• Nenhum resultado encontrado

2 REVISÃO DA LITERATURA

2.3 N EUROESTERÓIDES E E STERÓIDES N EUROATIVOS

Em 1981, Baulieu et al. propuseram o termo neuroesteróides, o qual se refere aos esteróides sintetizados pelas células gliais mielinizadas, astrócitos e neurônios no SNC e sistema nervoso periférico (SNP) a partir do colesterol ou de precursores esteróides importados de estruturas periféricas e que são metabolizados “in situ” (BAULIEU & ROBEL, 1990; BAULIEU, 1998; COMPAGNONE & MELLON, 2000). Diferem dos hormônios esteróides por seu potencial neurofarmacológico e por atuarem nos receptores de membrana, enquanto que os hormônios esteróides atuam nos receptores citosólicos (BRITTON & KOOB, 1998). Exemplos de neuroesteróides são a progesterona e seus metabólitos neuroativos, 3α-hidroxi-5α-pregnano-20-ona (aloP) e 3α-hidroxi-5β-pregnano-20- ona (pregnanolona). Precursores da progesterona, pregnenolona e sulfato de pregnenolona, também podem ser classificados como neuroesteróides (Figura 5).

Fases do Ciclo

Ovariano Fase Folicular * Fase Lútea

Níveis dos hormônios gonadotrópicos

Estágios foliculares durante o ciclo

ovariano

Níveis dos hormônios ovarianos

Figura 4. Eventos foliculares e hormonais do ciclo menstrual (Adaptada de Menstrual Cycle: Biology of the Female Reproductive System. In: http://www.merckmanuals.com/

home/womens_health_issues/biology_of_the_female_reproductive_system/menstrual_ cycle.html). *Fase Ovulatória

Posteriormente, o termo esteróides neuroativos foi introduzido e corresponde aos hormônios esteróides com ação no SNC, independente do local da sua produção (PAUL & PURDY, 1992). Os esteróides neuroativos sintetizados endogenamente, quer no cérebro ou por órgãos endócrinos periféricos, agem em tecidos neuronais e representam um aspecto da interação entre esteróides e o SNC. Dentre os esteróides neuroativos mais estudados estão os estrógenos, a progesterona e seus metabólitos, como aloP e pregnanolona. Em geral, os estrógenos exercem efeitos excitatórios, enquanto que a progesterona exerce efeitos inibitórios no SNC (WIHLBÄCK et al., 2006).

Embora o encéfalo constitua um importante sítio de metabolismo da progesterona, a qual é metabolizada a aloP (SCHUMACHER et al., 2000), a maior parte da aloP plasmática na mulher tem origem predominantemente no corpo lúteo (OTTANDER et al., 2005). Nas

mulheres saudáveis em idade fértil, os níveis circulantes de aloP variam de acordo com os níveis de progesterona ao longo do ciclo menstrual (BITRAN et al., 1995; WANG et al., 1996).

Os efeitos da progesterona no comportamento não reprodutivo não são mediados por sua interação direta com os receptores de progesterona, mas decorre da interação dos seus metabólitos, em especial a aloP, com o receptor GABAA, uma vez que a progesterona, por si só, não é ativa neste receptor (SIMMONDS et al., 1984; HARRISON et al., 1987; PAUL & PURDY, 1992; BITRAN et al., 1993).

Acreditava-se que os neuroesteróides, dentre eles a aloP, atuavam na subunidade β. Entretanto, evidências sugerem a presença de dois sítios de ligação distintos para os neuroesteróides no complexo receptor GABAA. Um destes locais de ligação seria responsável pela facilitação, ou potencialização, da ação de GABA e o outro local de ligação seria responsável pelas propriedades de abertura direta do canal de Cl- do receptor GABAA pelos neuroesteróides (PUIA et al., 1990). O estudo realizado por Hosie et al.(2006), demonstrou que o sítio de ativação direta dos neuroesteróides no receptor encontra-se na interface entre as subunidades α e β, enquanto que o sítio de ligação para potencialização da ação do GABA encontra-se na subunidade α. Assim, a ativação do receptor GABAA por neuroesteróides se baseia na ocupação de ambos os sítios, o de ativação direta e o de potencialização do GABA.

