• Nenhum resultado encontrado

2.1 GESTÃO DE PESSOAS POR COMPETÊNCIAS

2.1.1 A noção de competência nas organizações

A discussão de uma idéia contemporânea de competência se inicia com o americano McClelland em 1973, dando impulso a denominada linha americana. Para ele a competência está relacionada com uma performance superior de uma pessoa em determinada circunstância.

A partir dele vários outros estudiosos expressaram suas idéias acerca de uma noção de competência, as quais estão coletadas nos quadros abaixo, onde se pode observar que todas estão vinculadas a duas grandes vertentes: ao mun- do do trabalho ou ao mundo da educação, conforme ensinamentos de Barrenne e Zuniga (2004).

Os conceitos emitidos pelos estudiosos que se preocuparam com o tema sob a ótica da educação, cujas pesquisas adquiriram maior destaque na literatura, encontram-se listados no Quadro 03, a seguir.

Autor Conceito

– A competência é:

Cueto (1999)

“A capacidade de agir com eficiência, eficácia e satisfação sobre algum aspecto da realidade pessoal, social, natural ou simbólica”. Toda competência é, portanto, entendida como a integração de três tipos de saberes: “conceitual (saber), procedimental (saber fazer) e Cont.

Autor Conceito

– A competência é:

atitudinal (ser). São aprendizagens integradoras que envolvem a reflexão sobre o próprio processo de aprendizagem (metacognição).”

Masterpasqua apud

Boekaerts (1991) “Características pessoais (conhecimento, habilidades e atitudes) que levam a desempenhos adaptativos em ambientes relevantes.”

Conselho Federal de Cultura e Educação da Argentina

“Um conjunto identificável e avaliável de conhecimentos, atitudes, valores e habilidades interrelacionados que permitem desempenhos satisfatórios em situações reais de trabalho, segundo padrões utiliza- dos na área ocupacional.”

Resolução CNE/CEB nº 04/99 do Brasil

“Capacidade de mobilizar, articular e colocar em ação valores, co- nhecimentos e habilidades necessários para o desempenho eficiente e eficaz de atividades requeridas pela natureza do trabalho.”

Quadro 03: Mundo da educação – A competência

Fonte: Barrenne e Zuniga (2004).

Os autores, por suas pesquisas individuais, e as instituições, que desenvol- veram investigações acerca do tema, emitiram os conceitos que estão agrupados sob o título de “Mundo do Trabalho”, conforme se pode observar no Quadro 04, abaixo.

Autor Conceito

– A competência profissional é:

Ducci (1997)

“A construção social de aprendizagens significativas e úteis para o desempenho produtivo numa situação real de trabalho, que se obtém não só pelo ensino, como também – em grande parte – por meio da aprendizagem em situações concretas de trabalho.”

AFNOR (1996) “A operacionalização, em situação profissional, de capacidades que

permitem exercer convenientemente uma função ou atividade.”

36

Autor Conceito

– A competência profissional é:

Conocer (1997)

“A aptidão de um indivíduo para desempenhar a mesma função pro- dutiva em contextos diferentes e com base nas exigências de quali- dade esperadas pelo setor produtivo. Essa aptidão se consegue com a aquisição e o desenvolvimento de conhecimentos, habilidades e capacidades expressas no saber, no fazer e no saber fazer.”

Cintefor (1995) “A real capacidade para alcançar um objetivo ou um resultado em um dado contexto.”

Moore (1994)

“A real capacidade do indivíduo para cumprir todas as tarefas que compõem seu espaço de atuação. As mudanças (...) nos obrigam a focalizar mais as potencialidades que o indivíduo tem de mobilizar concretamente suas capacidades no desenvolvimento de situações profissionais.”

IHCD (1998) “A capacidade de desempenhar seu trabalho de acordo com os pa-drões exigidos pelo emprego, numa ampla gama de circunstâncias e em resposta a demandas mutáveis”.

Le Boterf (1998)

“Uma construção fruto de uma combinação de recursos – conheci- mentos, saber fazer, qualidades ou aptidões e recursos do ambiente (relações, documentos, informações e outros) – que são mobilizados para conseguir um desempenho”.

Gallart e Jacinto (1997)

“um conjunto de propriedades em permanente modificação, que de- vem ser submetidas à prova da resolução de problemas concretos em situações de trabalho que envolvem graus de incerteza e comple- xidade técnica. (...) não resultam da aplicação de um currículo (...) mas de um exercício de aplicação de conhecimentos em circunstân- cias críticas. (...) a definição das competências e, mais ainda, dos níveis de competências para determinadas ocupações se constrói na prática social e é uma tarefa conjunta entre empresas, trabalhadores e educadores”.

