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NEGRAS: DIÁLOGO ENTRE TECNOLOGIAS E RESISTÊNCIA

Irene Izilda da Silva

INTRODUÇÃO

Recebi o convite da Secretaria Municipal de Educação/Diretorias Pedagógicas/Prefeitura do Município de São Paulo (SME/DIPED/

PMSP), que atua na formação de educadoras(es) no viés das relações étnico-raciais e afro-indígenas, para fazer parte de um coletivo for-mativo. Educadoras e educadores se reúnem e montam um plano de ação com contextos de referencial bibliográfico e práticas educativas acerca das relações étnico-raciais e afro-indígenas à luz dos materiais que são produzidos pelo olhar da diversidade, que são socializados em rodas de diálogo. Em razão do período pandêmico que estávamos atravessando, as rodas aconteceram no ambiente virtual por meio de diferentes plataformas (Zoom, Teams, Meet) em três encontros mensais durante o ano letivo. As narrativas apresentadas pelas educadoras e educadores ao longo das rodas de diálogo possibilitaram um maior engajamento na Educação Antirracista, considerando que as Unida-des escolares estavam trabalhando em regime de home office e, assim, várias educadoras puderam participar oferecendo um momento de troca muito significativo, que me permitiu aprender muito acerca da atuação cotidiana nos diferentes segmentos da educação Básica.

Outro evento que teve impacto na minha formação e que se relaciona ao evento mencionado foi o VI Workshop de Tecnologia, Linguagens e Mídias na Educação, promovido pelo Instituto Federal do Triângulo Mineiro - Campus Centro – Uberlândia no formato remoto

na plataforma do Instituto Federal, em que apresentei a comunicação intitulada “Conversando com a pesquisa narrativa e a autoria negra”, no GT “A formação de profissionais e as metodologias de pesquisa-ação e Pesquisa Narrativa”. Essa vivência foi bastante enriquecedora, não só pela aprendizagem e os desafios de uso da plataforma, como também pela oportunidade de contar parte de minha história com a Pesquisa Narrativa e minha entrada no Grupo de Pesquisa Narrativa e Educação de Professores (GPNEP) sob a perspectiva de meu contexto atual.

Alinho-me à vertente teórico-metodológica da Pesquisa Narra-tiva proposta por Clandinin e Connelly (2000/2013), que apresentam a investigação narrativa como o estudo da experiência compreendida na narrativa, à medida que conto minhas histórias de vida, com pro-pósitos de justificativas pessoais, teórico-práticas e sociais. Segundo os autores, a experiência é estudada com o outro e ao refletir como ficam as autorias negras para além de mim, estou escrevendo minha trajetória, pois menciono e pesquiso autorias de outras escrevivên-cias5. Assim, neste relato, irei narrar como a minha experiência é vivida e como as escritoras que convido para este diálogo viveram suas autorias à luz do meu entendimento de suas biografias e da lei-tura das obras escritas por elas.

Por isso, partindo da proposição da Pesquisa Narrativa apre-sentada por Clandinin e Connelly (2000/2013) que entendem que a experiência é estudada com o outro, reflito como ficam as autorias negras para além de mim que estou escrevendo esta trajetória, visto que menciono e pesquiso autorias de outras escrevivências. O termo escrevivência foi utilizado pela primeira vez em 1995, no Seminário Mulher e Literatura. Conceição Evaristo (1995/2021), sua criadora, diz que ele surgiu da junção entre “escrever” e “viver”, ou seja, uma forma de “escrever vivências”. Assim, neste relato, irei narrar como a minha experiência é vivida e como as escritoras que convido para

5 O termo escrevivência foi utilizado pela primeira vez em 1995, no Seminário Mulher e Literatura.

Conceição Evaristo (1995/2021), sua criadora, diz que ele surgiu da junção entre “escrever” e “viver”, ou seja, uma forma de “escrever vivências”.

este diálogo viveram suas autorias à luz do meu entendimento de suas biografias e da leitura das obras escritas por elas.

A experiência de contar, recontar e pensar as possibilidades para um agir futuro mediado pela dialogicidade, pela interação das experiências semelhantes ou não semelhantes, está compartilhada nas minhas narrativas com os leitores deste capítulo e mesmo com outros pesquisadores. Na perspectiva de honrar as identidades das diversas autoras, gostaria de compartilhar diferentes experiências de autorias negras que me ajudam neste meu fazer pedagógico narrativo ético relacional que possibilita alimentar esta semente de Baobá6, de modo inclusivo e com respeito às diferenças.

