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Não correspondência da resposta às duas situações propostas

4 ANÁLISE DOS DADOS

4.1 ANÁLISE SOCIOLINGUÍSTICA DOS DADOS

4.1.1 Delimitação das variantes e expurgo das respostas invalidadas

4.1.1.2 Não correspondência da resposta às duas situações propostas

Considerando o fato de que o trabalho se restringe à investigação do comportamento de variantes no que tange à oscilação de uso das formas verbais que expressam futuridade em dois contextos distintos, buscou-se desconsiderar as formas documentadas que não correspondem às duas situações propostas.

Dentre os dados documentados, foram consideradas respostas que não correspondem à situação proposta – expressão da futuridade iminente em relação ao momento da fala – as seguintes construções:

a) respostas em que se expressa previsão ou incerteza em relação à ação futura; b) respostas que apresentam formas construídas com o verbo pretender seguido de

infinitivo [pretender (pres.) + inf.];

c) respostas nas quais se registram o emprego de ter que (de) seguido de infinitivo, como ocorre em tenho que fazer [ter (pres.) que/de + inf.] e terei que fazer [ter (fut.) + que + inf.];

No que tange às sentenças que não correspondem à expressão de futuridade condicionada a uma ação hipotética anterior, destacam-se:

a) formas constituídas com o verbo procurar seguido de infinitivo, como ocorre em

procuraria fazer [procurar (cond.) + inf.] e procurava fazer [procurar (imperf.) + inf.];

b) formas analíticas e sintético-analíticas construídas com auxiliares modais, sobretudo o verbo poder;

c) locuções verbais construídas com auxiliar e dois verbos [ir (imperf.) + inf. + inf.] d) respostas nas quais se registram o emprego de ter que (de) seguido de infinitivo

[ter (cond.) que + inf.]

Para melhor observação dos dados, exemplificam-se, primeiramente, as respostas invalidadas obtidas com a pergunta “O que você fará amanhã?” e, em seguida, as formas não quantificadas obtidas nas respostas dos informantes à pergunta “O que você faria se ganhasse na loteria?”.

Já fora dito que a pergunta “O que você fará amanhã?” tem por meta documentar o uso de formas que expressam futuridade iminente em relação ao momento da fala. Assim, as respostas que expressam previsão ou incerteza em relação à ação futura não foram consideradas na análise quantitativa. Observem-se alguns exemplos:

INQ. – O que é que o senhor fará amanhã?

INF. – Muitas coisas muita coisa planejada né pra fazer pra saí [...]

(QMS 043, ALiB. Natal, Informante 3: homem, faixa 2, nível fundamental) INQ. – O que é que o senhor fará amanhã?

INF. – Amanhã, a minha previsão é terminá um serviço que eu tô fazeno, né? (QMS 043, ALiB. Teresina, Informante 3: homem, faixa 2, nível fundamental)

Como se pode perceber, embora a formulação da pergunta tenha sido fidedigna à situação proposta, a resposta do informante é pautada na incerteza, na conjectura feita no presente sobre o futuro, explicitada pelo uso dos termos “previsão” e “planejamento”. O contexto frasal da resposta, não se refere, portanto, à expressão de futuridade em relação a um acontecimento real/possível, mas a uma estimativa ou intenção possível/provável/irreal. Essas respostas podem se agrupar às respostas “o que está pensando em fazer, amanhã”.

Semelhantemente, registraram-se formas construídas com o verbo pretender seguido de infinitivo [pretender (pres.) + inf.], as quais também não pressupõem certeza, como se pode notar nos excertos a seguir:

INQ. – O que o senhor fará amanhã, seu...? INF. –Eu num sei.

INQ. – Hãm? INF. – Eu não sei.

INQ. – Não, seu V.? Não sabe o que o senhor fará amanhã? E o que o senhor

pretende fazer amanhã?

INF. – Ah, pretendo ir pra chácara, de manhã. INQ. – É?

INF. – Só Deus sabe né... a gente... INQ. – Toda segunda?

