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NORMA ANTIRRACISMO E NOVOS RACISMOS

NORMA ANTIRRACISMO E NOVOS RACISMOS

2.1- Norma social antirracismo

Embora a noção de raça tenha ganhado força ideológica a partir do saber científico produzido em fins do século XVIII, servido como base ideológica para justificar relações desiguais entre os grupos humanos, é justamente como teoria científica que o racismo tornou-se inadequado. Pesquisas realizadas durante o século XX revelam que o patrimônio genético de indivíduos pertencentes a uma mesma raça podem ser mais distantes que os pertencentes a raças diferentes, sendo a raça um critério cientificamente inoperante para explicar a diversidade humana e para dividi-la em grupos (Munanga, 2003). Destacam-se os conhecimentos produzidos por cientistas do Projeto Genoma Humano, os quais verificaram que todos os seres humanos são 99,9% iguais, geneticamente falando. Em termos genéticos, toda diversidade que é observada quanto ao comportamento, personalidade e qualidades físicas seria associada aos 0,1% restantes. Nenhuma variação genética pode distinguir brancos, negros, asiáticos ou hispânicos (Bonham, Washauer-Baker & Collins, 2005).

Além dos avanços das pesquisas na área da genética que foram de encontro a ideia de que a variabilidade humana poderia ser explicada em termos de raça, no âmbito sócio-político, observou-se o fortalecimento de uma norma social antirracismo. Desde o fim da 2ª Guerra Mundial, as sociedades democráticas passaram a enfatizar princípios de igualdade e justiça, os quais não são compatíveis com a existência de hierarquias e tratamentos discriminatórios entre as pessoas. Tal mudança normativa pode ser

observada na Declaração Universal dos Direitos do Homem elaborada pela Organização das Nações Unidas em 1948:

Todos os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade e direitos. Dotados de razão e consciência, devem agir uns para com os outros em espírito de fraternidade (§1º); Todos os seres humanos podem invocar os direitos e as liberdades proclamados na presente Declaração, sem distinção alguma, nomeadamente de raça, de cor, de sexo, de língua, de religião, de opinião pública ou outra, de origem nacional ou social, de fortuna, de nascimento ou de qualquer outra situação. Além disso, não será feita nenhuma distinção fundada no estatuto político, jurídico ou internacional do país ou do território da naturalidade da pessoa, seja esse país ou território independente, sob tutela, autônomo ou sujeito a alguma limitação de soberania (§2º).

Verifica-se assim, a ênfase em valores igualitários, presentes na possibilidade de cada cidadão invocar os direitos presentes na Declaração, independentemente de distinções, incluindo a de raça. No contexto da sociedade brasileira, também se observa a constituição de um aparato jurídico que coíbe a doutrina racista e a manifestação de atitudes e comportamentos discriminatórios, tal como pode ser observado na Lei nº 7.716 de 5 de janeiro de 1989, a qual definia os crimes resultantes do preconceito de raça e de cor, sendo posteriormente alterada pela Lei nº 9.459 de 13 de maio de 1997, a qual alterou os Ats. 1º e 20º da lei supracitada, definindo no seu artigo 1º que “serão punidos, na forma desta Lei, os crimes resultantes de discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional.” Em seu Artigo 20º refere como crime de preconceito “praticar, induzir ou incitar a discriminação ou preconceito de raça, etnia, religião ou procedência nacional.” Cabe referir ainda a Lei nº 8081 de 21 de setembro de 1990, a qual estabelece os crimes e as penas aplicáveis aos atos discriminatórios ou de preconceito de raça, cor, religião, etnia, procedência nacional, praticados pelos meios de comunicação ou por publicação de qualquer outra natureza.

Desse modo, desde o período pós-guerra, sociedades democráticas como a nossa têm enfatizado uma norma social da indesejabilidade do racismo. Antes deste período, contudo, o preconceito e a discriminação eram manifestados explicitamente e recebiam apoio político e institucional para que o fossem. De acordo com Quillan (2006), nas pesquisas realizadas em Psicologia, o preconceito racial era claramente declarado em respostas dos participantes a surveys, cujos resultados apontavam que a maioria dos americanos brancos endossava a discriminação e a segregação racial, como também atribuíam muitos estereótipos negativos aos não brancos.