O Baobá inclusivo comentado por mim no parágrafo anterior está relacionado ao respeito às diferenças. Essa árvore detém um sim-bolismo muito significativo para mim desde a minha primeira visita ao Continente Africano, pois um dos meus objetivos foi compreender melhor minha ancestralidade. Trazendo para o universo de meu traba-lho, ele oferece a possibilidade de ressignificar as diferentes identidades presentes nas leituras e autorias negras que fizeram parte de minha trajetória pessoal e profissional. Esse percurso narrativo me ajuda a com-preender meu papel social como professora aposentada da rede pública da Educação Básica, hoje com um certo comprometimento visual e minha atuação nos diferentes espaços, como uma eterna aprendiz.

A experiência com a tecnologia também me possibilitou narrar e investigar as experiências de vida das autorias negras, revisitar minha dissertação de mestrado. Falar em tecnologias digitais é pensar como elas me ajudam na contemporaneidade, visto que elas são as ferramentas que possibilitam minha atuação em diferentes espaços acadêmicos e não acadêmicos e em diferentes estados brasileiros. Essas tecnologias digitais ainda se apresentam como um desafio no meu processo de aprendizagem, por me sentir insegura às vezes, mas ao mesmo tempo elas me motivam a querer aprender cada vez mais.

6 Árvore frondosa presente em diferentes regiões do Continente Africano e no Brasil, que possui frutos bem grandes e cheios de sementes.

Em minhas experiências, devo mencionar pesquisadoras/autoras com quem cruzei virtualmente ou não ao longo de minha trajetória, que possibilitaram a criação de pontes para atravessar rios de vida e unir os caminhos de aprendiz da mulher negra, professora de inglês, aposentada, pesquisadora independente voluntária, que hoje se volta para a formação de educadoras numa experiência educativa de ensino e aprendizagem de línguas e relações étnico-raciais e afro-indígenas.

Relembrando a fala da profa. Dra Aparecida de Jesus Ferreira em sua brilhante apresentação no VIII Congresso Latino Americano de Formação de Professores de Línguas (CLAFPL) que ocorreu em 2021, quando nos fala da Teoria Racial Crítica (temática na qual ela vem atuando) que faz toada na Linguística Aplicada Crítica na medida em que a pesquisadora comenta acerca da sua imagem a importância de se pensar no contexto do ensino-aprendizagem de línguas e na perspectiva não hegemônica, sentindo-se abraçada por Carolina Maria de Jesus.

Para Ferreira (2014/2021), a Teoria Racial Crítica apresenta algumas especificidades na sua abordagem que têm contribuído para discutir raça e racismo, uma vez que se apresenta como um referencial teórico que considera narrativas, autobiografias, histórias, contranar-rativas, histórias não hegemônicas, cartas... para demonstrar como o racismo é estrutural na sociedade e no ambiente educacional.

Esta contribuição vem sendo demonstrada pelas várias pesquisas de Ferreira (2021) e como suas provocações dialogam com Carolina Maria de Jesus, que utilizou, dentre os diferentes textos, cartas e diários para nos contar suas histórias de vida, bem como as condições vividas por muitas pessoas na favela e mesmo o não pertencimento social a que muitos negros e negras são submetidos. Ademais, Ferreira (2021) nos oferece um convite para conhecer outros pesquisadores da Teoria Racial Crítica: Cruz (2014), Cruz (2010), Delado e Stefancic (2000), Ferreira (2004; 2006, 2007; 2009; 2011), Gandin, Diniz-Pereira, Hipólito (2002), Gillborn (2006), Ladson-Billings (1998; 1999), López (2003), Lynn e Dixson (2014), Milner (2013), Rollock (2012) e Yosso (2005).

Desse modo, Ferreira e Jesus demonstram como as histórias de si podem contribuir para uma Educação Antirracista ao mesmo tempo que revelam que as histórias não hegemônicas nos ajudam a repensar o racismo no universo educacional.

