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2. Aspectos internacionais do desenvolvimento sustentável

2.3 Natureza jurídica do desenvolvimento sustentável

Poderia-se, desde logo, considerar, como aliás é um argumento muito utilizado, que perante as dificuldade de balizar e concretizar o conceito, conclui-se pela ausência de carácter normativo. Tanto assim é que perante esta dificuldade em balizar o alcance de um princípio de desenvolvimento sustentável “as considerações jurídicas são deixadas ao Grupo de Peritos em Direito do Ambiente da WCED”129

, uma intenção já manifestada no princípio 27 da Declaração Rio de uma necessidade de proceder a um desenvolvimento no direito internacional no campo do desenvolvimento sustentável130

. Do relatório do grupo de peritos na identificação de princípios do direito internacional pelo desenvolvimento sustentável resultaram dezanove princípios e conceitos com o objectivo de orientar a interpretação das obrigações jurídicas existentes como também de servir de apoio ao desenvolvimento

126 Ver infra ponto 6.

127 MALJEAN-DUBOIS dá como exemplo o sistema de non compliance introduzido pelo Protocol de Montreal que foi posteriormente adaptado noutras convenções internacionais, MALJEAN-DUBOIS, Sandrine. De rio à Johannesburg: et au- delà?...,cit, p.615

128 Idem Ibidem p.616

129 SARAIVA, Rute obra cit. p. 296

130 BIRNIE, Patricia, BOYLE, Alan and REDDGWELL, Catherine. International Law and the

38 de novos instrumentos jurídicos com vista ao objectivo do desenvolvimento sustentável131

. Dentre os princípios enunciados ressaiem obrigações procedimentais como as de informação, participação e acesso à justiça assim como princípios mais gerais, nomeadamente, o princípio das responsabilidades comuns mas diferenciadas132

. Em 2002 a International Law Association formula sete princípios de desenvolvimento sustentável133

e embora o conceito de desenvolvimento sustentável seja formulado enquanto tal e não como um princípio admite-se que o recurso ao conceito de desenvolvimento sustentável em direito internacional pode, com o tempo, reflectir a sua maturação num princípio de direito internacional134135

. Esta conclusão não deveria ser negligênciada. Com efeito, se as confêrencias das nações unidas não conseguiram balizar um princípio de desenvolvimento sustentável, delas resultam várias princípios cuja a observância visa a integração do ambiente na prossecução de objectivos económicos. Levando alguns autores a falar em princípios de chaves do desenvolvimento sustentável, como o faz por exemplo Sandrine MALJEAN- DUBOIS136

, referindo assim os princípios de precaução, participação e prevenção. Outros autores acabam por tentar identificar aquilo que consideram os elementos constitutivos do desenvolvimento sustentável, discernindo entre elementos substantivos (p. ex: o princípio de integração tal como previsto no princípio 4º da Conferência Rio) e procedimentais137

.

Não acompanhamos a visão de alguns autores que falam num novo corpus juris de direito internacional aglutinador de normas provindas do direito internacional económico, ambiental e social138

. O conceito de desenvolvimento sustentável vai continuar a ter um uso polissémico, a sua faceta transversal e multidisciplinar

131 LANFRANCHI, Marie-Pierre. Développement Durable et Droit International Public...,cit p. 16 132 Idem Ibidem

133 ILa resolution 3/2002 annexed to UN Doc. A/57/329

134 “Recourse to the concept of ‘sustainable development’ in international case law may, over time, reflect a maturing of the concept into a principle of international law, despite a continued and genuine reluctance to formalise a distinctive legal status;” ILa resolution 3/2002 annexed to UN Doc. A/57/329 135 Na declaração de Nova Deli o princípio de desenvolvimento sustentável surge identificado com sete princípios : i) obrigação de os Estados assegurarem um uso sustentável dos recursos naturais; ii) imperativo de equidade e de erradicação da pobreza; iii) princíop das responsabilidades comuns mas diferenciadas; iv) princípio da precaução; v) princípios do acesso à informação, participação e acesso à justiça em sede ambiental; vi) princípio da good governance; e vii) princípio da integração (dos direitos do Homem com os objetivos sociais, económicos e ambientais).

136MALJEAN-DUBOIS, Sandrine. De rio à Johannesburg: et au- delà?...,cit,p.600.

137 de onde resultam a cooperação dos Estados obrigação de fazer a AIA e a participação do público. . P. BIRNIE A. BOYLE and C. REDDGWELL, International Law and the environmen...,cit.

39 possibilita a sua invocação em outras áreas do Direito Internacional, e embora ele se concretize também pela ponderação de outros princípios, não consideramos muito prudente falar num Direito Internacional do desenvolvimento sustentável como um

corpus juris de Direito Internacional. A atribuir-lhe um valor normative

Por sua vez, a ideia de que o princípio de desenvolvimento sustentável se concretiza pela ponderação de outros princípios não preclude, em nossa opinião, a possibilidade deste conceito traduzir em si um princípio de Direito Internacional139

. Grande parte da doutrina internacional é muito reticente a atribuir efeitos jurídicos a este conceito ou a ver aqui um princípio de direito internacional140

, desde logo, em razão precisamente da indeterminação do seu contéudo. Certo é que o conceito de desenvolvimento sustentado, tem sido repetido sistematicamente e com as devidas abstrações todos sabemos do que se trata, tornou-se um adquirido da comunidade internacional. Nenhum ordenamento jurídico o ignora. Isto deve-se como se viu às grandes conferências das Nações Unidas, a criação de uma consciência comum em torno desta ideia. Contudo, a sua natureza juridical ainda é muito controversa daí a importância de que o TIJ se pronunciasse sobre a existência ou não de um princípio jurídico. O TIJ teve entre mãos dois casos que lhe permitiam estatuir sobre a naturza jurídica, clarificando o seu alcance e os seus contornos e contribuindo assim para a progressão do direito internacional contemporâneo. Vamos então agora ver como é o TIJ aplicou este conceito, focando-nos para isso nas suas duas decisões paradigmáticas na matéria.

139 VOIGT, Christina. The Principle of Sustainable Development...,cit. Juiz CANÇADO TRINDADE separated opinion...,cit; Weeramantry Project Gabcikovo-Nagymaros, separated opinion p. 163 140 Veja-se nesse sentido MALJEAN-DUBOIS, Sandrine. De rio à Johannesburg: et au- delà?...,cit;PERRUSO, Camila, La contribuition du juge au faconnement de la Democratie environnemental in CANAL-FORGUES, Eric, Démocratie et diplomatie environnementales: acteurs et processos en droit international. Editions A. Pedone, Paris,2015, SANDS, Philippe. Principles of international environmental law...,cit. VIÑUALES, Jorge. E. The Rise and fall of sustainable development...,cit.

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