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MOTIVOS PARA UMA POLÍTICA CAMBIAL ATIVA

Rossi (2016) relata que o debate sobre a política cambial, em geral, retrata os motivos que fazem com que a taxa de câmbio determinada pela oferta e procura, ou seja, pelo mercado, nem sempre é a taxa de câmbio adequada ao desenvolvimento econômico do país. O autor afirma que os motivos para uma política cambial ativa podem ser agrupados em dois grupos: o grupo dos fatores ligados aos fluxos de capital e ao mercado de derivativos e aqueles ligados, portanto, a motivos financeiros e o segundo grupo com os fatores reais ligados à conta corrente do balanço de pagamentos. O quadro 4 organiza os grupos de motivos para política de câmbio ativa.

Quadro 4 - Motivos para uma política cambial ativa

Motivos da Política Cambial Reais Financeiros Administração da Volatilidade Ciclo de preços de commodities Ineficiência dos mercados financeiros Administração do patamar Doença Holandesa Carry trade

Fonte: Rossi (2016, l. 2511)

Rossi (2016) explica que os motivos para política de câmbio também estão relacionados ao patamar de preço e à volatilidade. Os motivos para a existência da política cambial relacionados à volatilidade são o ciclo de preços de commodities e a ineficiência dos mercados financeiros. Já os motivos ligados ao patamar de preço do câmbio estão vinculados a dois conceitos: a Doença Holandesa e ao Carry trade que serão explicados mais adiante.

Primeiramente, cabe analisar o ciclo de preços de commodities como motivo para a existência de política cambial. Hicks (1974 apud Rossi 2016) diferencia o mercado de bens industriais, que ajusta as quantidades produzidas em choques de demanda, denominado pelo autor como fixprice, e mercado de commodities, que ajusta os preços em choques de demanda, denominado flexprice. Rossi (2016) ressalta que as commodities têm ciclos de produção longos e dificuldade em operar com a capacidade ociosa o que leva ao ajuste de preço. A relação dos bens industrializados e das commodities com a política cambial é explicado pelo autor:

Dessa forma, a receita de exportação do país produtor de commodities tende a ser mais volátil do que aquela de um país exportador de bens industriais e, portanto, a oferta de divisas decorrente do comércio externo dependerá do ciclo de preços dos produtos básicos. Essa instabilidade é

transmitida para a taxa de câmbio e com isso afeta o restante da economia. Portanto, em países com uma pauta de exportação fortemente baseada em commodities, a política cambial é importante para amenizar o impacto da volatilidade destes preços na taxa de câmbio. (ROSSI, 2016, l. 2516)

O segundo motivo para uma política cambial ativa, segundo Rossi (2016, l. 2522), ao citar Bresser-Pereira (2008), é a existência de recursos naturais vantajosos em relação aos outros mercados de forma a criar condições para a existência de um setor de commodities forte em exportações. “O protagonismo desse setor em uma economia nacional submete-a aos riscos da “doença holandesa”, que se manifesta como uma tendência crônica à apreciação cambial”.

Rossi (2016, l. 2524) relata: “Um dos pontos relevantes dessa abordagem é a identificação de uma taxa de câmbio de equilíbrio para a conta corrente cujo nível é mais apreciado do que aquele requerido para o desenvolvimento de um setor industrial competitivo”. Para o autor, nessa situação, o papel da política cambial é evitar a apreciação excessiva da moeda, que decorre da especialização do país na produção dos bens primários.

Rossi (2016) diz o que terceiro motivo para a existência de política cambial ativa é a necessidade de neutralizar possíveis distorções temporárias ou mesmo conjunturais no setor financeiro. O autor explica que o comportamento de manada, as assimetrias de informações e até mesmo as ações especulativas de câmbio baseadas em estratégias grafistas afastam a relação de preço da moeda dos fundamentos econômicos, sendo, assim, necessária a intervenção do formador de política para corrigir essas distorções.

Por fim, Rossi (2016) explica a necessidade da existência de política cambial ativa como forma de neutralizar os ganhos especulativos com o diferencial de juros dos agentes econômicos, carry trade.

[...] a operação de carry trade consiste em um investimento intermoedas onde se forma um passivo (ou uma posição vendida) na moeda de baixas taxas de juros e um ativo (ou uma posição comprada) na moeda de juros mais altos. [...] essa operação pode se apresentar como um dos principais mecanismos de transmissão do ciclo de liquidez internacional para as taxas de câmbio. (ROSSI, 2016, l. 2546)

Rossi (2016) lembra que é no mercado primário que residentes e não residentes realizam os contratos de compra e venda de divisas formando o fluxo cambial contratado. Nesse sentido, o autor explica que, se considerarmos apenas o

mercado primário de câmbio, o fluxo cambial contratado determina a formação da taxa de câmbio. Assim, a política cambial teria como objetivo apenas administrar o excesso e escassez do fluxo de divisas através venda e compra pelo banco central alterando as reservas cambiais.

