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LISTA DE ABREVIATURA E SIGLA

1 O CAMINHO TEÓRICO-METODOLÓGICO

2 BUSCA DE UMA CULTURA DE PARTICIPAÇÃO SOCIAL EM PROCESSOS EDUCATIVOS

2.1 MOVIMENTO CTS: SURGIMENTO E DESDOBRAMENTOS

De acordo com Bazzo, Linsingen e Pereira (2003), o trinômio Ciência- Tecnologia-Sociedade busca definir um campo de trabalho cujo objeto de estudo está constituído pelos aspectos sociais da CT, tanto no que concerne aos fatores sociais que influenciam na mudança científico-tecnológica, como no que diz respeito às consequências socioambientais. Conforme analiso ao longo do texto, há indicativos de que na repercussão, no campo educacional, a influência de fatores sociais na mudança científico-tecnológica tem sido subestimada.

Os movimentos sociais que marcaram os anos 1960 e 1970, como, por exemplo, manifestações pelos direitos civis e pelo meio ambiente, críticas ao consumismo exacerbado, movimentos contra as mudanças no trabalho acarretadas pela crescente automação nas fábricas, preocupações relativas à pesquisa genética e à utilização da energia nuclear, etc. (CUTCLIFFE, 2003) foram de suma importância para a busca de uma maior cultura de participação social nas decisões relativas à CT. Esses movimentos expressavam o descontentamento e a crescente desconfiança da sociedade em relação a distintos problemas, dentre os quais aqueles ligados à CT. Concomitantemente a esses movimentos, na academia, foi consolidado o campo de estudos em Ciência-Tecnologia-Sociedade (GARCÍA, CEREZO e LÓPEZ, 1996).

Conforme esses autores, o movimento CTS teve origem em meados do século XX, em países do hemisfério Norte, quando parte da população começou a questionar o modelo tradicional/linear de progresso, percebendo que o desenvolvimento científico, tecnológico e econômico não estava conduzindo de forma linear e automática ao desenvolvimento do bem-estar social. A sociedade começou a reivindicar maior participação nas decisões relacionadas ao processo científico-tecnológico que, até então, eram de caráter predominantemente tecnocrático.

Ainda, segundo os autores, em fins do século XIX e início do século XX, havia um otimismo relacionado ao modelo tradicional/linear de progresso. Porém, surgiu uma sequência de “acidentes” relacionados com desenvolvimento da CT, demonstrando o quanto ela pode ser determinante como, por exemplo, no projeto Manhattan e sua aplicação em Hiroshima e Nagasaki, o desenvolvimento da CT relacionado a guerras como a Guerra Fria e a do Vietnã e a contaminação ambiental, fazendo com que a população percebesse a necessidade de participação nas decisões relacionadas à CT. Em alguns âmbitos, os movimentos sociais começaram a lutar contra a ideologia cientificista e a tecnocracia, havendo a reivindicação de decisões mais democráticas em relação à CT e uma maior participação social no direcionamento dado à atividade científico-tecnológica. Esse consistiu num dos principais objetivos postulados no surgimento do movimento CTS.

A partir de meados do século passado, tendo como pano de fundo aspectos indesejáveis relacionados à CT, como a bomba atômica, bem como a produção de determinadas substâncias que agrediam severamente o meio ambiente, como o pesticida Dicloro-Difenil-Tricloroetano (DDT), levou parte da população, principalmente nos países da América do Norte e da Europa, a perceber que esse modelo de progresso não era sinônimo de bem-estar social. Essa passou a exigir decisões menos tecnocráticas e mais democráticas, ou seja, uma cultura de participação. Foi desse posicionamento, de segmentos da sociedade, que surgiu, na segunda metade do século XX, o movimento CTS.

Nesse sentido, historicamente, a origem do movimento CTS tem sido associada, dentre outros aspectos, à superação da concepção de neutralidade da CT, do questionamento do modelo de decisão tecnocrático.

A publicação das obras “Primavera Silenciosa”, em 1962, pela bióloga naturalista Rachel Carson, e “A estrutura das revoluções científicas”, também em

1962, pelo físico e historiador da ciência Thomas Kuhn, contribuíram para o questionamento da suposta neutralidade científico-tecnológica. Carson alerta para os efeitos na saúde e na natureza do uso de inseticidas sintéticos como o DDT. Kuhn, por sua vez, ressalta que a ciência é constituída e validada no que denomina de paradigmas, os quais estão situados social e historicamente. Consequentemente, não neutros.

Assim, o movimento CTS repercutiu em vários países, porém, de forma diferenciada, seguindo, inicialmente, segundo a literatura do Hemisfério Norte, duas tradições: a americana – de caráter mais ativista e a europeia – de caráter mais acadêmico (GARCÍA, CEREZO e LÓPEZ, 1996; BAZZO, LINSINGEN e PEREIRA, 2003). Segundo esses autores, essa divisão estaria superada atualmente. Contudo, focalizando repercussões, no campo educacional, os resultados da minha pesquisa, apresentados no capítulo quatro, não confirmam isso.

A tradição americana, predominante na pesquisa que realizei, nasceu nos Estados Unidos, nos movimentos sociais de contracultura, pró tecnologia alternativa, de ecologistas e pacifistas, entre outros. Dentre suas preocupações, de caráter prático decorrente do desenvolvimento da CT, estava a indústria armamentista, produtos químicos como o DDT e a energia nuclear. Essa tradição tem como foco as consequências sociais do desenvolvimento científico-tecnológico na sociedade, desse modo, destacando as implicações/impactos sociais, políticos e educativos da CT no contexto social (GARCIA, CEREZO e LÓPEZ, 1996).

Já a tradição europeia tinha em sua composição um número expressivo de atores ligados à academia, sendo assim, considerada acadêmica, de viés mais teórico e descritivo. As discussões/pesquisas estavam voltadas, também, para a análise de como a sociedade influencia no desenvolvimento da CT, ou seja, considerando os fatores sociais que antecediam esse desenvolvimento. Inicialmente, centrou-se mais na pesquisa científica em detrimento da tecnológica, percebendo, posteriormente, a inviabilidade do tratamento em separado da ciência e tecnologia (CT). Essa tradição entendeu a tecnologia como processo social e não apenas como ciência aplicada e neutra, desenvolvendo estudos não restritos a sociologia do conhecimento científico, mas considerando, também, a tecnologia. Como destaco no capítulo três, a literatura tem ignorado o que pode ser considerada uma terceira tradição, ou seja, o PLACTS.

Já, no contexto educacional, de acordo com Aikenhead (2003), o movimento CTS repercutiu, no final da década de 70 e início da década de 80, do século passado, no momento em que se desenvolvia um consenso, entre os educadores de ciências, em relação à necessidade de inovações na área, motivado, de um lado, por uma emergente necessidade de educação política, de outro, pelo crescente desinteresse e fracassos na educação científica, contemplando, nessa inovação, abordagens multidisciplinares, com currículos organizados em torno de temas, de problemas reais.

2.2 O MOVIMENTO CTS SURGE EM CONTEXTOS EM QUE A SUPOSTA