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1.3 A regulamentação do Sistema Único de Saúde

1.3.4 A Norma Operacional Básica-SUS 01/96

Para a pesquisa em questão, a NOB-SUS 01/96 é de fundamental importância, porque foi a responsável pela criação dos incentivos ao Programa Saúde da Família.

Foi criada por meio da edição da Portaria nº 1.742, pelo Ministério da Saúde, em agosto de 1996. Seu tema principal era a gestão plena, no sentido de “construir a plena responsabilidade do poder público municipal sobre a gestão de um sistema de saúde e, não somente, sobre a prestação de serviços de saúde.” (SANTORO, 2003, p. 75).

O município era considerado o responsável imediato pelo atendimento das necessidades e demandas de sua população e das exigências de intervenções saneadoras em seu território. Verifica-se que essa norma é nitidamente municipalista.

A NOB-SUS 01/96 teve como horizonte estratégico ampliar a responsabilidade do gestor municipal e estadual em um conjunto de mudanças no modelo assistencial, pelo fortalecimento da atenção básica e primária e das ações de saúde coletiva.

56 De acordo com Santoro (2003), essa NOB introduziu a idéia de Sistema de Saúde Municipal (SUS Municipal), procurando fortalecer o sistema local de saúde, integrado numa rede regionalizada e hierarquizada. Foi na NOB-SUS 01/96 que se instituiu o Cartão SUS Municipal, com numeração nacional, de modo a identificar o cidadão através desse sistema.

Foi definida uma hierarquização do papel público, sendo uma das responsabilidades nucleares do âmbito estadual mediar a relação entre os sistemas municipais, e a do federal, mediar as relações entre os sistemas estaduais.

Como corroboram Costa, Silva e Ribeiro (1999), os principais objetivos dessa NOB eram: promover e consolidar a função municipal na gestão do poder público na atenção à saúde; redefinir as responsabilidades de estados, Distrito Federal e União; reorganizar o modelo assistencial e estabelecer a direção única em cada nível de governo.

Em relação ao processo de responsabilização proposto pela NOB 01/93, a NOB 01/96 o simplificou, reduzindo as condições de habilitação municipal para duas modalidades: Gestão Plena da Atenção Básica (GPAB) e Gestão Plena do Sistema Municipal (GPSM). Aos estados, a NOB 01/96 prevê estas modalidades de gestão: Gestão Avançada do Sistema Estadual (GASE) e Gestão Plena do Sistema Estadual (GPSE).

No caso dos municípios, a Gestão Plena da Atenção Básica habilitou o gestor municipal para elaborar a programação dos serviços básicos, sendo responsável pela gestão e execução da assistência ambulatorial básica, pelas ações básicas de vigilância sanitária, epidemiológica e pelo controle de doenças. O município contratava, controlava e pagava os prestadores de serviços, os procedimentos e as ações de assistência básica.

Já a Gestão Plena do Sistema Municipal propiciou ao município a elaboração de toda programação em saúde, inclusive a assistência ambulatorial especializada e hospitalar, ampliando as responsabilidades municipais de acordo com as necessidades da população. O município passa a ser o responsável imediato pelo atendimento das necessidades e demandas de saúde. Habilitado nessa gestão, torna-se responsável pela avaliação e auditoria nos serviços de saúde local e pela administração da oferta de procedimentos de alto custo e complexidade, sendo a ele subordinados todas as unidades e serviços de gerência pública (municipal, estadual e federal) e privada.

Quanto às modalidades de gestão para os estados, verifica-se na Gestão Avançada do Sistema Estadual que:

57 [...] o estado é responsável pela programação da Fração Assistencial Especializada (FAE) e política de alto custo e complexidade; pela formulação da política de sangue e assistência farmacêutica; coordenação da política de vigilância sanitária, epidemiológica e controle de doenças, cooperação técnica aos municípios, elaboração e execução do Plano Estadual de Investimentos; contratação, controle e auditoria dos serviços.(NAKAI, 1998, p.24).

Na Gestão Plena do Sistema Estadual, o estado possui as mesmas responsabilidades e competências da gestão acima mencionada, mas também se responsabiliza pela gestão plena de todos os serviços, exceto nos municípios habilitados nas gestões que a exercem.

Essa NOB também estabeleceu os bancos nacionais de dados como instrumentos essenciais à realização do controle, avaliação e auditoria dos serviços e ações de saúde. Assim, os gestores municipais e estaduais do SUS devem garantir a alimentação regular desses bancos, conforme as regras estabelecidas pelo Ministério da Saúde.

