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Normas jurídicas como meio de atingir a eficiência econômica

3. EFICIÊNCIA FISCAL

3.2 Normas jurídicas como meio de atingir a eficiência econômica

O sistema jurídico se estrutura por meio de um conjunto de normas hierárquicas entre si, de modo a criar a chamada pirâmide jurídica. Essa denominação ocorre devido à necessidade de as normas inferiores estarem de acordo com as superiores, assim são consideradas válidas, caso contrário, a norma194 será considerada inválida e, portanto, não

produzirá efeitos.

Conforme doutrina Paulo de Barros Carvalho, uma norma só é considerada válida quando é colocada no ordenamento jurídico pelo órgão legitimado a produzi-la, mediante o procedimento estabelecido para esse fim, assim a validade da norma é o “vínculo que se estabelece entre a proposição normativa e o sistema do direito posto”.195

De acordo com o conceito trazido pela Enciclopédia Jurídica Soibelman, norma jurídica196 “é uma regra de conduta imposta, admitida ou reconhecida pelo ordenamento

jurídico”. Nas palavras de Clélio Chiesa, as normas jurídicas formam o conjunto de elementos que integram o sistema do direito positivo, sendo elas as unidades que devem ser agrupadas

194 Importante mencionar que a doutrina classifica de diversas formas as normas jurídicas, variando tal classificação de acordo com o autor. A Enciclopédia Jurídica Soibelman traz algumas delas: “primárias, secundárias, gerais, individualizadas, fundamentais, derivadas, legisladas, consuetudinárias, jurisprudenciais, nacionais, internacionais, locais, de vigência determinada ou indeterminada, de direito público ou privado, substanciais, adjetivas, imperativas, supletivas, de ordem pública, repressivas, preventivas, executivas, restitutivas, rescisórias, extintivas, constitucionais, federais, estaduais, municipais, ordinárias, complementares, negociais, de equidade, positivas, de organização, de comportamento, instrumentais, preceptivas, proibitivas, permissivas, particulares, autônomas, rígidas, elásticas, formais, materiais, construtivas, técnicas etc.”. O presente estudo não visa analisar cada classificação de norma, visto que o foco se restringe à necessidade de todas as normas jurídicas introduzidas em nosso ordenamento jurídico precisarem observar os ditames da Constituição Federal, que, no caso estudado, é a necessidade de observar o princípio da eficiência consignado no artigo 37 da Constituição Federal.

195 CARVALHO, P. de B. Curso de direito tributário. 17. ed. São Paulo: Saraiva, 2005, p. 82. 196 Disponível em: <http://www.elfez.com.br/elfez/Normajuridica.html>. Acesso em: 11 jun. 2016.

sob um princípio unificador para a formação do sistema jurídico.197 Para Noberto Bobbio, “as

normas jurídicas nunca existem isoladamente, mas sempre em um contexto de normas com relações particulares entre si”.198

No topo da pirâmide jurídica em nosso ordenamento jurídico, está a Constituição Federal, a qual deve ser observada pelas demais normas, pois confere fundamento de validade para essas, tendo em vista que “representa o escalão de direito positivo mais elevado. Sobremais, ela dá validade a si própria, já que encarna a soberania do Estado que a editou.”199 A relevância da Constituição Federal no sistema jurídico pode ser compreendida através dos ensinamentos de Hans Kelsen:

A ordem jurídica não é um sistema de normas jurídicas ordenadas no mesmo plano, situadas umas ao lado das outras, mas é uma construção escalonada de diferentes camadas ou níveis de normas jurídicas. A sua unidade é produto da relação de dependência que resulta do fato de a validade de uma norma, que foi produzida de acordo com outra norma, se apoiar sobre essa outra norma, cuja produção, por sua vez, é determinada por outra; e assim por diante, até chegar finalmente na norma fundamental - pressuposta. A norma fundamental - hipotética, nesses termos - é, portanto, o fundamento de validade último que constitui a unidade desta inter- relação. Se começarmos levando em conta apenas a ordem jurídica do Estado, a Constituição representa o escalão de Direito positivo mais elevado.200

Com isso, é imperativo que os ditames da Constituição Federal sejam observados quando da edição das normas jurídicas inferiores, visto que suas disposições não são meras recomendações, mas sim de uma lei fundamental do Estado que deve ser obrigatoriamente seguida.201

Nesse contexto, na Constituição Federal temos normas que representam regras a serem seguidas e também temos disposições que devem ser acatadas que são denominadas por princípios jurídicos, os quais devem ser observados pela Administração Pública. Como bem menciona Roque Antonio Carraza, os princípios são os “alicerces”, as “vigas mestras” do ordenamento jurídico:

Sendo o princípio, pois, a pedra de fecho do sistema ao qual pertence, desprezá-lo equivale, no mais das vezes, a incidir em erronia inafastável e de efeitos bem

197 CHIESA, Clélio. ICMS: Sistema Constitucional Tributário. Algumas inconstitucionalidades da LC n° 87/96. São Paulo: LTR, 1997, p. 23.