CONVERSANDO COM A TESSITURA TEÓRICA E METODOLÓGICA

Levando em consideração meu objetivo, em minha trajetória navego pela discussão teórica das concepções apontadas por Celani (2003) e Mello (2012); e para navegar pela experiência docente, me aporto na Pesquisa Narrativa segundo Clandinin e Connely (1987;

1988; 2000; 2015). Navegarei pela minha experiência como um pro-cesso investigativo no espaço tridimensional (interação, continuidade, situação) dialogado pelos pesquisadores à luz da experiência segundo Dewey (1938). Minhas experiências passadas e presentes nesta pers-pectiva apresentam a possibilidade de modificar experiências futuras.

Em minha pesquisa de mestrado (SILVA, 2006), minha orien-tadora, a profa. Dra Maria Antonieta Alba Celani, me permitiu aden-trar ainda mais no universo de professora da escola pública e, como meus retalhos de pesquisa7 precisavam de mais cores e amores, para melhor compreender as experiências e autorias negras, por meio das tecnologias digitais, consegui reunir essas nuances. Foi possível reunir diversos retalhos de pesquisa sobre a diversidade e a equidade dos povos diaspóricos que me constituem como mulher pesquisadora em prol de uma educação antirracista e formadora de opiniões.

Para tanto, naveguei pelo universo de Audre Geraldine Lorde que me ajudou a compreender este universo multicultural, que não se apresenta de forma igualitária e os escritos de Chimamanda Ngozi Adichie para me ajudar a entender o perigo de uma história única. Falar

7 Falo em retalhos de pesquisa, referindo-me a retalhos que, ao serem agrupados, compreendem um todo, no caso a experiência que foi vivida por mim que permite compreender o que aprendi nesta trajetória.

de povos diaspóricos, originários com suas especificidades não só cor-porais e culturais, como também da história de vida que estes ancestrais carregam em seu Baobá inclusivo, mas que foram invisibilizados pelo olhar colonizador que apresenta uma única versão acerca das autorias, é meu dever enquanto uma pessoa negra, que atua na formação de educadoras(es) pelo viés das relações étnico-raciais e afro-indígenas.

CONVERSANDO COM AUDRE GERALDINE LORDE Audre Geraldine Lorde foi uma poeta, escritora, ativista e ensaísta caribenha-americana. Seu ativismo foi ligado aos direitos civis, racismo, feminismo e opressão. Ela nos relata em seus escritos (1993) que em sua casa se celebra a festa de Kwanza, festa esta criada em 1966 pelo professor e ativista americano Maulana Karenga, que significa primeiros frutos da terra. Este festival afro-americano da colheita começa um dia depois do Natal e dura sete dias. Há sete princípios de Kwanza, um para cada dia. O primeiro princípio é Umoja, que quer dizer uni-dade, a decisão de lutar pela unidade e mantê-la em nós mesmos e na comunidade. O segundo princípio é Kujichagulia, a autodeterminação, a decisão de definir a nós mesmos, de dar nomes, de falar por nós em vez de sermos nomeadas e expressadas por outros. O terceiro princípio, Ujima, se relaciona ao trabalho coletivo e a responsabilidade, a decisão de construir e conservar junto nossas comunidades, de reconhecer e resolver juntos nossos problemas.

Para aguçar a curiosidade, embora a autora mencione três dias do evento Kwanza, peço permissão para partilhar um pouquinho dos outros quatro dias desta celebração. Ujamaa remete à economia coope-rativa, à construção e ganhos da comunidade através de suas próprias atividades. Nia diz respeito ao propósito, ao objetivo de trabalho em grupo para construir a comunidade e expandir a cultura africana.

Kuumba refere-se à criatividade,  que consiste em usar novas ideias para criar uma comunidade mais bonita e mais bem-sucedida. E finalmente

Imani está ligada à fé, ao honrar os ancestrais, as tradições e os líderes africanos e celebrar os triunfos do passado sobre as adversidades.

Relaciono esses princípios mencionados pela autora com a ressignificação de nossas experiências nas trajetórias escolares em minha dissertação entre meus estudantes e eu que falo como parti-cipantes da pesquisa, recorrendo a Dewey (1938), quando ele nos postula que contando nossa história de vida podemos ressignificar nossa identidade tendo a ferramenta da linguagem (CELANI, 2003) e a composição do eu professor (MELLO, 2012) entendendo as experiências dos sujeitos a partir de suas próprias vozes como nos apresenta (CONNELY; CLANDININ, 2011) dialogando com as tecnologias digitais/sociais que nos possibilitam navegar neste mar de resistências pedagógicas e identitárias.

