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2. ANÁLISE SOCIOLÓGICA DOS ACIDENTES DE TRABALHO:

2.2 NÍVEL DE COMANDO:

Neste nível há um controle direto do empregador sobre as atividades desenvolvidas pelos trabalhadores, gerando três relações distintas: autoritarismo, desintegração do grupo de trabalho e servidão voluntária (DWYER, 2009). No autoritarismo há uma restrição da autonomia do trabalhador que age de maneira contrária ao que deveria por outras orientações, como por exemplo, a de não se expor a determinado risco. A desintegração do grupo é uma perda de identidade, de se ver pertencente a um grupo, de ver o outro como seu colega de trabalho que pode

auxilia-lo, ampará-auxilia-lo, criando um terreno propício para o autoritarismo. Já a servidão voluntária se dá pela realização de determinadas atividades sem questionamento, realizando-a de própria vontade ainda que seja contrário a ela.

É a partir das atividades dos sindicatos que há uma diminuição do autoritarismo. Em áreas de atuação e fiscalização das atividades pelo sindicato, havendo maior autonomia para o trabalhador agir de acordo com as normas e orientações de segurança, há uma diminuição de até um terço dos acidentes (DWYER, 2009).

O autoritarismo, dito como “pressão” pelos entrevistados, é queixa comum nas entrevistas realizadas neste estudo. Eustáquio, trabalhador de empresa terceirizada e que labuta no interior da CSN, ao ser questionado sobre quais são as causas dos acidentes, assim responde: “falta de atenção e o não cumprimento do padrão de trabalho e também pressão de seus superiores” (EUSTÁQUIO, 2018).

Percebe-se que o entrevistado responsabiliza o próprio trabalhador pelo acidente que sofre, incorporando o discurso da empresa de que os acidentes de trabalho ocorrem por desatenção ou descuido do indivíduo-membro. Contudo, posteriormente, define que as pressões impostas pelos superiores são também uma das causas dos acidentes, evidenciando como o autoritarismo influencia na ocorrência dos acidentes.

Quanto à desintegração do grupo de trabalho, esta relaciona-se ao nível de rotatividade e mudanças dos grupos de trabalhadores, não possuindo um vínculo de identidade ou afeto o que impossibilita a harmonia naquele ambiente. Dificuldade de comunicação entre os trabalhadores também gera maior desintegração entre o grupo e, por conseguinte, mais acidentes de trabalho. Já a servidão voluntária que se dá principalmente quando a relação de trabalho é organizada e gerenciada ao ponto de fazer com que os trabalhadores não oponham aos riscos de seu trabalho, apesar do pleno conhecimento da existência deles (DWYER, 2009). Essa cultura interna no interior da indústria de servidão voluntária é perceptível no depoimento de Alberto, empregado de uma empresa terceirizada no interior da indústria: “sempre trabalhei com risco de morte. Pensando nisso agora acho que nunca parei para pensar nisso em outros momentos ou antes de executar uma atividade” (ALBERTO, 2018).

O que se evidencia pelo discurso supracitado é como um empregado que trabalha há 11 (onze) anos no interior de uma siderúrgica exposto deste então a risco de morte se expunha através da servidão voluntária a tamanho risco de forma naturalizada: “nunca parei para pensar nisso” (ALBERTO, 2018), pode-se entender também que o fato de naturalizar os riscos é uma defesa psíquica para o sofrimento e angústia intensa que é perceber o risco de morte ao qual é submetido cotidianamente. Trata-se de um mecanismo de defesa psíquico. E ele continua:

“já me coloquei em cada buraco (espaço confinado) que hoje em dia não entraria de novo. Hoje tenho uma visão mais na defensiva e avalio melhor as coisas antes de executar alguma atividade, mas foi algo que construí com o tempo, não me ensinaram aqui dentro” (ALBERTO, 2018)11.

Nota-se em um primeiro momento que a servidão voluntária a qual se submeteu durante anos sofreu uma transcendência, ao criar uma postura de resistência frente aos riscos expostos. Algo que, como o próprio entrevistado expõe, foi adquirido com o tempo e que a indústria, através das ordens, não o ensinou.

A servidão voluntária é responsável por vezes pelo não uso do equipamento de segurança, a retirada de algum equipamento de proteção da máquina e até mesmo da não atenção a determinadas orientações de segurança, pois ela vem investida pela recompensa simbólica, pelo status, o prestígio ou até mesmo pelo incentivo financeiro. O que faz entender que o fato do não uso de equipamentos de segurança ou a rejeição a alguma regra não pode ser atribuído somente ao nível do indivíduo-membro, responsabilizando-o exclusivamente (DWYER, 2009).

Assim como no nível de recompensa, no de comando, duas estratégias podem ser utilizadas para a redução dos acidentes: administração da segurança no nível de comando e auto comando. A administração de segurança no nível de comando consiste na utilização das ordens e do poder de mando que os empregadores possuem para transformar os processos das relações de trabalho a fim de torná-los mais seguros (DWYER, 2009).

Em relação ao auto comando, este consiste na união dos trabalhadores para que de forma autônoma e a partir da formação de um grupo integrado possam

estabelecer medidas para reduzir o peso das relações de trabalho e assim evitar acidentes.

Quando eles formam grupos de trabalhadores integrados, têm conhecimento de seu trabalho e dos fatores relevantes externos a ele, e uma orientação contra trabalhar com riscos, os trabalhadores têm uma base ideal sobre o qual se opor às pressões no nível do comando dos empregadores (DWYER, 2018, p. 185).

Conclui-se que, quanto maior for a incidência do nível de comando nas atividades desenvolvidas nas relações de trabalho, maior será a incidência de acidentes. O que é perceptível no depoimento de Alberto:

“A cobrança é grande para fazer a produção a todo custo que a pessoa perde essa noção de que uma atitude pode levar ao acidente. De certa forma uma pressão muito grande é uma negligência quanto a prevenir acidentes” (ALBERTO, 2018).

Essa pressão muito grande, essa cobrança muito grande vislumbra o quão o nível de comando é presente no interior da siderurgia e o quanto é o causador dos acidentes de trabalho.

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