INF. – Toda segunda cedo eu vô.(= vou)

(QMS 043, ALiB. Goiânia, Informante 4: mulher, faixa 2, nível fundamental)

INQ. – O que é que o senhor fará amanhã?

INF. – Preteno ir pô trabalho e quando saí eu pretendo dá uma volta em algum

lugá.

(QMS 043, ALiB. Teresina, Informante 5: homem, faixa 1, universitário)

INQ. – O que é que a senhora fará amanhã?

INF. – Amanhã eu pretendo ir à danceteria defensoria pública (inint).

(QMS 043, ALiB. Teresina, Informante 6: mulher, faixa 2, universitário)

É válido ressaltar o frequente uso do verbo ir nos dados documentados, quer seja em sua forma sintética no presente expressando futuro – vou – quer seja em construções analíticas, como auxiliar ou como verbo pleno ou verbo suporte para o auxiliar pretender, por exemplo. As construções, porém, apresentam características divergentes em relação ao traço deslocamento.

vou pretendo ir vou cantar

[+ deslocamento] [- deslocamento]

Enquanto o auxiliar ir – “vou cantar” – possui o traço [- deslocamento], ir, na perífrase “pretendo ir” mantém o traço [+ deslocamento], que lhe é peculiar, sobretudo na forma sintética – vou. Esse foi um critério para a delimitação das variantes.

Foram também não quantificadas construções modais nas quais se registram o emprego de locuções verbais como ter que (de) seguido de infinitivo, como ocorre em tenho

INQ. – E o que você fará amanhã?

INF. – Amanhã?... Inúmeras coisas eu tenho que fazer, amanhã, inclusive, é posse lá na confraria, né... eu como vou ser passada a vice-presidência... no caso... amanhã tem... inúmeras coisas pra fazê, nossa!

INQ. – É um dia bem puxado.

INF. – Bem, demais até! Essa hora já fiz... mil e uma coisa.

(QMS 043. ALiB. Macapá, Informante 8: mulher, faixa 2, universitária) Em contrapartida às sentenças que expressam incerteza, as construções formadas por

ter que (de) indicam a ideia de obrigatoriedade. Portanto, não consistem variantes da forma

canônica – futuro sintético – e, por conseguinte, não foram consideradas na análise quantitativa dos dados.

No que tange às sentenças que não correspondem à expressão de futuridade condicionada a uma ação hipotética anterior, destacam-se as formas constituídas com o verbo

procurar seguido de infinitivo, como ocorre em:

INF. – [...] procurava tirá essas pessoas da rua né, das droga, sofrimento

(QMS 044, ALiB. Campo Grande, Informante 1: homem, faixa 1, nível fundamental)

INF. – Eu procurava... ajudar o... próximo, alguns amigos... sabê administrá ele e fazê as outras pessoas felizes também.

(QMS 044, ALiB. Recife, Informante 7: homem, faixa 2, universitário)

INF. – Procuraria dá um conforto melhó pra minha família não é.

(QMS 044, ALiB. Belém, Informante 7: homem, faixa 2, universitário)

Evidencia-se, também, a oscilação de uso das formas analíticas e sintético-analíticas construídas com auxiliares modais, sobretudo o verbo poder, para ambas as situações. Observe-se:

INF. – aí pudia até me canditatá também

(QMS 044, ALiB. Rio Branco, Informante 1: homem, faixa 1, nível fundamental)

INQ. – E o que é que o senhor faria se o senhor ganhasse na loteria seu José? INF. – Nada

INQ. – Nada como assim? Fale um puquinho?

INF.– Praticamente aquele dinhêro, eu pudiria tirá, mas (init) prá lá mesmo. (QMS 044, ALiB. Teresina, Informante 3: homem, faixa 2, nível fundamental)

INF.- Bom, amanhã é sábado. É, de repente posso í ao supermercado comprá um negócio, uns ingredientes, né, compra um pexe, pá comê, que eu adoro um pexe né, e mais tarde tomá uma cervejinha né, quem sabe.

4.1.1.3 Elipse do verbo, de modo que a futuridade passa a ser expressa apenas pelo