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Na última parte do séc. XX, os movimentos indígenas da América Latina passam a representar uma nova dimensão nos processos proporcionados pela redemocratização que ocorreu na maioria dos países, tendo as suas ações resultado na incorporação de novos temas na pauta política dos Estados. Por mais paradoxal que pareça, a questão étnica identitária toma corpo diante da formação de uma percepção de cidadania global e infunde-se nas mobilizações e reivindicações por políticas e ações redistributivas, empunhando a bandeira da questão territorial, com direito à autonomia da sua gestão, consoante os próprios valores, além da melhoria na atenção das necessidades básicas diferenciadas.

Sob essa perspectiva, a Amazônia Continental se torna um importante espaço para os movimentos indígenas, na década de 1980, sobretudo em razão dos projetos

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Já se tornaram habituais as manifestações indígenas defronte aos parlamentos e demais órgãos governamentais como a manifestação denominada Abril Indígena (Brasil), assim como é tradicional a presença dos indígenas nos Fóruns Sociais Mundiais.

de ocupação e exploração que avançam em direção à região, onde boa parte das populações autóctones ainda não haviam sido totalmente assimiladas pelas sociedades nacionais (RAMOS, 1998). A condição de um relativo distanciamento das frentes civilizatórias e o “giro eclesiológico” do clero católico fizeram com que a “fricção interétnica” não lograsse êxito na extinção, via assimilação dos indígenas, e, sim, criasse um “indígena de contato” (idem) que passa a se organizar rapidamente.

Diante da intensa atividade na Amazônia, temendo pelas novas ameaças aos seus territórios, vidas e espiritualidade, em 14 de março de 1984, as organizações indígenas pan-amazônicas promovem, em Lima, o I Congresso das Organizações Indígenas da Bacia Amazônica, do qual nasce a Coordinadora de las Organizaciones

Indígenas de la Cuenca Amazónica – COICA –, com os seguintes membros: Asociación Interétnica de desarrollo de la Selva Peruana – AIDESEP –;

Confederación de Nacionalidades Indígenas de La Amazonia Ecuatoriana

CONFENIAE –; a Confederación de Pueblos Indígenas de Bolivia – CIDOB –;

Organización Nacional Indígena de Colombia – ONIC –; e a União das Nações

Indígenas – UNI –, Brasil.

A COICA se estrutura e, em seu 4º Congresso (1992), realizado em Manaus, aderem outras organizações: Organizacion Regional de Pueblos Indigenas de

Amazonas – ORPIA – da Venezuela; Amerindian Peoples Association – APA –, da

Guyana; Organization of the Indigenous Peoples in Suriname – OIS –; Federation des Organizations Autochtones de Guyane – FOAG –, da Guiana Francesa; e a

Confederação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira – COIAB –, em substituição à UNI.

No site dessa organização (www.coica.org.ec), hoje instalada em caráter permanente na cidade de Quito, há um vasto material com informações a respeito das entidades-membro, suas agendas regionais e a Agenda Indígena da Amazônia– AIA. Essas informações permitem identificar que seu modelo organizativo adota os moldes ocidentais, com organogramas, missão e visão institucionais, e um conjunto de eixos temáticos que compõem seu plano geral de ação.

O Plano Geral de Ação da COICA faz menção a um estatuto da instituição, no qual estão descritas as atribuições do Coordenador Geral, Coordenadores de Áreas (direitos humanos, socioculturais e educação; território, meio ambiente e diversidade; política, Estado e povos indígenas; cooperação econômica e recursos naturais), a composição dos seus Conselhos, os respectivos mandatos e a periodicidade das suas atividades. A visão da COICA está assim definida: “Somos una Organización

indígena internacional Amazónica, que coordina los esfuerzos, sueños e ideales de las nacionalidades, pueblos y organizaciones indígenas de La cuenca amazónica para promover, defender e ejercer los derechos de la vida como parte integral de la naturaleza y del universo”.

Organograma da Coordenação de Organizações Indígenas da Bacia Amazônica COICA

Figura –Fonte: www.coica.org.ec/portugues/gerencia/index.html

A Missão da COICA “Es generar políticas, propuestas y acciones a nivel local,

nacional e internacional de pueblos, nacionalidades y organizaciones indígenas amazónicas, mediante coordinación, el diálogo, La concertación y alianzas estratégicas con los actores públicos, privados y de La cooperación internacional para un desarrollo equitativo y diferenciado de la Amazonia”. O Plano Geral operativo de

curto e longo prazo está organizado em sete eixos temáticos:

Estrutura organizativa da Coordenação de Organizações Indígenas da

Bacia Amazônica - COICA

Congresso Geral (cada 4 anos) Conselho de Coordenação (cada 2 anos) Conselho Diretivo (permanente) CIDOB Bolívia COIAB Brasil AIDESEP Perú OPIAC Colombia ORPIA Venezuela CONFENIAE Equador APA Guyana FOAG Guyana Francesa OIS Suriname

