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6.2 TRABALHOS RELACIONADOS

6.2.1 Modelos para o Ensino de ES

A ES tem sua utilidade reconhecida em grandes projetos, com grandes equipes e orçamentos. Assim, a aprendizagem da área não pode ficar limitada a pequenos projetos irreais, exageradamente simplificados e que ignoram questões de confiabilidade de funcionamento, custos, prazos e outros requisitos importantes (NUNES, REIS e REIS, 2010). No entanto, diversos trabalhos na área de ensino de ES destacam a dificuldade de utilizar por completo, em ambiente acadêmico, vários dos modelos utilizados na indústria, em virtude das particularidades e diferenças entre esses dois tipos de ambientes (RODRIGUES e ESTRELA, 2012) (GIMENES, 2015). Por outro lado, é imprescindível que os alunos façam uso das boas práticas no desenvolvimento de software e se preparem para o mercado, de acordo com as expectativas deste.

A fim de tratar esta lacuna entre as exigências de formação profissional na área de ES e as limitações do ambiente acadêmico para realização de projetos práticos de desenvolvimento de software, alguns pesquisadores definiram modelos pedagógicos que podem ser adotadas no ensino de ES. A partir desses modelos, os alunos desenvolvem as competências técnicas de maneira mais adequada, auxiliados pelos professores que atuam como tutores neste processo de aprendizado.

Gary (2008) propõe um modelo pedagógico que permite apresentar, praticar e aplicar as melhores práticas da indústria a fim de proporcionar uma aprendizagem mais contextualizada nos alunos. Esse modelo pedagógico possui um currículo flexível e centrado em projeto. O objetivo é integrar experiências contextualizadas de projetos com conceitos fundamentais de ES através de uma abordagem denominada Software Enterprise. Essa proposta foi maturada durante 9 anos de aplicação na Arizona State University Polytechnic, onde foram desenvolvidos os produtos de trabalho para apoiar a metodologia centrada em projetos (GARY et al., 2013).

A abordagem Software Enterprise emprega um modelo de aprendizagem que combina aula tradicional, atividades em grupo, aprendizagem centrada em problema (PBL), prática e reflexão. Inicialmente, os alunos realizam leituras técnicas da disciplina de ES. Em seguida, eles assistem a diversas palestras para criar consciência e compreensão e colocam os conceitos de aula em prática através de sessões de laboratório em grupo a cada semana. Por fim, os alunos integram as habilidades adquiridas durante

CAPÍTULO 6 – DISCUSSÕES 136 o processo para o projeto de software da disciplina de ES, refletem sobre essa rápida experiência de aprendizagem, e se envolvem em grupos de discussão sobre as lições aprendidas. Esse modelo pedagógico é apresentado na Figura 20.

Figura 20 – Modelo Pedagógico da Abordagem Software Enterprise

Fonte: Adaptado de Gary (2008).

Por exemplo, considerando os tópicos de Gerência de Configuração (GC). Os conceitos de GC como itens de configuração, padrões de branching (ramificações) e gestão de mudanças são apresentados em leituras de artigos, feita pelos alunos antes da aula. Durante a mesma semana, a GC é aprofundada via exercícios de laboratório na ferramenta CVS. Na semana seguinte, a GC é incorporada ao projeto prático da disciplina. Ao final de uma iteração de 3 semanas, as equipes devem escrever em uma wiki instruções para aplicação de técnicas no projeto e uma avaliação do quão bem a abordagem funcionou.

Esse modelo busca facilitar a compreensão através da aplicação de conhecimento e, consequentemente, preparar melhor os graduandos para o mercado de trabalho (GARY et al., 2013). Além disto, esse modelo baseia-se no ciclo de aprendizagem de Kolb (1984) apresentado na Subseção 2.4.3 - A.