Contudo, essa concepção da política cambial, limitada a uma política de intervenção no mercado primário e de regulação dos fluxos de capital, não somente é estreita, mas é particularmente inadequada para as especificidades do mercado de câmbio brasileiro. (ROSSI, 2016, l. 2563)

Para Rossi (2016, l.2578), uma análise completa da política cambial brasileira deve considerar também o mercado interbancário de câmbio e o mercado de derivativos, “uma característica fundamental do mercado de câmbio brasileiro é a assimetria de liquidez entre a negociação de reais à vista, nos mercados primário e interbancário, e de derivativos, essencialmente o mercado de dólar futuro da BM& F”.

Essa assimetria é explicada por Rossi (2016) pela regulamentação do setor financeiro ao permitir que apenas bancos e corretoras de câmbio possam formar posição no mercado primário de câmbio sendo ainda necessária a formalização de contrato de câmbio e registro no sistema do Banco Central do Brasil (Sisbacen). No mercado futuro da BM&F não há formalização e restrição aos participantes, facilitando, assim, o acesso e à liquidez.

Rossi (2016) explica que, devido a essa assimetria, a taxa de câmbio se forma primeiro no mercado futuro e, depois, no mercado a vista através de arbitragem. Esse processo ocorre porque, como a liquidez está no mercado futuro, a taxa de câmbio futura se torna referência para a cotação nos demais mercados (primário e interbancário de câmbio).

O termômetro para arbitragem entre o mercado futuro e à vista é o cupom cambial. [...] essa variável pode ser definida como a taxa de juros em dólar no mercado brasileiro. O cupom cambial aumenta quando o preço do dólar futuro se aproxima do preço do dólar à vista e se reduz quando eles se distanciam. A intuição por detrás disso está no fato de que, quando há um excesso de oferta de dólar no mercado futuro, o hedge cambial fica mais barato e, assim, as aplicações em dólar onshore, com cobertura cambial, ficam mais bem remuneradas. (Rossi, 2016, l. 2596)

Rossi (2016) também ilustra a relação entre a especulação e o hedge no mercado futuro de dólar com a arbitragem que influencia no mercado primário.

Figura 26 - Ilustração do Circuito Especulação-Arbitragem

Fonte: Rossi (2016, l. 2602)

O importante é notar que o circuito especulação-arbitragem se inicia com um excesso de oferta ou de demanda no mercado futuro e a partir daí dá origem à arbitragem entre os mercados [...]. No caso de um excesso de oferta de dólares futuros, por exemplo, o cupom cambial aumenta, o que torna as aplicações em dólar onshore convidativas quando comparadas às taxas de captação offshore. Isso abre espaço para arbitradores que assumem a ponta comprada do mercado futuro e, ao mesmo tempo, tomam recursos no exterior para vender dólares no mercado doméstico. Por conseguinte, o excesso de oferta de dólares por parte dos arbitradores tende a apreciar a taxa de câmbio à vista. (ROSSI, 2016, l. 2624)

Rossi (2016) lembra, que no Brasil, a arbitragem é feita pelos bancos no mercado interbancário de câmbio através da utilização da “linha interbancária internacional”. O autor ainda apresenta as conclusões com base no circuito especulação-arbitragem:

a) os movimentos da taxa de câmbio não estão ligados ao fluxo de câmbio; b) a estratégia dos bancos para a formação das suas posições de câmbio é

importante para a formação da taxa de câmbio e depende da arbitragem realizada por eles e da especulação no mercado futuro;

c) os bancos representam uma fonte autônoma de divisas para o mercado primário ao utilizarem a linha interbancária internacional que não influencia no fluxo cambial contratado.

Para Rossi (2016) a atuação do Banco Central no mercado à vista tem pouca eficácia porque afeta a cotação da taxa de câmbio no mercado à vista absorvendo e provendo divisas, porém sem interferir diretamente no circuito de especulação- arbitragem.