1. Sustentabilidad da vida;

2. Territorios e Recursos Naturales;

3. Sistemas Jurídicos propios e Derechos Constitucionales; 4. Fortalecimiento de sabidurías ancestrales y organizativos; 5. Formación académica y científica;

6. Economía y desarrollo;

7. Sistemas de tecnología y comunicaciones.

No último informe disponível, o conselho diretivo apresenta os programas e projetos realizados e em andamento, destacando a importância da cooperação internacional para a sua consecução, em consonância com as orientações para cooperação publicadas em seu website65:

Antes todo, queremos dejar registrado nuestro reconocimiento a la cooperación internacional que ha posibilitado estos años, nuestra presencia política en el escenario nacional e internacional. Las ayudas al fortalecimiento organizativo, posibilitaba tanto la articulación interna, como la incidencia en el ámbito internacional, bien como realizaciones de campañas y denuncias sobre la situación en que nos encentrábamos. Sin embargo, en la década de los noventa, los diagnósticos del BM (banco mundial), indican que nosotros como pueblos indígenas, somos el grupo humano con menor ingreso y en situación de extrema pobreza. Estábamos pobres, poco desarrollados y nuestras economías se basan en trueques y subsistencia, condiciones que exigen acciones urgentes y la comunidad internacional esta en condiciones de contribuir para el cambio de esta realidad.

Dentro do eixo que contempla a sustentabilidade da vida, foram elencados três programas: povos indígenas autônomos em isolamento voluntário: equidade de gênero e gerações; autonomia das nacionalidades dos povos amazônicos. No segundo eixo, relativo aos territórios e recursos naturais, há referência ao projeto PROINDIGENA/GTZ66 (Defesa, manejo e uso dos territórios indígenas amazônicos) em execução com OPIAC (Colômbia); CIDOB (Bolívia); COIAB (Brasil); AIDESEP (Peru) e ORPIA (Venezuela). Há também menção sobre um convênio interinstitucional de longo prazo entre a COICA e a WWF (conservação e desenvolvimento sustentável da Amazônia).

No eixo temático direcionado aos sistemas jurídicos próprios e direitos constitucionais, o informe faz referência à rearticulação junto ao Foro Permanente para as Questões Indígenas da ONU, como órgão consultivo ante as diversas

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<http://www.coica.org.ec/sp/cooperacion/index.html> 66

Desde 1 de Janeiro de 2011, GIZ – Gesellschaft für Internationale Zusammenarbeit, reuniu a experiência da GTZ, DED e Inwent, www.giz.de/.

instâncias governamentais e não governamentais de nível internacional. Quanto ao Fortalecimento de saberes ancestrais e organizativos (eixo 4), destaca os contatos

com Coordenadora Andina de Organizações Indígenas – CAOI –; Consejo Indígena

de Centro América – CICA – e outras organizações do Cone Sul, visando ao

fortalecimento da unidade indígena no âmbito internacional. Em nível regional, faz menção ao relacionamento com o PARLAMAZ (Parlamento Amazônico), OTCA (Organização do Tratado Cooperação Amazônica), citados como instâncias políticas entre os Estados e os povos indígenas.

No âmbito da formação acadêmica e científica (eixo 5),cita o programa regional de capacitação e direitos dos povos indígenas amazônicos e gestão sustentável de recursos naturais em parceria com a Universidade Andina Simon Bolívar. No eixo economia e desenvolvimento, relata o quadro da crise financeira e institucional, e projetos com a OXFAM AMERICA (honrar compromisos y reactivar a

COICA), Fundação Ford (Incidencia en IIRSA, Energía e Minería), The Nature Conservancy TNC (defesa, manejo e uso de los territorios indígenas amazónicos),

PROINDIGENA/GTZ (acompanhamento e incidencia de la COICA), ONU, OEA, BID, OMC, OTCA, CAN (participação no âmbito internacional em foros de caráter governamental, em que foram apresentadas petições e demandas sobre os temas de interesse para a bacia amazônica).

Com relação ao último eixo: sistemas, tecnologia e comunicação, há referencia sobre a implementação de servidores e elaboração, com apoio da Fundação Ford, de páginas web para a COICA e as organizações membro, além de capacitação para a realização de vídeoconferências e transmissão de programas radiofônicos. Além disso, o informe traz ainda um relato sobre as participações na Conferencia Mundial da União Internacional de Conservação da Natureza – UICN –; Nona Reunião das Partes da Convenção da Biodiversidade CDB – COP 9 –; Foro Permanente para as Questões Indígenas das Nações Unidas; Reunião da Aliança Amazônica sobre Cambio Climático e IIRSA – Iniciativa para Integração Regional Sul- Americana.

3.4 A percepção indígena das causas comuns dos problemas e a