Rojas (1999)

“A condição de consenso impõe uma noção de competência que não pode ser técnica, pois o acordo dos atores sociais dificilmente se mantém se for produto de pura manipulação instrumental. (...) uma competência é uma ação social”.

Alexim e Brígido (2002)

“Capacidade de articular e mobilizar condições intelectuais e emocio- nais em termos de conhecimentos, habilidades, atitudes e práticas, necessários para o desempenho de uma determinada função ou ati- vidade, de maneira eficiente, eficaz e criativa, conforme a natureza do trabalho. Capacidade produtiva de um indivíduo que se define e mede em termos de desempenho real e demonstrado em deter-

Autor Conceito

– A competência profissional é:

minado contexto de trabalho e que resulta não apenas da instrução, mas em grande medida, da experiência em situações concretas de exercício ocupacional.”

Fleury e Fleury (2001) “Um saber agir responsável e reconhecido, que implica mobilizar, integrar, transferir conhecimentos, recursos e habilidades, que agre- guem valor econômico à organização e valor social ao indivíduo.”

Carbone et al. (2005)

“Combinações sinérgicas de conhecimentos, habilidades e atitudes, expressas pelo desempenho profissional, dentro de determinado contexto ou estratégia organizacional, que agregam valor a pessoas e organizações”.

Decreto n° 5.707, de 23 de fevereiro de 2006

“Conjunto de conhecimentos, habilidades e atitudes necessários ao desempenho das funções dos servidores, visando ao alcance dos objetivos da instituição”.

Nisembaum (2000) “integração sinérgica das habilidades, conhecimentos e comporta-mentos, manifestada pelo alto desempenho das pessoas, que contri- bui para os resultados da organização”.

A. CAP 2000 (1990)

Trata-se de um “savoir-faire” operacional validado:

- savoir-faire = conhecimentos e experiências de um assalariado - operacional = aplicáveis em uma organização adaptada

- validado = confirmados pelo nível de formação e, em seguida, pelo domínio das funções sucessivamente exercidas.

Bertrand (2005) “a capacidade do indivíduo para exercer uma atividade profissional concreta, aplicando seus conhecimentos, suas habilidades (savor- faire) e suas qualidades pessoais”.

Quadro 04: Mundo do trabalho – Competência profissional

Fonte: Alexim e Brígido (2002); Barrenne e Zuniga (2004); Bertrand (2005); Carbone et al. (2005); Fleury e Fleury, (2001); Nisembaum (2000); Tanguy (2001).

Fleury e Fleury (2001), pesquisadores brasileiros, inspirados em Le Boterf (1998), portanto, filiando-se à linha francesa de entendimento do significado da competência no mundo do trabalho, explicam que a competência do profissional inclui os elementos descritos no Quadro 05, a seguir:

38

Dimensão Conceito

Saber agir Saber o que e por que faz. Saber julgar, escolher, decidir.

Saber mobilizar recursos Criar sinergia e mobilizar recursos e competências.

Saber comunicar Compreender, trabalhar, transmitir informações, co-nhecimentos.

Saber aprender Trabalhar o conhecimento e a experiência, rever mo-delos mentais; saber desenvolver-se.

Saber engajar-se e comprometer-se Saber empreender, assumir riscos. Comprometer-se.

Saber assumir responsabilidades Ser responsável, assumindo os riscos e conseqüên-cias de suas ações e sendo por isso reconhecido.

Ter visão estratégica Conhecer e entender o negócio da organização, o seu ambiente, identificando oportunidades e alternati- vas.

Quadro 05: Competência profissional

Fonte: Fleury e Fleury (2001).

Le Boterf (2003), um dos expoentes da chamada linha francesa e inspira- dor dos autores acima, em estudo acerca dos elementos que compõe a compe- tência e permitem a sua expressão, apresenta os saberes mobilizáveis relaciona- dos às funções que atendem, além dos modos principal de aquisição e de mani- festação, conforme se pode visualizar no Quadro 06, a seguir.