Para quem escrevemos, é necessário examinar não só a verdade do que falamos, mas também a verdade da linguagem em que o dize-mos. Segundo Lorde (2015), trata de compartilhar e difundir aquelas palavras que significam tanto para nós. Mas em princípio, para todas nós, é necessário ensinar com a vida e com as palavras essas verdades que acreditamos e conhecemos mais além do entendimento. Só assim sobreviveremos, participando num processo de vida criativo, contínuo e em crescimento, pois como afirma a autora:

O fato de estarmos aqui e que eu esteja dizendo essas palavras, já é uma tentativa de quebrar o silêncio e estender uma ponte sobre nossas diferenças, porque não são as diferenças que nos imobilizam, mas o silên-cio. E restam tantos silêncios para romper! (LORDE, 2015, p. 19).

Acredito que o trabalho colaborativo desenvolvido entre docentes e discentes, bem como as tecnologias da informação e comunicação (TIC) têm contribuído para o desenvolvimento social, entretanto, temos muito que avançar no universo das diversidades em especial no contexto das escolas públicas que estão em sua maioria

localiza-das em locais onde o acesso às redes sociais ainda se apresenta bas-tante complexo, falta acessibilidade das mais variadas formas, se faz necessário quebrar o silêncio entre nossas diferentes vozes em nossas diferenças, como postula Lorde (2015).

CONVERSANDO COM CHIMAMANDA NGOZI ADICHIE Nossos retalhinhos agora vão cruzar o Atlântico para conversar com Chimamanda Adichie. Me recordo de meu estudante de Educação de Jovens e Adultos (EJA), numa aula de inglês, quando me trouxe a seguinte fala: “nossa nunca tinha visto uma professora de inglês negra”.

A fala de meu aluno foi, no mínimo, instigante. Quero acreditar que este foi um dos motivadores para eu revisitar minha dissertação de mestrado (2006) com um olhar mais atento acerca do meu papel enquanto professora, não só por ser negra, mas a questão racial é de todos nós, e nossos estudantes da educação básica.

Chimamanda Ngozi Adichie (2021) comenta que ...

Temos um mundo cheio de mulheres que não conse-guem respirar livremente porque estão condicionadas demais a assumir formas que agradem aos outros. Ima-gine como seríamos mais felizes, o quão livres seríamos para sermos nós mesmos, se não tivéssemos o peso das expectativas de gênero.

Quando tive minha filha, que tem cinco anos agora, meu marido e eu fazer escolhas muito conscientes sobre como iríamos criá-la. Eu decidi que ela iria ser muito ativa fisicamente, porque acho que é preciso começar cedo a tentar lidar com as horríveis mensagens negativas que meninas recebem sobre seus corpos .... 8 Considerando a ancestralidade e que cada ser é único, mas nasce e cresce com sua história de vida, balizada pelas ocorrências do mundo

8 Disponível em: https://www.uol.com.br/universa/noticias/redacao/2021/06/15/chimamanda-ngozi--adichie-nos-da-licoes-sobre-feminismo-na-pratica.htm?cmpid=copiaecola.

que o cerca, fazendo memória aos povos diaspóricos e originários, apresento algumas reflexões. Temos voz e cabe ao interlocutor exercer a escuta desta voz, pois não me sinto ouvida quando leio o poema de Manuel Bandeira que contém meu nome, Irene. Vamos repensar este poema nas palavras de Grada Kilomba?

Grada Kilomba é uma escritora negra, psicóloga, artista inter-disciplinar portuguesa, autora da obra Memórias da plantação: episó-dios de racismo cotidiano (2008) e, por meio de uma escrita engajada, apresenta como foco exame da memória, trauma, gênero, racismo e pós-colonialismo. Kilomba (2008) postula que “sim, subalternos podem falar”. Trago esta autora para compor este diálogo em especial acerca da memória e gênero que conversa com o poema Estrela da Manhã de Manuel Bandeira (1936) que parafraseei do autor e intitulei

“Irene no Céu” (SILVA, 2006, p.123)

Irene no Céu Irene preta Irene boa

Irene sempre de bom humor.

Imagino Irene entrando no céu:

- Licença, meu branco!

E São Pedro bonachão:

- Entra, Irene. Você não precisa pedir licença.

