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Narrativa e tradução do coletivo Parque Solón de Lucena – Parque da Lagoa Uma das primeiras operações que um objeto técnico realiza é aquela que

narrativas descritivas e traduções

6.1 Narrativa e tradução do coletivo Parque Solón de Lucena – Parque da Lagoa Uma das primeiras operações que um objeto técnico realiza é aquela que

define os atores e um espaço” (2014, p. 165), escreve Akrich. Aqui entendemos o objeto técnico ao qual Akrich se refere como os dispositivos construídos dos espaços públicos analisados. Partimos da observação da autora para iniciarmos a narrativa do coletivo Parque Solón de Lucena, ou Parque da Lagoa. Os dispositivos espaciais, além de definirem o espaço, atuam também como mediadores em suas interações com as disposições sociais.

Localizado no bairro do Centro, o parque é um elemento estruturador da morfologia urbana e da paisagem do centro histórico⁸² da cidade. Por muitos anos, como citado no quarto capítulo, sua espacialidade foi marcada por anéis viários para onde convergia o sistema de transporte público de ônibus de João Pessoa. As intervenções urbanísticas de requalificação recentes⁸³ pautaram-se pela retirada dos anéis viários mais internos e a incorporação do espaço das vias ao parque propriamente dito. Um ponto positivo, se pensarmos sob a ótica do espaço público, foi a restituição desse espaço para as pessoas, rompendo com a lógica que permeia os espaços públicos em grande parte das cidades brasileiras, e também, alvo das críticas acerca da cidade pensada para a escala do carro e não das pessoas. Tal fato gerou uma nova ambiência⁸⁴ para o parque como passamos a observar.

Seu arranjo espacial continuou perimetral. Os dispositivos estão distribuídos

⁸² Sobre o conceito de centro histórico ver o que diz Scocuglia: “O conceito de centro histórico estaria atrelado à origem do antigo núcleo urbano, à simbologia associada ao passado, à importância da área como elemento inicial no processo de formação do espaço urbano. Enquanto o conceito de centro principal ou de centro tradicional corresponderia à maior aglomeração diversificada de empregos, ou a maior aglomeração de comércio e de serviços numa correspondência com as antigas áreas centrais que deram origens as cidades brasileiras, chamadas anteriormente apenas de “centro” (2010, p. 24 e 25).

⁸³ O parque da Lagoa teve as obras de intervenção concluídas em junho de 2016.

⁸⁴ Entendemos ambiência no sentido atribuído por Thibaud: “em suma, ambiência é definida como o espaço-tempo experimentado pelos sentidos” (2001, p.9).

em faixas sucessivas em torno da lâmina de água, conforme vemos na vista aérea e imagem a seguir (figura 25 e 26). Assim, a retirada das vias de automóveis cedeu lugar ao aumento do gramado que circunda a lagoa, tendo em sua volta uma ciclovia. Após essa, uma área livre para passeio e por fim, toda a área de dispositivos como descreveremos.

Embora seja possível acessar o parque de qualquer ponto, existem quatro acessos principais demarcados cuja dinâmica está diretamente correlacionada ao seu entorno como veremos a seguir nos mapas comportamentais. No entorno do parque, observamos uma diversidade de usos com predominância de comercial e de serviços. A concentração de comércios na porção mais ao norte do parque faz com que esta seja a área de maior afluxo de pessoas, principalmente nos dias e horários quando o comércio está aberto, imprimindo uma dinâmica intensa que se relaciona com o entorno, como discutiremos mais adiante nas traduções dos coletivos, pois, nesse

Figura 25: Vista aérea do Parque da Lagoa

Fonte: Google Earth Pro

Gramado Pontos de ônibus

Pontos de ônibus Ciclovia Caminhada Dispositivos contruídos/ praças

momento, fazemos apenas um relato descritivo do referido coletivo.

Relacionada também à dinâmica do parque está a questão da acessibilidade e da mobilidade. O ônibus tornou-se um dos principais meios de transporte de acesso ao parque. Dois fatores contribuem para o incentivo ao uso do ônibus como principal modal. O primeiro é que a maioria e as principais linhas de ônibus da cidade passam pelo parque, tendo dois pontos principais de confluência como vemos na figura 25. O segundo diz respeito ao fato de a área de entorno imediato não dispor de estacionamentos para o automóvel individual. Esse é um fator de promoção do primeiro meio de transporte e de falta de incentivo ao uso do segundo. Contudo, vemos mais adiante, como essa dinâmica acontece de maneira diferenciada entre dias úteis da semana e nos finais de semana.

Com relação aos dispositivos construídos, após a requalificação, o parque passou a contar com a oferta maior de equipamentos destinados ao esporte, lazer, alimentação e contemplação sendo organizados em doze espaços de pequenas praças em torno da lagoa. O parque conta ainda com uma ciclovia e uma pista de

cooper, parede de escalada, pista de skate, área para passeio, deck de contemplação

Figura 26: Vista do Parque da Lagoa vendo-se a distribuição perimetral dos

dispositivos espaciais em torno da lagoa

integrado ao restaurante já existente, parques infantis, equipamentos de ginástica, área com mesas para jogos de tabuleiro, catorze quiosques com baterias de banheiros, além de posto policial da guarda civil municipal e polícia militar. Apresenta também áreas livres para dispositivos efêmeros⁸⁵.

Com uma organização espacial perimetral, não há uma setorização marcada na distribuição dos dispositivos na faixa mais externa ao parque, favorecendo, de certa forma, uma mescla de usos daqueles. Destacamos que a acessibilidade aos dispositivos merece ser discutida sob o ponto de vista técnico e em sua amplitude, pois nem todos os equipamentos podem ser acessados de forma independente por pessoas com deficiência.

A iluminação pública também é um ponto que precisa ser analisado, pois representa um fator de aumento da permanência das pessoas na área e da sensação de segurança no período noturno. O parque possui, em toda a sua extensão, iluminação com postes altos e iluminação baixa. Embora considerada boa, a vegetação de grande porte, cria áreas de sombreamento para os dispositivos instalados embaixo das árvores, motivo de queixa dos usuários como verificado nas entrevistas com esse público.

Outro ponto a destacar quanto à descrição do espaço diz respeito ao uso da vegetação como dispositivos espaciais. Quanto ao porte, observamos dois tipos: árvores de grande porte e vegetação forrageira, não dispondo de uma vegetação mais arbustiva. O parque é bastante arborizado e a vegetação tem papel importante para o uso e apropriação do espaço como veremos mais adiante. As áreas sombreadas contribuem para uma maior permanência dos usuários, mesmo em horas onde a insolação é mais forte. O fato da vegetação se configurar como descrito tem importância também para a permeabilidade visual do parque. Ao nível dos olhos, há uma continuidade visual, bem como espacial. O parque não apresenta barreiras físicas que promovam descontinuidades espaciais nem visuais.

Após a descrição dos dispositivos espaciais, apresentamos abaixo o registro de observação relativa ao item dispositivos, sintetizando os pontos apresentados, seguido de um mapa com a espacialização dos dispositivos.

⁸⁵ Chamamos de dispositivos efêmeros aqueles que não estão fixos no espaço, que podem ser colocados e retirados de um determinado lugar, tendo muitas vezes curta duração de tempo.

Quadro 2: Registro de observação do Parque da Lagoa - Resumo