A idéia de mudança do modelo assistencial, como vimos desde a NOB anterior, era enfática. A NOB-SUS 01/96 ressaltou a construção de uma rede regionalizada e hierarquizada, bem como a busca do enfoque epidemiológico.

O novo modelo a ser organizado deveria estar centrado na construção da ética do coletivo que incorpora e transcende a ética individual.

Dessa forma foi incentivada a associação dos enfoques clínico e epidemiológico. Nessa nova relação a pessoa é estimulada a ser agente da sua própria saúde e da saúde da população da comunidade que integra. (SANTORO, 2003, p. 80).

Sobre o financiamento, essa NOB estabeleceu o aumento percentual da transferência regular e automática (fundo a fundo) dos recursos federais aos estados e municípios. Em contrapartida, reduziu a transferência de recursos por remuneração de serviços prestados.

Além do teto financeiro de assistência, a NOB 01/96 criou um conjunto de instrumentos indutores do novo modelo assistencial, destacando-se: a criação do Piso Assistencial Básico (PAB); a Fração Assistencial Especializada (FAE); o Índice de Valorização de Resultados (IVR); o Piso Básico de Vigilância Sanitária (PBVS) e Índice de Valorização do Impacto em Vigilância Sanitária (IVISA); o incentivo à adoção do Programa Saúde da Família (PSF) e o Programa de Agentes Comunitários (PACS). Focaremos-nos na criação do PAB e no incentivo à adoção do PSF e do PACS.

58 O Piso Ambulatorial Básico (PAB) é destinado ao custeio da atenção básica sob a responsabilidade do município. É composto de uma parte fixa (PAB fixo), destinada a todos os municípios, e de uma parte variável (PAB variável), que consiste no acúmulo de recursos financeiros destinados a estimular a implantação das seguintes estratégias nacionais de reorganização do modelo de atenção à saúde: Saúde da Família – SF; Agentes Comunitários de Saúde – ACS; Saúde Bucal – SB e outras.

O PAB fixo é calculado pela multiplicação da população do município por um valor per

capita nacional.

O PAB variável é acréscimo percentual ao montante do PAB, sempre que estiverem atuando na rede municipal equipes de saúde da família, agentes comunitários de saúde ou estratégias similares de garantia da integralidade da assistência, sinalizando a preocupação da norma em promover uma mudança do modelo assistencial; preocupações também presentes nas NOBs anteriores. Buscava-se a reformulação do modelo assistencial centrado na assistência médico-hospitalar individual, fragmentada e sem qualidade, para um modelo com assistência integral, universalidade, equânime, regionalizada e hierarquizada.

O Programa Saúde da Família (PSF) e o Programa de Agentes Comunitários (PACS) receberam, e ainda recebem, recursos através da transferência fundo a fundo, sendo calculados conforme os seguintes critérios:

a) Programa de Saúde da Família (PSF):

 acréscimo de 3% sobre o valor do PAB para cada 5% da população coberta, até atingir 60% da população total do município;

 acréscimo de 5% para cada 5% da população coberta entre 60% e 90% da população total do município e,

 acréscimo de 7% para cada 5% da população coberta entre 90% e 100% da população total do município.

b) Programa de Agentes Comunitários de Saúde (PACS):

 acréscimo de 1% sobre o valor do PAB para cada 5% da população coberta até atingir 60% da população total do município;

 acréscimo de 2% para cada 5% da população coberta entre 60% e 90% da população total do município; e

59  acréscimo de 3% para cada 5% da população coberta entre 90% e 100% da população

total do município.

Cabe destacar que os acréscimos no PSF têm, como limite, 80% do valor do PAB original do município e que os acréscimos no PACS possuem, como limite, 30% do valor do PAB original do município.

Segundo Santoro (2003), o Programa Saúde da Família (PSF) produziu consenso quanto ao projeto de mudança do modelo hegemônico, contribuindo ainda para o acirramento das discussões sobre a necessidade de uma nova lógica de financiamento que não fosse por procedimentos. O PSF foi estruturado para nortear as mudanças propostas pela NOB-SUS 01/96. Santoro demonstra em seu trabalho que, com a implementação da NOB-SUS 01/96, houve intensificação do processo de descentralização, com 99% dos municípios brasileiros habilitados em alguma forma de gestão, em 1998, sendo que 90% se apresentavam habilitados em Gestão Plena da Atenção Básica. “Tal fato, acrescido do estímulo à implantação da estratégia da Saúde da Família, permitiu melhoria considerável do acesso da população às ações básicas à saúde.” (SANTORO, 2003, p. 97)