Tipo Função Modo principal de

aquisição Modo de manifesta-ção

Saberes teóricos Saber compreender Educação formal Formação inicial e continuada

Declarativo

Tipo Função Modo principal de

aquisição Modo de manifesta-ção

Saberes de meio

Saberes Procedurais1 Saber adaptar-se Saber agir conforme a

situação

Saber como proceder

Formação contínua e experiência Educação formal Formação inicial e continuada Declarativo Declarativo e procedu- ral Saber-fazer operacio- nais Saber proceder Saber operar Experiência profissio- nal Procedural Saber-fazer experien-

cial Saber agir em função de algo Experiência profissio-nal Procedural

Saber fazer sociais ou

relacionais Saber cooperar Saber conduzir-se Experiência social e profissional Procedural

Saber-fazer cognitivos Saber tratar a infor- mação Saber raciocinar Educação formal Formação inicial e contínua experiência social e profissional analisada Procedural

Quadro 06: Saberes mobilizáveis para a competência

Fonte: Le Boterf (2003).

Os conceitos anteriormente coletados permitem observar que não há uma concordância entre os estudiosos acerca da noção de competência. No entanto, a análise desses conceitos permite identificar algumas idéias que se repetem. A essas idéias dá-se o nome de elementos constitutivos ou dimensões da compe- tência. Constituem-se eles em elementos que dão suporte à competência, con- forme se pode visualizar na Figura 04, a seguir.

1

Mantida a expressão utilizada pelo tradutor. A expressão “procedural” é utilizada com o sentido de procedimental, significando saberes relativos aos procedimentos administrativos, no contexto das organizações.

40

Figura 04: Os três elementos da competência

Fonte: Droval (2009), com adaptações.

Além dos três elementos acima, também é possível identificar mais dois outros fatores presentes nos conceitos emitidos pelos diversos estudiosos anali- sados (Barrenne e Zuniga, 2004, p. 48):

A idéia de colocar em jogo, mobilizar capacidades diversas para agir visando a um desempenho;

A idéia de que esse desempenho pode ocorrer em diversos con- textos cujos significados o indivíduo deve ser capaz de compreen- der para que sua atuação seja ad hoc.

Fleury (2002, p. 56) ainda chama a atenção para outro conceito que é ne- cessário agregar à noção de competência: a idéia desenvolvida por Dutra (2001, 2004) de entrega, segundo a qual é preciso considerar “aquilo que a pessoa re- almente quer entregar para a organização”. A autora relaciona esta idéia de en- trega ao conceito de competência por ela emitido indicando que “o termo entrega refere-se ao indivíduo que sabe agir de forma responsável e é por isso reconheci- do”.

Dutra (2004, p. 23) apresenta o conceito de entrega, passível de observa- ção sob três aspectos:

A entrega exigida pela organização e que se origina dos seus objeti- vos estratégicos e se apresenta em diferentes padrões para diferen- tes grupos profissionais dentro da empresa;

A caracterização da entrega constituída pela forma de descrever a entrega exigida dos profissionais, identificável e objetiva para ser fa- cilmente apreendida;

A forma de mensurar a entrega, ou seja, a construção de uma esca- la para mensurar a entrega descrita.

Para Dutra (2004, p. 33), desde o momento em que se iniciou o debate a- cerca da noção de competência até o momento em que realiza sua análise – 2004, é possível identificar pelos menos quatro fases, conforme descrito a seguir:

Primeira fase: Competência como base para a seleção e o desen-

volvimento de Pessoas – é a linha americana iniciada com McClel- land e se caracteriza pela identificação das competências diferenci- adoras dos profissionais de sucesso.

Segunda Fase: Competência diferenciada por nível de complexida-

de - surgem desconfortos em relação ao uso do conceito, especial- mente em razão da vinculação com realidades passadas e desvincu- lação dos objetivos da organização.

Terceira Fase: Competência como conceito integrador da gestão de

pessoas e destas com os objetivos estratégicos da empresa – permi- te um novo olhar para a área de gestão de pessoas, pois vincula os conceitos de competências individuais aos conceitos de competên- cias organizacionais.

Quarta Fase: Apropriação pelas pessoas dos conceitos de compe-

tência – a compreensão e o uso dos conceitos permitem aprimorar os sistemas de gestão no que se refere às estratégias das organiza- ções e o desenvolvimento profissional dos empregados.

Ao analisar a evolução do conceito de competência a professora Maria Te- reza Fleury (2002, p.56) apresenta um conjunto de imagens simbolizando a idéia de cada autor. É o que se pode observar na Figura 05, a seguir.

42

Figura 05: Evolução do conceito de competência

Fonte: Fleury (2002).

Essas imagens aliadas a expressões-chave permitem compreender o con- ceito de competência construído pelos principais autores que se ocupam com os estudos acerca desse tema.