Gary (2008) destaca que o acoplamento entre o conhecimento adquirido e as habilidades práticas aplicadas nas tarefas do processo leva à compreensão mais rápida e

CAPÍTULO 6 – DISCUSSÕES 137 a uma aprendizagem mais profunda do que o modelo tradicional. O autor classifica esse modelo pedagógico como um “modelo iterativo centrado no aluno e facilitado por um instrutor”. No entanto, reforça que utilizar uma metodologia de ensino/aprendizagem altamente iterativa coloca uma grande responsabilidade sobre os instrutores/facilitadores. Exercícios práticos para aprendizagem centrada no problema devem ser construídos. Os facilitadores devem determinar a quantidade correta de orientação e apoio que devem fornecer às equipes dos projetos que viabilize a aprendizagem sem gerar forte influência nas atividades, desviando os alunos de encontrar por si mesmos o “caminho certo”. Por fim, Gary (2008) enfatiza que os instrutores devem repensar o modo como avaliam o aprendizado e como avaliam o relativo sucesso do projeto prático.

Quanto à avaliação, Gary et al. (2012) constataram em suas pesquisas que o mais importante é criar uma base conceitual duradoura pela qual novas experiências são assimiladas para aumentar a base de conhecimento pessoal do aluno de uma forma ordenada. Dessa forma, adotaram em sua abordagem de Software Enterprise mapas conceituais como uma técnica para avaliar a evolução da compreensão do aluno em relação ao conhecimento conceitual em Engenharia de Software. O protocolo de avaliação de mapas conceituais segue as seguintes etapas:

1. No início do semestre, os estudantes criam um mapa conceitual, referente a uma unidade de conhecimento, a partir de um template com os conceitos dessa unidade;

2. Os estudantes são instruídos a organizar os conceitos nos mapas da maneira que melhor reflita o seu entendimento sobre a unidade de conhecimento; 3. Ao final do semestre, os estudantes criam outro mapa conceitual, a partir do

mesmo template e das mesmas instruções. Eles não podem consultar o mapa criado no início do semestre.

Então, avaliadores especialistas criam mapas conceituais para cada unidade de conhecimento como gabarito. Em seguida, esses avaliam e ranqueiam os pré e pós-mapas dos alunos de acordo com esse gabarito. Assim, pode-se avaliar o quanto o mapa de um aluno se aproximou do mapa do especialista e a trajetória de aprendizado do aluno durante o semestre.

O modelo pedagógico de Gary et al. (2013) serviu como base para instrumentalização da abordagem iterativa do modelo proposto nesta tese. O referido trabalho auxiliou na definição das etapas, bem como na ordem de realização destas. Além

CAPÍTULO 6 – DISCUSSÕES 138 disso, adotou-se na avaliação de aprendizagem dos alunos, durante a realização do experimento controlado (ver Seção 5.3), a abordagem de mapas conceituais a fim de analisar a ordenação de conceitos dos alunos e a sua trajetória de aprendizado.

Apesar da contribuição, esse trabalho possui algumas limitações. Os autores não fizeram uma análise da correlação do conteúdo abordado pelo modelo com os currículos de referência da área. Isso faz com que não seja possível afirmar que se de fato o modelo aborda os tópicos da área de ES. Adicionalmente, o modelo é aplicado em uma disciplina específica, denominada Software Enterprise, e com o conteúdo focado em Linguagens de Programação, Algoritmos e Estrutura de Dados, Programação Web e Mobile.

O diferencial do modelo proposto nessa pesquisa consiste na adoção de tópicos dos currículos de referência considerados relevantes pelos professores entrevistados no survey (ver Seção 3.5). Assim, na instanciação do modelo, o professor poderá definir qual unidade de conhecimento de ES seguirá a abordagem iterativa (ver Subseção 4.4.1). Essa abordagem permite que o modelo possa ser aplicado em qualquer disciplina da área de ES.

Por fim, destaca-se que o modelo de Gary et al. (2013) não foi avaliado através de um método empírico de pesquisa. Sendo assim, ainda se realizou uma análise da eficiência da sua aplicação. O modelo apresentado nesta tese foi aplicado em 2 turmas de graduação, através de um experimento controlado, sendo os dados analisados de forma qualitativa e quantitativa.

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