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Na Estação Experimental também estanciam os filhos ilustres

CATÍTULO 2 UMA CIDADE MONUMENTALIZADA DE SOBRENOME

2.2 A toponímia dos Pessoa nos espaços urbanos

2.2.3 Na Estação Experimental também estanciam os filhos ilustres

Um empreendimento de grande porte e que promoveu expressivos benefícios aos umbuzeirenses foi criado pelo então Presidente da República, Epitácio Pessoa. Através do Decreto n° 14.711, de 5 de março de 1921, ele fundou duas Estações de Monta na Paraíba: uma em Pombal e outra na sua cidade natal66. A “Estação de Monta de Umbuzeiro” foi inaugurada em 14 de novembro de 1922, já no último dia de seu mandato presidencial. Para dirigir o estabelecimento, foi nomeado seu sobrinho, o engenheiro agrônomo Epitácio Pessoa Sobrinho.

A Estação fazia parte de um conjunto de obras realizadas com o objetivo de “attenuar os rigôres das sêccas”. Foi equipada com “silos” capazes de armazenar aproximadamente “50 toneladas” de “milho e outros cereaes a salvo das pragas que os atacam, ficando assim resolvido praticamente o problema da conservação dos mesmos”67. Concomitantemente, ela foi destinada à criação, seleção de raças e melhoramento do gado bovino e, ainda, auxiliar os criadores da Paraíba.

De acordo com a revista Era Nova (1923, p. 9): “Dentre os grandes melhoramentos com que o govêrno do dr. Epitácio Pessôa quiz dotar a Parahyba, destaca-se a Estação de Monta de Umbuzeiro”68. Um benefício concedido pelo Presidente da República ao seu torrão natal.

Todavia, em 1931, na ocasião da solenidade em memória do aniversário de morte de João Pessoa, a Estação teve seu nome alterado para “Estação de Monta João Pessoa”, através do Decreto nº 20.187, de 07 de julho de 193169. Atualmente, devido às mudanças

66 Este decreto federal deu novo regulamento ao Serviço de Indústria Pastoril no país e versa sobre várias

atribuições em âmbito agropastoril. Para tanto, pelo Art. 8º criou duas estações de monta permanentes na Paraíba,

uma delas construída em Umbuzeiro. Este decreto encontra-se disponível em:

http://www2.camara.leg.br/legin/fed/decret/1920-1929/decreto-14711-5-marco-1921-517494- publicacaooriginal-1-pe.html Acesso: 16 jun. 2014.

67 Mensagem apresentada à Assembleia Legislativa do Estado em 1° de setembro de 1922, pelo Presidente Solon

Barbosa de Lucena, p. 25.

68 Informações encontradas na Revista Era Nova, número 48 de 26 de julho de 1923, p. 9.

administrativas, foi estadualizada e passou a ser denominada de “Estação Experimental João Pessoa”70.

IMAGEM 19 - ESTAÇÃO EXPERIMENTAL JOÃO PESSOA

Fonte: Acervo pessoal da autora. 2013.

Nesta ocasião, vários preitos foram realizados em Umbuzeiro e em todo o estado paraibano. A solenidade feita na Estação se deu por volta das duas horas da tarde. O primo do homenageado e chefe da estação, o Sr. Epitácio Pessoa Sobrinho, foi o encarregado de preparar as solenidades, bem como “proferiu emocionantes palavras sobre o inolvidável João Pessôa, exaltando a acção do mesmo em pról daquela repartição que elle chefia” (A UNIÃO, 30 jul. 1931, p. 3).

No terraço da casa da Estação, foi colocado um retrato do homenageado em um “altar symbolizando a pátria” (A UNIÃO, 30 jul. 1931, p. 3), que era formado por “uma columna auri-verde tendo abaixo o escudo rubro negro com a seguinte legenda: ‘Ainda vive no coração do Brasil’”. As pessoas ali presentes foram conduzidas a colocar flores neste altar, realizando assim uma espécie de ritual. O gesto permeado de uma conotação bastante significativa reforçava a tentativa de manter viva a figura de João Pessoa ligada à cidade, refundando seu nome pelos recantos da pequena urbe. Igualmente, a mensagem tem um teor apelativo no mesmo sentido para o âmbito nacional.

Os participantes da solenidade foram agraciados com uma fotografia do ex-presidente, distribui-se cerca de dois mil exemplares. Nos conta A União (30 jul. 1931, p. 3) que o retrato

70 Atualmente a “Estação Experimental João Pessoa” é ligada à Emepa-PB (Empresa Estadual de Pesquisa

foi arrebatado “principalmente pelos pobres, que o guardavam como uma relíquia”. Aqui o jornal deixa transparecer que o tal retrato, nas mãos das pessoas humildes, parecia se confundir com a própria existência de João Pessoa e que, por isso, era algo precioso. Destarte, o periódico oficial do estado insiste em revelar nesta matéria que João Pessoa era ainda muito querido pelos paraibanos e principalmente pelos mais humildes, dando a entender que este homem havia se tornado um herói para estes indivíduos. Outros aspectos importantes deste momento podem ser visualizados a partir da fotografia a seguir:

IMAGEM 20 - FOTOGRAFIA DA HOMENAGEM FEITA NA ESTAÇÃO DE MONTA JOÃO PESSOA

Fonte: Acervo da Estação Experimental João Pessoa. 1931.

Esta foto foi produzida na frente da casa da Estação e tem como legenda no seu quadro as seguintes palavras: “Estação de Monta João Pessoa”, Umbuzeiro, “Comemoração do 26 de julho de 1931”. Ao que tudo indica, ela foi encomendada a um fotógrafo de Recife que a assinou no canto inferior, mas que não conseguimos identificar. Atualmente encontra-se exposta em parede interna da casa da Estação, juntamente com outras imagens, e, dentre as quais, um retrato de João Pessoa.

