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A Lei nº 12.587/12, que institui a Política Nacional de Mobilidade Urbana (PNMU), prevê em seu art. 3º, § 2º, 128ao tratar dos transportes urbanos, o serviço de transporte

124 Informações sobre a legalidade da Uber no Brasil e jurisprudência. Disponível em:

<http://docplayer.com.br/24406626-Informacoes-sobre-a-legalidade-da-uber-no-brasil-e-jurisprudencia.html>. Acesso em: 22/05/2017. p. 05.

125 Ibidem.

126 SARMENTO, Daniel. op. cit., p. 31.

127 LINS, Elaine Braga Martins Ribeiro. A intervenção estatal no domínio econômico e o aplicativo Uber no

brasil (state intervention in the economic field and the uber app in brazil). Revista Jurídica. vol. 04, n°. 45, Curitiba, 2016. pp.832-864 DOI: 10.6084/m9.figshare.4659416.

128 Art. 3º. O Sistema Nacional de Mobilidade Urbana é o conjunto organizado e coordenado dos modos de

transporte, de serviços e de infraestruturas que garante os deslocamentos de pessoas e cargas no território do Município. [...]; § 2º. Os serviços de transporte urbano são classificados: I - quanto ao objeto: a) de passageiros;

individual de passageiros de natureza pública (art. 3º, § 2º, inciso I, “a”, c/c incisos II, “b”, e III, “a”), assim como, o serviço de transporte individual de passageiros de natureza privada (art. 3º, § 2º, inciso I, “a”, c/c incisos II, “b”, e III, “b”)129. Regulamenta, ainda, o transporte

público coletivo urbano, que busca atender toda a coletividade, sendo, dessa forma, um serviço público que pode ser concedido, regido, regulamentado e fiscalizado pelo Poder Público130.

Todavia, o art. 4º da Lei nº 12.587/2012 não aludiu a modalidade de transporte privado individual de passageiros, como fez referência à modalidade de transporte público individual de passageiros (inciso VIII), porém, não significa que o legislador tenha deixado de reconhecê-la. Até porque, o caput do art. 4º, estabelece definições “para os fins” da aplicação da Lei nº 12.587/2012. A lei apenas previu o transporte privado individual de passageiros, mas não o regulou, como fez com o público, conforme Sarmento, o legislador parece ter considerado desnecessário definir o primeiro131.

Assim, segundo o princípio da livre iniciativa, expresso no parágrafo único do art. 170 da Constituição Federal de 1988, “é assegurado a todos o livre exercício de qualquer atividade econômica, independentemente de autorização de órgãos públicos, salvo nos casos previstos em lei”, como regra, existe a liberdade no exercício da atividade econômica, o que, no entanto, não impede que o Estado, avaliando a importância de uma determinada atividade sujeite-a a regulação prevista em lei.

A partir dessa ideia extraída da norma constitucional, a atividade dos taxistas se desenvolveu no Brasil com base em uma farta regulamentação, com o destaque para exigência de outorga prévia do Poder Público para o seu exercício. Em âmbito nacional, a regulamentação da atividade dos táxis está prevista na Lei Federal nº 12.587/2012 que instituiu as diretrizes da Política Nacional de Mobilidade Urbana.

Por sua vez, a Lei Federal nº 12.468/2011, que regulamenta a profissão do taxista, é taxativa ao proclamar o transporte público individual remunerado de passageiros como atividade privativa do taxista, sendo desenvolvida por meio de concessão ou permissão, conforme autoriza o artigo 175 da Constituição Federal. Nesse sentido, a doutrina majoritária,

b) de cargas; II - quanto à característica do serviço:a) coletivo b) individual; III - quanto à natureza do serviço: a) público b) privado.

129 SARMENTO, Daniel. op. cit., p. 25.

130 TAVARES, André Ramos. Parecer jurídico. Site Parceiros bsb. Disponível em:

<http://www.parceirosbsb.com/uploads/5/4/7/6/54769587/kit_doc_01.pdf>. Acesso em: 20 jun. 2017. p. 30.

considera que não se concedeu aos taxistas o monopólio no exercício de toda a atividade de transporte individual de passageiros, que compreende as modalidades pública e privada132.

Ressalte-se, que a Lei nº 12.587/2012 faz referência em seu art. 12 ao serviço de utilidade pública133, enquanto, o art. 12 da Lei Federal nº 12.468/2011, faz referência ao serviço público134 de transporte público individual de passageiros. Quanto às nomenclaturas

utilizadas, merece o destaque, a redação original do art. 12, que fazia menção a serviços públicos de transporte individual de passageiros e diante da incongruência da expressão, o legislador alterou a sua redação justamente com o intuito de retirar o transporte individual da qualificação de serviços públicos. Nesse sentido, os serviços de utilidade pública, nas palavras de Alexandre dos Santos Aragão:

são atividades da iniciativa privada para as quais a lei, face à sua relação com o bem- estar da coletividade e/ou por gerarem desigualdades ou assimetrias informativas para os usuários, exige autorização prévia para que possam ser exercidas, impondo ainda a sua contínua sujeição à regulação do poder público autorizante, através de um ordenamento jurídico setorial135.

