• Nenhum resultado encontrado

Casa do Sol.

A casa oniricamente completa é a única onde se pode viver os devaneios de intimidade em toda a sua variedade. Nela se vive só, ou a dois, ou em família em toda a sua variedade. E em nossos sonhos da noite, há sempre uma casa onde vivemos só. Assim o exigem certos poderes do arquétipo da casa no qual se juntam todas as seduções da vida recolhida. (BACHELARD, 2003, p.81)

Ao longo da pesquisa, a casa de Hilda Hilst tornou-se cada vez mais presente. Pois, no exercício de dar voz ao que pela caminhada com Agda me encontrava, o cunho autobiográfico da escrita hilstiana, espelhava constantemente esta casa. Casa do Sol, casa corpo, Hilda-casa-Agda.

Figura 1421

Ai meu Senhorzinho, se me matam desaparece a casa de Agda- andorinha, essa extensão de mim, casa-golondrina de tua Agda, casa que não foi feita para morar mas para ser pensada, casa-caminho- morada existindo no de dentro de mim. Deveis pensar, Senhorzinho, que é insignificância ter Agda ao teu lado se aqui na terra ela é mais tua porque atormentada, se aqui na terra ela pode sonhar eternidade, e se existir eterna estando ao teu lado, nem sonha aparência [...] (HILST, 2002, p.116)

A partir de premissas advindas da fenomenologia de Goethe, vivenciei ao longo de quatro dias22 os arquétipos dos elementos da natureza na Casa do Sol,

com o objetivo de imergir no local onde Agda nasce. Dessa maneira, o interesse instalado inicialmente na pesquisa de pensar “por que as imagens força se potencializam no trânsito da literatura para a cena?”, acha nesta casa a materialização deste “entre”.

21 Foto disponível em:<http://eleusiana.blogspot.com.br/2012/07/casa-do-sol-dia-11-dia-12-dia-

13.html> . Acesso em 10 nov. 2016.

22 Primeira experiência nos dias 9 e 10 de outubro de 2016. Segunda experiência nos dias 14

Este trânsito claramente permeia não só os pólos conto e cena, pois nesta perquisa Agda é uma tríade: conto, cena e Casa do Sol. Portanto, isso traz a reflexão sobre os processos criativos a partir de imagens, mergulhados na intimidade de suas forças, que vai conectando diversas nuances com as quais os objetos imagéticos se ligam. A poises, dessamaneira, é um processo laboratorial intenso entre intimidade e dureza da matéria.

Diante o material a ser trabalhado (palavra, argila, corpo, papel, aquarela etc) a imaginação se dispõe, enquanto forjador de uma materialidade, atuante sobre a resistência que algo concreto tem em si. Neste sentido, os corpos poetas diante o conto Agda estão diante uma literatura, palavra escrita, com início, meio e fim; tal como ferreiros eles forjam, pois acreditam desta materialidade poder extrair algo além do que já está dado pela natureza, no caso, por Hilda.

Imagens do texto, como o pátio, o musgo da calçada de pedra, o Dante que dá forma a madeira e lá na casa a gente está no meio das formas de madeira que ele deu forma. [...] tem um tanto de imagem que aparece no texto, e que até então a gente vinha trabalhando... Eu como atriz tinha lá as minhas imagens e depois da experiência na Casa do Sol, essas imagens ganham novos contornos. Porque a casa está lá e muitas imagens do texto remetem à casa. Então, acho que são aspectos importantes e transformadores do trabalho de atriz, já que essa questão das imagens, de gerar imagens é uma boa parte do nosso trabalho. Dentro deste aspecto tem uma coisa individual, cada atriz com suas imagens e seu trabalho. Mas também a experiência na casa cria um campo comum de imagens. [...] campo comum imagético entre as três atrizes. (Trecho da entrevista com Alice Possani)

Simultaneamente, neste processo há o adentramento na intimidade da matéria. O contato com o conto foi só o primeiro passo para um universo imagético muito mais intenso, que se estendeu pelo mergulho em Hilda e na Casa do Sol, se convertendo em pura e intensa experiência de materialidade poética. A travessia pelo portal das imagens profundas pode propiciar aos processos criativos a contaminação entre corpos poetas e imagens, de modo que algo possa nascer, ampliar e/ou transformar.