No tocante ao aspecto geral dessa fotografia, observamos que sua composição é muito boa. As pessoas estão todas bem posicionadas, havendo apenas o desfoque do rosto de duas crianças que se moveram no momento. Porém, percebe-se que o fotógrafo teve o máximo de cuidado na organização da cena a ser perpetuada pela objetiva.

No plano central da foto encontramos três homens vestindo trajes de cor escura ou preta. O homem do meio trata-se de Epitácio Pessoa Sobrinho e, à sua esquerda, está o padre José Vital Ribeiro Bessa. Os demais personagens ao redor deles provavelmente são também membros da família Pessoa. Notamos que a grande maioria é composta por figuras masculinas, que, de modo geral, apresentam-se bem vestidas. Certamente trata-se de políticos locais, de pessoas influentes ou até mesmo dos funcionários da Estação de Monta.

Ainda no primeiro plano da fotografia encontram-se algumas crianças, sobretudo meninos. Alguns deles têm em seus peitos uma fitinha de cor preta indicando o sinal de luto, e outros têm um papel na mão, o qual deve tratar-se do retrato de João Pessoa, distribuído aos presentes naquela ocasião. A presença infantil nesse tipo de evento é bastante significativa já que a intenção é de que, desde cedo, aprendam a admirar aquele conterrâneo, se espelhem no seu exemplo de vida e se transformem em propagadores de sua memória para as futuras gerações.

Na sacada da casa é possível ver algumas bandeiras hasteadas. Uma delas é bastante nítida e podemos identificar a palavra “Nego”. É a bandeira que se tornou símbolo da morte de João Pessoa e o pavilhão oficial do estado da Paraíba. Dentre elas, certamente havia também a bandeira nacional. Ambas constituíam um aspecto sentimentalista e patriótico, dando ao evento um ar de civismo.

A presença de alguns homens vestidos a caráter, posicionados no canto superior direito da foto e encostados na parede da casa, tal como o senhor que aparece no canto superior do lado esquerdo, indica que houve uma banda de música, que, nestas ocasiões, era geralmente encarregada de tocar os hinos ou alguma marchinha. Concluída esta homenagem, os presentes de dirigiram para o centro da cidade onde seguiu-se a programação daquele dia.

Além da Estação representar mais um dos vários lugares de memória que foram especializados por Umbuzeiro, a ela soma-se ainda outro elemento simbólico representativo da monumentalização dos Pessoa. Trata-se do busto erguido como preito ao primeiro diretor da Estação, Epitácio Pessoa Sobrinho (filho de Antônio Pessoa, sobrinho de Epitácio e primo de João Pessoa).

IMAGEM 21 - EPITÁCIO PESSOA SOBRINHO E O SEU BUSTO NA ESTAÇÃO EXPERIMENTAL JOÃO PESSOA

Fonte: Revista Era Nova, 1923 e acervo pessoal da autora, 2013.

Este ficou conhecido por suas aptidões, as quais “evidenciam esta capacidade do operoso administrador daquelle importante estabelecimento os progressos por que rapidamente vae passando o mesmo, sob sua orientação” – comenta a Revista Era Nova (26 jul. 1923), que, complementando este arcabouço de elogios, divulgou algumas fotografias das instalações da Estação e de seu diretor71.

Para além dos benefícios agropecuários, a Estação ainda era utilizada enquanto recinto cultural e de lazer. Nela havia “um plantel dos mais belos e sofisticados espécimes de todas as raças, expostos à visitação pública” que se transformou num espetáculo, proporcionando “a maior diversão para o povo, em dias de domingo”. Boa parte destes animais havia sido importada de outros países, e eles foram “escolhidos a dedo, pelo maior Zootecnista do Nordeste – Dr. Epitácio Pessoa Sobrinho” (GOMES, 1995, p. 137, grifo nosso).

Diante de tão esmerado trabalho, na comemoração do cinquentenário da Estação em 1972, Epitácio Sobrinho recebeu um monumento como laurel. Na placa afixada na base onde está assentado o busto, lê-se as seguintes informações: Homenagem do Ministério da Agricultura aos 50 anos de atividades da “Fazenda Regional de criação ‘João Pessoa’, ao seu fundador e zootecnista pioneiro na seleção do Gir Leiteiro no Brasil - Eng. Agr. Epitácio Pessôa

Sobrinho”72. Embora a placa indique que a homenagem se fez pelo Ministério da Agricultura,

vale destacar que o sobrinho do homenageado, o agrônomo Carlos Pessoa Filho, exercia o seu terceiro mandato como deputado estadual após ter ocupado o cargo de secretário da agricultura, e não seria surpresa se ele tivesse dado indicações para a feitura do monumento ao tio.

Outros filhos do Cel. Antônio Pessoa também fizeram parte da trajetória da Estação. Com o fim da gestão de Epitácio Sobrinho, seu lugar foi assumido por outro membro da família Pessoa: seu irmão Roberto Pessoa. Seguiu-se assim mais um período da supremacia daquela família. A existência desses símbolos (nome e busto) dos Pessoa na Estação formam um conjunto monumentalístico que incrementa este lugar de memória.

Destarte, em favor da preservação deste espaço de memória, em 07 de maio de 2002 a Estação Experimental “João Pessoa” foi tombada por meio do Decreto nº 23.011/200273. O

tombamento foi o resultado de um pedido feito pela diretoria da Estação ao IPHAEP. Nele inclui-se a área total de 277 hectares, suas edificações e a espécie vegetal jurema branca, árvore centenária da Estação. Com isso, este “lugar de memória” foi legitimado e ficou salvaguardado.