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Netnografia é um neologismo (netnography = net + ethnography), que identifica o uso do método etnográfico na internet, em que o pesquisador tem uma posição imersiva no campo de estudos. Um dos pioneiros na área, Robert Kozinets, iniciou estudos sobre netnografia ainda na década de 80, com pretensões de aplicá-la em pesquisas de marketing. O autor definiu o termo como uma descrição do trabalho de campo na internet, onde “tanto o trabalho de campo como a descrição textual são metodologicamente conduzidas pelas tradições e técnicas da antropologia cultural”.355

O método etnográfico aplicado ao ambiente virtual justifica-se, segundo Hine, porque o ciberespaço é um meio rico em comunicação. Com cada vez mais usuários, torna-se um lugar privilegiado para a pesquisa nas áreas humanas. Para a autora, com a etnografia, entendemos a internet como cultura. O método etnográfico e a internet, para ela, têm uma relação de mútua dependência:

O contexto online é definido como um contexto cultural pela demonstração de que a etnografia pode ser aplicada a ele. Se nós podemos estar confiantes de que a etnografia pode ser aplicada com sucesso em contextos online, então nós podemos ficar seguros de que estes são, realmente, contextos culturais, uma vez que a etnografia é um método para entender a cultura.356

Em relação às vantagens da netnografia, Kozinets aponta: é um método menos dispendioso, não necessita deslocamento, é menos invasivo, não é realizado em um espaço fabricado para a pesquisa, além de que os dados já encontram-se registrados, não necessitando de transcrição. Quanto às desvantagens, ocorre a perda do gestual e das características do ambiente que envolve o pesquisado. No entanto, esse não é um fato relevante, pois as análises são, justamente, dos relacionamentos no ambiente virtual, onde linguagem não-verbal e ambiente natural não tem relevância.357

355 KOZINETS, Robert V. On netnography: inicial reflections on consumer research investigations of

ciberculture. Advanes in Consumer Research. Volume 25. Provo, UT, 1998. Disponível em: http://www.acrwebsite.org/volumes/display.asp?id=8180. Acesso em: 05 Jun 2010. Tradução da autora para: “where both the field work and the textual account are methodologically informed by the traditions and techniques of cultural anthropology.”.

356 HINE, Christine. Virtual Methods and the Sociology of Cyber-Social- Scientific Knowledge. In: HINE,

Christine. Virtual Methods. Issues in Social Research on the Internet. Oxford: Berg, 2005, p. 8. Tradução da autora para: “The online context is defined as a cultural context by the demonstration that ethnography can successfully be applied to online context then we can rest assured that these are indeed cultural context, since ethnography is a method for understanding culture.”

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KOZINETS, Robert V. The Field Behind the Screen: Using Netnography for Marketing Research in Online Communities. Journal of Marketing Research, 39 (February), 2002. Disponível em: http://www.nyu.edu/classes/bkg/methods/netnography.pdf. Acesso em: 10 Jun 2010.

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Segundo Kozinets, o uso da netnografia deve ser baseado em princípios éticos, assim como acontece nas pesquisas de campo etnográficas. O autor sugere que o pesquisador deixe claras as suas intenções e informe ao sujeito que o conteúdo produzido por ele será utilizado para a pesquisa. Isso deve acontecer porque mesmo que se considere público o espaço virtual, quem produz o conteúdo são pessoas, que podem não consentir com o uso dos dados no trabalho. Dessa forma, o pesquisador precisa do “consentimento informado”.358 Foi assim que agimos com o grupo pesquisado por nós. Pedimos autorização via email para todos os blogueiros que tiveram conteúdo publicado nesta pesquisa.

A coleta e análise de dados, de acordo com Kozinets, podem ser obtidas através de três tipos de capturas: a) dados coletados e copiados diretamente dos membros das comunidades

online de interesse, tomando o cuidado para a utilização de filtros que auxiliem no encontro

de informações de relevância; b) coleta de informações através da observação das práticas de comunicação e interação dos membros das comunidades; c) dados levantados em entrevistas com os indivíduos, trocas de emails, mensagens instantâneas ou outras ferramentas359. Neste último caso, fica evidente o uso de multimétodos, que vão além da observação do pesquisador e que auxiliam nas análises.

Quanto à postura do pesquisador em relação às análises, Kozinets diz que elas “podem variar ao longo de um espectro que vai desde ser intensamente participativa até ser completamente não-obstrutiva e observacional.”360 Acreditamos que em cada estudo, dependendo do propósito, deva-se escolher a forma de participação do pesquisador. Nesta pesquisa, optamos por uma participação intensa, em que o grupo estudado ficou sabendo das pretensões da pesquisadora.

Entendemos que seja importante ressaltar que as contribuições de Kozinets estão voltadas à área de estudos do autor, as pesquisas em marketing na internet. Dessa forma, devemos relativizar algumas de suas considerações, como, por exemplo, quando ele fala das facilidades que a netnografia oferece: método pouco dispendioso e menos invasivo. O percurso desta pesquisa nos possibilitou verificar que, em relação aos estudos culturais, o esforço do pesquisador é muito grande. É necessária a presença virtual diária para perceber as modificações que vão acontecendo com o grupo pesquisado. E, além disso, é preciso que se criem laços com as pessoas envolvidas no processo. Isso nos leva a compreender que, de certa

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KOZINETS, R. V. Op. cit., 2002, online.

359 Idem.

360 KOZINETS Apud AMARAL, Adriana; NATAL, Geórgia; VIANA, Lucina. Apontamentos metodológicos

iniciais sobre a netnografia no contexto pesquisa em comunicação digital e cibercultura. In: XXXII Intercom

(Anais), Curitiba-PR, 2009. Disponível em: http://www.intercom.org.br/papers/nacionais/2009/resumos/R4- 2346-1.pdf. Acesso em: 05 Mai 2010.

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forma, o pesquisador acaba invadindo o espaço alheio. Por isso, acreditamos que existe a necessidade de maiores estudos em relação à etnografia virtual.