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3. FORMAÇÃO CONTINUADA E DESENVOLVIMENTO PROFISSIONAL DOCENTE:

3.2. A escola: espaço de formação continuada

3.2.1. Modelos de docência

A prática dos professores pode ser classificada de acordo com alguns modelos, influenciados pelos sistemas econômicos e políticos que, conforme Santos (2009, p. 67) podem repercutir de forma decisiva na organização dos sistemas educativos, nas políticas educacionais, na formação de professores, e no desenvolvimento do trabalho docente.

Os processos de FC, desenvolvidos nas escolas, são planejados esperando que os professores atuem de determinada forma, com relação aos espaços, recursos e tempos escolares. Assim, encontramos na obra de Contreras (2002) uma sistematização de três modelos de docência, bem como a discussão sobre a autonomia como elementos fundamentais para o desenvolvimento do ensino pelos professores.

3.2.1.1. O professor como profissional técnico

Ao tratar do professor como técnico Contreras (2002), assim como Schön (2000), confirma que o modelo dominante em termos de formação de professores por muito tempo foi o da racionalidade técnica, consistindo na solução instrumental de problemas mediante a aplicação de conhecimentos teóricos e técnicos.

Esta concepção teve origem nos anos 70, quando a educação foi impactada pelos conhecimentos científicos advindos da psicologia comportamental e da tecnologia educacional. A ênfase era a formação técnica dos professores e especialistas da educação cuja prática baseava-se na definição de objetivos, seleção de conteúdos, estratégias de ensino e avaliação (SANTOS, 2009, p. 68).

Este modelo concebe o profissional da docência como aquele que soluciona problemas instrumentais, por meio da seleção de meios e aplicação de teorias e técnicas derivadas do conhecimento científico. Contudo, atualmente, os problemas da prática se dão de forma cada vez menos determinada. Cada profissional procura encontrar soluções tendo por referência os seus antecedentes disciplinares, histórias de vida, interesses (SCHÖN, 2000, p. 15).

Os processos de formação continuada baseados nesta concepção de docência visam a análise e diagnóstico dos problemas da prática e buscam encontrar meios para solucioná-los, por meio de conhecimentos da ciência aplicada (Contreras, 2002, p. 91). Esta concepção de docência ressalta a ideia de separação entre a teoria e a prática, valorizando a produção de conhecimentos teóricos produzidos nas Universidades, e considerando que a prática é o espaço de aplicação da teoria. A escola se vê como a receptora dos conhecimentos pedagógicos e os professores como meros executores de técnicas e procedimentos produzidos por especialistas.

Concordamos com Santos (2009, p. 70) ao afirmar que essa ideia, ao sustentar os processos formativos de professores e a organização escolar, desconsidera o trabalho docente como prática social, bem como desvaloriza os professores quanto à sua capacidade de identificar e relacionar os aspectos como as políticas educacionais, as formas de gestão escolar, as relações profissionais e a formação profissional.

Consideramos que a FC na escola precisa ter o ensino e a aprendizagem como finalidade, além de oportunizar espaços para que os docentes discutam sobre

as situações que possam levar os alunos a aprender e interpretar criticamente o mundo em que vivem, contribuindo para a superação do modelo técnico de formação.

3.2.1.2. Professor como profissional reflexivo

O modelo enunciado por Contreras (2002) que se opõe a da racionalidade técnica é o que considera o professor como um profissional reflexivo. Fundamentada em Schön, essa concepção de docência entende o professor como um indivíduo que reflete sobre a finalidade de sua ação e questiona os elementos da estrutura organizacional onde desempenha sua função, extrapolando o caráter instrumental ou pragmático do cotidiano de trabalho.

O profissional reflexivo diante de uma situação problemática em sua prática pedagógica repensa o processo de conhecer-na-ação e vai além das regras e teorias, elaborando estratégias, ou formas diferenciadas de conceber o problema e testar suas novas compreensões. Essa visão da reflexão-na-ação de acordo com os estudos de Contreras (2002, p. 108) está fundamentada numa visão construcionista da realidade, e considera o professor como um “pesquisador no contexto da prática” capaz de analisar criticamente suas práticas e buscar meios para aprimorar a sua atuação.

Essa concepção de docência considera que os conhecimentos mobilizados pelos professores podem ou não ser sistematizados pelas pesquisas acadêmicas. Neste ponto, concordamos com Santos (2009, p. 74) ao destacar que para resolver os problemas os docentes devem problematizá-los à luz das teorias já consolidadas no campo educacional. Desta forma, poderão dispor de outros argumentos teóricos e práticos para confrontarem com suas situações de trabalho, transpondo a reflexão situada apenas na sua realidade de sala de aula.

O processo de formação de um profissional reflexivo exige a superação do modelo fundamentado nos princípios da racionalidade técnica, uma vez que essa perspectiva está centrada na dimensão instrumental da ação docente, e não se constitui como possibilitadora de posturas reflexivas diante das diferentes situações que emergem na sala de aula.

Tendo em vista ampliar essa discussão apresentamos a seguir a concepção de professor como intelectual crítico que segundo Giroux (1997) aponta avanços em

termos de reflexão crítica sobre suas situações de trabalho, transpondo os contexto da sala de aula.

3.2.1.3. O professor como intelectual crítico

Outro autor a quem nos reportamos para tratar da concepção de docência é Giroux (1997) por meio da defesa da ideia de professor como um intelectual reflexivo, cujo trabalho é uma tarefa intelectual de compreender o ensino, opondo-se à racionalidade técnica. Neste viés, para desempenhar o seu papel no sentido de uma transformação social o docente tem de proporcionar situações pedagógicas e reflexivas que proporcionem aos alunos a construção de um conhecimento crítico sobre as estruturas sociais.

Giroux (1993, p. 158) entende que as formações que se baseiam em uma abordagem tecnocrática de treinamento, onde o professor é receptor do conhecimento elaborado por especialistas, implicam na proletarização do trabalho docente, e, em nossa opinião, não contemplaria a função social do ensino.

A concepção de professor como intelectual crítico opõe-se às formações baseadas em soluções imediatistas e genéricas, em que formadores externos são convidados a darem respostas aos problemas dos diferentes contextos educacionais. Pelo contrário, essa concepção entende o professor como transformador, que constrói de forma autônoma o seu trabalho, e se dedica a pensar as questões que vivencia em sua prática docente.

Este modelo de docência evidencia a importância da escola propiciar um projeto institucional de FC que leve os professores a levantar questões sobre os princípios que fundamentam os métodos didáticos, técnicas de pesquisa e as teorias da educação, sem se restringir a aprender o “como fazer”, o que “funciona” ou o domínio de ensinar um dado corpo de conhecimentos (GIROUX, 1997, p. 159).

Tendo por base os autores acima indicados, entendemos que os processos formativos que visam o treinamento dos docentes, tendo por cerne a racionalidade técnica e a aplicação de modelos pedagógicos generalizados que solucionariam todos os problemas da sala de aula, se configuram como uma descontinuidade no processo de formação do professor. Por sua vez, a concepção de docência que vê o professor como um profissional reflexivo ou intelectual crítico, precisa partir de um diagnóstico da realidade vivenciada pelos professores e tê-los com sujeitos

autônomos, com responsabilidade moral e social, capazes de pensar sobre a sua ação pedagógica, e compartilhar ideias num processo coletivo e construtivo, em que opiniões e valores sejam respeitados, e o individualismo e resistência superados. Estas seriam condições importantes para a qualificação do trabalho docente e realização de FC com vista à transformação das instituições de ensino e reflexão critica sobre o desenvolvimento da tarefa educativa.