Assim, o serviço de utilidade pública se enquadra num conceito intermediário entre serviço público e atividade econômica (conforme item 3.2), mas se sujeita a intensa regulação e fiscalização estatal, em razão do interesse público inerente à sua prestação. Já os serviços públicos são de titularidade exclusiva do Estado para atender a uma necessidade coletiva, porém, poderão ser prestados por particulares através de concessão ou permissão, e, quando outorgado para terceiros, demandam, necessariamente, de prévio processo licitatório para fins da sua concessão ou permissão (art. 175 da Constituição Federal).

A evolução legislativa evidencia que, ao tratar do transporte público individual de passageiros, o legislador mirou os serviços de táxi. Mas demonstra, também, que, até pela nova ótica do legislador, o serviço de táxi não configura propriamente serviço público, mas sim de serviço de utilidade pública, que são institutos diferentes. O serviço público, como visto, é titularizado pelo Estado, mas pode ser eventualmente prestado por particulares, mediante concessão ou permissão, sempre precedidas de licitação pública, nos termos do art. 175 da Constituição. Já o serviço de utilidade pública se enquadra no campo da atividade econômica, mas se sujeita a intensa

132 Art. 2º. É atividade privativa dos profissionais taxistas a utilização de veículo automotor, próprio ou de

terceiros, para o transporte público individual remunerado de passageiros, cuja capacidade será de, no máximo, 7 (sete) passageiros.

133 Art. 12. Os serviços de utilidade pública de transporte individual de passageiros deverão ser organizados,

disciplinados e fiscalizados pelo poder público municipal, com base nos requisitos mínimos de segurança, de conforto, de higiene, de qualidade, de qualidade de serviços, de fixação prévia dos valores máximos das tarifas a serem cobradas.

134 Art. 12. Os serviços públicos de transporte individual de passageiros, prestados sob permissão, deverão ser

organizados, disciplinados e fiscalizados pelo poder público municipal, com base nos requisitos mínimos de segurança, de conforto, de higiene, de qualidade dos serviços e de fixação prévia dos valores máximos das tarifas a serem cobradas.

regulação e fiscalização estatal, em razão do interesse público inerente à sua prestação136.

Daniel Sarmento complementa ainda que:

Quanto ao regime jurídico, não há prévia licitação, seguida de concessão ou permissão aos taxistas, como impõe a Constituição para os serviços públicos (art. 175, CF). Não bastasse, o título que enseja o exercício da atividade em questão pode ser alienado ou transmitido causa mortis (art. 12-A, §§ 1º e 2º da Lei nº 12.587/2012), o que é absolutamente inconciliável com a lógica do serviço público. O prestador do serviço – o taxista – não é obrigado a assegurar a sua continuidade: nada o impede de deixar o seu táxi parado, por longos períodos, se assim preferir137.

Ressalte-se que antes mesmo da inovação legislativa, Celso Antônio Bandeira de Mello, defendia que serviço dos taxis é de utilidade pública, assim, inserido no âmbito da iniciativa privada, não um serviço público:

“(...) os serviços prestados pelos táxis – e quanto a isto nada importa que o sejam por autônomos ou por empresas – possuem especial relevo para toda a coletividade, tal como se passa, aliás, com inúmeras outras atividades privadas, devendo por isso ser objeto de regulamentação pelo Poder Público, como de fato ocorre, mas obviamente isto não significa que sejam categorizáveis como serviços públicos. (...)

Nem a Constituição, nem a Lei Orgânica dos Municípios, nem a lei municipal regente da matéria qualificam os serviços de táxi como serviços públicos. Contudo, a Constituição foi expressa em qualificar como serviço público o serviço municipal de transporte coletivo local de passageiros (art. 30, V), não se podendo, como é óbvio, considerar casual a explícita menção a ‘coletivo’. Nisso, a toda evidência, ficou implícito, mas transparente, o propósito de excluir o transporte individual de passageiros da categorização de serviço público138.

