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Capítulo 1. Compras públicas: conceito e suas implicações para atuação de governos

1.3 Nova política de compras governamentais do Banco Mundial

Em contratações de projetos com aporte financeiro de bancos internacionais, as compras públicas são instrumentos frequentemente utilizados para operacionalizar a aquisição de produtos, serviços ou obras. O Banco Mundial, instituição que atua no financiamento de projetos em países pouco desenvolvidos ou em desenvolvimento, detém experiência em

operações relacionadas às compras públicas. Ressalta-se que os bancos multilaterais, como o Banco Mundial, não são parte das contratações de compras públicas. Os contratos e negociações são conduzidas por entes da administração pública e pelas empresas que executam o escopo contratado, como o fornecimento de produtos, a prestação de serviços ou a realização de obras.

Ainda que não participe diretamente das compras, o Banco Mundial criou regulamento para compras públicas, que visa resguardar a aplicação de seus aportes financeiros aos fins do projeto contratado. O primeiro regulamento sobre as compras públicas do Banco Mundial foi lançado na década de 1960. Antes desse regulamento, contudo, o Banco Mundial realizava aportes em projetos articulados por compras públicas, mas não existiam regras específicas sobre as operações do Banco de tais contratações. Basicamente, o objetivo geral do Banco Mundial era de que os empréstimos fossem utilizados para os propósitos aos quais foram cedidos, em atendimento aos princípios da economia e da eficiência (WILLAMS-ELEGBE, 2017).

A primeira edição do regulamento foi lançada em 1964 e posteriores revisões ocorreram em 1965, 1974, 1985, 1995, 2004, 2011 e, recentemente, a última revisão em 2016. As edições do regulamento acompanharam as mudanças nas partes e o escopo das contratações - antes, limitados a países membros do Banco Mundial e grandes projetos, de larga escala e muitas vezes, em setores de infraestrutura e atualmente aberto a todos os países, com poucas exceções e abarcando compras em diversos setores, inclusive de inovação. O Banco Mundial não é parte no contrato de compra, mas acompanha de perto o processo de compra por meio dos documentos e informações prestadas pelo mutuário. O contrato de financiamento celebrado pelo Banco é executado com o ente da administração pública, que irá promover a compra. As responsabilidades sobre a execução das atividades de compra ou a prestação dos serviços contratados são exclusivas do órgão público contratante e a empresa ou os indivíduos contratados.

As revisões das regras do Banco Mundial concernentes aos empréstimos acompanharam tendências internacionais de governança dessas operações. No período entre 1964 e 1994, o regulamento do Banco Mundial baseava-se em quatro princípios, são eles: economia e eficiência no processo de compra, ampla concorrência entre os proponentes, estímulo à indústria local e transparência. Na revisão do regulamento em 1995, foram introduzidas disposições sobre combate à fraude e à corrupção no intuito de evitar que empresas envolvidas nessas atividades ilícitas assumissem contratos em projetos financiados

pelo Banco Mundial. Em razão do acréscimo dessa previsão ao regulamento, os mutuários passaram a propor a inclusão de cláusulas anticorrupção nos documentos da compra.

Posteriormente, em 2004, as disposições anticorrupção do regulamento foram revisadas e acrescentaram no rol das atividades proibidas práticas de manipulação fraudulenta da concorrência (bid rigging), acordo de preços, atividades coordenadas, colusivas ou coercitivas. Deste modo, além dos quatro princípios (economia e eficiência, concorrência, estímulo à indústria local e transparência) o regulamento passou a incorporar também a anticorrupção como um de seus pilares.

Na década seguinte, entre 2005 e 2014, houve um movimento por reformas em busca da harmonização de práticas e diretrizes em diferentes bancos multilaterais. O Banco Mundial encabeçou esse processo com novas regras de governança com abrangência dentro e fora da instituição. A crise financeira de 2008 deu mais ênfase para as reformas nos procedimentos dos bancos multilaterais na concessão de financiamentos a projetos. Em sintonia com múltiplas instituições financeiras, o Banco Mundial reavaliou, a partir dos eventos da crise de 2008, suas operações no sentido de criar mecanismos para responder melhor a reviravoltas imprevisíveis e sistêmicas, como foi a crise global econômica. Dessa forma, foram criadas novas regras para aumentar o controle e a responsabilidade sobre as decisões tomadas nas operações do Banco, bem como métodos mais transparentes e participativos no poder decisório.

Em 2011, o Banco Mundial iniciou uma grande reforma no seu regulamento sobre o financiamento de compras públicas. Dessa reforma emergiu um novo regulamento que reuniu as disposições sobre as compras públicas na referida instituição. As modificações introduzidas no conjunto de regras criadas a partir de 2011 seguiram dois enfoques, são eles: entender as compras públicas como instrumentos adequados à finalidade (fit-for-purpose) e que a liberação do financiamento pelo banco consideraria o valor investido vis-à-vis os objetivos almejados com a compra, em uma avaliação de custo-benefício (value for money).

Em julho de 2016, entrou em vigor o regulamento de aquisições do Banco Mundial para financiamento de projetos de investimento. As compras públicas são os principais instrumentos nessas operações de financiamento e o regulamento em vigor incorporou as reformas anteriores. O regulamento em vigor, de 2016, pauta-se nos seguintes princípios: economicidade, integridade, maior custo-benefício, adequação à finalidade, eficiência, transparência e equidade (WORLD BANK, 2017). Além disso, constam do

regulamento as disposições anticorrupção, que vinham inseridas desde as reformas na década de 1990.

Em linhas gerais, de acordo com Enzo de Laurentis, diretor chefe do departamento de compras do Banco Mundial, as revisões do regulamento de aquisições partiram de uma abordagem mais prescritiva para um enfoque baseado em princípios. Em outro sentido, o regulamento em vigor reconhece que os mecanismos de compra nem sempre devem perseguir o menor preço na concorrência. Além disso, o compartilhamento de informações de forma transparente e ágil - com forte estímulo às atividades de tecnologia da informação que já são relevantes para as compras (e-procurement) - são aspectos enfatizados no regulamento revisado.

A atuação do Banco Mundial nas operações que envolvem compras públicas é dupla, ou seja, o banco age como financiador e adota medidas para fiscalizar que o empréstimo seja utilizado para o propósito contratado. Neste contexto, o Banco aloca representantes nos países em que há potenciais projetos de investimento para interpretar e monitorar leis e regulamentos sobre compras públicas, bem como assessorar o Banco na fiscalização dos empréstimos concedidos.

1.4 Experiência dos Estados Unidos com a compra pública no cenário internacional