As mudanças no quadro sócio-histórico influenciaram o desenvolvimento de novas teorias acerca do preconceito e racismo, posto que as práticas explícitas de discriminação foram gradativamente sendo proibidas e os brancos passaram a repudiar a discriminação e formas ostensivas de preconceito contra negros. Dentro desse contexto normativo, Meertens e Pettigrew (1999) propõem os conceitos de racismo flagrante e preconceito sutil. O primeiro sendo caracterizado por formas de expressão mais abertas e diretas e o segundo, por formas sutis e indiretas, sensíveis à norma antirracismo.

As modificações no contexto normativo, contudo, não alteraram as relações desiguais entre brancos e negros, tendo sido constatadas desigualdades quanto ao acesso ao emprego, moradia, saúde, entre outras esferas da vida social. Muitos pesquisadores argumentaram que tal mudança no plano político não refletiria, necessariamente, uma mudança genuína nas atitudes raciais dos grupos dominantes, mas sim que o preconceito e a discriminação, em consonância com as normas sociais igualitárias, teriam adotado formas mais sutis de manifestação (Gaertner & Dovidio, 1986).

Percebe-se, assim, uma mudança no foco do interesse dos pesquisadores, com um aumento substancial de pesquisas, que empregando medidas mais indiretas, visam revelar as atitudes raciais em suas formas de expressão mais sutis e menos evidentes,

formas estas que reproduzem as atitudes racistas sem desafiar a norma social antirracismo. Essas medidas mais indiretas passaram a ser utilizadas em detrimento daquelas que tinham como objetivo a busca de seus conteúdos, utilizando métodos diretos de obtenção de dados (Pereira, 2002; Vala, Brito & Lopes, 1999).

As principais mudanças nas técnicas utilizadas para analisar o preconceito e a discriminação foram avaliadas por Brauer, Wasel e Niendental (2000). Conforme observaram, as primeiras medidas adotadas consistiam em escalas que acessavam preconceitos e estereótipos de uma maneira transparente ao participante. A exemplo, os autores mencionam a escala de distância social de Borgadus (1925), na qual os respondentes eram solicitados a declararem o grau de intimidade com membros de outros grupos que estariam dispostos a tolerar, sendo que o escopo das respostas variava de “excluiria esta pessoa de meu país” a “admitiria parentesco próximo, através do casamento.”

Ainda segundo Brauer et al. (2000), a preocupação dos pesquisadores em analisar atitudes raciais num contexto normativo que condena a manifestação do racismo levou ao desenvolvimento de uma segunda geração nas escalas de preconceito, elaboradas, principalmente, para verificar suas formas mais veladas ou indiretas. Tais escalas eram consideradas como menos reativas, pois ajustes foram realizados para que se apresentassem itens e formatos de resposta que encobrissem o propósito original da investigação. Desse modo, presumia-se que se os participantes fossem realmente preconceituosos, isso poderia ser verificado por meio das escalas, apesar de seus esforços de autoapresentação.

A utilização dessas escalas de verificação de formas sutis do preconceito demonstra que, apesar da raça ter pouco embasamento científico e seja constantemente banida do discurso público através de coerções legais, isso não quer dizer que o

preconceito e o racismo tenham sido excluídos das percepções e das relações estabelecidas no cotidiano. A ideia de raça continua presente no contexto social contemporâneo, ao passo que permanece estruturando a percepção que se tem dos outros e a operar o discurso de exclusão, ainda que de forma camuflada (Cabecinhas, 2007).

Nesse quadro normativo, Vala, Lopes e Brito (1999) pontuaram que o pensamento do senso comum vem deslocando a construção das teorias sociais sobre os grupos humanos e as consequentes formas de categorização social, de ideias sobre raça para ideias sobre diferenças culturais e étnicas. O discurso racista tradicional tem sido substituído por outro que salienta as diferenças culturais e que opera novas diferenciações a partir dos conceitos de cultura e etnia, também utilizados para enunciar hierarquias entre grupos humanos tal como foi feito com o conceito de raça, contudo a ideia de etnia é socialmente mais normativa para justificar conflitos sociais e assimetrias de poder.