Portanto, os serviços de táxi são reconhecidamente atividade econômica de interesse público, já que o seu regime jurídico é eminentemente privado, não possuindo as características essenciais dos institutos de direito público, e, o Estado, por opção legislativa, regulamentou a atividade, exigindo prévia autorização para o seu exercício, desde que cumpridas as exigências legais, determinando tarifas e os direitos e deveres prescritos em lei específica. Ainda que não tenha o aspecto de garantia do direito à locomoção, o que é atribuído ao transporte coletivo, essencial à vida urbana, o táxi atende a um grupo indeterminado de pessoas que individualmente usufruem da sua execução139. Nesse sentido,

Canotilho:

Embora a redacção da Lei nº 12.587, de 3 de Janeiro de 2013, possa permitir ambiguidades interpretativas, ao utilizar a formula “ direito à exploração de

serviços de táxi”, é segura que, na sua sistemática conceitual e de regime, só um

certo modo de exercício daquela actividade é que se encontra sujeita à prévia intervenção autorizativa ou licenciadora do poder público – precisamente, o

136 SARMENTO, Daniel. op. cit., p. 27. 137 SARMENTO, Daniel. op. cit., p. 27.

138 MELLO, Celso Antônio Bandeira de apud SARMENTO, Daniel. op. cit., p.28. 139 SARMENTO, Daniel. op. cit., p.28.

transporte individual de passageiros na sua modalidade dita pública, o modo de “serviços de táxi”.E isto é assim, na sistemática conceitual e de regime da Lei, por a actividade de transporte individual de passageiros ser legalmente qualificada como um “serviço de utilidade pública de transporte individual de passageiros”. Ou, dito de outro modo, por ser legalmente qualificada como uma atividade económica privada de utilidade pública, isto, é uma actividade económica privada de utilidade pública, isto é, uma actividade económica privada de interesse público (e não de serviço público)140.

O serviço da Uber, apesar da semelhança com o táxi, apresenta algumas diferenças que são usadas para afirmar que o serviço da Uber se trata de um serviço de transporte individual privado, regulado pelo Código Civil (art. 730 do Código Civil). A Uber oferece atividade econômica em sentido estrito (item 3.1) – em sentido contrário, parecer de Eros Grau, o qual define que a Uber realiza serviço público, sendo um tipo de atividade econômica cujo desenvolvimento compete preferencialmente ao setor público141 – é uma plataforma tecnológica que conecta diretamente demanda e oferta no âmbito digital142.

A Lei 12.965/2014, que trata do Marco Civil da Internet, trouxe alguns aspectos relevantes, como por exemplo, em seu artigo 2º, inciso V, no qual, previu a livre iniciativa e a livre concorrência. A referida lei disciplinou, como princípio, em seu art. 3º, inciso VIII, a liberdade de modelos de negócios promovidos na internet. Já em seu art. 4º, inciso III, o diploma normativo trouxe, como objetivo, a promoção da inovação e do fomento à ampla difusão de novas tecnologias e novos modelos de acesso.

Diante disso, torna-se impossível condicionar a possibilidade de um particular criar um modelo de negócio com a existência de regulamentação prévia estatal da sua atividade. Além de inconstitucional, é, no mínimo, temerário reprimir a inovação social em prol do desenvolvimento econômico.

Por ser algo inovador, a Uber ainda não possui normativa nacional criada específica e detalhadamente para o seu controle e disciplina, a exemplo daquela apresentada para os táxis. Porém, a partir do enquadramento legal da atividade da Uber no art. 3º, §2º, inciso I, alínea “a”, inciso II, alínea “b” e inciso III, alínea “b” da Lei 12.587/2012, reitere-se, que a Uber – diferentemente do táxi – oferece transporte individual privado de passageiros não sujeito às ingerências normativas e fiscalizatórias municipais.

140 CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Parecer jurídico sobre o Uber. Disponível:

<https://www.conjur.com.br/dl/parecer-canotilho-uber.pdf>. Acesso em: 01/10/2017. p. 16.

141 GRAU, Eros Roberto. Parecer jurídico. Conjur. Disponível em: <https://www.conjur.com.br/dl/parecer-eros-

grau-ilegalidade-uber.pdf>. Acesso em: 27 nov. 2017.

142 SAMICO JUNIOR, Paulo. O aplicativo Uber: Um estudo de caso baseado nos princípios e fundamentos

da ordem econômica na Constituição Federal de 1988. Revista de Direito da Administração Pública Law Journal of Public of Administration. Ano nº 2 - vol. 1 - Edição nº 2 – jul/dez (2016). Niterói, 2016. ISSN 2447- 2042. p. 134.

Diante do exposto, as atividades dos motoristas da Uber e a dos taxistas não se confundem, os taxistas realizam atividade de interesse público e atuam no transporte público individual, já os motoristas da Uber realizam transporte privado individual, atividade econômica em sentido estrito (item 3.1). O serviço de transporte da Uber nada mais é que uma alternativa ao serviço de transporte individual, sem interesse público envolvido na prestação, que, de acordo com as normas que regem as atividades econômicas em sentido estrito, devem estar coerentes com os princípios da ordem econômica e da liberdade de profissão.

4.2 COMPETÊNCIA PARA LEGISLAR O TRANSPORTE INDIVIDUAL PRIVADO DE

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