

A representa a atividade enzimática no tempo t, A0 é a atividade enzimática inicial (no tempo zero) e

k é uma constante, a taxa de degradação a uma dada temperatura.

A grande maioria dos autores adota o modelo de primeira ordem para descrever a inativação enzimática, que se baseia no pressuposto de que a ruptura de uma simples ligação ou de uma estrutura é suficiente para inativar a enzima; sabe-se, no entanto, que o processo é muito mais complexo (Corradini e Peleg, 2004; Fujikawa e Itoh, 1996; Ladero, Santos e García-Ochoa, 2006). De acordo com Gardossi et al. (2010), a inativação de um biocatalisador, raramente, segue precisamente a cinética de primeira ordem. A inativação enzimática foi apresentada como um mecanismo complexo que consiste em várias etapas unimoleculares consecutivas, conduzindo de uma forma nativa a uma forma final (ativa ou inativa) através de um ou mais intermediários ativos (Augusto et

al., 2015; Mozhaev e Martinek, 1982; Polakovič e Vrábel, 1996). Entretanto, sugere-se que, no caso

de um processo de inativação aparentemente de primeira ordem, um dos sete fenômenos causadores de inativação enzimática (descritos na seção 3.4.3) tenha predominância sobre os outros. Se várias reações ocorrem em uma taxa similar, espera-se uma cinética de inativação complexa, que não seja de primeira ordem (Van Loey et al., 2003).

É importante notar que, no contexto de inativação enzimática, o conceito de ordem da reação é puramente empírico e não fornece uma informação sobre o mecanismo da reação. Este procedimento fornece um modelo que descreve a cinética de uma reação, mas o modelo não deve,

necessariamente, ser interpretado como representante do mecanismo real da reação (Van Loey et

al., 2003).

Para o modelo de isoenzimas distintas, Weemaes et al. (1998) sugeriram que a perda de atividade da enzima pode ser descrita pela soma de dois decaimentos exponenciais, um para a enzima termolábil (índice L) e outro para enzima termo-estável (índice R). Van Loey et al. (2003) descreveram o modelo como contendo diversas isoenzimas, podendo ser divididas em duas (ou mais) frações com diferentes estabilidades no processamento, ou seja, uma mais termorresistente do que outra, e ambas inativadas de acordo com um modelo cinético de decaimento de primeira ordem. A taxa constante de inativação da fração lábil (valor de kL), a taxa constante de inativação da fração estável (valor de kR) e a atividade de ambas as frações podem ser estimadas usando análise de regressão não linear a partir do gráfico da atividade residual em diversos intervalos de tempo (Van Loey et al., 2003).

O modelo de duas frações foi apresentado por Chen e Wu (1998) que hipotetizaram que as amostras de extratos vegetais têm várias isoenzimas que podem ser separadas em dois grupos, um mais termorresistente do que o outro, e ambos inativados termicamente de acordo com a cinética de degradação de primeira ordem. O coeficiente a representa a atividade da fração da isoenzima termolábil em relação à atividade enzimática total.

Segundo Fujikawa e Itoh (1996), o modelo multicomponente (ou multifração) de primeira ordem é expresso como a soma da cinética dos seus componentes. Supõe-se que cada componente segue uma inativação de primeira ordem durante o aquecimento. Este modelo tem sido estudado principalmente para a inativação térmica de enzimas que consistem de isoenzimas com diferentes estabilidades térmicas.

A conversão fracionária se refere a um processo de inativação de primeira ordem que leva em conta a atividade enzimática diferente de zero após aquecimento ou pressurização prolongado(a) devido à presença de uma fração de enzima extremamente resistente ao calor (Ar - atividade quando o sistema alcança o equilíbrio) (Rizvi e Tong, 1997; Rudra Shalini et al., 2008; Van Loey et al., 2003). Isso significa que somente a fração lábil é inativada, enquanto que a atividade da fração estável (Ar) não muda ao longo do tempo; esta atividade diferente de zero pode ou não ser uma função da temperatura e da pressão aplicadas. A taxa constante de inativação (valor de k) e a atividade que permanece após tratamento prolongado (valor de Ar) podem ser estimadas, usando análise de regressão não linear ao se plotar a atividade residual versus tempo (Van Loey et al., 2003).

O padrão de distribuição de Weibull é baseado no pressuposto de que, sob as condições examinadas, a taxa momentânea de sensibilidade térmica ao calor depende apenas da intensidade

de aquecimento transiente e da atividade residual, sendo independente da taxa à qual a atividade residual foi atingida (Peleg e Penchina, 2000). A distribuição de Weibull é de fato um modelo estocástico, suficientemente flexível, levando em conta a inativação da enzima em diferentes condições de processamento. Conforme visto na Equação 3.6 da Tabela 3.6, a distribuição de Weibull é caracterizada por dois parâmetros b e n, sugerindo uma degradação contínua da enzima. O valor de

n determina a forma da curva de distribuição, enquanto b determina o seu dimensionamento,

representando a taxa da reação. Consequentemente, b e n são os chamados fatores de escala e de forma, respectivamente (Hutchinson, 2000; Rudra Shalini et al., 2008). Segundo Peleg (2003), valores de n maiores do que 1 indicam que a curva de sobrevivência semi-logarítmica possui concavidade voltada para baixo. Para os valores de n abaixo de 1, a concavidade voltada para cima (fenômeno de cauda, ou tailing phenomena em inglês) pode ser inferida como uma indicação da presença de uma fração da enzima extremamente resistente ao calor.

No modelo de nésima ordem, como o nome já diz, n é a ordem da reação que pode ser variável (Rudra Shalini, Shivhare e Basu, 2008). Nesse caso, a taxa constante de inativação k recebe a unidade Un-1min-1 (Chakraborty, Rao e Mishra, 2015). O modelo de séries se baseia numa sequência de duas etapas irreversíveis de primeira ordem: a conversão da enzima nativa (E) para um intermediário (EI) com menor atividade específica; e a conversão subsequente do intermediário para uma forma de enzima inativa (ED) (Henley e Sadana, 1985).

O modelo de duas etapas consecutivas é baseado na reação de duas etapas irreversíveis sucessivas de primeira ordem: uma conversão irreversível da enzima nativa a uma intermediária com atividade específica menor; e a subsequente conversão irreversível da forma intermediária a uma forma inativa da enzima (Augusto et al., 2015; Van Loey et al., 2003). As taxas constantes de inativação k1 e k2 e a atividade de ambas as frações podem ser estimadas usando análise de regressão não linear através do gráfico da atividade residual em diferentes intervalos de tempo ao longo do tempo. k1 e A1 se referem à primeira etapa, e k2 e A2, à segunda etapa (Van Loey et al., 2003).