198 CHIESA, Clélio. Teoria do ordenamento jurídico. 10. ed. Brasília: Editora da UnB, 1999, p. 19.

199 CARRAZA, R. A. Curso Direito Constitucional Tributário. 12. ed. São Paulo: Malheiros Editores, 1999, p. 28.

200 KELSEN, H. Teoria Pura do Direito. 3. ed. São Paulo: Martins Fonte, 1999, p. 240.

201 CARRAZA, R. A. Op. cit., p. 28. Em sua obra, explica que “as normas constitucionais, além de ocuparem a cúspide da pirâmide jurídica, caracterizam-se pela imperatividade de seus comandos, que obrigam não só as pessoas físicas ou jurídicas, de direito público ou de direito privado, como o próprio Estado”.

previsíveis: o completo esboroamento da construção intelectual, a exemplo, como lembra Geraldo Ataliba, do que ocorreu na Abóbada, de Alexandre Herculano.202

O legislador constituinte, para proteger os cidadãos de eventuais arbitrariedades que poderiam ser causadas pelo Estado, estabeleceu como direito e garantia individual no artigo 5º, inciso II da Constituição Federal que “ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei”, assim somente com a expedição de normas editadas pelos “representantes do próprio povo é que tem nascimento, modificação ou extinção de direitos e obrigações, competindo à Administração Pública expressa obediência ao princípio da legalidade (art. 37 da Constituição Federal)”.203

Com isso, a Administração Pública só pode agir mediante a existência de uma norma jurídica válida em nosso ordenamento jurídico que autorize o ato administrativo a ser praticado. Isso porque, conforme dito anteriormente, de acordo com o artigo 37204 da Constituição Federal, a Administração Pública deve observar o princípio da legalidade.

Como bem ressalta o ilustre professor Ives Gandra da Silva Martins a “lei é o instrumento introdutor dos preceitos jurídicos que criam direitos e deveres correlatos”.205A

norma jurídica, nesse contexto, deve ingressar em nosso ordenamento jurídico por meio do competente processo legislativo, de modo que a Administração Pública fica restrita a atuar no limite da lei. Com isso, podemos afirmar que a norma jurídica seria o instrumento por meio do qual a autoridade administrativa está autorizada a realizar os atos administrativos.

Tais instrumentos devem estar pautados nos princípios norteadores da Administração Pública, isso porque a Constituição Federal tem como objetivo reunir os mandamentos lineares para a organização da estrutura do Estado federal, de modo que os princípios ali previstos representem os alicerces do sistema jurídico, os quais devem ser observados para garantir a harmonia interna desse sistema.206 Como bem explica Tércio Sampaio Ferraz Jr., a

202 CARRAZA, R. A. Curso Direito Constitucional Tributário. 12. ed. São Paulo: Malheiros Editores, 1999, p. 30.

203 MELO, J. E. S. de. 8. ed. Curso de direito tributário. 8. ed. São Paulo: Dialética, 2008, p. 18.

204 Art. 37: “A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência […]” (grifo nosso)

205 MARTINS, I. G. da S. Estímulos Fiscais no ICMS e a unanimidade constitucional. In: ______; CARVALHO, P. de B. Guerra fiscal: Reflexões sobre a concessão de benefícios no âmbito do ICMS. São Paulo: Noeses, 2012, p. 21: “ […] Por força do princípio da legalidade (CRFB/88, art.5º, II) a potência de normas jurídicas inaugurais no sistema há de ser feita, exclusivamente, por intermédio de lei. Em qualquer segmento da conduta social, regulada pelo direito, é a lei o instrumento introdutor dos preceitos jurídicos que criam direitos e deveres correlatos”.

