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Números reais: abordagem axiomática

Nos anexos 1, 2 e 3, apresentamos três abordagens clássicas dos números reais: axiomática, cortes de Dedekind e classes de equivalência de sequências de Cauchy (de números racionais), respectivamente. A escolha deve-se ao fato de deve-serem frequentes nos livros didáticos brasileiros de Cálculo Diferencial e Integral e Análise Matemática.

Não temos aqui a pretensão de fazer uma abordagem aprofundada e detalhada de cada uma delas, ou a construção minuciosa das mesmas, com as demonstrações de todos os teoremas. Um estudo mais detalhado de cada teoria pode ser encontrado nos livros que constam nas referências bibliográficas.

Nosso principal objetivo com estes anexos é apresentar estas abordagens, demonstrar alguns teoremas, assim como explicitar algumas ideias relativas aos aspectos intensional e extensional do conceito de número.

NÚMEROS REAIS: ABORDAGEM AXIOMÁTICA

A referência utilizada na apresentação da abordagem axiomática encontra-se em Lima (2004). A abordagem axiomática dos números reais baencontra-seia-encontra-se na apresentação de uma lista contendo fatos elementares, admitidos como axiomas.

Essa lista identifica um conjunto com duas operações (adição e multiplicação).

Todas as propriedades relativas a esse conjunto decorrem logicamente desses axiomas. O que se tem ao final é que essa lista de axiomas vai conceituar estruturalmente o conjunto R (conjunto dos números reais) como um corpo

ordenado completo. E poderemos ver (demonstrar) que esse conjunto (que é corpo, que tem ordem, e é completo), a menos de um isomorfismo é único.

Os axiomas serão apresentados por etapas: os axiomas de corpo; os de ordem, e por último lugar o axioma do supremo, esse último é precisamente o axioma não-algébrico, aquele que desempenha o papel fundamental na caracterização do conjunto dos números reais.

1. Axiomas de Corpo

O conjunto R, munido de duas operações, chamadas adição e multiplicação, satisfaz os axiomas de corpo, quais sejam:

A1. Associatividade da adição – quaisquer que sejam x, y, z∈ R, tem-se )

( )

(x+ y +z= x+ y+z .

A2. Comutatividade da adição - quaisquer que sejam x, y∈ R, tem-se x

y y

x+ = + .

A3. Existência do elemento neutro para a adição – existe 0∈ R tal que x

x+0= , seja qual for x∈ R. O elemento 0 chama-se zero.

A4. Existência do oposto aditivo (ou simétrico) – todo elemento x∈ R possui um simétrico −x∈ R tal que x+(−x)=0.

M1. Associatividade para a multiplicação – dados quaisquer x, y,z∈ R, tem-se (x.y).z =x.(y.z).

M2. Comutatividade para a multiplicação - quaisquer que sejam x, y∈ R, vale x.y= y.x.

M3. Existência do elemento neutro – existe 1∈ R tal que 1≠0 e x.1= x, qualquer que seja x∈ R. O elemento 1 chama-se um.

M4. Existência do inverso multiplicativo – todo x≠0 em R possui um inverso x1, tal que x.x1 =1.

D1. Distributividade da multiplicação em relação à adição - dados quaisquer x, y, z∈ R, tem-se x.(y+z)=x.y+x.z.

2. Axiomas de ordem

Um corpo ordenado é um corpo R, no qual se destacou um subconjunto P⊂R, chamado o conjunto dos elementos positivos de R, tal que as seguintes condições são satisfeitas:

P1. A soma e o produto de elementos positivos são positivos. Ou seja, P

y x P y

x, ∈ ⇒ + ∈ e x.yP.

P2. Dado x∈ R ocorre exatamente uma das três condições:

=0

x , ou xP, ou −xP.

Indicando com −P o conjunto dos elementos −x, tais que xP, temos R= P(P)

{ }

0 , sendo os conjuntos P, −P e

{ }

0 dois a dois disjuntos. Os elementos de −P chamam-se negativos.

No corpo ordenado R, escrevemos x< y, para indicar que x é menor do que y, para significar que yxP, ou seja, que y= x+z, onde zP. Analogamente, y> x indica que y é maior do que x.

Em particular x>0 indica que xP e x<0 indica que x é negativo e nesse caso −xP. Se xP e y∈−P tem-se x> y.

A relação de ordem x< y em um corpo ordenado R goza das seguintes propriedades:

O1. Transitividade – se x< y e y<z então x< z.

O2. Tricotomia – dados x, y∈ R, ocorre apenas uma das seguintes condições: x= y, ou x < y, ou x> y.

O3. Monotonicidade da adição – se x< y então, para todo z∈R, tem-se z

y z

x+ < + .

O4. Monotonicidade da multiplicação – se x< y então, para todo z >0, tem-se x.z< y.z. Se, porém, for z<0, então x< y implica x.z > y.z.

Um subconjunto X de um corpo ordenado R chama-se limitado superiormente quando existe b∈R tal que bx para todo xX. Cada elemento de R com essa propriedade chama-se uma cota superior de X.

Analogamente, X ⊂R diz-se limitado inferiormente quando existe a∈R tal que xXax. Um elemento de R com essa propriedade chama-se cota inferior de X .

Um subconjunto X de um corpo ordenado R chama-se limitado quando é limitado superiormente e inferiormente.

3. Números reais

Sejam R um corpo ordenado e X ⊂R um subconjunto limitado superiormente. Um elemento b∈R chama-se supremo do subconjunto X quando

b é a menor das cotas superiores de X em R.

Assim, para que b∈R seja supremo de um conjunto X ⊂R, é necessário e suficiente que sejam satisfeitas as duas condições abaixo:

S1. Para todo xX, tem-se xb.

S2. Se c∈ R é tal que xc para todoxX, então bc.

A condição S1 afirma que b é cota superior de X, enquanto S2 afirma que qualquer outra cota superior de X deve ser maior do que ou igual a b. O supremo de um conjunto, quando existe, é único e escrevemos sup X para indicá-lo.

Analogamente, um elemento a∈R chama-se ínfimo de um conjunto Y ⊂R, limitado inferiormente, quando a é a maior das cotas inferiores de R.

Para que a∈R seja o ínfimo de Y ⊂R, é necessário e suficiente que as condições abaixo sejam satisfeitas:

I1. Para todo yY, tem-se ay.

I2. Se c∈ R é tal que cy para todoyY, então ca. O ínfimo de Y, quando existe, é único e escreve-se a=inf Y.

Um corpo ordenado R chama-se completo quando todo subconjunto não-vazio, limitado superiormente, X ⊂R, possui supremo em R.

Resulta da definição que, num corpo ordenado completo, todo conjunto não-vazio, limitado inferiormente, Y ⊂R, possui um ínfimo. Com efeito, dado Y, seja X =−Y, isto é, X =

{

y; yY

}

. Então X não é vazio e limitado superiormente; logo existe a=sup X . Como se vê, tem-se −a=inf Y. Demonstra-se ainda que todo corpo ordenado completo é arquimediano.

Axioma. Existe um corpo ordenado completo, R, chamado o corpo dos números reais.

Dados R e L, corpos ordenados completos, existe uma única bijeção :

f R→L tal que f(x+ y)= f(x)+ f(y) e que f(x.y)= f(x).f(y). A função f chama-se um isomorfismo entre R e L. Os corpos R e L são isomorfos, ou seja, indistinguíveis no que diz respeito às propriedades de corpos ordenados completos. Demonstra-se que, a menos de um isomorfismo, existe apenas um corpo ordenado completo. Isso garante a unicidade dos números reais.