O texto poético atende ao exercício memorial que fiz em minhas histórias de vida. Ao colocar este poema nesta escrita, ressignifico a figura da Irene Izilda enquanto mulher, negra, que adentra a academia, algo que ouvi durante muito tempo nos bancos escolares por me chamar Irene e neste contexto a conquista do Mestrado no Linguística Aplicada aos Estudos da Linguagem (LAEL) na Pontifícia Universidade de São Paulo (PUCSP), simbolizando a cura do céu e a escrita da terra.

REVISITANDO ASPECTOS DA MINHA DISSERTAÇÃO Segundo Macedo (2018), nesse advento tecnológico, a socie-dade possui um acesso à informação intermitentemente com o uso da tecnologia nos inúmeros meios de comunicação para obtê-la com maior rapidez e eficiência. Importante ressaltar como a tecnologia social nos ajuda a pensar em nossas crianças da Educação Básica para o universo de autoria negra no cotidiano da sala de aula dialogando com suas experiências vividas.

A prática social da linguagem vai muito além de tablets, ipads e outras ferramentas como nos conta Menezes (2008) […],

quando surge uma nova tecnologia a primeira atitude e a desconfiança e de rejeição. Aos poucos a tecnologia começa a fazer parte das atividades sociais da lingua-gem e a escola acaba por incorporá-la em suas práticas pedagógicas (p.2).

Compreendo a prática da linguagem sob diferentes perspectivas e as tecnologias digitais em nossos currículos escolares podem ser uma aliada ao desenvolvimento de práticas por parte de nossos edu-candos. Acredito que nós educadores precisamos (des)construir estes estereótipos acerca do que se apresenta como novo e ter clareza que o universo das tecnologias digitais é muito amplo pode ser incorporado às nossas práticas pedagógicas, pois

ninguém educa ninguém, como tampouco ninguém se educa a si mesmo: os homens se educam em comunhão, mediado pelo mundo (FREIRE, 1993, p. 3).

Ressignificando Sankofa (símbolo adinkras africano) olhar o passado para ressignificar o presente, pois somos seres representados por nossa linguagem e nosso contexto sócio-histórico. Enquanto apren-dizes da Linguística Aplicada, não podemos perder de vista a equidade que vai além da igualdade, em especial se pensarmos em tecnologia e nas tantas mídias algumas mais “antigas” (imprensa, rádio, televisão,

vídeo, cinema, e outras) e os dispositivos móveis (celulares, tablets, notebooks) a tão famosa cibercultura. Assim, abraçando um retalhinho verde e aparelho me pergunto: será mesmo cultural digital para todos?

Entendo que as inovações do século XXI não abarcam somente a inclusão das tecnologias digitais, mas sim, a necessidade de pre-cisarmos de seres humanos pensantes de forma crítica para a con-tribuição social e, por isso, precisamos estar atentos as ferramentas digitais (FINDIKOGLU; ILHAN, 2016).

Os autores citados acima postulam que é diferente de tecnologias digitais que são parte de políticas públicas na medida em que podem auxiliar nossos educandos na caminhada de seus diferentes currículos, para além das ferramentas digitais (para mim recursos digitais que possibilitam a utilização das tecnologias com o objetivo de facilitar a comunicação e o acesso à informação, através de dispositivos eletrô-nicos, como computadores, tablets e smartphones), que se apresentam no universo estudantil alinhada a importância da parceria a meu ver de uma educação libertadora que leva em conta qual público nos atendemos enquanto educadoras(es) e que uso vamos fazer destas tecnologias digitais para o avanço científico.

Voltando para a tessitura de mais um retalho de minha/nossa colcha, vamos conversando com as tecnologias sociais. Muito se troca miudezas discursivas acerca da tecnologia dos avanços tec-nológicos não só na educação, mas em outras áreas de conheci-mento, por exemplo, a medicina.

Porém, a tecnologia não determina os caminhos da sociedade tão diversa. Os pedacinhos da colcha reconhecem as possibilidades, mas também os desafios das potencialidades de aprendizagem ressig-nificadas no que podemos intitular de Cultura digital.

Considero a imagem que desenhei durante minha dissertação de Mestrado ainda muito atual pensando nas experiências de vida, na escola, na ancestralidade e nas tecnologias, razão pela qual ela está fazendo parte destes retalhinhos de minha história de vida.