. A Fenomenologia Goetheanística é um método que consiste em uma cosmovisão que dá diretrizes para contemplar, imaginar e intuir o mundo. Coloquei-me enquanto residente na Casa do Sol, a fim de abrir-me à escuta deste lugar, no qual Agda nasceu e onde os grupos de teatro Boa Companhia e Matula Teatro, compartilharam o espetáculo homônimo em março de 2011.

Figura 15

Foi uma das experiências mais incríveis que já vivi. Passamos o dia na casa [...] Preparamos o almoço na cozinha, com as louças da casa, almoçamos na mesa que fica bem do lado de fora da casa (no pátio) e nesse mesmo dia fizemos um

ensaio fotográfico pela casa.

Em minha memória tenho a imagem do “musgo da calçada de pedra” e o feixe de luz que atravessava a presença da umidade na pedra, tinha também um balanço que já não tem mais e recordo-me de Verônica, linda com seus cabelos soltos brincando feito criança nele... O abraço na figueira (famosa por realizar pedidos), nós três correndo pelo jardim da chácara, entre as árvores... a ferrugem no portão antigo que já não é mais a entrada principal da casa, o muro cor de rosa, já envelhecido com o tempo...

Quando encerramos o passeio e parte do ensaio fotográfico, os pés estavam sujos de barro, as três sentaram na fonte, ou em um poço “vazio coalhado de sapos e serpentes” e lavamos os pés... o pátio seria o palco da encenação e ali passamos horas a fio até o início da apresentação, no convívio dos cães, ajeitando detalhes do figurino... costurando botões, ainda que, como no texto de Agda “não foi para bordar que me fizeste assim”. (Trecho da entrevista com Melissa Lopes)

Figura 16

Para o método científico de Goethe, a observação do fenômeno tem por princípio a existência de unidade entre o sujeito observador e o objeto. Por exemplo, quando me coloco diante da figueira da Casa do Sol, a imagem, o cheiro, o peso, o tamanho, estão dentro e fora de mim, simultaneamente. Portanto, reconheço os elementos da natureza, porque estão dentro e fora de mim.

Em estado de observação, a partir dos meus sentidos físicos, que são portas de entrada, percebo os fenômenos e ao longo do tempo, constato que a Ideia/arquétipo/tipo que subjaz o fenômeno também se revela.

O tipo é algo inteiramente fluido, do qual derivam todos os gêneros e espécies particulares que se podem considerar como subtipos, tipos especializados. O tipo não exclui a teoria da descendência. Ele não contradiz o fato de que as formas orgânicas se desenvolvem umas das outras; é apenas o protesto racional contra a opinião de que a evolução orgânica transcorre meramente em sucessivas formas objetivas (sensorialmente perceptíveis). Trata-se daquilo que subjaz a toda essa evolução, estabelecendo a conexão nessa infinita variedade; é o interior daquilo que presenciamos como as formas externas dos seres vivos. (STEINER, 2004, p.90)

Esta observação investiga a Ideia comum entre o conto Agda, o espetáculo homônimo e a Casa do Sol, morada de Agda em seu mais amplo sentido. “A observação goetheana é uma contemplação paciente, demorada, ao longo do tempo, ao longo do espaço (comparando, acompanhando, procurando pontos em comum).” (MORAES, xx p.24).

Enquanto pesquisadora, guiada por este método, no que se relaciona com modo de ver e estar diante o objeto de estudo, reconheço que para me considerar uma fenomenóloga goetheanística, de fato, precisaria me aprofundar ainda mais no tempo e no espaço. No entanto, no escopo dessa investigação, a experiência na Casa do Sol foi imprescindível, no que concerne a unir a tríade em que Agda se expressa enquanto imanência – conto, cena e casa. Nestes três contextos observei o fenômeno Agda tal qual ele se revela, principalmente de maneira descritiva, intencionando dar-lhe voz.

O primeiro passo da fenomenologia de Goethe consiste na fase de simpatia, no qual há a admiração e contemplação pelo/do fenômeno, observando os detalhes sinestesicamente, sendo capaz de descrever cheiro, timbre, gesto, cores etc. sem questionar o motivo das coisas. O importante é ser capaz de abarcar o que o fenômeno é em si. Para as atrizes, que fizeram várias visitas à Casa do Sol durante o processo dos ensaios, a Casa, o simples estar lá, abertas a essa “simpatia” foi um importante alimento para criação, provendo- as de imagens-sensações fundamentais.