[...] a especulação de venda (compra) de dólares futuros aumenta (diminui) o cupom cambial e incentiva arbitragem dos bancos, que vendem (compram) dólar no mercado interno e ao mesmo tempo compram (vendem) dólar futuro, fazendo a contraparte do especulador e assumindo uma posição em dólar comprada no mercado futuro e vendida no mercado à vista. As intervenções do banco central, nesse contexto, fazem a

Mercado Primário Mercado de Derivativo s Arbitragem US$ à vista

US$ futuro US$ futuro

Especulaç ão

contraparte dos bancos no mercado à vista e podem não impedir um ciclo especulativo de apreciação ou depreciação da moeda brasileira. Além disso, a intervenção pode incentivar mais “entrada” ou “saída” de dólar por conta do seu impacto sobre o cupom cambial[...]. (ROSSI, 2016, l. 2628)

Rossi (2016) explica que ao intervir no mercado à vista através de leilão de compra de dólares, a taxa de câmbio à vista se deprecia, valorizando o real e se aproximando da taxa de câmbio no mercado futuro – o que aumenta o cupom cambial. Com o cupom cambial mais alto, os bancos captam divisas via linha interbancária internacional e vendem para o Banco Central gerando entrada de mais dólares no país.

Uma forma de equacionar esse problema é a intervenção via leilões de swaps reversos. O efeito do swap reverso é de “amenizar” o cupom cambial, pois pressiona pela depreciação da taxa de câmbio futura, o que inibe a arbitragem dos bancos. Os swaps reversos, registrados na BM&F, são equivalentes à compra de dólar futuro. Assim como os contratos futuros, os swaps também oferecem ajustes diários, no entanto, diferentemente desses, não há contraparte central e os contratos são customizados no que se refere aos prazos de vencimento e aos lotes. Como exemplo, o Banco Central pode realizar um swap de US $ 1 bilhão dividido em três lotes que vencem em datas diferentes. (ROSSI, 2016, l. 2739)

Nesse sentido, Rossi (2016) explica que a atuação do Banco Central através de swaps cambiais é mais eficiente ao afetar diretamente o circuito especulação- arbitragem. Com swap cambial o Banco Central se torna a contraparte do especulador e, assim, tira a necessidade de arbitragem pelos bancos, que não mais precisam alterar suas posições cambiais. Além disso, o swap cambial promove liquidez no mercado futuro reduzindo a variação do cupom cambial.

Figura 27 - Mercado de Câmbio e a Política Cambial

Fonte: Rossi (2016, l. 2631)

Rossi (2016) ressalva que, nos momentos críticos de especulação, a atuação por swap cambial pode não ter o efeito desejado na taxa de câmbio e, nesse sentido, as medidas regulatórias também podem fazer parte da política cambial.

As medidas regulatórias instituídas sobre o mercado de derivativos e o mercado interbancário mitigaram a especulação pela apreciação do real e permitiram ao Banco Central o manejo da taxa de câmbio com intervenções (vendas e compras) e swaps (tradicional e reverso), que mostraram impacto mais efetivo na formação da taxa de câmbio e na dissuasão do mercado financeiro em suas empreitadas especulativas. (ROSSI, 2016, l. 2657).

Rossi (2016) traz como exemplo de atuação regulatória do Banco Central as iniciativas ocorridas ano de 2011 para conter a apreciação do Real. Em janeiro de 2011 atuou na estrutura regulatória do mercado interbancário impondo custos às posições vendidas dos bancos tendo efeito no circuito especulação-arbitragem. Em julho de 2011, com a Medida Provisória 539 a política cambial impôs condições específicas no mercado de derivativos e imposto de 1% sobre aumento de posições vendidas. Essas ações tiveram efeito positivo para conter a apreciação da moeda, porém, em 2013, as medidas foram gradativamente desmontadas para conter o oposto, a depreciação do real.

Mercado Primário Mercado de Derivativo s Arbitragem US$ à vista

US$ futuro US$ futuro

Especulaç ão Hedge Intervençõ es Swap Regulamen tação das apostas com derivativos Fluxos financeiros Fluxos de comércio Fluxo Cambial Mercado Interbancá -rio Banco Offshore Empréstimo via linha interbancária Regulamentação do mercado interbancário

5 EXPOSIÇÃO CAMBIAL

A exposição à oscilação da taxa de câmbio, também chamada de exposição cambial, é tema de debates financeiros dentro das empresas multinacionais. A variação da taxa de câmbio pode colocar em risco a operação da empresa ao variar os fluxos de caixa de recebimento e pagamento. Quanto maior for a oscilação da taxa de câmbio, maior será a imprevisibilidade dos fluxos financeiros. Como tentativa de reduzir as incertezas de caixa, muitas empresas buscam técnicas de previsão da taxa de câmbio.