A aloP apresenta propriedade ansiolítica, anticonvulsivante, sedativa/hipnótica e anestésica. Ao ligar-se ao complexo-receptor do GABA, promove modulação alostérica e aumenta o binding de GABA e de benzodiazepínicos às membranas neuronais, com consequente aumento no influxo de Cl-. Logo, a aloP potencializa a inibição mediada por GABA durante estados de excitabilidade alterada do SNC, tais como estresse ou ansiedade (MAJEWSKAet al., 1986; HARRISON et al., 1987; PETERS et al., 1988; BITRAN et al.,

1991; PURDYet al., 1991).

O efeito dos neuroesteróides no receptor GABAA varia de acordo com o estado reprodutivo de ratas (BRUSSARD et al., 1997; SMITH et al., 1998). Mudanças nos níveis de progesterona e, consequentemente, de aloP, ao longo do ciclo modulam os efeitos comportamentais de drogas gabaérgicas em modelos pré-clínicos (BABALONIS et al., 2008). Algumas evidências mostram que a exposição a este neuroesteróide produz efeitos ansiogênicos de modo tempo-dependente. Em roedores, a exposição continuada à progesterona ou à aloP durante 48-72 h, da mesma forma que a retirada após a exposição prolongada a estes neuroesteróides (cinco dias), aumenta a ansiedade e gera insensibilidade à

agonistas benzodiazepínicos (MORAN & SMITH, 1998; SMITH et al., 1998; GULINELLO

et al., 2001).

Em humanos, a sensibilidade à benzodiazepínicos em mulheres saudáveis parece estar aumentada durante a fase lútea, quando comparado com a fase folicular, em decorrência das altas concentrações endógenas de esteróides neuroativos, tais como a aloP (SUNDSTRÖM et

al., 1997).

Os estrógenos, por sua vez, ao nível cerebral estimulam o eixo HPA (KIRCHBAUM, et

al., 1996; CHROUSOS et al, 1998; MORGAN&PFAFF, 2002), modulam a plasticidade dos

terminais axonais, ramos dendríticos e receptores (WOOLLEY & McEWEN, 1993; GAZZALEY et al., 1996), modulam o funcionamento de diversos sistemas de neurotransmissores como o serotoninérgico, dopaminérgico, adrenérgico e colinérgico (LUINE, 1985; McEWEN & ALVES, 1999; SELLIX, et al., 2004), e potencializam a transmissão glutamatérgica no receptor N-Metil-D-aspartato (NMDA). Além disso, influenciam a neurotransmissão inibitória por inibir a síntese de GABA através da redução da atividade da enzima ácido glutâmico descarboxilase (GAD), enzima necessária para a síntese do neurotransmissor (RUDICK & WOOLLEY, 2001).

Alterações no receptor GABAA após a administração de estradiol têm sido atribuídas aos mecanismos genômicos, enquanto que os efeitos rápidos da progesterona e seus metabólitos, como a aloP, ocorrem como resultado da interação direta com o receptor GABAA (SCHUMACHER et al., 1989).

Além desses efeitos, os estrógenos e a progesterona podem aumentar a densidade de receptores GABAA em determinadas regiões do cérebro (MAGGI & PEREZ, 1984) e assim, é possível que alterem também os efeitos de agonistas gabaérgicos, como os benzodiazepínicos.

Figura 5. Biossíntese de Esteróides. 3α-HSOR: 3α-hidroxiesteróide oxiredutase; 3β-HSD: 3β-hidroxiesteóide desidrogenase; 17β-HSD: 17β-

hidroxiesteróide desidrogenase; 17β-HSOR: 17β-hidroxiesteróide oxiredutase; P450c17: 17α-hidroxilase; P450scc: enzima citocromo P450 clivadora de cadeia de colesterol. 3α-HSOR 5α-redutase 17β-HSD P450aromatase 17β-HSOR P450c17 3β-HSD P450c17 3α-HSOR P450c17 5α-redutase 3α-HSOR 5α-redutase 3β-HSD P450c17 21β-hidroxilase 11β-hidroxilase 17β-HSD COLESTEROL PREGNENOLONA 17-OH-PREGNENOLONA PROGESTERONA 5α-DIIDRODESOXICORTICOSTERONA 3α,5α-TETRAHIDRODESOXICORTICOSTERONA DEIDROEPIANDROSTERONA ANDROSTENEDIONA 17-OH-PROGESTERONA PREGNANEDIONA ALOPREGNANOLONA DESOXICORTISOL CORTISOL TESTOSTERONA ESTRADIOL ESTRONA DIIDROTESTOSTERONA ANDROSTENADIOL ANDROSTERONA P450scc

Documentos relacionados