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1.2. Relações históricas e as imagens sobre a mulher no Brasil

1.2.2 A era dos modelos flexíveis

Pinsky (2012) aponta alguns fatores como importantes para a mudança da condição da mulher até então. Vejamos quais são eles. O currículo, que começou a se equiparar entre os gêneros e aumentou a chance de melhor concorrência à uma vaga universitária. A migração para a cidade e a urbanização foi outro fator. Elas permitiram o maior intercâmbio de cultura, possibilitando mudanças de comportamento. E também o fato de as mulheres passarem a ter mais acesso à

informação. Em 1949, Beauvoir lança O segundo sexo, afirmando que a mulher

aprende a ser mulher e não nasce com as suas atribuições.

Entre 1960 e 1970, os jovens urbanos estudavam juntos, trabalhavam juntos e faziam festas juntos. Faziam festas em apartamento, frequentavam bares, andavam em grupo... Seus comportamentos estavam mudando. Tornavam-se mais transgressores e mais críticos em relação aos costumes estabelecidos.

As jovens que andavam nesse meio, que estavam inseridas nessa conjuntura,

tinham comportamentos pioneiros. Usavam minissaias, calça jeans, biquíni e

iniciavam uma série de reflexões e questionamento quanto à sexualidade feminina. São exemplos de questões referentes a este tema: discriminação sexual, amor livre, relacionamento aberto e obrigatoriedade da virgindade.

Com a chegada do anticoncepcional, diminuiu-se o risco de gravidez e abriu-se o espaço para polêmicas como a necessidade de integridade física antes do casamento (virgindade) e a dupla moral para homens. Começou-se a questionar a necessidade do casamento para haver sexo. Outro fato significativo foi a busca por prazer, visto como um direito da mulher e não mais como uma mancha na sua reputação.

Mantinha-se a distinção entre as mulheres que eram “respeitáveis”, “puras”, “para casar” e “construir família” e as que eram “desonráveis”, “para diversão” e “satisfação sexual”. As relações foram mudando, aos poucos, gestos de carícias foram permitidos.

As informalidades foram tomando espaço nos relacionamentos, São exemplos disso: o flerte mais direto, em que a moça demonstrava mais desejo e atração; o fato de não necessariamente se pedir em namoro ou a autorização dos pais; os beijos, os abraços e as mãos dadas em público – estas não eram mais atitudes que precisamente ofenderia a “honra” da moça e de sua família (ela ainda precisava de “honra”, isso era significantemente valorizado); e, por fim, as jovens passaram a seduzir, tornaram-se mais espontâneas e autênticas.

O sexo antes do casamento passou a se tornar uma realidade. Noivos viam nisso a oportunidade de testar a compatibilidade sexual, de se evitar traumas femininos e evitar que homens buscassem a prostituição. O sexo casual foi visto como uma extensão natural da atração entre duas pessoas sem necessariamente ter a obrigação do vínculo. Hippies e alguns intelectuais apoiaram essa ideia, mas na mídia, ainda não havia alguém que representasse esse ponto de vista e mesmo alguns se aproveitaram dessa ideia para ter sexo, mas ainda atribuindo sentidos negativos a mulher que praticava esse tipo de atividade sexual.

Pinsky (2012) explica que se buscavam direitos iguais entre homens e mulheres em relação ao sexo. O movimento hippie preconizava a ideia de não posse sobre o outro e era avesso à ideia de família tradicional porque seria sinônimo de hipocrisia. Além disso, era também a fase do Rock and roll e das perseguições às uniões partidárias. Tudo contribuiu para o desenvolvimento do sexo sem compromisso.

Em 1970 houve um crescimento do movimento feminista. Donas do corpo, mulheres reivindicavam o direito de ter prazer sexual, de engravidar quando quiser, se quiser, e pelo direito ao aborto. Isso abriu caminhos e modificou o modelo tradicional de mulher e da relação entre homem e mulher.

Revistas começaram a legitimar o novo modelo de mulher pois traziam reportagens com temas liberais em relação às mulheres. No cinema, mais imagens de mulheres sentindo prazer apareceram. Na TV, as relações, as imagens e os discursos foram mudando. Seriados trouxeram mulheres com iniciativa. A internet e o vídeo cassete permitiram acesso a cenas de sexo. As revistas discutiam o que é melhor. Dão dicas, espaço para bate-papos, conselhos, debates. A estética e a saúde entram mais em cena. Propagou-se o autoconhecimento, o diálogo, o acordo e a satisfação própria. Houve a imagem de beijos e de erotismo dentro dos relacionamentos. Depois, cenas em quartos e camas, de casados ou não.

Os casais dos anos dourados tinham outras concepções para o casamento: igualdade e não hierarquia; direitos iguais, inclusive, sexuais; intimidade, confiança, fidelidade mútua; crescimento pessoal; realizações individuais e felicidade. Eles tinham mais diálogo quando comparados com casais de gerações anteriores.

A partir de 1970, o sexo tornou-se fator decisivo, igualou-se a importância do amor. Em 1977 o divórcio se tornou lei e já era possível observar uniões que se davam sem a oficialidade legal ou religiosa. O desejo de casar permaneceu, o que mudou foram as concepções atribuídas a ele. As realizações pessoais foram postas em primeiro lugar e não mais a social em si. Essa mudança de pensamento iniciou-se pela clasiniciou-se alta e média. E a imprensa foi acompanhando e legitimando essas tendências.

Começou-se a falar em parceria. Parceira era companheira do marido. Dividia com ele suas dimensões de vida. O novo tipo de casamento requeria que ele reconhecesse a realização pessoal e profissional da mulher e que esta ajudasse no desenvolvimento dos seus sentimentos. A infidelidade não foi aceita, mas era reconhecida e explica-se pelo temperamento ou frustrações. O adultério feminino era mal visto, mas admitido.

A igualdade de direitos pela constituição de 1988 também contribui para a equiparação entre gêneros.

Contudo, permaneceu a violência e a sobrecarga das tarefas domésticas para as mulheres, o que interferiu também no investimento da carreira. Mulheres também se achavam as únicas competentes para a criação dos filhos. Homens ainda se recusavam a fazerem tarefas domésticas, mas alguns já as faziam. Às solteiras, divorciadas ou viúvas foi permitida a atividade sexual e que fossem felizes e realizadas sozinhas.

Importantes mudanças no campo profissional ocorreram para as mulheres. O trabalho foi aceito e profissões antes estigmatizadas como trabalho de homens passaram a fazer parte do leque de possibilidades para o ofício feminino. A sua qualificação crescente permitiu que chegassem às chefias das empresas, que se tornassem empresárias e recebessem o reconhecimento de sua capacidade.

Atualmente, a imagem da mulher moderna, profissional, tem se feito em sobreposição à exclusivamente doméstica, do lar. O desejável é que a mulher concilie maternidade, vida profissional, conjugal e pessoal. Quanto à maternidade, o que, aos poucos, está mudando é a não necessidade de ser mãe para se ter valor.

Nota-se que, ao logo da história, várias imagens da mulher foram construídas. Podemos dizer que elas convergem ora para uma imagem mais tradicional e conservadora, ora para uma imagem mais moderna e libertária. A retomada histórica dos fatos sobre a mulher é importante para que se compreenda de que maneira as relações sociais influenciam na constituição dessas imagens e determinam os sentidos que lhes são atribuídos.