Figura 17

No segundo momento, na fase de antipatia, exercita-se distanciar do fenômeno e aproximar da Ideia subjacente a este. Agora, cabe comparar quais vínculos são possíveis a partir do que o fenômeno nos revela. Por exemplo, o fenômeno “espirais”, que remete ao elemento ar, pode ser observado no conto Agda, nos corpos poetas em cena e na Casa do Sol. Há o desnudamento do fenômeno.

Na cena, as espirais estão presentes todo tempo em que as atrizes se expressam como Agda. Nesses momentos, os movimentos corporais e gestuais são espiralados. A Casa do Sol, em sua arquitetura, também traz a ideia de espirais, quando fazemos o movimento de entrada e saída por seus tantos portais em torno do pátio.

Essa casa que a Hilda construiu, habitou, viveu, criou, enfim, tem um tanto de Hilda na casa, nas paredes, nos tijolos, no musgo, nos cães... E fazer o espetáculo dentro da casa, no pátio, que é um pátio cercado de casa por todos os lados. Aquele pátio é meio que o coração da casa também foi uma experiência super intensa de coabitar com a presença da Hilda, ou experienciar a Hilda ali. [..] Foi muito forte essa sensação, essa qualidade, energia, presença, essas palavras que a gente busca... Isso, de certa maneira, fica, e como atriz levo isso para as apresentações no palco e fora dali. (Trecho da entrevista Alice Possani)

A partir deste desnudamento, passo a vincular a Ideia comungada pelas três instâncias (o conto, a cena e a casa) sobre o elemento ar e o fenômeno espirais, que conduz essa tríade (conto Agda, corpos poetas em cena e Casa do Sol) a uma síntese, num elo arquetípico.

Portanto, nesta pesquisa, objetivou-se a observação do fenômeno elementos da natureza, no primeiro momento a partir da contemplação do conto e na sequência procurei observar as metamorfoses da Ideia elementos da natureza na cena e na Casa do Sol.

A partir da Contemplação da Ideia e de suas metamorfoses, Goethe, em seu tempo, descobriu que as plantas tem todas as suas partes derivadas de uma única, a folha. Uma flor são folhas transformadas. Também pétalas e sépalas, pistilos e estames. E as folhas, por si mesmas, são metamorfoses umas das outras. (MORAES, xx, p.29)

Kalau: Lenta... pensando não sei quê... molhando as avencas. Uma vez empurrei-a no tronco espinhudo da paineira. (HILST, 2002, p.103) [...]o jeito que ela olha... Tu não tomas parte, entendes? O cão é também uma coisa que está dentro dela, a planta

Kalau: O dedo espatulado suspendendo as avencas. (idem, p.104) As avencas estão na Casa do Sol, no conto e também na cena. Um mesmo tipo faz morada nestes três lugares, com suas respectivas singularidades. Diante uma imagem, como a avenca, imanada de maneiras diferentes, nos adentram por portas de percepções outras.

O tipo se apresenta em formas individualizadas, e é nelas que entra em interação com o mundo exterior. A mente humana tem apenas uma forma. No entanto, aqui aqueles objetos movimentam seu sentir, ali aquele ideal a entusiasma para ações, etc. não se trata de uma forma particular do espírito humano, é sempre com o ser humano inteiro, pleno, que se lida. (STEINER, 2004, p.102)

Chegando à Casa do Sol no dia 9 de outubro de 2016, fui recebida carinhosamente por Olga Bilenky, amiga de Hilda Hilst de longa data e atual coordenadora do espaço e programa de residência artística23, procurando

manter viva a tradição de tornar o fluxo de criação artística e compartilhamento de ideias latentes neste lugar.

Figura 19

23 Para mais informações sobre o Programa de Residências Artísticas da Casa do Sol,

Olga me mostrou cada canto da casa, do quintal, compartilhando seus planos para o jardim. Nesta caminhada pude perceber o quão vivo é o conto na casa e a casa no conto. Me (re)encontrei com imagens força, com a mítica figueira e me senti. O verbo cósmico numa mesa de café, entre dois tempos unidos por gengibres, pimentas, indignações, amor no peito, filhos vindos e filhos por vir, por Hilda.