O manuscrito feito por mim representa a reconstrução da iden-tidade e do papel do educador nas aulas de inglês. Este manuscrito emergiu posteriormente à releitura dos documentários/textos apre-sentados na minha dissertação, em 2004 e relidos em 2005.

Figura 1 - Contexto da minha dissertação de mestrado, Brasil, Continente Africano, sala de aula, máscara de flandres.

Fonte: a autora

A imagem acima representa o Continente Africano, que dialoga com o Brasil nas minhas histórias de vida, bem como a sala de aula, a girafa - meu animal de estimação, ressignificados após esta trajetória.

Embora a sala de aula ainda represente um grande desafio, não só com

as carteiras em formato de ônibus, os nós da máscara de flandres vão sendo desvelados à medida que eu vou compreendendo meu papel enquanto educadora e meu compromisso de ensino-aprendizagem com minhas educandas e educandos.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Coloco-me como uma eterna aprendiz da pesquisa narrativa apresentada por Clandinin e Connelly (2000/2015), investigando meus escritos, recontando minhas narrativas, lendo as publica-ções acadêmicas e participando de nosso grupo de pesquisa, além das histórias secretas vividas com leituras de autoria negra que estão sempre na minha cabeceira.

Minha colcha está chegando a um finalmente momentâneo, tentando reagir neste período pandêmico, fortalecida pela releitura de minha/nossa dissertação de Mestrado, colhendo as sementes de Baobá que tanto me fortalecem mesmo virtualmente, as conversas nas diferentes trajetórias nos diferentes projetos de extensão dos quais participo, as janelas e as boas brisas proporcionadas pelo GPNEP, pelo Grupo de Apoio à Criança, aos Adolescentes e Idosos (GAIA) e a todes que aqui estão nesta construção por uma educação mais justa, reflexiva crítica, numa perspectiva que com os pés no chão, exerça a escuta aqueles que por nós perpassam. Nas bordas de nossa colcha as referências bibliográficas.

A experiência de vida na minha trajetória de pesquisa me coloca no lugar de observadora da realidade que me cerca como professora aposentada que continua em busca de aprendizagem diária em especial na (re)contagem de minhas narrativas e nas narrativas de educadoras que permeiam meu universo formativo no contexto atual que já dia-loguei ao longo desta trajetória de escrita.

A inovação tecnológica ou não muito colabora com este meu novo olhar para o currículo antirracista, para este letramento racial crítico que vem sendo objeto de meus estudos neste novo paradigma.

Ao redigir este trabalho pude revisitar muitas linguagens e muitos pensares assim sendo as sementes de meu Baobá vão crescendo na perspectiva de novos olhares para as experiências de autorias negras.

REFERÊNCIAS

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CELANI, M. A, A, (org.), 2003.Professores e formadores em mudança: relato de um processo de reflexão e transformação da prática docente. Campinas. Mercado de Letras, São Paulo.

CLANDININ, D. J.; CONNELLY, M. Narrative Inquiry: experience and story in qualitative research. Wiley Company, 2000.

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CLANDININ D. J.; CONNELLY, F. M. Pesquisa Narrativa: experiências e história em pesquisa qualitativa. 2. ed. Uberlândia: EdUFU, 2011. Tradução: Grupo de Pesquisa Narrativa e Educação de Professores (GPNEP) ILEEL/UFU

DEWEY, J. Experience and Education. New York: Macmillan, 1938.

LORDE, De “The Collected Poems of Audre Lorde.” Versão on-line. Traduzido por Lucas Vosh. https://www.mpba.mp.br/sites/default/files/biblioteca/direitos-humanos/direitos--da-populacao-lgbt/obras_digitalizadas/audre_lorde_-_textos_escolhidos_portu.pdf acesso em 14 set. 2021

FERREIRA, A. J. Teoria racial crítica e letramento racial crítico: narrativas e contranarra-tivas de identidade racial de professores de línguas. Revista da ABPN • v. 6, n. 14 • jul. – out.

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FINDIKOGLU, F.; ILHAN, D. Realization of a desired future: innovation in education.

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Kwanzaa: o que é e como funciona a celebração preta da diáspora que “substitui” o Natal.

Versão on-line 24/12/2020 Correio Nagô, Afro TV, HowStuffWorks Brasil e Pele Negra. https://