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95 Neste sentido, ver Jorge Miranda A Constituição de 1976, p 16 e Gomes Canotilho/ Vital Moreira, Fundamentos da Constituição, p 36.

1.2.2. Normas programáticas e a eficácia da Constituição.

A Constituição abarca uma série de normas, como se vê, regras e princípios, todas revestidas de eficácia e valor jurídico mesmo que de diferente grau. Desta forma, existem normas que, para otimizarem sua eficácia prescindem de uma normação complementar98. As normas programáticas são desta espécie. Eficácia, segundo José Afonso da Silva, é a capacidade de atingir objetivos

previamente fixados como metas. Tratando-se de normas jurídicas, a eficácia

consiste na capacidade de atingir os objetivos nela traduzidos, que vêm a ser, em

última análise, realizar os ditames jurídicos objetivados pelo legislador."

As normas constitucionais, no âmbito da eficácia, por serem superiores hierarquicamente às demais, classificam-se segundo proposta de José Afonso da Silva100 em normas constitucionais de eficácia plena, normas constitucionais de eficácia contida e normas de eficácia limitada. Dentre as

97 Cf. LARENZ, op. cit., p. 310-311.

98 Normação complementar refere-se, aqui, à norma que complementa, tanto a ordinária quanto a complementar no sentido técnico do termo.

99 Cf. SILVA, J. op. cit., p.66.

100 A questão da aplicabilidade e da eficácia das normas constitucionais não é o objeto principal desta dissertação, portanto será abordada tão somente uma referência quanto à programaticidade das normas constitucionais e da eficácia da Constituição, para maior aprofundamento da matéria ver: SILVA, José M om o Aplicabilidade das normas constitucionais. 3.ed. São Paulo: Malheiros, 1999.

últimas situam-se as normas declaratórias de princípios institutivos ou organizatórios e as declaratórias de princípio programático101.

No que tange a norma programática propriamente dita, já não se aceita a antiga doutrina de que ela seja despida de normatividade, valendo, desta forma, como simples programa futuro, promessa ou mesmo declaração carecedora da coatividade que lhe garanta a eficácia. Hodiernamente se reconhece a normatividade da norma programática como norma-fim, norma-tarefa, que dirige

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materialmente a concreção constitucional já que a norma constitucional, programática ou não, é uma norma como qualquer outra, porém de hierarquia superior. Isto significa que sua positividade decorre da obrigatoriedade do legislador, do Poder Público e seus órgãos de conferir-lhe a concretude por ela exigida, porque não existem simples declarações na Constituição. Todas as normas ali contidas são iguais em dignidade. Verifica-se, então, que a questão radica não na idéia de normatividade da norma constitucional, haja vista que esta sempre tem valor normativo, mas na questão de sua aplicabilidade.

Crisafulli103, entretanto, ao analisar a questão da norma programática enquanto promessa, mera declaração de fins, entendeu que as normas programáticas no corpo constitucional retiram a aplicabilidade imediata e a eficácia da Constituição, causando gravame ao cidadão. Sem olvidar que as normas programáticas são, via de regra, as normas constitucionais referentes a direitos fundamentais sociais. José Afonso da Silva, por esta razão, diz que estas

101 Para um aprofundamento acerca das normas constitucionais vide SILVA, losé Afonso da. Aplicabilidade das normas constitucionais.

102 Cf. CANOTILHO, J. op. cit., p. 1102.

103 Cf. CRISAFULLI, V. op. cit., p. 101. Entendido aqui o conceito antigo de norma programática como norma-programa, sem a força normativa hoje reconhecida.

compõem os elementos sócio-ideológicos das constituições contemporâneas. Mas neste sentido, apesar de as normas programáticas muitas vezes ficarem na dependência de lei que lhes confira a eficácia necessária à fruição de determinado direito, elas ainda possuem eficácia no sentido impeditivo, ou seja, caso seja criada uma lei que pretenda extinguir o direito conferido pela norma programática mesmo que ainda não determinado esta lei será inconstitucional104. Deste modo, na pior das hipóteses a norma programática tem eficácia ab-rogativa e cria direito subjetivo negativo105.

Portanto, a aplicabilidade direta significa que as normas referentes a direitos e garantias valem inclusive contra a lei, tomando-a inconstitucional no caso de contrariar esses valores albergados pela norma constitucional. E o que se verifica na Constituição Brasileira, fenômeno que é uma verdadeira

inconstitucionalidade superveniente106 que ocorre na derrogação de normas

anteriormente válidas, em virtude de uma nova Constituição. Esta aplicabilidade também alcança a norma programática.

No tocante à aplicabilidade imediata das normas programáticas, sustenta Canotilho que elas não poderiam ser desprovidas de imediata aplicabilidade e efetividade, pois sua posição hierárquica constitucional faz com que funcionem à maneira de vincular a atuação da Administração Pública, do legislador e dos próprios tribunais, que no caso de um possível desatendimento

104 Cf. MIRANDA, Jorge, Manual de direito constitucional, II ,3. ed.Coimbra: Coimbra, 1994, p. 533, GRAU, Eros Roberto.A Constituição brasileira e as normas programáticas. Rev,Dir. Const. E C. Política, 4, p.45.

105 SILVA, J. op. cit., p. 262,

geraria o incidente de inconstitucionalidade do ato,- lei ou decisão107. Urge observar que deixar que um direito consagrado constitucionalmente dependa da edição de uma norma ordinária, é no mínimo subverter a hierarquia das normas

jurídicas108, e com isso retirar a força da Constituição. Entende-se que a eficácia

da Constituição pertine com sua efetividade, sua realização. Neste sentido, Barroso109 insiste em que a efetividade da norma representa a materialização dos preceitos legais, refletindo-se numa aproximação entre o dever-ser normativo e o

ser da realidade social.

A estrutura programática tradicional, adverte Canotilho, acaba por esvaziar a força normativa da Constituição perante a dinâmica social e política110 Desta forma, verifica-se o fenômeno da Constituição meramente formal, garantidora de direitos ao cidadão em forma de promessa, mas que não se coaduna com o ideal de justiça proclamado pela Carta Constitucional e a sua materialidade.

Outrossim, Loewenstein111 ao analisar a questão da efetividade constitucional elaborou a chamada classificação ontológica, dividindo em três categorias, a constituição nominal, a semântica e por fim a normativa. Na constituição nominal o processo político não está em harmonia com a realidade social e econômica, esta é remetida ao futuro. A constituição semântica estabelece uma relação de subordinação do poder político para os detentores do poder. Por 101 Cf. CANOTILHO, J. op. cit., p. 1106. (,..)além de constituírem princípios e regras definidoras

de diretrizes para o legislador e a administração, as “normas programáticas ’’ vinculam também os tribunais(...) suscitando o incidente de inconstitucionalidade(...) dos atos normativos contrários às mesmas normas.

108 GRAU, Eros Roberto. Direito, conceitos e normas jurídicas. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1988, p. 127.

109 Cf. BARROSO, Luís Roberto. O Direito constitucional e a efetividade de suas normas, limites e possibilidades da Constituição brasileira 2.ed. Rio de Janeiro: Renovar, 1993, p.79. 110 CANOTILHO, J. op. cit., p. 81.

outro lado a constituição normativa domina o processo de poder político que deve se amoldar a ela, assim esta é a constituição válida e integrada na sociedade.