Um dia solar. Não saber o que encontrar e calar-se. Um silêncio a partir dos pés que se desnudam para escutar as pedras, a umidade, aspereza, maciez, a vida. Quantas formas adentrando pela epiderme dos meus pés! E assim, no primeiro dia vivenciei o elemento terra: cheiro, textura, tamanhos, formas, existências imanentes na casa, organização da vida neste espaço/tempo, que rasga as configurações cotidianas. Fiquei descalça. Terra sob os pés, entre os dedos, pensando se Agda havia cutucado ou não estrumes, como sugeria Kalau. Kalau: [...] Mas já viste, Celônio, Agda-lacraia à tarde no pátio... cutucando estrume:

Celônio: Não não. Isso nunca. Que idéia. Bordava. [....] Kalau: E tu viste, Orto?

Orto: Cutucando estrume? Deves estar louco. Agda pode ser tudo, mas é limpa como coisa do mar. Sempre lavada. [...]

Kalau: Parem. Pois eu vi quando cutucava estrume.

Celônio: Mentira. Estrume no pátio? Impossível. E de longe a gente vê a limpeza da casa.

[...]

Orto: E por que alguém há de cutucar estrume? Kalau: Por prazer. (HILST, 2002, p.107-108)

Somos realmente obrigados a convir que com a terra mole toca-se num ponto sensível da imaginação da matéria. A experiência que temos dela remete a experiências íntimas, a devaneios recalcados. Põe em jogo valores antigos, valores que são muito antigos tanto para o indivíduo como para a espécie humana. (BACHELARD, 2008, p.106) Não se aceita com facilidade que o outro seja capaz de cutucar estrume. De adentrar na matéria excretada por outro ser, sentir prazer em entrar de forma visceral na intimidade do outro. Esta imagem reverbera o conto, a cena e meu bloco de argila.

A transformação da matéria por Agda continua. Não só é possível que cutuque estrume, mas ela nos conta sobre sua atuação sobre a resistência dos metais, sobre entrar “nas casas para roubar o ouro”, derrete-los e transformá-los em espirais. Espiralar o nobre metal.

O ferreiro frequentemente é um intermediário entre os deuses e os homens. [...] Do ponto de vista da imaginação dos elementos, o ofício do ferreiro se mostra como um ofício completo. Implica devaneios relacionados ao metal, ao fogo, à água e ao ar. (BACHELARD, 2008, p.136)

Agda encarna a profunda capacidade de anima, de adentrar as mais maleáveis e mais duras materialidades. Do estrume ao metal, transformando-os. No fundo do mais animus incidir sobre a matéria, perfurando seu ventre (como Kalau faz com Agda), há a capacidade anima de transformar, de desvendar as profundezas de cada ato, de cada poiseis, de cada faber.

Retirei-me sob a sombra da figueira. Sentei, sem saber o que fazer. Desejei que Hilda me contasse o que há em cada canto desta casa, ou ainda melhor, como os cantos choram. Eu. A figueira. As memórias. A reverência. Um bloco de argila. Meu corpo poeta.

Mas quando vem realmente o reinado da grande solidão, quando soa realmente a hora da tranquilidade, então a mesma paz está no coração do sonhador e da chama, então a chama mantém sua forma e corre, direta, como um pensamento firme, a seu destino de verticalidade. (BACHELARD, 1989, p.27)

Agda, na comunhão da cena, em suas múltiplas labaredas, fez-se fogueira. Pois, tal como no início do trabalho disse sobre as rodas de contação de estórias de minha família, imagens arquetípicas no teatro tem essa capacidade de nos acordar, nos fazer sentir parte.

É preciso refazer a cadeia, a antiga cadeia em que o espectador procurava no espetáculo sua própria realidade, é preciso permitir que esse espectador se identifique com o espetáculo, respiração a respiração e tempo a tempo. (ARTAUD, 2006,p.160)

Havia contemplado a casa. Diante do bloco de argila, em silêncio, tentei descrever o que meu corpo conseguiu alcançar desta contemplação. Deixei que as imagens do conto contaminassem meus pensamentos e os aqueci em meu sentir. Permiti que meu metabólico se expressasse por minhas mãos, que invadiram o bloco de argila intuitivamente. De baixo para cima, de cima para baixo.