Diferentemente do conceito de raça, o grupo étnico é um conceito mais impreciso e que não se resume a uma definição exclusiva, abrangendo outros aspectos que não os traços fenotípicos, tais como o idioma, a religião, a herança cultural, a história e o espaço territorial (Adesky, 2005). Entretanto, Meertens e Pettigrew (1999) verificaram que os termos raça e etnia fazem parte de um processo mais geral de heterorracialização e heteroetnização de grupos humanos, num contexto de relações marcadas pela assimetria de poder ou por relações de dominações reais ou imaginadas. Tal constatação foi observada num estudo sobre as atitudes sociais dos europeus em que foram adotadas escalas de racismo sutil e racismo flagrante. Os resultados indicaram que o primeiro racismo está associado a diferenciações no plano biológico e o segundo, a diferenciações no plano emocional e de valores. Entretanto, análises fatoriais

confirmatórias indicaram que ambos encontram-se relacionados, demonstrando que eles compõem dimensões diferentes de um mesmo fenômeno, tornando-se legítimo abordar os termos de raça e racismo no estudo processos intergrupais.

É dentro desse contexto em que as pessoas tornam-se conscientes das normas antirracista e sustentam valores igualitários que propomos avaliar a relação entre normas sociais e expressões do racismo em crianças. Nesse sentido, apresentaremos os chamados “novos racismos” o impacto que as normas sociais têm exercido sobre a manifestação dos mesmos.

2.2- Normas sociais e os novos racismos:

O estudo do racismo é algo que permanece a instigar o campo das ciências sociais a buscar novas formas de compreender e solucionar esta problemática que aparenta acompanhar diferentes configurações sociais ao longo da história. Tal como abordado anteriormente, na sociedade contemporânea, o que mais chama atenção quanto a esta problemática é o fato de existir todo um aparato jurídico e cultural que condena o racismo e outra formas de discriminação, tais como a discriminação religiosa, gênero, religião (ver Constituição de 1988), sendo ainda o racismo considerado como crime inafiançável e imprescritível, sujeito à pena de reclusão. Todavia, ainda são recorrentes episódios que envolvem a discriminação e o ódio entre os grupos humanos em função da diferença existente entre os mesmos.

Embora já tenham se passado mais de seis décadas desde a publicação da Declaração Universal dos Direitos do Homem, garantindo-se a brancos e negros, igualdade de acesso a instituições e espaços públicos, as estratificações raciais continuam a permear a sociedade brasileira, considerando que ainda é possível notar que, mesmo mais de 100 anos após a abolição da escravatura, brancos e negros ocupam

diferentes posições nas camadas da sociedade, tendo estes últimos permanecido nas condições que envolvem maior desvantagem social, estando comumente vinculados a situações de pobreza e vulnerabilidade.

Conforme um estudo elaborado pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada com amostra por domicílio (IPEA/ FIBGE/ PNAD/ 2008): 1) Os negros correspondem a 68% dos pobres e 71% dos indigentes são negros; 2) Um trabalhador negro ganha, em média, pouco mais da metade do que ganha um trabalhador branco; 3) Das 571.000 crianças entre 7 e 14 anos estão fora da escola, 62% são negras; 4) Uma pessoa negra tem, em média, quase dois anos a menos de estudo que a população branca (8,3 anos contra 6,6). A taxa de analfabetismo entre os negros é mais que o dobro entre brancos.

No cerne deste paradoxo, em que se verificam disparidades sociais herdadas de um passado recente marcado pela vasta tradição racista e pelo legado escravocrata, ao mesmo tempo em que a sociedade estabelece princípios de justiça e equidade, que condenam tanto no âmbito moral como no jurídico as expressões de preconceito, estas últimas têm adquirido novas formas de manifestação que não venham a ferir de maneira aberta as normas de igualdade difundidas em nosso meio social. Esse novo contexto social tem despertado estudos baseados nas denominadas teorias dos novos racismos, as quais afirmam que na sociedade contemporânea, a norma social é a de evitar a expressão de comportamentos ou atitudes discriminatórias (Gaertner & Dovidio, 1986; Katz & Hass, 1988; Kinders & Sears, 1981; Pettigrew & Meertens, 1995). De maneira que estas novas abordagens do preconceito têm concentrado esforços para identificar suas manifestações mais sutis, implícitas e automáticas.