206 José Eduardo Soares de Melo, ao se basear nos ensinamentos de Geraldo Ataliba, explica: “A Constituição Federal estabelece um sistema escalonado de normas, representado por uma autentica pirâmide jurídica que, visualizada de baixo para cima, compreende num patamar inicial o seu próprio alicerce, denominado ‘princípios’, tendo sido pontificado que “o sistema jurídico - ao contrário de ser caótico e desordenado - tem

importância das diretrizes constitucionais decorre de sua característica como “lei fundamental” e “é um conjunto de normas articuladas que tecnicamente viabilizam os procedimentos para que realmente a atividade organizada da sociedade possa se desenvolver”.207

Geraldo Ataliba reforça a importância dos princípios em nosso ordenamento jurídico e os define como “linhas mestras, os grandes nortes, as diretrizes magnas do sistema jurídico”, os quais apontam os rumos que devem ser obrigatoriamente seguidos pelos órgãos do governo.208

No que tange ao princípio da legalidade, a sua observação se faz necessária visto que tal princípio consubstancia os valores de certeza e de segurança jurídica, à medida que carrega de carga valorativa para coibir a discricionariedade do legislador.209

No caso das normas do sistema tributário, a Constituição Federal no artigo 150, inciso I,210 exigiu expressamente que a instituição, majoração e extinção dos tributos devem sempre estar previstos em lei, bem como exigiu que, da mesma forma, os casos de subsídio, isenção, redução de base de cálculo, concessão de crédito presumido, anistia ou remissão relativos aos tributos também devem ter menção em lei.

Assim, no caso das normas de tributação, deve haver a observação do princípio da estrita legalidade para garantir a segurança jurídica ao sistema tributário. Como é possível se considerar, em âmbito tributário, o princípio da legalidade foi reforçado para prevenir que os

profunda harmonia interna. Esta se estabelece mediante uma hierarquia segundo a qual algumas normas descansam em outras, as quais, por sua vez, repousam em princípios que, de seu lado, se assentam em outros princípios mais importantes. Dessa hierarquia decorre que os princípios maiores fixam as diretrizes gerais do sistema e subordinam os princípios menores”. (MELO, F. S. Curso de direito tributário. 8. ed. São Paulo: Dialética, 2008).

207 FERRAZ JR, Tércio Sampaio. Introdução ao estudo do direito. São Paulo: Atlas, 2001, p. 208. 208 ATALIBA, Geraldo. República e Constituição. 3. ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2011, p. 6-7.

209 FIGUEIREDO, L. V. Princípio de proteção ao contribuinte, princípio da segurança jurídica. Revista de Direto Tributário, São Paulo, n. 47, p. 561, 2001.

210 Art. 150: “Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:

I - exigir ou aumentar tributo sem lei que o estabeleça; […]

III - cobrar tributos:

a) em relação a fatos geradores ocorridos antes do início da vigência da lei que os houver instituído ou aumentado;

b) no mesmo exercício financeiro em que haja sido publicada a lei que os instituiu ou aumentou; (vide Emenda Constitucional nº 3, de 1993)

§6º Qualquer subsídio ou isenção, redução de base de cálculo, concessão de crédito presumido, anistia ou remissão, relativos a impostos, taxas ou contribuições, só poderá ser concedido mediante lei específica, federal, estadual ou municipal, que regule exclusivamente as matérias acima enumeradas ou o correspondente tributo ou contribuição, sem prejuízo do disposto no art. 155, §2º, XII, g. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 3, de 1993).”

entes competentes instituam ou modifiquem os tributos que são de sua competência de forma arbitrária.211

Note-se que a característica compulsória da exigência dos tributos é acobertada pela legalidade de tais atos, à medida que a tributação é considerada legal sempre que o tributo estiver devidamente previsto em uma norma jurídica válida.

A necessidade da observação do princípio da legalidade em âmbito tributário ressalta a importância que as normas jurídicas possuem para garantir a harmonia do sistema de tributação e, como todo ato do Poder Público, devem estar pautadas nos princípios previstos no artigo 37 da Constituição Federal, dentre eles, o da eficiência.

Assim, as normas jurídicas tributárias, como instrumentos da Administração Pública para modificar o sistema de tributação, devem viabilizar a eficiência administrativa, a qual se concretiza sempre que a Administração Pública, por meio de seus atos, consiga os melhores resultados com a utilização do menor número possível de recurso.

Com isso, a burocratização do sistema do ICMS bem como a descentralização normativa, causada em decorrência da competência estadual desse imposto, são um obstáculo para alcançar a eficiência exigida, visto que as normas jurídicas, como estruturadas, além de gerar um grande volume de questionamento212 também exigem que cada ente federativo mantenha uma estrutura necessária para fiscalização e arrecadação de tal tributo.