Os contornos de Agda, de Hilda, do feminino começaram a surgir a partir de uma forma quadrada, que transformou-se em um falo e teimou em arredondar-se.

Em suma, o verdadeiro modelador sente, por assim dizer, animar-se sob seus dedos, na massa, um desejo de ser modelado, um desejo de nascer para a forma. Um fogo, uma vida, um sopro é uma potência de argila fria, inerte, pesada. A argila, a cera, têm um potencial de formas. [...] Mas a imaginação que fala, a imaginação que explica, a imaginação literária nos ajuda a viver um desejo íntimo de formas como se tivéssemos o poder de conhecer os segredos da criação do vivente. (BACHELARD, 2008, p.80-81)

Deixei-me guiar pelas mãos de Agda cutucando o estrume, na imaginação de Kalau e agora em minhas mãos.

Se a poesia deve reanimar na alma as virtudes da criação, se deve nos ajudar a reviver, em toda a sua intensidade e em todas as suas funções, nossos sonhos naturais, precisamos compreender que a mão, assim como o olhar, tem seus devaneios e sua poesia. Deveremos portanto descobrir os poemas do tato, os poemas da mão que amassa. (Idem, p. 65-66)

Seios, ventre, cabeça... Agda, que no conto não mostra suas costas para seu cavalo-três, mas na cena nos revela o oco das costas e seus seios em total entrega. Agda na argila gera em seu ventre, ganha vida a partir do sopro em seu dorso, que cria espaço. Onde o fogo, o mais alto calor encontra vida, encontra as vísceras, consome, goza e gesta.

Figura 20

A Ideia de Agda terra está no aprofundamento na imanência. No apossar do corpo do outro até o mais profundo, deixando-se literalmente penetrar, estar dentro. Um processo de vitalizar a matéria, transformá-la. São dedos que suspendem as avencas, que atuam sobre a matéria diretamente, nem que seja no imaginário de quem disse que viu Agda cutucando estrume.

Agda adentra tão visceralmente a matéria, que o fruto desta mais profunda troca material, o filho que carrega no ventre, advindo através do ato sexual com seu cavalo-três, a faz querer espiritualizar este fato pedindo paternidade ao Senhor. Agda enraíza-se na terra (aldeia) de modo que nesta terra também espelha o céu.

A raiz é a árvore misteriosa, é a árvore subterrânea, a árvore invertida. Para ela, a terra mais sombria – como o lago, sem o lado – é também um espelho, um estranho espelho opaco que duplica toda a realidade aérea com uma imagem subterrânea. (BACHELARD, 2003, p.225) Na cena são as materialidades dos corpos poetas que possibilitam Agda a dançar. Dão as palavras literárias o corpo voz, gesto. Mas, a palavra é ainda a grande terra, de resistência e intimidades, onde Agda se corporifica.

No que há de mais material no conto e na cena, é onde mais vida habita. O éter vital, isso que sopra pelos pulmões, anima Agda, os corpos poetas e a Casa do Sol. A figueira, com sua imponência material: grande, robusta, forte, é onde guarda a sutileza de uma vida mágica, que transubstancializa toda esta força em algo etérico.

Todo esse texto é importante ser compartilhado, porque tanto o Matula como a Boa Cia tem o hábito de chegar no teatro em dia de apresentação no período da manhã, bem cedinho e todo esse ritual é muito importante para a apresentação em si. Ter vivido esse mesmo ritual na Casa do Sol deu outro sentido para mim

com relação a peça.

Lembro-me que no início do espetáculo, enquanto o público entrava para assistir, já estávamos deitadas no pátio e os cachorros nos acompanhavam e durante os nossos uivos,, eles também uivavam... Foi tudo muito mágico. Pés descalços na calçada de pedra, aquelas paredes, pouquíssimos recursos de iluminação... A casa de Hilda tinha se tornado a casa da Agda. (Trecho da entrevista com Melissa Lopes)

No segundo dia, acordar, tomar banho quente e um café da manhã com a surpreendente companhia de Olga... Quantas histórias incríveis de amores, desamores, encontros e desencontros! Entrevistá-la24 num exercício de leitura

conjunta de Agda trouxe possibilidades de inúmeras reminiscências advindas de

Documentos relacionados