Cabe ressaltar que, no caso de um país miscigenado como o Brasil, este paradoxo reflete um processo cultural e histórico único, no qual o racismo convive não só com normas que o condenam, mais também com ideologias que negam a sua

presença no processo de formação de nosso povo, entre estas destaca-se o chamado “mito da democracia racial” (Fernandes, 2007), o qual sustenta que a aparente ausência de tensões abertas e conflitos permanentes entre os grupos sociais pode ser considerada como indício de boa organização das relações raciais. Entretanto, o argumento de uma suposta igualdade racial não pode ser sustentado numa sociedade recém-egressa da escravidão e onde negros, conforme os dados mencionados, sofrem restrições quanto a oportunidades econômicas, educacionais, sociais e políticas.

Várias teorias foram desenvolvidas com o propósito de avaliar o aparente divórcio entre avaliações públicas mais igualitárias e condições de fato das relações assimétricas entre os grupos. São exemplos a Teoria do Racismo Moderno (McConahay & Hough, 1976), a Teoria do Racismo Aversivo (Gaertner & Dovidio, 1986) ou ainda a teoria do preconceito flagrante e do preconceito sutil (Pettigrew & Meertens, 1995). Essas teorias propõem que os grupos dominantes mantêm suas atitudes preconceituosas face às minorias, mas não a expressam em contextos onde a norma antirracista tende a inibir a expressão de preconceito, suscitando no seu lugar a expressão de atitudes igualitárias e de repúdio da discriminação racial. As expressões do preconceito e da discriminação raciais passam a ocorrer de forma velada, aversiva, discreta, sutil, opondo-se às predecessoras de tipo flagrante, direto e explícito.

Embora não possa ser expresso de forma aberta, mas frequentemente de forma sutil ou velada, é capaz de atuar de modo igualmente perverso sobre os grupos minoritários. (Meertens & Pettigrew, 1999). Dentre estes novos racismos, destacamos o racismo aversivo. A teoria do racismo aversivo considera que o preconceito continua a existir e afetar a vida das pessoas, ainda que de forma indireta. Embora seja abordado como “sutil”, as consequências deste preconceito (p. ex. restrição de oportunidades

econômicas) pode ser significante para as pessoas de cor e tão perversa quanto às formas mais tradicionais e declaradas de discriminação (Dovidio, 2001).

Gaertner e Dovidio (1986) argumentam que a maioria dos americanos exibem o que eles definem como racismo aversivo, um estilo de preconceito que resulta do (1) preconceito que se desenvolve histórico e culturamente no contexto racista e de mecanismos cognitivos que promovem o desenvolvimento de estereótipos e (2) de sistema de valores igualitários. O preconceito que o racista aversivo sente não é abertamente hostil, mas sim é um sentimento de desconforto, mal-estar e medo de negros, manifestado no ato de evitar contato com minorias raciais. Define-se, então o racismo aversivo como uma forma de preconceito caracterizada por pensamentos, sentimentos e comportamentos racistas de uma maioria de norte-americanos brancos que se autodescrevem como bem intencionados e ostensivamente não preconceituosos (Pearson, Gaertner & Dovidio, 2009).

O estudo sobre racismo aversivo aponta que as pessoas possuem crenças e sentimentos raciais negativos, dos quais são inconscientes ou esforçam-se para dissociar estas características de sua autoimagem não preconceituosa. Segundo Dovidio (2001), o racista aversivo, por adotar valores igualitários, não discrimina de uma forma direta ou aberta em que possam julgá-lo como racista, contudo, considerando que mantém atitudes implícitas negativas, manifestará discriminação ainda que de forma não intencional, sempre que seu comportamento possa ser justificado por um outro fator que não seja a raça. O modelo do racismo aversivo considera, portanto, que em contextos nos quais a norma social possa favorecer justificações não racistas para a discriminação, esta última irá ocorrer.

A fim de obter evidências empíricas sobre o racismo aversivo, Dovidio e Gaertner (2000) conduziram um estudo com o objetivo de explorar situações de

discriminação em contextos do cotidiano, neste caso o contexto abordado foi a da contratação, em que os participantes da pesquisa deveriam avaliar, através da descrição de trechos de entrevistas, qual dos candidatos apresentavam perfil apropriado para participar de um novo programa da universidade. Para tanto, os pesquisadores elaboraram três diferentes perfis de candidato: um refletindo boas qualificações, outro apresentando baixas qualificações e um terceiro candidato moderado quanto à apresentação de boas qualificações. Os participantes teriam que avaliar estes perfis em duas condições distintas, uma em que o candidato era negro e outra em que era da cor branca. Os resultados encontrados mostraram que nas situações em que as características dos candidatos eram objetivamente caracterizadas como positivas ou negativas, não se verificaram diferenças expressivas entre brancos e negros. Contudo, nas situações onde os critérios não eram tão objetivos, isto é quando o candidato apresentava qualificações moderadas, houve maior rejeição do candidato negro.

Esta pesquisa evidencia como o preconceito é influenciado por normas sociais que são salientadas no contexto imediato no qual os indivíduos se encontram. Embora nenhum dos participantes se auto afirmasse como racista, no contexto onde não haviam critérios suficientes para qualificar de forma positiva o candidato negro, este era rejeitado, posto que a ausência características suficientemente positivas serviu como justificativa para que este fosse discriminado. Nesse sentido, a teoria do racismo aversivo não só considera que o preconceito tornou-se sensível ás normas sociais, mas que também é caracterizado por atitudes e crenças implícitas que estariam subjacentes à manifestação do comportamento discriminatório (Dovidio, 2001).

Pode-se salientar que a teoria do racismo aversivo considera que o preconceito não pode ser acessado por meio de pesquisas de autorrelato tão como era feito nos estudos iniciais sobre o tema. Isto porque tais instrumentos seriam capazes de acessar

apenas as forma tradicionais de preconceito, manifestas por meio de ações explícitas e conscientes de discriminação. De tal maneira, o racismo aversivo e os novos preconceitos realizam uma distinção que emergiu na literatura da Psicologia Social sobre atitudes e estereótipos (Greenwald & Banaji, 1995). As atitudes explícitas operam de modo consciente e são exemplificadas por mensurações tradicionais de autorrelato. As atitudes implícitas e os estereótipos, por outro lado, atuam como avaliações e crenças ativadas automaticamente frente a um determinado objeto atitudinal, demandando por instrumentos de mensuração capazes de acessar formas indiretas de manifestação do preconceito.

Para Crandall e Eshleman (2003) as teorias correntes sobre o preconceito podem ser caracterizadas como “teorias de dois fatores”. Isto porque compreendem o preconceito racial como resultante da interação entre dois fatores motivacionais distintos, o preconceito racial propriamente dito e a motivação para suprimi-lo. O primeiro fator, o precocneito genuíno, é qualificado como primário, subjacente, apreendido nos primeiros anos de vida e não requer grande esforço cognitivo para ser expresso. O segundo fator, por seu turno, é considerado como o desejo de não manifestar preconceito, sendo influenciado por normas sociais que condenam a expressão do preconceito, abrangendo o liberalismo, o igualitarismo e o desejo de manter de uma auto-imagem coerente com valores humanitários. As teorias, de maneira geral, consideram que a tensão entre a expressão e supressão do preconceito caracacteriza as atitudes dos brancos frente aos negros, sendo que tal interação gera emoções ambivalentes, instabilidade emocional e inconsistência cognitiva.

Embora a teoria do racismo aversivo enfatize a existência de atitudes implícitas na expressão do preconceito e que este é suscetível à influência das normas sociais, ainda são pouocs os estudos que evidenciem a importância das normas sociais na

expressão do preconceito e do racismo, e, mais especificamente quais as normas sociais atuam diretamente sobre a produção e inibição desses fenômenos. Lima, Machado, Ávila, Lima e Vala (2006), fazendo uso do Implicit Association Test (IAT) analisaram o impacto das normas sociais da igualdade e da competição na expressão automática de preconceito contra os negros no Brasil. Os autores realizaram três estudos. No primeiro estudo, analisaram os efeitos dos contextos normativos, igualitário e meritocrático, na expressão do preconceito e verificaram que o contexto meritocrático aumenta o preconceito, entretanto o contexto igualitário não o reduz .

No segundo estudo, analisa-se os sentidos dados pelos participantes à “igualdade”. Observou-se a atribuição de dois sentidos: 1) igualdade solidária: “Por exemplo, podemos pensar que todas as pessoas devem ter as suas diferenças respeitadas e valorizadas pela sociedade. E que as diferenças entre as pessoas não devem produzir diferenciações ou discriminações e preconceitos. Isto implica pensar uma sociedade mais inclusiva e justa que produza integração entre as pessoas e crie uma situação de

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